Acórdão Arbitral
Os árbitros José Poças Falcão (árbitro presidente), Clotilde Celorico Palma e António Sérgio de Matos (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 22.05.2015, acordam no seguinte:
I. Relatório
1. A... Lda., Pessoa Colectiva nº..., com sede na ..., ...-... ... (doravante designada Requerente) apresentou um pedido de constituição do tribunal arbitral colectivo, nos termos conjugados dos artigos 2.º, n.º 1, e 10.º, n.º 1, alínea a), do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, doravante designado RJAT), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira, com vista à declaração de ilegalidade e anulação de várias liquidações de Imposto sobre o valor acrescentado (“IVA”) e dos correspondentes juros compensatórios, relativos aos períodos de tributação de 2010.03T a 2014.03T, no Total de 122.718,14 Euros, a saber:
Liquidação Adicional n.º ... (Doc. 1), Liquidação Adicional n.º ... (Doc. 2), Liquidação Adicional n.º ... (Doc. 3), Liquidação Adicional n.º ... (Doc. 4), Liquidação Adicional n.º ... (Doc. 5), Liquidação Adicional n.º ... (Doc. 6), Liquidação Adicional n.º ... (Doc. 7), Liquidação n.º ... (Doc. 8), Liquidação n.º ... (Doc. 9), Liquidação n.º ...(Doc. 10), Liquidação n.º ... (Doc. 11), Liquidação n.º ... (Doc. 12), Liquidação n.º... (Doc. 13), Liquidação n.º ... (Doc. 14), Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014... (Doc. 15), Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014... (Doc. 16), Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014... (Doc. 17), Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014... (Doc. 18), Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014... (Doc. 19), Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014... (Doc. 20), Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014... (Doc. 21), Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014... (Doc. 22), Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014... (Doc. 23), Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014... (Doc. 24), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 25), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 26), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 27), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 28), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 29), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 30), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 31), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 32), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 33), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 34), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 35), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 36), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 37), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 38), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 39), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 40), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 41), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 42), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 43), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 44), Demonstração de Liquidação de Juros de IVA n.º 2014... (Doc. 45), Demonstração de Liquidação de Juros de IVA n.º 2014... (Doc. 46), Demonstração de Liquidação de Juros de IVA n.º 2014... (Doc. 47), Demonstração de Liquidação de Juros de IVA n.º 2014... (Doc. 48), Demonstração de Liquidação de Juros de IVA n.º 2014... (Doc. 49), Demonstração de Liquidação de Juros de IVA n.º 2014... (Doc. 50), Demonstração de Liquidação de Juros de IVA n.º 2014... (Doc. 51), Demonstração de Liquidação de Juros de IVA n.º 2014... (Doc. 52), Demonstração de Liquidação de Juros de IVA n.º 2014... (Doc. 53), Demonstração de Liquidação de Juros de IVA n.º 2014... (Doc. 54).
2. A Requerente pede:
a) A anulação de todas as liquidações, liquidações adicionais e demonstrações de acerto de contas correspondentes ao IVA, bem como as demonstrações de acerto de contas/liquidações correspondentes aos juros compensatórios; e
b) A condenação das Administração Tributária a pagar à Impugnante juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43º da LGT, até integral reembolso das quantias de IVA e juros compensatórios previstos nas liquidações, liquidações adicionais e demonstrações de acerto de contas.
3. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira, em 13-03-2015.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.° 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo o Senhor Dr. Juiz José Poças Falcão, o Senhor Prof. Doutor Guilherme d Oliveira Martins e o Senhor Dr. António Sérgio de Matos, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
Em 06-05-2015 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.° e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 22-05-2015.
Posteriormente, o árbitro Senhor Prof. Doutor Guilherme d Oliveira Martins veio, justificadamente, renunciar às funções, o que motivou, da parte do Exmo. Senhor Presidente do Conselho Deontológico, a respectiva substituição pela Senhora Prof.ª Doutora Clotilde Celorico Palma.
Na sequência e em consequência dessa alteração do colégio arbitral, foi deliberado, ponderado o disposto no artigo 9º-3, do RJAT, que não havia necessidade de repetição de qualquer ato processual – Cfr despacho do presidente do Tribunal de 3-1-2016.
4.Em suporte das suas pretensões alega a Requerente, em síntese:
a) A Impugnante efectuou a declaração em apreço – de renúncia à isenção de IVA - verbalmente no Serviço de Finanças da ... no prazo a que estava obrigada nos termos da Lei em vigor, não lhe tendo sido entregue nenhum documento comprovativo de tal facto e, por outro lado, ainda que tal tivesse acontecido, como dispõe o artigo 52.º, n.º 1, do CIVA, o prazo para o contribuinte arquivar e conservar em boa ordem todos os livros e respectivos documentos de suporte são 10 anos, prazo que manifestamente já foi ultrapassado, não podendo a Impugnante ser prejudicada por não ter em sua posse tal documento comprovativo, como tem sido entendimento uniforme da jurisprudência;
b) Padecem de ilegalidade – as liquidações adicionais de IVA - por serem ininteligíveis devido à falta de fundamentação, pois a Impugnante, perante cinco documentos diferentes, todos eles enviados pela AT como suposto resultado da Inspecção, ficou sem saber exactamente qual era o Documento que servia para pagar e para que serviam os restantes;
c) A Impugnante não consegue perceber as operações matemáticas constantes nas demonstrações de acerto de contas, nem tão pouco compreende se as demonstrações das liquidações têm em si as liquidações, se apenas as demonstram ou até se as liquidações se encontram nos tais documentos de acerto de contas;
d) Padecem de ilegalidade (as liquidações adicionais de IVA) devido ao procedimento de inspecção tributária ter preterido formalidades essenciais como é o caso da inquirição das testemunhas indicadas para dar oportunidade à Impugnante de se defender e fazer prova dos factos que alega e ter violado uma série de princípios a que está vinculado como são os princípios do inquisitório, da busca da verdade material, etc…;
e) Padecem de ilegalidade por violarem o princípio da justiça e da proporcionalidade na medida em que o Estado ao obrigar a Impugnante a pagar o montante correspondente à totalidade de IVA que deduziu, sem ter em conta o que liquidou enriquece ilicitamente, já que o montante pago é superior ao deduzido.
f) Padecem de ilegalidade por serem materialmente inconstitucionais na interpretação que fazem do artigo 12.º, n.º1, al. a) e 52.º n.º1 do CIVA, ao violarem o princípio da justiça e o princípio da proporcionalidade e por se encontrarem inquinadas pelo vício de violação de lei e erro nos pressupostos de facto e de direito quanto à aplicação daquele artigo.
5. A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta e juntou o processo instrutor, invocando:
5.1 Como questão prévia, que "demonstrações de liquidação" não traduzem actos de liquidação dos tributos para efeitos de se aferir se os mesmos estão feridos de qualquer ilegalidade.
5.2 E, por impugnação, em síntese, o seguinte:
a) Face aos documentos fornecidos pela TOC da Requerente, os SIT concluíram que a A...se encontrava acreditada por organismo competente, como entidade formadora, pelo menos desde 08-08-2007, pelo que desde essa data, se encontrava automaticamente abrangida pelo regime de isenção nas operações efectuadas no âmbito da formação profissional;
b) Nessa medida, deveria ter apresentado a respectiva declaração de alterações, no prazo de 15 dias a contar da data da acreditação, a informar a AT que passava a exercer operações isentas, ficando, assim, dispensada da apresentação de declarações periódicas de imposto;
c) Ou, querendo exercer a opção pela tributação, podia ter renunciado à isenção, nos termos da aI. a) do n.º 1 do art. 12.° do CIVA, optando pela aplicação do imposto às operações efectuadas;
d) Não tendo exercido tal opção, a mesma terá de considerar-se enquadrada no regime de isenção, pelo que, desde a data de reconhecimento como entidade formadora, que a Requerente continuou, incorrectamente, a exercer o direito à dedução do imposto suportado nos bens adquiridos e, ao mesmo tempo, continuou a liquidar indevidamente imposto, sendo este devido ao Estado nos termos do disposto nos artigos 2.°, n.º 1, aI. c) e 27.°, n.º 2 do CIVA;
e) No que toca ao enquadramento da Requerente em termos de IVA, não existe qualquer dúvida que a mesma vem, desde o início de actividade, a liquidar e a deduzir IVA como um sujeito passivo enquadrado no regime normal de tributação em IVA;
f) A AT não faz a acreditação das entidades competentes no domínio da formação e reabilitação profissionais e, porquanto é só a partir desta acreditação que tais entidades podem passar a exercer prestações de serviços isentas de IVA, procedeu a uma confirmação junto dos organismos oficiais, sendo certo que, por consulta à listagem das entidades acreditadas divulgada pela DGERT • Direcção Geral do Emprego e das Relações de Trabalho, apenas se pôde confirmar que a Requerente se encontrava reconhecida por aquele organismo como entidade formadora desde 08/08/2007;
g) É irrelevante, para efeitos da apreciação e decisão da presente questão jurídica o facto de a Requerente, eventualmente, estar acreditada como entidade formadora, como ela alega, desde 2002, uma vez que sempre a AT desconheceu tal facto e, de qualquer modo, qualquer liquidação adicional de IVA que a mesma AT pretendesse efectuar, sempre teria que respeitar o prazo de caducidade do direito à liquidação de imposto;
h) Seguro é que a Requerente, como entidade formadora acreditada, desde 08/08/2007, gozava de uma isenção incompleta em termos de IVA;
i) Ainda que a ora Requerente pretendesse fazer prova de que fez verbalmente a opção, o que é certo é que a teria que fazer mediante a entrega de uma declaração de início ou de alterações, consoante os casos, cfr. n.º 2 do artigo 12.° do CIVA e que, nos termos do então artigo 34.° A do CIVA, ainda que pudesse verbalmente fazer tal declaração, isso sempre dependeria de o serviço de finanças competente dispor dos meios informáticos adequados para, desde logo, proceder à introdução de tais dados no sistema informático da AT para que os mesmos fossem confirmados pelo declarante, após a sua impressão em documento tipificado;
j) Se a Requerente tivesse mesmo, em data que não sabe precisar, exercido o seu direito à renúncia à isenção de IVA, isso seria facilmente comprovado quer pela AT, através dos dados que esta teria inserido no sistema, quer pela própria Requerente que não deixaria de ter um documento formal em sua posse a confirmar tal facto;
l) Se a AT não tem qualquer registo informático da opção pela renúncia à isenção feita pela Requerente antes de 20/06/14, pode-se seguramente concluir que isso deve-se ao facto de a mesma nunca, antes dessa data, a ter feito.
m) No que toca à ininteligibilidade das liquidações invocada pela Requerente, fundamento este que, no fundo, depreende-se, se reconduzirá ao vício da falta de fundamentação, dir-se-á, antes de mais, que a mesma Requerente não pode pretender ver ou fazer crer ao Tribunal que as liquidações, demonstrações de liquidações e demonstrações de acerto de contas que recebeu estão isoladas no procedimento, uma vez que sabe perfeitamente que todas as notificações que lhe foram efectuadas, o foram como consequência de um procedimento inspectivo no âmbito do qual, inclusive, ela exerceu o direito de audição;
n) Necessariamente, todas as liquidações que lhe foram efectuadas posteriormente ao RIT e relativas àqueles períodos de tributação sempre remeteriam para a fundamentação, de facto e de direito, que consta do mesmo relatório, donde, a requerente ficou em perfeitas condições de compreender os motivos, de facto e de direito, que levaram às notificações das liquidações efectuadas e ao montante em concreto que as mesmas reflectiam, tendo sido capaz de se opor eficazmente às mesmas, conforme o comprova o presente pedido de pronúncia arbitral;
o) Os SIT deram cumprimento, no âmbito do procedimento de inspecção, a todos os princípios a que se encontram vinculados, designadamente àqueles a que a Requerente faz alusão para justificar o seu pedido de anulação das liquidações em apreço.
Conclui pela improcedência da presente acção e afirma que devem ser mantidas as liquidações nos exactos termos emitidos pela AT.
6. No dia 20-11-2015, procedeu-se à reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, seguida da produção de prova requerida (depoimento de parte e testemunhal) – Cfr ata respetiva.
7. As Partes apresentaram alegações escritas sucessivas, mantendo, na essência, os argumentos vertidos nos articulados iniciais.
II. Saneamento
8. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamente representadas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
8.1. Suscita a Autoridade Tributária e Aduaneira uma questão prévia que podemos sintetizar do seguinte modo: os atos impugnados são “demonstrações de liquidação” e estas não são actos de liquidação passíveis de permitir anulação com fundamento em ilegalidade.
A verdade, porém, é que afigura-se sem fundamento válido ou constituir falsa questão a suscitada pela AT.
E tal revela-se desde logo claro quanto é certo que na própria petição de pronúncia arbitral a Requerente alega pretender “(...) a anulação dos actos de liquidação de IVA e dos actos de liquidação dos correspondentes juros compensatórios dos períodos de tributação (...)” .
É certo que a Requerente formula o seguinte pedido conclusivo final, peticionando:
“(...)a) A anulação de todas as liquidações, liquidações adicionais e demonstrações de acerto de contas correspondentes ao IVA, bem como as demonstrações de acerto de contas/liquidações correspondentes aos juros compensatórios; e
b) A condenação das Administração Tributária a pagar à Impugnante juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43º da LGT, até integral reembolso das quantias de IVA e juros compensatórios previstos nas liquidações, liquidações adicionais e demonstrações de acerto de contas (...)” .
Todavia, é absolutamente claro que o cerne da pretensão é a anulação dos atos de liquidação sendo as demonstrações de acerto de contas invalidadas como consequência lógica da eventual anulação dos atos tributários que lhes deram causa e foram claramente objeto de impugnação arbitral.
Improcede assim a questão prévia suscitada pela AT.
8.2. Não se verificam quaisquer circunstâncias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
III. Mérito
III.1. Matéria de facto
9. Factos provados
Como nota preliminar assinale-se que o Tribunal não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamentam o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596º, nº.1 e 607º, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do CPPT).
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6). Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371º, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.
9.1. Com base na prova produzida em audiência, nos elementos que constam do processo e do processo administrativo junto aos autos, tudo analisado de forma crítica pelo Tribunal, consideram-se provados os seguintes factos (seguindo-se, relativamente a alguns dos factos, os respetivos elementos de prova especial e especificamente relevantes):
a) A Impugnante iniciou a actividade com a firma comercial de B... –..., Lda, em 24/01/1996, com o CAE 52488 (Cfr. Doc. 55, junto à P.I.);
b) Em 28/01/1999, apresentou Declaração de Alterações, no Serviço Fiscal da ..., tendo mudado a sua firma comercial para “A ... - …, Lda.” (Cfr. doc. 56, junto à P.I.);
c) Exerce actualmente a actividade de formação profissional, à qual corresponde a Classificação Portuguesa de Actividades Económicas – CAE 85591, tendo concretizado o pedido de acreditação junto do Instituto para a Inovação na Formação (INOFOR) no início de 2002 (Cfr. doc. 57, junto à P.I.);
d) Em 06/03/2002, foi notificada da acreditação como entidade formadora, por despacho da Comissão Directiva do INOFOR, com a indicação expressa que essa decisão produzia efeitos a partir de 08/02/2002, pelo período de um ano, no domínio da Concepção, Organização e Promoção, Desenvolvimento / execução (Cfr. Doc. 57, junto à P.I.);
e) Pelo ofício nº..., de 21/04/2003, a Impugnante foi notificada do despacho proferido, em 31 de Março de 2003, pela Comissão Directiva do INOFOR, da renovação daquela acreditação, pelo período de três anos, com efeitos a partir de 08/02/2003 (Cfr. Doc. 58, junto à P.I.);
f) Em 2006, a acreditação viria a ser novamente renovada, pelo período de dezoito meses, por despacho do Conselho Directivo do Instituto para a Qualidade na Formação, I.P (IQF), com efeitos a 08/02/2006 (Cfr. Doc. 59, junto à P.I.);
g) Em 2007, a acreditação foi igualmente renovada, pelo período de três anos, com efeitos a partir de 08/08/2007, por despacho do Conselho Directivo do IQF (Cfr. Doc. 60, junto à P.I.);
h) Em 2010, concretizou-se a renovação, que ainda se encontra em vigor, por despacho do Senhor Director-Geral da Direcção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho, de 12/10/2010, com efeitos a 08/08/2010 (Cfr. Doc. 61, junto à P.I.);
i) Quando a Impugnante se dirigiu ao Serviço de Finanças da..., em Janeiro de 2014, para obter uma certidão comprovativa de que tinha comunicado à Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) o seu direito de renúncia à isenção do IVA, o senhor funcionário da AT invocou que o registo do exercício daquele direito por parte da Impugnante era inexistente, no sistema informático;
j) A Impugnante alega ter exercido tal direito verbalmente, em tempo, não podendo concretizar a data, nem possuindo documento comprovativo de tal facto;
k) Em 15 de Janeiro de 2014, a Requerente solicitou à AT a emissão de certidão do enquadramento em que se inseria a sua actividade, bem como da data a partir da qual a empresa se encontra enquadrada no respectivo regime de IVA (Cfr. doc. 63, junto à P.I.);
l) O Serviço da AT da ... emitiu a certidão junta à P.I. como Doc. 64, cujo teor aqui se dá por reproduzido, da qual se extrai, entre o mais, que a actividade principal da empresa é a Formação Profissional, CAE-85591, bem como que está enquadrada no regime de tributação normal, com periodicidade trimestral, em sede de IVA, desde 24/01/1996;
m) Posteriormente, na sequência de um pedido de esclarecimento formulado pela TOC da Impugnante - no âmbito da actividade da A..., o POPH (Programa Operacional Potencial Humano) solicitara um comprovativo da sua renúncia à isenção de IVA, porquanto estando certificada pela Direcção Geral do Emprego e das Relações de Trabalho (DGERT), deveria encontrar-se abrangida pelo regime de isenção - a Direcção de Serviços do IVA, pela sua Divisão de Concepção I, forneceu a “Informação” n.º..., de 28-04-2014, em que conclui o seguinte:
“i) A A... encontra-se acreditada por Organismo competente, como entidade formadora desde 2010/08/08, pelo que, desde então, encontra-se automaticamente abrangida pelo regime de isenção nas operações efetuadas no âmbito da formação profissional;
ii) Deveria ter apresentado a declaração de alterações, no prazo de 15 dias a contar da data da acreditação (2010/08/08), a informar a AT que passava a exercer operações isentas, ficando, assim, dispensada da apresentação de declarações periódicas de imposto;
iii) Caso pretenda renunciar à isenção, deve ser efetuada através da apresentação da declaração de alterações, que produz efeitos na data da sua apresentação, nela assinalando a renúncia à isenção;
iv) Desde a data do reconhecimento como entidade formadora, continuou, incorretamente, a exercer o direito à dedução do imposto suportado nos bens e serviços adquiridos para a realização das operações e, ao mesmo tempo, continuou a liquidar imposto, pelo que este é devido ao Estado;
(…)” ;
n) A Requerente foi alvo de uma análise inspectiva efectuada ao abrigo das Ordens de Serviço n.ºs .../…/…/…/…, emitidas no âmbito do código de actividade ...-... Reenquadramento de IVA;
o) A mencionada análise inspectiva foi de âmbito parcial - IVA - de acordo com o disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 14° do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT) e teve origem na informação n.º..., de 2014/04/28, da Divisão de Conceção I da Direcção de Serviços do IVA (DSIVA);
p) Em 11/07/2014, foi notificado o Projecto de Relatório de Inspecção Tributária, tendo a Impugnante apresentado o respectivo direito de audição, no dia 28/07/2004, via fax e via CTT (Cfr. Doc. 62, junto à P.I.);
q) Através do ofício nº..., de 10/09/2014, foi a Impugnante notificada do Relatório Final de Inspecção Tributária (Cfr. Doc. 65, junto à P.I.);
r) A AT dispensou a inquirição de testemunhas indicadas pela Impugnante afirmando, para o efeito que: “não há factos a necessitar de prova, em virtude das correcções propostas decorrerem da aplicação da lei, ou seja, o sujeito passivo não cumpriu com os requisitos formais consubstanciados no Código do IVA, pois estando a exercer uma actividade isenta mas tendo optado por liquidar IVA nas suas operações activas, estava legalmente obrigado a formalizar essa opção, através da renúncia a essa isenção.”
s) Quanto à declaração de alterações de actividade, quer a Direcção de Serviços do IVA, quer a Direcção de Finanças de … entenderam que a Impugnante deveria entregar uma nova declaração de alteração de actividade para formalizar o Direito de renúncia à isenção do IVA, passando, dessa forma, a figurar na sua base de dados, o que acabaria por ser feito em 20/06/2014 (Cfr. doc. 66, junto à P.I.);
t) Desde 13/12/2004 a AT, concretamente o Serviço de Finanças da ..., emitiu certidões afirmando que “A..., Lda., contribuinte fiscal nº..., com sede em..., ..., tem a situação tributária regularizada, visto que não é devedor perante a Fazenda Nacional de quaisquer impostos ou prestações tributárias e respectivos juros (…).” (Cfr. Docs. 67, 68, 69, 70, 71, 72, 73 e 74, juntos à P.I.);
u) Sendo que a maioria dos requerimentos apresentados para emissão dessas certidões continham expressamente mencionado que as mesmas se destinavam a beneficiar de apoios comunitários e fundos públicos, concretamente do POEFDS (Programa Operacional Emprego, Formação e Desenvolvimento Social);
v) A Requerente declarou início de actividade em 24.01.1996, com o CAE 47420 - COM. RET. EQUIPAMENTO TELECOMUNICAÇÕES, ESTAB. ESPEC e, desde 06.03.2008, com o CAE 85591 - actividade de "FORMAÇÃO PROFISSIONAL".
w) Na sequência da certidão mencionada na al. l), C..., a TOC da Requerente, enviou, em 14.03.2014, um e-mail dirigido à DSRC (Direcção de Serviços de Registo de Contribuintes e à DSIVA (Direcção de Serviços do IVA), onde solicitava parecer sobre as seguintes questões (cfr. fls ... do PA):
"1 - Enquadramento
- Sou TOC da entidade com o NIPC - ... e o CAE 85591, em relação à qual nos foi pedido um comprovativo de que tinha sido pedida a renúncia à isenção do IVA, considerando que este enquadramento é automático;
- Foi pela empresa pedida uma certidão no serviço local de Finanças, a solicitar informação acerca do enquadramento da empresa, em termos de IVA, desde quando se verifica esse enquadramento e se alguma vez a empresa esteve enquadrada no regime de isenção. A certidão que foi emitida não faz qualquer referência à isenção;
- Do POPH estão a solicitar que mostremos uma declaração em como renunciámos ao regime de isenção, porque dizem que, pelo que facto da empresa ser certificada pela DGERT, teria ficado automaticamente enquadrada no regime de isenção e no qual se deveria manter por não ter renunciado ao mesmo e que, também, não deveria liquidar IVA.
2 - Dúvida
- O enquadramento no Art. 9.º CIVA é automático e como funciona ou tem que ser requerido e qual o procedimento?
- Como pode a empresa apresentar uma informação vinculativa ao POPH?
- Para que a V/ informação seja vinculativa basta enviar um documento assinado por mim, como TOC, ou é necessário um requerimento assinado pelo representante da empresa?"
x – Em resposta, além das conclusões já constantes da al. m), a DSIVA, na mesma “Informação” n.º..., de 28.04.2014, ainda esclareceu o que se transcreve (cfr. fls ... do PA):
« (...) 4. Consultado o Sistema de Registo de Contribuintes, confirma-se que, desde 06/03/2008, vem exercendo a actividade de formação profissional, encontrando-se enquadrada no regime normal de tributação, periodicidade trimestral, exercendo, assim, o direito à dedução do imposto suportado e liquidando IVA nas operações efectuadas, uma vez que não possuía qualquer certificado de acreditação emitido como entidade competente no domínio da formação e reabilitação profissionais, de modo a ficar abrangida pela isenção prevista na aI. 10) do art. 9.º do CIVA (parte final), onde se estipula que são isentas de imposto as prestações de serviços que tenham por objecto a formação profissional, bem como as prestações de serviços conexas, como sejam o fornecimento de alojamento, alimentação e material didáctico, efectuadas por organismos de direito público ou por entidades reconhecidas como tendo competência nos domínios de formação e reabilitação profissionais pelos ministérios competentes. "
5. Da consulta à Iistagem das entidades acreditadas divulgada pela DGERT - através do seu site, verifica-se que a A ... se encontra reconhecida por aquele organismo como entidade formadora, desde 2010/08/08. Por essa razão a partir do momento em que obteve a certificação como entidade formadora, ficou, nas operações realizadas no âmbito da formação profissional, automaticamente, abrangida pela citada isenção.
6. Não obstante, no prazo de 15 dias, estava obrigada a proceder à alteração do seu enquadramento através da entrega de uma declaração de alterações, nos termos dos artigos 32.º e 35.º, ambos do CIVA, informando a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) que tinha passado a exercer operações isentas ao abrigo da aI. 10) do art. 9.º do CIVA e que não conferem direito à dedução.
7. Querendo exercer a opção pela tributação, podia ter renunciado à isenção, nos termos da aI. a) do n.º 1 do art. 12.º do CIVA, optando pela aplicação do imposto às operações efectuadas. Enquanto tal não acontecer o sujeito passivo encontra-se a efectuar operações isentas que não conferem direito à dedução.
...
12. Relativamente ao enquadramento da exponente, refira-se que, atendendo a que é uma entidade reconhecida como tendo competência nos domínios da formação e reabilitação profissionais e as operações efectuadas se encontram desde esse reconhecimento, (2010/08/08), abrangidas pelo regime de isenção previsto no art. 9º do CIVA, não tendo renunciado à isenção, o imposto suportado nos inputs não é susceptível de direito à dedução.
13. Todavia, procedendo de forma incorrecta e de acordo com o regime normal de tributação em IVA em que se encontrava enquadrada desde o início da actividade, continuou a apresentar as declarações periódicas, liquidando imposto nas operações efectuadas e deduzindo o imposto pago nos bens e serviços que adquiriu a outros sujeitos passivos.
14. Em conformidade, o imposto liquidado nas operações é devido ao Estado, por força do disposto na aI. c) do n.º 1 do art. 2.º e n.º 2 do art. 27.º do CIVA.»
z – Os SIT procederam, relativamente ao IVA considerado indevidamente deduzido pela Requerente, nos anos de 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014, às seguintes correcções:
|
2010
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2011
|
2012
|
2013
|
2014
|
PERíODOS
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03T
|
7308,65
|
5172,08
|
7652,34
|
3507,17
|
3663,28
|
06T
|
5440,51
|
7588,41
|
7395,36
|
5680,85
|
|
09T
|
4623,66
|
5611,56
|
6981,15
|
4276,73
|
|
12T
|
6764,87
|
7691,34
|
12625,88
|
11 525,14
|
|
TOTAL
|
24137,69
|
26063,39
|
34654,73
|
24989,89
|
3663,28
|
aa) Do RIT, concretamente do seu capítulo IX – Direito de Audição e da análise ao exercício de tal direito, extrai-se, com relevância para os presentes autos, o seguinte:
"(...) nos pontos de 1 a 5 refere que o RIT labora em erro, quanto à data em que o sp entregou a declaração de alterações de actividade com vista a alterar do CAE 047420 "Comércio a Retalho Equipamento Telecomunicações, Estab. Espec." para o CAE 85591 "Formação Profissional', que segundo ele, foi entregue em 28 de Janeiro de 1999.
Analisada toda a situação através dos elementos constantes da base de dados da A T na aplicação informática do "Sistema de Gestão e Registo de Contribuintes" bem como mediante consulta ao serviço de finanças da ..., onde consta o processo individual do contribuinte, confirmamos que o projecto de correcções não enferma de qualquer erro, uma vez que em 28-01-1999, não existe qualquer declaração de alterações de actividade entregue pelo sp a alterar a actividade para o CAE 85591 "Formação Profissional".
Nesta data apenas existem declarações de alterações Oficiosas, efectuada pelos serviços da AT, mas que não alteram o CAE do sp para a "Formação Profissional".
Em 29-06-2001 o sp entregou uma declaração de alterações, onde consta a actividade com o CAE 52488 "comércio a Retalho Outros Produtos Novos em Estab. Espe.”, mas mantém o enquadramento que tinha em IVA, Regime Normal Trimestral, desde o inicio de actividade em 24-01-1996, não renunciando à isenção, pois não foram assinalados os campo 10 e 13, onde o sujeito passivo exercia a opção pelo regime de tributação.
Em 31-03-2005 o sp entregou nova declaração de alterações, onde altera apenas o NIF do TOC, em 18-03-2008 altera o regime de contabilidade, em sede de IRC, optando pelo Regime Geral de determinação do Lucro Tributável e indica o Número de Identificação Bancária (NIB). Novamente, em 29-06-2012, apresenta declaração de alterações onde apenas altera o NIB e a identificação do TOC.
Ora, o sujeito passivo não alterou nem o CAE nem efectuou a opção pela tributação, sendo o CAE alterado oficiosamente pelos serviços em 06-03-2008, pelo que, quando o sp entregou a declaração de alterações em 18-03-2008, o CAE já era o 85591 - Formação Profissional. No entanto o sp não efectuou a renúncia à isenção em nenhuma das declarações de alterações entregues (impressões do SGRC e fotocópias das declarações de alterações de actividade em anexo).
O facto da empresa se encontrar acreditada desde 08-02-2002, não a inibe de ter cumprido com as regras impostas no Código do IVA relativamente à renúncia da isenção, já que se lê no ponto 14° do DA que "...importa sublinhar que na presente data o sujeito passivo desde a sua acreditação como entidade formadora em 08/02/2002 renovou sucessivamente e ininterruptamente o estatuto de entidade acreditada...". O ponto 15° refere que "...o sp foi notificado do deferimento do pedido de acreditação junto do INFOR, em 05/-03/-2002, data relevante para se proceder à contagem do prazo para efeito de opção pela renúncia à isenção, previsto no nº 10, do artigo 9° do código do IVA ".
Contudo o sp não procedeu desta forma, pois, como é dito no Projecto de Relatório, "...a A..., no prazo de 15 dias, estava obrigada a proceder à alteração do seu enquadramento através da entrega de uma declaração de alterações, nos termos dos artigos 32.° e 35.°, ambos do CIVA, informando a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) que tinha passado a exercer operações isentas ao abrigo da aI. 10) do art. 9.° do CIVA e que não conferem direito à dedução.
Querendo exercer a opção pela tributação, podia ter renunciado à isenção, nos termos da aI. a) do n. ° 1 do art. 12.° do CIVA, optando pela aplicação do imposto às operações efectuadas. Enquanto tal não acontecer o sujeito passivo encontra-se a efectuar operações isentas que não conferem direito à dedução."
No ponto 17° do DA o sp diz que "...em 2002 (ano da acreditação pela primeira vez) o sujeito passivo fez essa comunicação verbal no serviço de finanças da ...
No ponto 18° refere " o que acontece é que a declaração de renúncia não consta do processo administrativo do sujeito passivo, existente naquele serviço de finanças.
Ora, conforme dispunha o artigo 34° A do CIVA, o sp tinha essa alternativa ao seu dispor, mas também existiam regras, estipuladas nesse artigo, que quer os serviços quer o declarante tinham de cumprir. (...)
Concluímos pois que embora as declarações pudessem ser prestadas de forma verbal, as mesmas tinham de ser introduzidas no sistema informático e impressas em documento devidamente comprovado pelo TOC do sp. Como se constatou, tal documento não se encontra nem no sistema informático, nem na posse do serviço de finanças e nem do próprio sujeito passivo, pelo que se conclui que a tal declaração verbal não foi efectuada, razão pela qual, a AT desconhecia que a "A..." era uma entidade acreditada por organismo competente como entidade formadora.
Ao longo dos inúmeros pontos do DA, o sp vem invocar que, se não podia exercer o direito à dedução, no âmbito da isenção também não podia liquidar, mas liquidou. Então, questiona, se também não se deveriam efectuar correcções às liquidações.
Como já foi referido no projecto de relatório, o imposto liquidado nas operações é devido ao Estado, por força do disposto na aI. c) do nº 1 do art.2º e nº 2 do art. 27° do CIVA, (...)
Ou seja, tendo o sp liquidado indevidamente o IVA nas suas operações, este deveria ter sido entregue nos cofres do Estado no prazo referido no nº 2 do artigo 27° do CIVA.
No ponto 36° do DA refere que "...a haver qualquer falha do sujeito passivo, traduzir-se-ia na ausência de uma mera declaração de opção de renúncia à isenção."
No ponto 37° diz que "...o não cumprimento de um mero requisito formal ... não pode conduzir ao resultado proposto no RIT".
Não podemos concordar com o sp uma vez que os requisitos formais consubstanciados no CIVA, são para ser cumpridos, caso contrário estar-se-ia a desvirtuar a lei. [...]
O presente processo de inspecção foi efectuado, na sua totalidade e exclusivamente, nas instalações da Administração Tributária, através da análise de informações, declarações do sp, bem como de todos os elementos disponíveis na base de dados da AT.
Tendo o sp entregue todas as declarações de IVA, onde se pressupõe que declarou com verdade todo o imposto liquidado e deduzido, e já tendo entrado nos cofres do Estado a diferença positiva entre o liquidado e deduzido, só se encontra em falta o que foi deduzido indevidamente.
Assim, a correcção proposta no projecto de relatório apenas incide na reposição do imposto deduzido indevidamente, de forma a que todo o imposto liquidado possa estar entregue nos cofres do Estado”.
bb) Foram emitidas as liquidações que a Requerente junta à PI como Docs. 1 a 54 e que têm como prazo de pagamento voluntário os dias 12.12.2014 e 31.12.2014.
9.2. Factos não provados
Não se provou que a Requerente tenha comunicado à Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) o seu direito de renúncia à isenção do IVA, antes de 20-06-2014.
9.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto
Os factos provados baseiam-se nos documentos existentes nos autos, no PA e no acordo das Partes, não havendo controvérsia sobre eles.
A prova produzida em audiência pela Impugnante não foi convincente, pois, quer o sócio gerente da Requerente, ..., quer a testemunha ... (ex TOC da empresa) foram incapazes de precisar os factos susceptíveis de incutir no Tribunal a convicção de que a A... tenha comunicado verbalmente à AT o seu direito de renúncia à isenção de IVA. Aliás, ambos claudicaram no imperativo de explicar por que motivo não persistiram em obter um comprovativo documental do exercício de tal direito quando, algures em 2002, tal desiderato se teria frustrado devido a uma alegada dificuldade de impressão do papel, no Serviço de Finanças onde disseram ter-se deslocado para o efeito.
No limite e relativamente a esta matéria, subsistiriam dúvidas sobre essa realidade - que competiria à Requerente demonstrar - e que conduziriam sempre (essas dúvidas) a ser considerada não provada a comunicação verbal nos termos e tempo alegados – Cfr artigos 414º, do CPC e 346º, do CC.
E, tal como alega a AT[1], quanto ao documento apresentado pela Requerente na reunião do Tribunal Arbitral de 20/11/15 e que constitui cópia de auto de notícia (cfr. nº 1 do art. 57º do RGIT), bem como, a respectiva notificação dos factos apurados no processo de contra-ordenação, embora a Requerente pretenda com os mesmos passar a ideia de que a AT teria aí assumido que reconhecia que a mesma era entidade acreditada como entidade formadora desde 2002, não está provado que isso não tenha sido uma mera reprodução do que a própria Requerente invocava.
Por outro lado, o que é certo é que tal processo de contra-ordenação é distinto do processo inspectivo que deu origem às liquidações, objecto do presente processo e que no documento ora junto pela Requerente nada é dito sobre se essa data foi ou não apurada pela AT ou se reproduz o que vinha sendo invocado pela própria Requerente.
Daí que, de acordo com a atrás invocada e documentada Informação nº..., de 28-04-2014 da DSIVA, “(...)consultado o Sistema de Registo de Contribuintes, confirma-se que, desde 06/03/2008, vem (a Requerente) exercendo a actividade de formação profissional, encontrando-se enquadrada no regime normal de tributação, periodicidade trimestral, exercendo, assim, o direito à dedução do imposto suportado e liquidando IVA nas operações efectuadas, uma vez que não possuía qualquer certificado de acreditação emitido como entidade competente no domínio da formação e reabilitação profissionais, de modo a ficar abrangida pela isenção prevista na al. 10) do art. 9.o do CIVA (parte final),
(...)
5. Da consulta à listagem das entidades acreditadas divulgada pela DGERT – através do seu site, verifica-se que a A... se encontra reconhecida por aquele organismo como entidade formadora, desde 2010/08/08. Por essa razão a partir do momento em que obteve a certificação como entidade formadora, ficou, nas operações realizadas no âmbito da formação profissional, automaticamente, abrangida pela citada isenção.
Ou seja, para efeitos legais a AT só́ consegue confirmar o alegado pela requerente por via da consulta à listagem das entidades acreditadas divulgada pela DGERT e, de acordo com o mesmo, a requerente encontra-se reconhecida por aquele organismo desde 08/08/2010.
De qualquer modo, o facto de a requerente ser, ou não, uma entidade acreditada desde 2002, só poderá eventualmente relevar em termos de determinação do grau de negligência da mesma, tanto maior quanto é certo que deixou decorrer mais de 10 anos sem efectuar a renúncia à isenção. O que significa, em termos práticos, que a AT só podia exercer o seu direito à liquidação, atento o prazo de caducidade, a partir de 2010.
Por seu turno, a Senhora Inspectora ..., da Direcção de Finanças de ..., no essencial, limitou-se a confirmar a informação de que, no Serviço de Finanças da ..., não existe qualquer registo, físico ou informático, do exercício daquele direito de renúncia por parte da Requerente.
III.2. Matéria de direito
São as seguintes, em síntese e se bem são entendidas, as questões suscitadas:
a) Se as liquidações e acertos de contas enfermam de ilegalidade por traduzirem violação do disposto nos artigos 9º-10) e 12º-a), do CIVA (erro quanto aos pressupostos de facto e de direito da tributação);
b) Se padecem de ilegalidade tais liquidações adicionais e acertos de contas por serem ininteligíveis, por falta de fundamentação;
c) Se padecem de ilegalidade essas liquidações adicionais de IVA por preterição de formalidades essenciais no procedimento tributário (v.g., inquirição de testemunhas) e violação dos princípios do inquisitório, da busca da verdade material, etc.;
d) Se tais liquidações violam o princípio da justiça e da proporcionalidade [pagamento da totalidade do IVA deduzido sem a AT ter em conta o anteriormente liquidado e pago em montante superior ao deduzido];
e) Se há inconstitucionalidade na interpretação feita pela AT dos artigos 12º-1/a) e 52ª-1, do CIVA [violação do princípio da Justiça e do princípio da proporcionalidade além de erro nos pressupostos de facto e de direito quanto à aplicação daqueles artigos].
E se o Tribunal tem o dever de apreciação, em princípio, das questões suscitadas pelas partes, não, tem, por outro lado, o dever de apreciar todos os argumentos formulados – é o que tem sido repetidamente afirmado pela Jurisprudência (Vd inter alia, Ac do Pleno da 2ª Secção do STA, de 7 Jun 95, rec 5239, in DR – Apêndice de 31 de Março de 97, pgs. 36-40 e Ac STA – 2ª Séc – de 23 Abr 97, DR/AP de 9 Out 97, p. 1094).
Dispõe o artigo 124º, do CPPT (aplicável na arbitragem tributária por força do artigo 29º, do RJAT):
“1. Na sentença, o tribunal apreciará prioritariamente os vícios que conduzam à declaração de inexistência ou nulidade do acto impugnado e, depois, os vícios arguidos que conduzam à sua anulação.
2. Nos referidos grupos a apreciação dos vícios é feita pela ordem seguinte:
a) No primeiro grupo, o dos vícios cuja procedência determine, segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos.
b) No segundo grupo, a indicada pelo impugnante sempre que este estabeleça entre eles uma relação de subsidiariedade e não sejam arguidos outros vícios pelo Ministério Público ou, nos demais casos, a fixada na alínea anterior”.
No pressuposto, que se sufraga (Cfr., v. g., Acórdãos do STA de 23-5-1991 – Pleno – Proc 22444-A; de 2-2-1995, - Proc 17036-A; 25-5-1995 – Pleno – Proc 27800) de que o Tribunal não é obrigado a conhecer todos os vícios imputados ao acto impugnado, justifica-se que seja estabelecida uma ordem de prioridade no conhecimento dos vícios, muito especialmente - como parece ser o caso - quando a requerente/impugnante argui os vícios segundo uma relação de subsidiariedade.
Compreende-se assim a apreciação dos vícios imputados ao ato numa lógica que evite, para melhor ou mais eficaz tutela dos interesses ofendidos, uma decisão anulatória motivada por meros vícios de forma passíveis de execução do julgado com a prática pela AT de actos com o mesmo sentido do acto anulado, apenas com a eliminação do vício formal que o afectava.
De todo o modo, sempre se deverá deixar assinalado que, no que se reporta à ininteligibilidade das liquidações e ao vício da falta de fundamentação, as demonstrações das liquidações e demonstrações de acerto de contas que a Requerente recebeu lhe foram efectuadas como consequência de um procedimento inspectivo no âmbito do qual exerceu o direito de audição, remetendo-se para a fundamentação, de facto e de direito, que consta do correspondente relatório, as razões de improcedência de tais vícios.
Aliás, é patente no pedido de pronúncia o claro entendimento pela Requerente das razões e fundamentos das liquidações.
E quanto ao exercício do direito de renúncia isenção de IVA, nada será de acrescentar ou invocar sobre tal matéria quando é certo que ficou demonstrado que esse direito não foi exercido antes de 20-6-2014.
O que desde logo se revela essencial para justificar a legalidade das liquidações objeto da presente pronúncia arbitral.
Também quanto aos elementos documentais pretensamente probatórios da renúncia e a desoneração do dever de manter ou exibir os documentos findo o prazo de 10 anos previsto no artigo 52º-1, do CIVA, é questão irrelevante, no caso, na medida em que é a própria Requerente a alegar ter efetuado o pedido verbal de isenção e não lhe ter sido facultado pela AT documento comprovativo.
E quanto à alegada violação do princípio da justiça e da proporcionalidade decorrente do pagamento da totalidade do IVA deduzido sem a AT ter em conta o anteriormente liquidado e pago em montante superior ao deduzido, é matéria igualmente irrelevante, ou salvo o devido respeito, que não faz mesmo sentido atenta a natureza do próprio imposto
Na verdade, reembolso consiste na devolução ao sujeito passivo do IVA do imposto por ele suportado em excesso durante determinado período temporal. Por sua vez, o mecanismo de dedução de IVA consiste na faculdade que o sujeito passivo tem de poder deduzir ao imposto incidente sobre as operações tributáveis que efectuou, o tributo que lhe foi facturado nas suas aquisições de bens ou serviços por outros sujeitos passivos de IVA (cfr. Clotilde Celorico Palma, Introdução ao Imposto Sobre o Valor Acrescentado, Cadernos do I.D.E.F.F., no.1, 2a.edição, Almedina, 2005, pág.157 e segs e Ac. do STA - 2a.Secção de 25/11/2004 – Recurso nº 216/04)
Ora, para que a Requerente pudesse deduzir o IVA referente a bens e serviços adquiridos para o exercício da sua actividade/escopo social, tinha a mesma que ter renunciado à isenção (o que não fez, como se viu) e optado pela aplicação do IVA, nos termos do estatuído na al. a) do no 1 e no 2 do artº 12º do CIVA.
Assim, in casu, uma vez que não se verificavam os pressupostos da renúncia à isenção desde, pelo menos, o ano de 2007, as operações efectuadas pela Requerente, de prestação de serviços de formação profissional, estavam isentas de IVA e a Requerente não podia liquidar IVA e nem podia deduzir o IVA suportado.
Se o Estado (AT) recebeu, eventualmente, mais imposto (IVA) do que receberia se a Impugnante estivesse no âmbito do regime de isenção, conforme alega a Requerente, sibi imputat porquanto, por negligência, opção ou qualquer outro motivo não usou a Requerente dessa faculdade de renúncia.
Não há assim, sob este aspecto o menor fundamento para invocar a violação do princípio da justiça e da proporcionalidade.
Finalmente uma palavra relativamente a alegadas inconstitucionalidades interpretativas para dizer que não se surpreendem nem tão pouco a Requerente alega quais as normas constitucionais concretas que, na sua perspetiva, foram violadas pela AT.
Vejamos agora mais em detalhe a situação sub juditio.
10. A isenção da formação profissional
Foi com a Sexta Directiva IVA[2] que se procurou uniformizar as isenções nas transacções internas que os Estados membros poderiam conceder, dado que na Segunda Directiva[3] esta matéria foi deixada ao critério exclusivo do legislador nacional.
A principal preocupação subjacente ao regime das isenções previsto na Sexta Directiva foi a de estabelecer uma lista comum de isenções de forma a tornar possível, tal como resulta do seu preâmbulo, que os recursos próprios sejam cobrados de modo uniforme em todos os Estados membros.
Na escolha das operações isentas do imposto sobre o valor acrescentado, o legislador comunitário inspirou-se, aquando da adopção da Sexta Directiva, por um lado, nas isenções já existentes nos Estados membros, por outro lado, tentou limitar o número de isenções, dado as mesmas consubstanciarem uma excepção ao princípio geral de que todas as prestações de serviços e transmissões de bens efectuadas a título oneroso por um sujeito passivo estão sujeitas a IVA.
Assim, essencialmente por motivos de ordem social, cultural e política, a Directiva IVA[4] prevê uma série de isenções, que, todavia, se aplicam a um conjunto, apesar de tudo, restrito de serviços, dada a base de incidência alargada do IVA.
Na Directiva IVA, a regulamentação das isenções encontra-se sistematizada distinguindo “isenções em benefício de certas actividades de interesse geral”, “isenções em benefício de outras actividades” (isenções internas), “isenções relacionadas com as operações intracomunitárias e isenções na importação”, “isenções na exportação”, “isenções aplicáveis aos transportes internacionais”, “isenções aplicáveis a determinadas operações assimiladas a exportações”, “isenções aplicáveis a prestações de serviços efectuadas por intermediários” e “isenções aplicáveis a operações relacionadas com o tráfego internacional de bens”.
Pelo que toca às isenções nas operações internas, e em especial às isenções em benefício de certas actividades de interesse geral, a Sexta Directiva procedeu como vimos à sua harmonização, procurando atingir uma lista limitada de isenções, que permita uma base de incidência alargada.
Na nossa legislação, as isenções aplicáveis ao ensino e formação profissional constam dos n.ºs 9 a 11 do artigo 9.º do CIVA e correspondem às isenções previstas nas alíneas i) e j) do n.º1 do artigo 132.º da Directiva IVA, que, por sua vez, correspondem às isenções já antes previstas na Sexta Directiva IVA, mais concretamente nas alíneas i) e j) do n.º1 da parte A do seu artigo 13.º.
A alínea i) do n.º1 do artigo 132.º da Directiva IVA abrange quer o ensino quer a formação profissional sob a epígrafe de Isenções em benefício de certas actividades de interesse geral, determinando o seguinte: “1. Os Estados–Membros isentam as seguintes operações:
(…)
i) A educação da infância e da juventude, o ensino escolar ou universitário, a formação ou reciclagem profissional, e bem assim as prestações de serviços e as entregas de bens com elas estreitamente relacionadas, efectuadas por organismos de direito público que prossigam o mesmo fim e por outros organismos que o Estado–Membro em causa considere prosseguirem fins análogos;”
Tal como o legislador começa por salientar no artigo 131.o da Directiva IVA, as “… isenções previstas nos Capítulos 2 a 9 aplicam-se sem prejuízo de outras disposições comunitárias e nas condições fixadas pelos Estados–Membros a fim de assegurar a aplicação correcta e simples das referidas isenções e de evitar qualquer possível fraude, evasão ou abuso.”
As isenções nas operações internas previstas no artigo 9.º do CIVA, em conformidade com o previsto na Directiva IVA, aplicam-se, fundamentalmente, a determinadas actividades de interesse público ou a actividades relativamente às quais se demonstra particularmente complexa a aplicação do IVA, como, por exemplo, o caso das operações financeiras e de seguro e resseguro.
Estas isenções caracterizam-se por serem incompletas, simples, parciais, ou que não conferem o exercício do direito à dedução do IVA suportado. Ou seja, nestas isenções o sujeito passivo beneficiário não liquida imposto nas suas operações activas, mas não tem o direito a deduzir o IVA suportado para a respectiva realização.
O legislador nacional optou por fazer a transposição das isenções do ensino e da formação profissional em disposições separadas, a saber, os n.ºs 9 e 11 e o n.º 10 do artigo 9.º do CIVA.
De acordo com o previsto no n.º 10 do referido normativo, estão isentas de IVA as prestações de serviços que tenham por objecto a formação profissional, bem como as transmissões de bens e prestações de serviços conexas, como, por exemplo, o fornecimento de alojamento, alimentação e material didáctico, desde que sejam efectuadas por organismos de direito público ou por entidades reconhecidas como tendo competência nos domínios da formação e reabilitação profissionais pelos ministérios competentes.
Isto é, para efeitos da aplicação desta isenção exige-se o preenchimento de: (i) um elemento de natureza objectiva - a promoção de cursos ou acções que visam a iniciação, qualificação, aperfeiçoamento, reconversão ou a especialização profissional dos formandos, e de (ii) um elemento de natureza subjectiva, que se consubstancia na necessidade de que os serviços sejam prestados por um organismo de direito público ou por uma entidade formadora reconhecida como tendo competência no domínio da formação profissional[5]. Para efeitos de aplicação deste último requisito a Administração Fiscal remete, naturalmente, para a legislação específica do sector. Assim, desde logo nos termos do Despacho n.º 51/88, de 7.10.88, do Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional, publicado no DR, II série, de 27.10.88, se determinou que competiria ao Instituto de Emprego e Formação Profissional o reconhecimento de que as entidades a que se refere a segunda parte do n.º 10 desenvolvem prestações de serviços de formação ou reabilitação profissional.
Cumpre salientar que, regra geral, as isenções acolhidas no CIVA e no RITI funcionam de forma automática, não sendo necessário o sujeito passivo solicitar a respectiva aplicação, encontrando-se precisamente nesta situação a isenção que ora nos ocupa.
Como se elucida, “As isenções nas operações internas previstas no artigo 9.º do Código, aplicam-se, fundamentalmente, a determinadas actividades de interesse público ou a actividades relativamente às quais se demonstra particularmente complexa a aplicação do IVA, como, por exemplo, o caso das operações financeiras e de seguro e resseguro.
Estas isenções caracterizam-se nos seguintes termos:
a) São incompletas, não conferindo o direito à dedução do imposto suportado. Excepcionam-se, apenas, as situações pontuais previstas no artigo 20.º, n.º 1, alínea b), IV), do CIVA, relativas a operações de seguro e de resseguro, no caso de o destinatário se encontrar estabelecido ou domiciliado fora da UE ou que estejam directamente ligadas a bens que se destinem a ser exportados para países não pertencentes à UE;
b) São taxativas;
c) São automáticas, não carecendo de um acto de reconhecimento por parte da Administração Fiscal;
d) Em algumas situações excepcionais previstas no artigo 12.º, concede-se a possibilidade de renúncia à isenção, passando o sujeito passivo a aplicar o IVA nos termos normais às suas operações e, consequentemente, a poder deduzir o imposto suportado para a respectiva realização;”[6]
Sendo esta precisamente a situação da Requerente sendo uma entidade reconhecida para o efeito, tal como resulta dos factos dados como provados, conclui-se, consequentemente, que as acções de formação por si ministradas são automaticamente isentas de IVA, não devendo liquidar imposto nestas operações sendo-lhe vedado o exercício do direito á dedução do IVA suportado para a respectiva realização, a menos que seja devidamente exercida, nos termos que se seguem, a renúncia à isenção.
11. A renúncia à isenção da formação profissional
Devido ao facto de as isenções em sede de IVA poderem ser penalizadoras, o legislador comunitário, a título excepcional, possibilitou em algumas situações o direito à renúncia à isenção, passando o sujeito passivo, nos termos normais, a liquidar e a deduzir o IVA suportado. Contudo, o exercício deste direito fica dependente do preenchimento de condições procedimentais exigíveis pelos Estados membros.
Como referimos, nas isenções incompletas, o operador encontra-se fora do mecanismo do imposto, sendo tratado como um consumidor final, ao passo que nas isenções completas, ou nas situações de tributação à taxa zero, o operador faz parte integrante do mecanismo do imposto, podendo deduzi-lo nos termos gerais. Por isso mesmo, o legislador comunitário veio permitir, em casos excepcionais, que os Estados membros concedessem o direito à renúncia de certas isenções, passando os sujeitos passivos a aplicar o imposto nos termos gerais, i.e., a liquidar e deduzir o IVA suportado, de forma a não encarecer o preço das suas operações.
Ora, a isenção da formação profissional encontra-se precisamente nessa situação excepcional, sendo passível de renúncia, podendo os sujeitos passivos por ela abrangidos renunciar à isenção, ou seja, podem ser tributadas por opção expressamente efectuada pelos sujeitos passivos, as prestações de serviços que tenham por objecto a formação profissional a que se refere o n.º 10 do artigo 9.º (alínea a), do n.º 1, do artigo 12.º do CIVA).
Relativamente ao exercício desta opção deverá ter-se em consideração o seguinte:
a) Regra geral a opção é global, ou seja, aplica-se ao conjunto das operações efectuadas pelo sujeito passivo;
b) Efectiva-se mediante a entrega da declaração de início ou de alterações, conforme for o caso;
c) Produz efeitos a partir da apresentação das declarações supra citadas;
d) O sujeito passivo é obrigado a permanecer no regime pelo qual optou durante um período mínimo de cinco anos, passando a estar sujeito a todas as obrigações decorrentes desse regime.
Isto é, interessa em especial para o efeito salientar que o legislador nacional, em conformidade com as regras da Directiva IVA, veio determinar que para que a isenção automática aplicável à formação profissional deixe de operar é necessário que o sujeito passivo formalize a renúncia através da devida declaração.
12. Regras de incidência subjectiva
As regras de incidência subjectiva constantes do artigo 2.º do CIVA indicam-nos quem são os sujeitos passivos do IVA.
De acordo com as regras gerais, os sujeitos passivos do IVA são as pessoas singulares ou colectivas que mencionem indevidamente IVA em factura (artigo 2.º, n.º 1, alínea c)).
Compreende-se que o legislador comunitário se tenha preocupado em tornar sujeito passivo do imposto quem mencione IVA indevidamente em factura ou documento equivalente. Com efeito, o que se passa nestas circunstâncias é que se está a dar início à cadeia da liquidação e dedução do imposto, com os efeitos daí subjacentes.
Como tal, caso um sujeito passivo que seja isento mencione IVA indevidamente na factura deve fazer entrega deste imposto ao Estado.
Tal não obsta, contudo, à possibilidade de o sujeito passivo efectuar as regularizações do IVA correspondentes conforme o previsto no artigo 78.º do CIVA, caso se verifiquem os respectivos requisitos de aplicação.
IV. Enquadramento da situação controvertida
13. No caso concreto resulta provado que a Requerente exerce actividades de formação profissional sendo reconhecida enquanto tal pelas entidades competentes, encontrando-se, consequentemente, automaticamente abrangida pela isenção relativa à formação profissional acolhida no n.º 10 do artigo 9.º do CIVA.
Tal como referimos, não incumbe à AT, naturalmente, fazer a acreditação das entidades competentes no domínio da formação e reabilitação profissionais e só a partir de tal acreditação é que tais entidades podem passar a exercer, automaticamente, prestações de serviços isentas de IVA. Ora, a AT, por consulta à listagem das entidades acreditadas divulgada pela Direcção Geral do Emprego e das Relações de Trabalho, confirmou que a Requerente se encontrava reconhecida por aquele organismo como entidade formadora desde 8 de Setembro de 2008, pelo que, como entidade formadora acreditada, gozava automaticamente desde essa data de uma isenção incompleta em termos de IVA, facto que lhe inviabilizava a dedução do IVA suportado.
Não obstante a Requerente invocar que renunciou verbalmente à isenção, pelo que passou a poder deduzir o IVA suportado para a realização das acções de formação, o certo é que, tal como resulta dos factos não provados, não resulta provado que o fez.
Com efeito, mesmo que a Requerente pretendesse fazer prova de que fez verbalmente a opção, o que é certo é que a teria que fazer mediante a entrega de uma declaração de início ou de alterações, e que, nos termos do então artigo 34.° A do CIVA, ainda que pudesse verbalmente fazer tal declaração, tal facto sempre dependeria de o serviço de finanças competente dispor dos meios informáticos adequados para, desde logo, proceder à introdução de tais dados no sistema informático da AT para que os mesmos fossem confirmados pela declarante, após a sua impressão em documento tipificado.
Se a Requerente tivesse, mesmo que em data que não sabe precisar, exercido o seu direito à renúncia à isenção de IVA, tal facto seria comprovável pela AT através dos dados que esta teria inserido no sistema, quer pela própria Requerente, que deveria possuir um documento formal em sua posse a confirmar tal facto.
Ora, sucede que, tal como vimos, a AT não tem qualquer registo informático da opção pela renúncia à isenção feita pela Requerente antes de 20 de Junho de 2014.
14. No que concerne à liquidação e entrega do IVA por parte da Requerente, as regras de incidência subjectiva constantes do artigo 2.º do CIVA indicam-nos que são sujeitos passivos do IVA as pessoas singulares ou colectivas que mencionem indevidamente IVA nas facturas. Como tal, caso um sujeito passivo que seja isento mencione IVA indevidamente na factura deve fazer entrega deste imposto ao Estado. Todavia, o sujeito passivo pode efectuar as regularizações do IVA correspondentes conforme o previsto no artigo 78.º do CIVA, caso se verifiquem os respectivos requisitos de aplicação.
15. Nestes termos, deve este Tribunal julgar improcedente o pedido de declaração de ilegalidade e anulação das liquidações de IVA em causa, ficando assim prejudicados os demais pedidos formulados.
IV. Dispositivo
De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em:
A - Julgar totalmente improcedente o pedido de anulação dos atos em causa, ou seja:
Liquidação Adicional n.º ... (Doc. 1), Liquidação Adicional n.º ... (Doc. 2), Liquidação Adicional n.º ... (Doc. 3), Liquidação Adicional n.º ... (Doc. 4), Liquidação Adicional n.º ... (Doc. 5), Liquidação Adicional n.º ... (Doc. 6), Liquidação Adicional n.º ... (Doc. 7),Liquidação n.º ... (Doc. 8), Liquidação n.º ... (Doc. 9), Liquidação n.º ...(Doc. 10), Liquidação n.º ... (Doc. 11), Liquidação n.º ... (Doc. 12), Liquidação n.º ... (Doc. 13), Liquidação n.º ... (Doc. 14), Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014... (Doc. 15), Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014... (Doc. 16), Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014... (Doc. 17), Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014... (Doc. 18), Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014... (Doc. 19), Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014... (Doc. 20), Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014... (Doc. 21), Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014... (Doc. 22), Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014... (Doc. 23), Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014... (Doc. 24), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 25), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 26), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 27), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 28), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 29), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 30), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 31), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 32), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 33), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 34), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 35), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 36), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 37), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 38), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 39), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 40), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 41), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 42), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 43), Demonstração de Acerto de Contas n.º 2014... (Doc. 44), Demonstração de Liquidação de Juros de IVA n.º 2014... (Doc. 45), Demonstração de Liquidação de Juros de IVA n.º 2014... (Doc. 46), Demonstração de Liquidação de Juros de IVA n.º 2014... (Doc. 47), Demonstração de Liquidação de Juros de IVA n.º 2014... (Doc. 48), Demonstração de Liquidação de Juros de IVA n.º 2014... (Doc. 49), Demonstração de Liquidação de Juros de IVA n.º 2014... (Doc. 50), Demonstração de Liquidação de Juros de IVA n.º 2014... (Doc. 51), Demonstração de Liquidação de Juros de IVA n.º 2014... (Doc. 52), Demonstração de Liquidação de Juros de IVA n.º 2014... (Doc. 53), Demonstração de Liquidação de Juros de IVA n.º 2014... (Doc. 54).
B – Julgar prejudicadas as demais questões suscitadas e
C – Condenar a Requerente nas custas do processo e que se fixam em €3.060,00
*
Valor do processo: € 122.718,14
Lisboa e CAAD, 13 -1-2016
O Tribunal Arbitral Coletivo,
José Poças Falcão
(Presidente)
A. Sérgio de Matos
(Vogal)
Clotilde Celorico Palma
(Vogal)
[1] Reproduzem-se, no essencial, as alegações sobre esta matéria apresentadas pela AT e que têm a concordância do Tribunal.
[2] Directiva n.º 77/388/CEE, do Conselho, de 17 de Maio de 1977, publicada no JO n.º L 145, de 13.6.77.
[3] Directiva n.º 67/228/CEE, do Conselho, de 11 de Abril de 1967, que instituiu o primeiro sistema comum do IVA na Comunidade Económica Europeia (JO L 71, de 14.03.1967).
[4] Directiva n.º 2006/112/CE, de 28 de Novembro, publicada no JO n.º L 347, de 11 de Dezembro de 2006. Essencialmente, esta Directiva veio reformular o texto da Sexta Directiva (trata-se de uma reformulação basicamente formal, atendendo ao facto de o seu texto se encontrar excessivamente denso, dadas as sucessivas alterações que lhe foram introduzidas desde a sua aprovação). Com a reformulação passou a ter 414 artigos (tinha 53). Note-se, todavia, que foram revogadas várias directivas de IVA, pelo que poderemos passar a designar a “nova” Directiva, abreviadamente, como Directiva IVA (a Directiva base do sistema comum vigente).
[6] Cfr. Clotilde Celorico Palma, Introdução ao Imposto sobre o Valor Acrescentado, 6.ª edição, Almedina, Setembro de 2014, pp. 177 e 178.