Decisão Arbitral
CAAD: Arbitragem Tributária
Processo nº 334/2015-T
Tema: Imposto de Selo, verba 28.1 Tabela Geral
Requerente: A…, SA
Requerida: Autoridade Tributária e Aduaneira (AT)
I - RELATÓRIO
A…, SA, nipc …, com sede na Av. …, nº … e … a …, …, em Lisboa, apresentou, em 28/05/2015, ao abrigo do disposto na al. a) do n.º 1, do art.º 10º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprova o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), um pedido de pronúncia arbitral no qual é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira - AT, solicitando a declaração de ilegalidade, com a consequente anulação, da liquidação adicional nº 2015 …, datada de 20.3.2015, do Imposto de Selo respeitante ao ano de 2014, no montante de 9 436,43€.
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD, e a Autoridade Tributária e Aduaneira (de ora em diante designada por “AT” ou a “Requerida”) foi notificada da sua constituição em 23 de Julho de 2015.
O Conselho Deontológico do CAAD designou, termos do n.º 1 do artigo 6.º, e da alínea a), do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, árbitro singular do tribunal arbitral o signatário, que comunicou a aceitação do encargo no prazo legalmente estipulado, tendo o Tribunal sido constituído em 07/08/2015 e as partes notificadas na mesma data.
II – FUNDAMENTAÇÃO
1 – Pedido
A Requerente nos presentes autos, A…, SA, apoia o seu pedido fundamentalmente no seguinte:
A questão decidenda respeita à mencionada liquidação de imposto de selo referente ao ano de 2014, com a qual a Requerente não concorda, e da qual vem pedir a respetiva anulação por ilegalidade.
A impugnante juntou uma cópia da Notificação da liquidação de IS com referência ao ano de 2014, com o valor de 28 309,27€, a qual contém também os elementos para o pagamento do valor da primeira prestação do imposto durante o mês de Abril de 2015.
Todavia, e apesar de na PI e documento anexo juntos pela Requerente se identificar o prédio, deduzindo-se pela leitura da mesma que se trata de um terreno para construção, só através da Caderneta Predial e a Ficha de Avaliação apresentadas pela AT, na qual consta que se encontra anexado o Projeto de Viabilidade Construtiva, ficámos a conhecer os restantes elementos essenciais para a verificação da legalidade da liquidação impugnada.
O Tribunal, pela leitura de ambos os documentos, ficou ciente de se trata da tributação em imposto de selo, com referência ao ano de 2014, incidente sobre o terreno para construção sito na freguesia de …, na Figueira da Foz, que está inscrito na matriz predial urbana sob o artigo U - …, com o valor patrimonial tributário de 2 830 962,91 e que,
Foi por ter um VPT superior a 1 000 000€, e por constar na matriz predial de que se trata de um terreno com aptidão para construção autorizada ou prevista, que a AT efetuou a liquidação do imposto de selo previsto na Verba 28.1 da TGIS com referência ao ano de 2014.
Essa liquidação foi notificada conjuntamente com a indicação de que devia efetuar o pagamento do valor de 9 346,43€, durante o mês de Abril de 2015, montante correspondente à primeira prestação da coleta de 28 309,27€ apurada nessa liquidação (documento anexo).
A impugnante não está de acordo com tal liquidação e, por isso, vem solicitar ao Tribunal a sua anulação, por ilegalidade.
Em seu favor, alegou, no essencial, que a tributação incidiu indevidamente sobre um terreno para construção, porque referindo-se “a norma de incidência a prédios urbanos com “afetação habitacional” sem que seja estabelecido qualquer conceito específico para o efeito, não pode dela extrair-se que na mesma se contenha uma potencialidade futura, inerente a um distinto prédio que porventura venha a ser edificado no terreno”.
“A expressão “com afetação habitacional” inculca, numa simples leitura, uma ideia de funcionalidade real e presente. Da norma em causa (a citada Verba 28 da Tabela) não é possível extrair-se, por interpretação, que, a opção do legislador por aquela expressão tenha em vista integrar “outras realidades para além das identificadas no art.º 6º, nº 1 alínea a), do CIMI”. Tal interpretação não tem apoio legal, face aos princípios contidos no art.º 9º do Código Civil e 11º da Lei Geral Tributária”.
E alegou também que “… a circunstância de para um determinado terreno para construção estar autorizada a edificação de prédio destinado a habitação, ou qualquer outra finalidade, ainda que deva ser considerada na sua avaliação, não determina qualquer alteração na classificação do terreno que, para efeitos tributários, continua a ser como tal considerada”.
Em resumo, segundo a impugnante, os terrenos para construção não estão abrangidos pela regra de incidência da Verba 28.1 da TGIS.
Nada mais se pede.
2. Resposta da Requerida
A AT responde que é seu entendimento que o documento de liquidação remetido à Impugnante respeita a uma de liquidação anual, apesar de no mesmo estar também referenciado o valor correspondente ao valor da 1ª prestação do montante da liquidação anual.
Por isso, o Tribunal deve sindicar um único ato tributário de liquidação com referência ao imposto de selo do ano de 2014, cujo montante é de 28 309,27€, e que foi também notificado em Março de 2015, a par do valor da primeira prestação a pagar em Abril de 2015, donde, a decisão que vier a ser tomada nos presentes autos deve dizer respeito à liquidação do ano de 2014 e não apenas ao valor da 1ª prestação.
Acrescenta nesta sequência que uma coisa é o montante da liquidação outra coisa é a sua cobrança, porque,
“A Administração Tributária efetuou um único ato de liquidação do Imposto do Selo respeitante à verba 28.1 da TGIS e referente ao ano de 2014, o qual foi notificado em março de 2015, juntamente com o documento de cobrança da primeira prestação respetiva.
Ora, é este ato de liquidação, anual e único, notificado em março de 2015, o objeto do presente pedido de pronúncia arbitral, impugnando-se o dito ato com o argumento de erro na aplicação da norma de incidência do imposto.
E, impugnando-se o ato de liquidação do imposto, o juízo que vier a ser feito sobre a legalidade ou ilegalidade do mesmo repercutir-se-á sobre todos os atos de cobrança, independentemente do momento em que venham a ter lugar”.
Quanto à questão de fundo, não esclarecendo, todavia, a sua posição quanto a anos anteriores, a Requerida defende que, após a modificação da redação conferida pela Lei nº 83-C/2013, de 31 de Dezembro à Verba 28.1 da Tabela Geral Anexa ao Código do Imposto de Selo, cujo início de vigência ocorreu a partir de 1/01/2014, é devido imposto de selo à taxa de 1%, que incidirá sobre o valor patrimonial tributário dos terrenos para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, sempre o mesmo seja igual ou superior a 1 000 000,00€.
Na sequência deste raciocínio, a AT entende que a liquidação notificada obedece aos critérios legais do Código de Imposto de Selo em vigor para o ano fiscal de 2014 e que é isso que está devidamente espelhado na notificação enviada à impugnante no documento anexo.
III - Tramitação subsequente
Tendo em conta que nos presentes autos estão em apreciação apenas questões de direito, e não existindo exceções para considerar, o Tribunal deliberou prescindir da realização da reunião prevista no artigo 18º do RJAT, bem como da fase de alegações.
IV – FACTOS PROVADOS
São os seguintes os factos considerados provados:
A requerente, em 31 de Dezembro de 2014, era proprietária do terreno para construção sito na Figueira da Foz - freguesia de …, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo n.º …, com o valor patrimonial tributário (VPT) de 2 830 928,91€, constante da matriz naquela data;
A AT, em observância do disposto na Verba do 28.1 da TGIS em vigor à data, efetuou a liquidação de imposto de selo em março de 2015, com referência ao ano de 2014, aplicando ao mencionado VPT a taxa de 1% aí estabelecida;
A Requerente foi notificada do valor do imposto de Selo do ano de 2014, no montante de 28 309,27€, valor constante da primeira parte da notificação a que se refere o Doc. nº 2015 003476578, junta aos autos,
E nesse mesmo documento de notificação, onde também surgem as referências para esse efeito, a Requerente foi informada de que deveria pagar durante o mês de Abril de 2015 o valor respeitante à primeira das três prestações em que a lei permite efetuar o pagamento do IS (como era o caso, nos termos do artº 120º do CIMI).
Embora apontando na sua petição ilegalidades ao ato de liquidação do IS efetuada ao abrigo da Verba 28.1 da Tabela de Imposto de Selo, com referência ao ano de 2014, a Requerente, no articulado, refere-se somente ao montante da 1ª prestação da coleta liquidada com respeito a todo o ano, mas nada diz sobre o valor da liquidação anual nem indica, a final, qual o valor do processo.
Apesar de tudo, considera-se provado que as partes estão a referir-se ao mesmo fato tributário e à mesma liquidação de Imposto de Selo de 2014.
Não existem facto não provados, nem foi impugnado qualquer facto ou documento.
V – SANEAMENTO
O Tribunal Arbitral Singular encontra-se regularmente constituído em 07-08-2015, e foram cumpridas as respetivas formalidades legais e regulamentares (artigos 11º, n-º 1, als. a) e b) do RJAT e 6º e 7º do Código Deontológico do CAAD), pelo que o mesmo é competente em razão da matéria, em conformidade com o artigo 2.º do RJAT.
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se regularmente representadas.
Não foram identificadas nulidades no processo nem exceções de que Tribunal deva conhecer, e o pedido é tempestivo.
VI – QUESTÕES A DECIDIR
Tendo em conta que os fundamentos das partes assentam em versões diferentes, no tempo, para a mesma norma, sobre este Tribunal impende o ónus de decidir sobre:
· Por um lado, qual a redação da verba 28.1 da TGIS que se aplica para cálculo do imposto referente a terrenos para construção com referência ao ano de 2014, se é a lei invocada pela Requerente, ou antes a versão em vigor a partir de 1/01/2014 invocada pela AT, e se, face a esta nova redação, a liquidação notificada sofre de alguma ilegalidade;
· Por outro lado, se o pedido formulado abrange a liquidação do imposto de selo de 2014 ou antes, e apenas, o valor da 1ª prestação a que a Requerente se refere.
A – O legislador estabeleceu na aditada Verba 28 da TGIS que, a partir de 1/01/2014, passariam a ser tributados em sede de imposto de selo a propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos sempre que o respetivo valor patrimonial tributário constante da matriz nos termos do CIMI seja igual ou superior a 1 000 000,00€ e, desde que esse prédio urbano tenha afetação habitacional. Sobre o VPT incidirá a taxa de 1%.
Da leitura cuidada da PI da Requerente depreende-se com mediana certeza, que a argumentação expendida tem como base argumentativa o conteúdo normativo da Verba 28 da TGIS, aditada pela da Lei nº 55-A/2012, de 2012, que estabelecia:
«28 — Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1 000 000 — sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:
28.1 — Por prédio com afetação habitacional — 1 %;
28.2 — Por prédio, quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças — 7,5 %.»
Com respaldo deste regime legal, a Requerente entende que a norma de incidência não contempla a tributação dos terrenos para construção, ainda que a sua aptidão seja a construção, exista ou não projeto aprovado.
E tem efetivamente razão nas suas pertinentes alegações, considerando que o elemento objetivo da regra de incidência não incluía, no seu núcleo, os terrenos para construção ainda que revestidos daquelas caraterísticas. E em seu apoio beneficiaria da reiterada e pacífica jurisprudência do STA e do CAAD que, desde sempre, entenderam que esses imóveis não cabiam na Verba 28 da TGIS aditada à TGIS pela acima referida Lei nº 55-A/2012, de 29/10.
Porém, esta norma só vigorou até 31 de Dezembro de 2013 na sua redação primitiva, uma vez que a Lei do OE para 2014, concretamente a Lei nº 83-C/2013, de 31 de Dezembro, no seu art.º 194º, veio determinar:
“Artigo 194.º - Alteração à Tabela Geral do Imposto do Selo:
A verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, anexa ao Código do Imposto do Selo, aprovado pela Lei n.º 150/99, de 11 de setembro, passa a ter a seguinte redação:
«28.1 — Por prédio habitacional ou por terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI — 1 %»
E, por seu turno, o artº 260º da mesma lei fixou o início da vigência da alteração introduzida:
….
Artigo 260.º Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia 1 de janeiro de 2014”.
Deste modo, no dia 1 de Janeiro de 2014 deixou de estar em vigor redação da Lei nº 55-A/2012, para vigorar a nova regra de incidência introduzida na redação da Verba 28.1. pela Lei nº 83-C/2013, a coberto da qual passaram, expressamente, a ficar compreendidos na regra de incidência do imposto de selo os terrenos para construção com as caraterísticas ali enunciadas, como é o caso do terreno a que se reporta o pedido de pronúncia arbitral.
Respeitando o pedido de pronúncia à apreciação da legalidade do IS exigido já na vigência da nova lei quanto à liquidação respeitante ao ano de 2014, que esteve em vigor a partir do dia 1 de janeiro dessa ano, e tendo em conta que de acordo com os princípios gerais o regime legal a observar na liquidação é aquele que vigorar na data da verificação do respetivo fato tributário, somos forçados a ter em conta segundo a redação da lei referida à data: (i) o sujeito passivo é o titular dos direitos mencionados na Verba 28 no dia 31/12/2014, ou seja, a Requerente (ii) os elementos da matriz predial a ter em conta na liquidação (aqueles que a lei em vigor determinar como relevantes à data da respetiva verificação, por força do art.º 8º do CIMI, subsidiariamente aplicável) foram igualmente os que aí constavam nessa mesma data; (iii) o ato de liquidação, por força da nova redação da lei, incidiu também sobre um terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do CIMI; (iv) cujo respetivo VPT era superior a 1 000 000,00€.
Ou seja, subsumindo os factos enunciados na nova redação da Verba 28 da TGIS, dada pela Lei nº 83-C/2013, é inquestionável que o pedido de reconhecimento de ilegalidade da liquidação carece de fundamento legal, quando referido ao IS de 2014 incidente sobre o terreno para construção identificado nos autos, pelo que o mesmo é julgado improcedente.
B – A outra questão prende-se com a amplitude da decisão, isto é, a Requerente, apesar de referir “a liquidação adicional nº 2015 …, datada de 20.3.205, relativa ao Imposto de Selo respeitante ao ano de 2014”, pede a anulação do valor do imposto de selo em montante igual ao da 1ª prestação da coleta anual determinada, pagável em Abril de 2015.
A AT, na sua Resposta, alegou que o pedido só se pode referir ao ato tributário de liquidação do IS de 2014 porque:
“5.- …uma coisa é o ato de liquidação,(que é anual e único e tem de ser notificado nos termos do art.º 36º), e outra coisa é a emissão e notificação do documento de cobrança, o qual contém uma ordem de pagamento da dívida de imposto.
6 -Fica assim claro que o imposto de Selo respeitante à verba 28.1 da TGIS é liquidado anualmente e de uma só vez, o que deve ocorrer entre os meses de fevereiro e março do ano seguinte àquele a que respeita o imposto, podendo o pagamento do imposto ser efetuado em uma prestação única, duas prestações ou três prestações, conforme o total da dívida.
…
9- E, impugnando-se o ato de liquidação do imposto, o juízo que vier a ser feito sobre a legalidade do mesmo repercutir-se-á sobre todos os atos de cobrança, independentemente do momento em que venham a ter lugar.”
Acompanha-se aqui a tese da AT.
O que está previsto no art.º 2º do RJAT é que na Arbitragem Tributária os respetivos Tribunais são competentes para apreciar as pretensões que visem a declaração de ilegalidade de atos tributários de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e pagamentos por conta.
O pedido da Requerente vem interposto tendo como objeto o ato tributário de liquidação de IS de 2014 constante do Doc. 2015…, realizado pela AT em 2015-03-20, no qual se diz que a liquidação tem o valor de 28 039,27€ e que o notificado deve pagar a 1ª prestação em que se pode fracionar esse valor (das três legalmente autorizadas) em Abril de 2015.
Na realidade a Requerente apresentou ao Tribunal um pedido de apreciação de legalidade da liquidação do Imposto de Selo efetuada ao abrigo da Verba 28.1 da TGIS, com referência ao ano de 2014 e, salvo melhor opinião, não é pelo facto de ter requerido a anulação em montante igual ao do valor da primeira prestação que o Tribunal não é competente para analisar o ato tributário na sua globalidade, com os contornos anuais que lhe são intrínsecos e que por ela foram identificados.
A decisão tomada em Tribunal Arbitral deve reportar-se necessariamente ao ato tributário sindicado, que, neste caso, como se disse, é a liquidação do IS previsto na TGIS, Verba 28.1, com referência ao ano de 2014, no montante de 28 309,27€, valor que derivou da multiplicação da taxa de 1% sobre o VPT constante da matriz em 31/12/2014, que ascendia a 2 830 926,91€, e não ao ato constante do documento de pagamento que mais não é do que a notificação do valor da liquidação fracionado em três prestações, em que a primeira devia ser paga durante o mês de Abril de 2015
E é precisamente isto que determina o artº. 23º, nº 7, do Código do Imposto de Selo quando refere que “tratando-se do imposto devido pelas situações previstas na verba nº 28 da Tabela Geral, o imposto é liquidado anualmente (…)” nos meses de fevereiro e março do ano seguinte, conforme a determinação do artº 113º do CIMI, subsidiariamente aplicável. Ou seja, para cada facto tributário haverá, em princípio, uma única liquidação, pela qual se determinará a coleta a pagar.
Deste modo, pelo simples facto de a lei permitir o pagamento da coleta em prestações, em número normalmente previsto em função do respetivo montante, não significa que se consumaram três ou quatro liquidações, conforme o número de prestações legalmente previstas.
A liquidação é só uma e só o seu conteúdo poderá ser lesivo dos interesses do sujeito passivo abrangido, e, por isso, só ela pode ser objeto de impugnação[1].
Ainda assim, neste âmbito, poderia surgir a dúvida de saber se a Requerente não teve apenas em vista impugnar parcialmente o ato tributário na parte correspondente ao valor da 1ª prestação.
Não se nos afigura sustentável esta tese.
Em abstrato, permite-se efetivamente que a impugnação possa ter âmbito parcial.
In casu, da leitura atenta da PI, não decorre que a requerente pretendeu que este Tribunal declarasse a ilegalidade parcial da liquidação de IS de 2014, em valor correspondente ao montante da 1ª prestação. Toda a construção argumentativa estriba-se nos eventuais vícios do ato de liquidação de IS de 2014 e não em vícios imputáveis a uma parte do ato tributário cuja anulação corresponderia ao valor de 9 436,43€, que é o montante ali que foi enunciado.
Pelo que tem também razão a AT nesta matéria.
A decisão do Tribunal abrange o ato tributário de liquidação na sua globalidade anual e não só o valor que corresponder ao do documento de pagamento respeitante à 1ª prestação, pese embora a possibilidade legal de se pedir a anulação parcial de um ato de liquidação. Os efeitos da decisão atuam sobre a liquidação, ou parte dela se for esse o objeto do processo, e não apenas sobre o montante da prestação.
Nesta conformidade entende-se que a decisão proferida nos autos respeita ao ato tributário de liquidação do imposto de selo de 2014 com referência ao terreno para construção atrás melhor identificado, de que a impugnante é proprietária, levada a cabo com base na Verba 28.1 da TGIS.
VII - Valor da causa
O pedido que deu causa à presente impugnação respeita ao ato tributário de liquidação do Imposto de Selo de 2014, não se podendo considerar que diz respeito a uma parte da coleta correspondente ou igual à do primeiro pagamento prestacional que a impugnante estava obrigada a realizar em Abril de 2015. Por isso, tendo o pedido de pronúncia como objeto o ato de liquidação do IS de 2014, é o montante da coleta nele apurado que constitui o valor da utilidade económica imediata do pedido, tendo em conta a determinação que decorre do artº. 296º do CPC.
Ademais, a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, do mesmo modo que os tribunais judiciais em sede de impugnação, compreende só os pedidos de declaração de ilegalidade de atos de liquidação e não de prestações através das quais se faz a cobrança das quantias liquidadas. Esses são atos relacionados com a cobrança.
Por outro lado, o artº 306, nº 1, do Código de Processo Civil, determina que “compete ao juiz fixar o valor da causa, sem prejuízo do dever de indicação que impende sobre as partes”.
Ora, de conformidade com o nº 1 do art º. 3º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, o valor da causa é determinado nos termos do artº 97º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário. Este artigo, de conformidade com a alínea a) do seu nº 1, prevê que os valores atendíveis para efeitos de custas ou outros previstos na lei, são os seguintes: “quando seja impugnada a liquidação, o da importância cuja anulação de pretende”.
Em conclusão, à face deste regime legal e das considerações explanadas, o valor da importância cuja anulação que se pretende é o correspondente ao valor da liquidação de Imposto de Selo de 2014, cuja coleta calculada ascende a 28 039,27€, isto porque, neste caso, o pedido apresentado não vem dirigido a uma parte da liquidação apenas.
Pelo que, sem necessidade de outras considerações, em face da clareza dos factos e das normas mencionadas, o valor da causa vai fixado em 28 309,27€, correspondente ao montante da utilidade económica imediata obtida com a decisão arbitral.
VIII. DECISÃO
Com os fundamentos expostos:
· julga-se improcedente o pedido formulado pela requerente, decidindo-se manter na ordem jurídica o ato de liquidação de Imposto do Selo de 2004, por não enfermar de qualquer ilegalidade.
· fixa-se o valor da ação em 28 309,27 euros (nº 2 do regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, art.º 97º-A do CPPT e art.º 306º do CPC).
Custas a cargo da Requerente.
De acordo com os termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, e com a Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em 1 530.00€.
Registe-se e notifique-se esta decisão arbitral às partes.
Lisboa, Centro de Arbitragem Administrativa, 28/10/2015
O Árbitro
(José Ramos Alexandre)
[1] Há jurisprudência do CAAD no mesmo sentido, de que é exemplo o Ac. do Procº 736-2014-T.