Decisão Arbitral
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RELATÓRIO
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A… e B…, contribuintes n.º … e n.º …, respectivamente, comproprietárias na proporção de ½ e de 1/6, apresentaram em 26/05/2015, pedido de pronúncia arbitral, no qual solicitam a anulação dos actos de liquidação de imposto do selo respeitantes ao ano de 2014.
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O Exmo. Senhor Presidente do Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), designou em 23/07/2015 como árbitro, Francisco Nicolau Domingos.
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No dia 10/08/2015 ficou constituído o tribunal arbitral.
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Cumprindo a estatuição do art. 17.º, nº 1 do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT) foi a Requerida em 17/08/2015 notificada para, querendo, apresentar resposta e solicitar a produção de prova adicional.
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Em 29/09/2015 a Requerida apresentou a sua resposta e solicitou a dispensa da reunião a que alude o art. 18.º do RJAT, bem como a apresentação de alegações.
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As Requerentes em 21/10/2015 apresentaram requerimento no qual solicitam a dispensa da referida reunião, bem como de alegações.
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O tribunal, no dia 22/10/2015 decidiu, nomeadamente, dispensar a realização da reunião a que o art. 18.º, n.º 1 do RJAT se refere, com fundamento no princípio da autonomia do tribunal arbitral na condução do processo e na determinação das regras a observar com vista à obtenção, em prazo razoável, de uma pronúncia de mérito sobre as pretensões formuladas, cfr. art. 16.º, al. c) do RJAT e agendou data para a prolação da decisão final.
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SANEAMENTO
A cumulação de pedidos e de autores subjacente aos presentes autos é admissível, porquanto tem por objecto actos de liquidação do mesmo imposto, o do selo. Como também se verifica a identidade entre a matéria de facto e a procedência do pedido depende da interpretação dos mesmos princípios e regras de direito, cfr. art. 3.º, n.º 1 do RJAT.
O processo não enferma de nulidades, não foram suscitadas quaisquer questões que obstem à apreciação do mérito da causa, o tribunal arbitral encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente para conhecer e decidir o pedido, verificando-se, consequentemente, as condições para ser proferida a decisão final.
3. OBJECTO DO LITÍGIO
As Requerentes entendem que as liquidações de imposto do selo – verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS) e respeitantes ao ano de 2014 são ilegais.
Em concreto, sustentam, preliminarmente, que a sujeição ao imposto do selo da verba 28.1 da TGIS determina-se pela afectação habitacional e a partir do VPT constante na matriz de montante igual ou superior a € 1 000 000.
Na sua partitura argumentativa constam os seguintes: i) o regime contido na supra referenciada verba é omisso quanto a regras próprias de definição e de determinação da sua base de incidência e que, assim, ordena a aplicação da base de incidência prevista no IMI, o VPT constante da matriz; ii) o imposto do selo da verba 28.1 da TGIS tem a natureza de imposto acessório do IMI e, como tal, é liquidado sobre a mesma matéria colectável do imposto principal; iii) entre os aspectos que se encontram omissos no regime do imposto do selo, avulta o da relevância e da autonomia tributária de cada andar ou divisão do prédio susceptível de utilização independente e iv) de acordo com o CIMI, em resultado de tal omissão, quando as partes são economicamente independentes, cada uma é avaliada por aplicação das correspondentes regras (art. 7.º, n.º 2, al. b) do CIMI). Por isso, concluem que, se o VPT de qualquer uma das quinze unidades residenciais constantes da matriz do prédio a que se referem estes autos for inferior a € 1 000 000, sobre as mesmas não incide o imposto do selo da verba 28.1 da TGIS.
Invocam ainda que não sendo a concentração ou a dispersão imobiliária um critério de capacidade contributiva ou qualquer outro critério legítimo de tributação, forçoso é de concluir que a norma de incidência da verba 28.1 da TGIS é inconstitucional, por violação do princípio da igualdade, previsto no art. 13.º da CRP.
Por seu turno, a Requerida afirma que a sujeição ao imposto do selo da verba 28.1 da TGIS resulta da conjugação de dois elementos, a afectação habitacional e o valor do prédio urbano inscrito na matriz ser igual ou superior a € 1 000 000.
Assim, defende que se as Requerentes são comproprietárias de um prédio em regime de propriedade total ou vertical, este não possui fracções autónomas, às quais a lei fiscal atribua a qualificação de prédio. Deste modo, observa que aquelas não são comproprietárias de 17 fracções autónomas, mas de um único prédio e, como tal, não se verifica o vício imputado aos actos em crise.
Para sustentar tal conclusão, acrescenta que: i) o objectivo das Requerentes que consiste em que se considere que existe analogia entre o regime da propriedade horizontal e o da propriedade vertical, é ilegal; ii) não existe qualquer lacuna quanto à matéria na lei fiscal, pois o CIMI determina que não estando o prédio submetido ao regime da propriedade horizontal, as fracções são partes susceptíveis de utilização independente, sem que haja partes comuns; iii) apesar de cada andar ou parte susceptível de utilização independente ser considerado separadamente na inscrição matricial, por força do art. 12.º, n.º 3 do CIMI, a verdade é que tal sucede na mesma matriz; iv) a unidade do prédio em propriedade vertical, composto por vários andares ou divisões, não é afectada pelo facto de todos ou parte deles serem susceptíveis de utilização económica independente e v) se tal prédio não deixa de ser apenas um, não podem as suas partes distintas ser juridicamente equiparadas às fracções autónomas em regime de propriedade horizontal.
Sustenta igualmente a Requerida que o facto do IMI ser apurado em função do VPT de cada parte de prédio com utilização independente não afecta também a aplicação da verba 28.1 da TGIS, porquanto o elemento determinante desta é o valor patrimonial total e não separadamente cada uma das parcelas.
Conclui que interpretação diversa violaria a letra e o espírito da verba 28.1 da TGIS e o princípio da legalidade dos elementos essenciais do imposto, previsto no art. 103.º, n.º 2 da CRP. Ou seja, aquela interpretação que defende que o valor patrimonial de que depende a incidência seja determinado globalmente e não andar a andar ou divisão a divisão.
4. MATÉRIA DE FACTO
4.1. FACTOS QUE SE CONSIDERAM PROVADOS
4.1.1. As Requerentes são comproprietárias do imóvel a que corresponde a inscrição matricial n.º …, urbano, freguesia de … (…), Lisboa, na proporção de ½ e 1/6, respectivamente.
4.1.2. Tal imóvel compreende 17 andares com utilização independente, inscritos do seguinte modo:
a) 1.º D, com um VPT de € 94 430,00, habitação;
b) 2.º D, com um VPT de € 94 430,00, habitação;
c) 3.º D, com um VPT de € 95 380, 00, habitação;
d) 4.º D, com um VPT de € 95 380,00, habitação;
e) 5.º D, com um VPT de € 96 320,00, habitação;
f) 6.º D, com um VPT de € 96 320,00, habitação;
g) 7.º D, com um VPT de € 78 640,00, habitação;
h) 8.º, com um VPT de € 33 540,00, habitação;
i) 1.º E, com um VPT de € 119 290,00, habitação;
j) 2.º E, com um VPT de € 119 290,00, habitação;
l) 3.º E, com um VPT de € 120 480,00, habitação;
m) 4.º E, com um VPT de € 120 480,00, habitação;
n) 5.º E, com um VPT de € 121 680,00, habitação;
o) 6.º E, com um VPT de € 121 680,00, habitação;
p) 7º E, com um VPT de € 95 740,00, habitação;
q) 166 A, com um VPT de € 170 140,00, armazéns e actividade industrial;
r) 166 C, com um VPT de € 235 540,00, comércio.
4.1.3. As Requerentes foram notificadas das liquidações de imposto do selo, relativas ao ano de 2014, em relação a cada uma de tais inscrições matriciais, com afectação habitacional, no montante global de € 10 020,54 e que se decompõem do seguinte modo:
i) A…:
a) 1.º D, no montante de € 472,15;
b) 2.º D, no montante de € 472,15;
c) 3.º D, no montante de € 476,90;
d) 4.º D, no montante de € 476,90;
e) 5.º D, no montante de € 481,60;
f) 6.º D, no montante de € 481,60;
g) 7.º D, no montante de € 393,20;
h) 8. º, no montante de € 167,70;
i) 1.º E, no montante de € 596,45;
j) 2.º E, no montante de € 596,45;
l) 3.º E, no montante de € 602,40;
m) 4.º E, no montante de € 602,40;
n) 5.º E, no montante de € 608,40;
o) 6.º E, no montante de € 608,40;
p) 7.º E, no montante de € 478,70.
ii) B…:
a)1.º D, no montante de € 157,38;
b) 2.º D, no montante de € 157,38;
c) 3.º D, no montante de € 158,97;
d) 4.º D, no montante de € 158,97;
e) 5.º D, no montante de € 160,53;
f) 6.º D, no montante de € 160,53;
g) 7.º D, no montante de € 131,07;
h) 8.º, no montante de € 55,90;
i) 1.º E, no montante de € 198,82;
j) 2.º E, no montante de € 198,82;
l) 3.º E, no montante de € 200,80;
m) 4.º E, no montante de € 200,80;
n) 5.º E, no montante de € 202,80;
o) 6.º E, no montante de € 202,80;
p) 7.º E, no montante de € 159,57.
4.1.4. As Requerentes efectuaram os seguintes pagamentos no dia 24/04/2015:
i) A…:
a) 1.º D, no montante de € 236,08;
b) 2.º D, no montante de € 236,08;
c) 3.º D, no montante de € 238,45;
d) 4.º D, no montante de € 238,45;
e) 5.º D, no montante de € 240,80;
f) 6.º D, no montante de € 240,80;
g) 7.º D, no montante de € 196,60;
h) 8. º, no montante de € 167, 70;
i) 1.º E, no montante de € 198,83;
j) 2.º E, no montante de € 198,83;
l) 3.º E, no montante de € 200,80;
m) 4.º E, no montante de € 200,80;
n) 5.º E, no montante de € 202,80;
o) 6.º E, no montante de € 202,80;
p) 7.º E, no montante de € 239,35.
ii) B…:
a) 1.º D, no montante de € 157,38;
b) 2.º D, no montante de € 157,38;
c) 3.º D, no montante de € 158,97;
d) 4.º D, no montante de € 158,97;
e) 5.º D, no montante de € 160,53;
f) 6.º D, no montante de 160,53;
g) 7.º D, no montante de € 131,07;
h) 8.º, no montante de € 55,90;
i) 1.º E, no montante de € 198,82;
j) 2.º E, no montante de € 198,82;
l) 3.º E, no montante de € 200,80;
m) 4.º E, no montante de € 200,80;
n) 5.º E, no montante de € 202,80;
o) 6.º E, no montante de € 202,80;
p) 7.º E, no montante de € 159,57.
4.1.5 O imóvel identificado em 4.1.1. não se encontrava constituído sob o regime de propriedade horizontal a 31 de Dezembro de 2014.
4.2. FACTOS QUE NÃO SE CONSIDERAM PROVADOS
Não existem factos com relevância para a decisão arbitral que não tenham sido dados como provados.
4.3. FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO QUE SE CONSIDERA PROVADA
A matéria de facto dada como provada tem génese nos documentos utilizados para cada um dos factos alegados e cuja autenticidade não foi colocada em causa.
5. DIREITO
5.1. Ilegalidade dos actos em crise
Em primeiro lugar, são duas as questões que o tribunal tem de decidir, apurar se a sujeição à norma de incidência da verba 28 da TGIS deve ser concretizada pelo VPT correspondente a cada uma das partes, andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, ou se, pelo contrário, pela soma do VPT de cada uma de tais partes. E, em segundo lugar, determinar se a interpretação que conclui que só há incidência de imposto do selo quando o VPT de cada uma das partes, andares ou divisões susceptíveis de utilização independente é superior a € 1 000 000, viola o princípio da legalidade dos elementos essenciais do imposto, previsto no art. 103.º, n.º 2 da CRP.
Para concretizar tal tarefa há, desde logo, que procurar a norma cujas partes dissentem na sua interpretação.
Assim, o art. 1.º, n.º 1 do Código do Imposto do Selo (CIS) e a verba 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS), dispõem que se encontram sujeitos a tributação: «Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1 000 000 – sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:
28.1 - Por prédio habitacional (…) - 1 %...».
Deste modo, é necessário perscrutar o conceito de «prédio habitacional» a que alude a norma em interpretação e o de «valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI». Ora, não sendo possível resolver a questão com recurso ao CIS é por força da estatuição do art. 67.º, n.º 2 de tal diploma necessário aplicar as normas do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI).
Consequentemente, dispõe o art. 2.º do CIMI sobre o conceito de prédio:
«1 - Para efeitos do presente Código, prédio é toda a fracção de território, abrangendo as águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência, desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva e, em circunstâncias normais, tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontrem implantados, embora situados numa fracção de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial.
2 - Os edifícios ou construções, ainda que móveis por natureza, são havidos como tendo carácter de permanência quando afectos a fins não transitórios.
3 - Presume-se o carácter de permanência quando os edifícios ou construções estiverem assentes no mesmo local por um período superior a um ano.
4 - Para efeitos deste imposto, cada fracção autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio».
Ora, o conceito de prédio em sede de IMI é, como sabemos, dotado de maior amplitude em relação aqueloutro vertido no art. 204.º, n.º 2 do Código Civil (CC) e engloba três elementos, mais concretamente, um de natureza física, o segundo de carácter jurídico e o último de natureza económica, J. SILVÉRIO MATEUS/L. CORVELO DE FREITAS, Os impostos sobre o património imobiliário. O Imposto do Selo., Engisco, 2005, pág. 101 a 103 e JOSÉ MARTINS ALFARO, Código do Imposto Municipal sobre Imóveis – Comentado e Anotado, Áreas Editora, 2004, pág. 118 a 123. O primeiro exige a referência a uma fracção de território, abrangendo, designadamente, edifícios e construções nela incorporados com carácter de permanência. O elemento de carácter jurídico exige que a coisa, móvel ou imóvel, pertença ao património de uma pessoa singular ou colectiva. Em terceiro lugar, o elemento de natureza económica exige que a coisa tenha um valor económico.
No que concerne ao conceito de prédio urbano, o art. 6.º do CIMI descreve as suas várias categorias, sendo fundamental para a subsunção em cada uma delas, a natureza da utilização, isto é, o fim a que o mesmo se destina. E, nada na economia do art. 6.º, n.º 1, al. a) do CIMI impede que se classifiquem as partes de um prédio em propriedade vertical, com divisões ou andares susceptíveis de utilização independente, com uma utilização habitacional, como «prédio habitacional». Relevante é, repete-se, a sua utilização. E a conclusão diferente não é possível chegar pela interpretação do art. 2.º, n.º 4 do CIMI que eleva cada fracção autónoma em propriedade horizontal à categoria de prédio. Na verdade, também neste último normativo não se consegue vislumbrar nenhum fundamento para discriminar entre prédios em propriedade horizontal e prédios em propriedade vertical, com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, no que tange à sua subsunção como prédios urbanos e habitacionais, de acordo com toda a economia da verba 28 da TGIS. Por outras palavras, se o legislador não tratou diferentemente os prédios em propriedade vertical em relação àqueles constituídos em propriedade horizontal, não deve o intérprete fazê-lo[1].
Bem pelo contrário, a inscrição matricial e a determinação do VPT bem demonstram a similitude de tratamento legislativo. Com efeito, as partes dotadas de independência económica devem, cada uma delas, ser objecto de inscrição matricial separada e, consequentemente, deverá de igual modo constar autonomamente o respectivo VPT, cfr. art. 2, n.º 4, art. 7.º, n.º 2, al. b) e art. 12.º, n.º 3 todos do CIMI. O que tem refracção em sede de liquidação, na medida em que existirá uma por cada parte, divisão ou andar objecto de utilização separada.
Revertendo tal interpretação para os presentes autos, existem 15 andares do imóvel com utilização habitacional independente que, à data do facto tributário, isto é, 31 de Dezembro de 2014, ainda não se encontrava constituído em propriedade horizontal e, por conseguinte, desde logo, dúvidas não existem que os mesmos devem ser classificados como prédios habitacionais de natureza urbana.
Importa ainda dilucidar o outro segmento gráfico da verba do CIS em interpretação, ou seja, o «valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI».
A este respeito, como já se descreveu acima, o CIMI prevê a autonomização das partes de prédio urbano susceptíveis de utilização independente no que tange à inscrição matricial e à especificação do respectivo VPT. Tal observação é igualmente válida a propósito da consequente liquidação, como dispõe o art. 113.º, n.º 1 e o art. 119.º, n.º 1, ambos do último diploma citado. Com efeito, se o imposto é liquidado «…com base nos valores patrimoniais tributários dos prédios (nosso sublinhado) e em relação aos sujeitos passivos que constem das matrizes (nosso sublinhado) …» e o documento de cobrança deve conter a «…discriminação dos prédios, suas partes susceptíveis de utilização independente, respectivo valor patrimonial tributário e da colecta…», tal significa que, não só o VPT para efeitos de aplicação da verba 28.1 da TGIS a considerar é aquele objecto da inscrição matricial separada, como também nada obsta à qualificação como «prédio habitacional» de partes, andares ou divisões com utilização independente.
Ora, se nenhum dos andares das Requerentes com afectação habitacional ultrapassava o VPT de € 1 000 000, não pode ser aplicável ao caso sub judice a norma de incidência em crise, sob pena de ilegalidade. Repete-se, relevante é, para recortar o âmbito de tal norma, que as partes dissentem na sua interpretação: i) que o andar susceptível de utilização independente tenha um VPT superior a € 1 000 000 e ii) que o referido andar tenha uma afectação habitacional.
Defende a Requerida que seria inconstitucional, por violação do princípio da legalidade dos elementos essenciais do imposto, a interpretação da verba 28.1 da TGIS diversa daquela que conclui que o VPT relevante para tal norma de incidência tem de ser o valor patrimonial tributário global do prédio e não o de cada uma das suas partes independentes. Se assim fosse, não se compreenderia a referência expressa ao «valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI». E esse, dúvidas não existem, é objecto de autonomização em relação a cada uma das partes susceptíveis de utilização independente. De igual modo, também não encontraríamos argumento para a emissão de notas de liquidação autónomas. Acresce ainda que, perante a remissão expressa do art. 67.º, n.º 2 do CIS para o CIMI, no que concerne às matérias não reguladas, as partes, andares ou divisões com autonomia são enquadráveis nos prédios classificados como urbanos e habitacionais, cfr. artigos 2.º, 3.º e 6.º, todos do CIMI. Deste modo, entende-se que a referida interpretação não padece de inconstitucionalidade.
5.2. JUROS INDEMNIZATÓRIOS
O art. 43.º, n.º 1 da LGT dispõe que: «São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido». Por outras palavras, são três os requisitos do direito aos referidos juros: i) existência de um erro em acto de liquidação de imposto imputável aos serviços; ii) determinação de tal erro em processo de reclamação graciosa ou de impugnação judicial e iii) pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
Deste modo, é logo possível formular uma questão: é admissível determinar o pagamento de juros indemnizatórios em processo arbitral tributário? A resposta à questão é afirmativa. Com efeito, o art. 24.º, n.º 5 do RJAT dispõe que: «É devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previstos na Lei Geral Tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário».
Conhecendo a questão, a ilegalidade dos actos em crise é imputável à Requerida, perante a falta de amparo normativo aquando da sua prática. Consequentemente, procede o pedido de juros indemnizatórios, contados à taxa apurada, de acordo com o previsto no art. 43.º, n.º 4 da LGT, entre a data em que foi efectuado o pagamento indevido e até integral reembolso.
6. DECISÃO
Nestes termos e com a fundamentação acima descrita decide julgar-se procedente o pedido arbitral, com a consequente anulação dos actos objecto de pronúncia, com todas as consequências legais, incluindo, nomeadamente, o reembolso das quantias indevidamente pagas.
7. VALOR DO PROCESSO
Fixa-se o valor do processo em € 10 020,54 (o correspondente à soma das liquidações objecto de pronúncia) nos termos do art. 97.º - A do CPPT, aplicável por força do disposto no art. 29.º, n.º 1, al. a) e b) do RJAT e do art. 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).
8. CUSTAS
Custas a cargo da Requerida, no montante de € 918, cfr. art. 22.º, n.º 4 do RJAT e da Tabela I anexa ao Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, na medida em que o pedido de anulação das liquidações de Imposto do Selo supra identificadas procedeu integralmente.
Notifique.
Lisboa, 11 de Novembro de 2015
O árbitro,
Francisco Nicolau Domingos
[1] V. neste sentido a decisão arbitral proferida no processo n.º 50/2013 – T, de 29/10/2013, na qual assumiu as funções de árbitro a Dra. MARIA DO ROSÁRIO ANJOS.