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CAAD: Arbitragem Tributária
Processo n.º 241/2015
Tema: IVA – Verba 2.6.
Decisão Arbitral
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RELATÓRIO
A… – ARTIGOS MÉDICOS, LDA, NIPC n.º …, com sede na Rua …, em …, veio, nos termos do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico de Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado RJAT), requerer a constituição de Tribunal Arbitral singular, em que é requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante AT ou Requerida, com vista a obter a pronúncia sobre a ilegalidade e consequente anulação de actos de liquidação de IVA e juros compensatórios.
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Ex.mo Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 9 de Abril de 2015.
Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Tribunal Arbitral singular foi constituído em 19 de Junho de 2015.
A AT respondeu, defendendo que o pedido deve ser julgado improcedente.
Foi dispensada a reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT e a realização de alegações finais, em face do teor da matéria contida nos autos.
O Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária, são legítimas e estão representadas (artigo 4.º, e n.º 2 do artigo 10 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112/2011, de 22 de Março).
Não ocorrem quaisquer nulidades, excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento imediato do mérito da causa.
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MATÉRIA DE FACTO
Com base nos elementos que constam do processo e do processo administrativo junto aos autos, consideram-se provados os seguintes factos:
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A Requerente tem por objeto social o comércio por grosso e distribuição de aparelhos de prótese, ortopedia implantes dentários de todo o tipo, instrumentos, dispositivos, artigos médico – cirúrgicos e produtos sanitários de todo o tipo.
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No cumprimento da Ordem de Serviço n.º OI2014… e OI2014… emitida pela Direção de Finanças do Porto, em 17 de Abril de 2014, foi a empresa/ Requerente sujeita a uma fiscalização;
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Segundo a Requerida, o procedimento de inspeção resultou de uma evidência corroborativa de uma prática generalizada consubstanciada na aplicação indevida da taxa reduzida do imposto na liquidação de IVA nas transmissões internas de implantes dentários e material conexo (isto é, bens que, de modo manifesto, não se enquadram em qualquer das verbas da lista I anexa ao respetivo código, porquanto são usualmente transacionados se fizerem parte de uma unidade única);
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Aplicando o referido entendimento, a AT emitiu os seguintes actos de liquidação de IVA e juros compensatórios:
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Liquidação Adicional de IVA n.º … (período 1003T), no valor de €1.833,07 (mil oitocentos e trinta e três Euros e sete cêntimos);
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Liquidação Adicional de IVA n.º … (período 1006T), no valor de €1.819,42 (mil oitocentos e dezanove Euros e quarente e dois cêntimos);
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Liquidação Adicional de IVA n.º … (período 1009T), no valor de €853,56 (oitocentos e cinquenta e três Euros e cinquenta e seis cêntimos);
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Liquidação Adicional de IVA n.º … (período 1012T), no valor de €1.015,42 (mil e quinze Euros e quarente e dois cêntimos);
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Liquidação adicional de juros compensatórios n.º … (período 1003T), no valor de €322,22 (trezentos e vinte e dois Euros e vinte e dois cêntimos);
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Liquidação adicional de juros compensatórios n.º … (período 1006T), no valor de €301,67 (trezentos e um Euros e sessenta e sete cêntimos);
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Liquidação adicional de juros compensatórios n.º … (período 1009T), no valor de €133,02 (cento e trinta e três Euros e dois cêntimos);
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Liquidação adicional de juros compensatórios n.º … (período 1012T), no valor de €148,00 (cento e quarente e oito Euros);
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Liquidação Adicional de IVA n.º … (período 1103T), no valor de €1.654,66 (mil seiscentos e cinquenta e quatro Euros e sessenta e seis cêntimos);
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Liquidação Adicional de IVA n.º … (período 1106T), no valor de €2.331,21 (dois mil trezentos e trinte e um Euros e vinte e um cêntimos);
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Liquidação Adicional de IVA n.º … (período 1109T), no valor de €2.125,98 (dois mil cento e vinte e cinco Euros e noventa e oito cêntimos);
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Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014 … (período 1112T), no valor de €2.768,56 (dois mil setecentos e sessenta e oito Euros e cinquenta e seis cêntimos);
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Liquidação adicional de juros compensatórios n.º … (período 1103T), no valor de €224,85 (duzentos e vinte e quatro Euros e oitenta e cinco cêntimos);
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Liquidação adicional de juros compensatórios n.º … (período 1106T), no valor de €293,29 (duzentos e noventa e três Euros e vinte e nove cêntimos);
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Liquidação adicional de juros compensatórios n.º … (período 1109T), no valor de €246,03 (duzentos e quarenta e seis Euros e três cêntimos);
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Demonstração de Acerto de Contas de Juros Compensatórios n.º 2014 … (período 1112T), no valor de €292,78 (duzentos e noventa e dois Euros e setenta e oito cêntimos);
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Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014 … (período 1203T), no valor de €1.786,38 (mil setecentos e oitenta e seis Euros e trinta e oito cêntimos);
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Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014 … (período 1206T), no valor de €903,76 (novecentos e três Euros e setenta e seis cêntimos);
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Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014 … (período 1209T), no valor de €1.090,02 (mil e noventa Euros e dois cêntimos);
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Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014 … (período 1212T), no valor de €1.681,21 (mil seiscentos e oitenta e um Euros e vinte e um cêntimos);
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Demonstração de Acerto de Contas de Juros Compensatórios n.º 2014 … (período 1203T), no valor de €171,28 (cento e setenta e um Euros e vinte e oito cêntimos);
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Demonstração de Acerto de Contas de Juros Compensatórios n.º 2014 … (período 1206T), no valor de €77,45 (setenta e sete Euros e quarenta e cinco cêntimos);
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Demonstração de Acerto de Contas de Juros Compensatórios n.º 2014 … (período 1209T), no valor de €82,54 (oitenta e dois Euros e cinquenta e quatro cêntimos);
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Demonstração de Acerto de Contas de Juros Compensatórios n.º 2014 … (período 1212T), no valor de €110,34 (cento e dez Euros e trinta e quatro cêntimos);
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Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014 … (período 1303T), no valor de €615,05 (seiscentos e quinze Euros e cinco cêntimos);
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Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014 … (período 1306T), no valor de €592,30 (quinhentos e noventa e dois Euros e trinta cêntimos);
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Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014 … (período 1309T), no valor de €67,15 (sessenta e sete Euros e quinze cêntimos);
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Demonstração de Liquidação de IVA n.º 2014 … (período 1312T), no valor de €205,58 (duzentos e cinco Euros e cinquenta e oito cêntimos);
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Demonstração de Acerto de Contas de Juros Compensatórios n.º 2014 … (período 1303T), no valor de €34,37 (trinta e quatro Euros e trinta e sete cêntimos);
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Demonstração de Acerto de Contas de Juros Compensatórios n.º 2014 … (período 1306T), no valor de €27,06 (vinte e sete Euros e seis cêntimos).
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O termo do prazo de pagamento voluntário das liquidações verificou-se em 31 de Dezembro de 2014 e em 2 de Janeiro de 2015.
Não existem factos com relevo para a apreciação do mérito da causa que não se tenham provado.
Este Tribunal firmou a sua convicção na consideração dos documentos juntos aos autos pelas Partes.
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MATÉRIA DE DIREITO
A principal questão que se coloca nos presentes autos reconduz-se a saber se a transmissão “individualizada” das coroas, implantes e pilares deverá ser tributada à taxa reduzida de 6% por se subsumir no âmbito do disposto na verba 2.6 da Lista I anexa ao Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA).
A este propósito, a Requerente alega no seu pedido de constituição do Tribunal Arbitral o seguinte:
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O legislador ao criar a verba 2.º da Lista I anexa ao Código do IVA pretendeu tributar à mesma taxa situações em que o produto final é o mesmo, que no caso concreto culmina com os implantes, independentemente do consumidor final ter adquirido os produtos de forma faseada ou a sua totalidade;
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Sempre, foi entendimento da Requerente assim como de todas as empresas que se dedicam à mesma atividade, e que àquela tem contacto direto, que os produtos em causa têm pleno enquadramento na verba 2.6 da Lista I anexa ao Código do IVA, que prevê a tributação à taxa reduzida dos “Aparelhos ortopédicos, cintas médico-cirúrgicas e meias medicinais, cadeiras de rodas e veículos semelhantes, acionados manualmente ou por motor, para deficientes, aparelhos, artefactos e demais material de prótese ou compensação destinados a substituir, no todo ou em parte, qualquer membro ou órgão do corpo humano ou a tratamento de fraturas e as lentes para correção de vista, bem como calçado ortopédico, desde que prescrito por receita médica, nos termos a regulamentar pelo Governo no prazo de 30 dias”;
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O sentido e alcance da taxa reduzida aplicada neste domínio deverá ter em conta as boas regras da hermenêutica, tendo em conta não só o elemento gramatical, como o respetivo contexto, razão de ser e finalidades prosseguidas pela verba 2.6, devendo resultar numa interpretação declarativa;
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Nada na letra da lei leva a restringir a sua aplicação às situações de transmissões de “ bens completos” de implante;
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Em bom rigor muito dificilmente os adquirentes destes produtos, clinicas dentárias, médicos dentistas podem comprar as próteses na sua totalidade, na medida em que a maioria dos componentes são solicitados à medida que vão sendo colocados no paciente;
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Em nenhuma circunstância, as próteses podem ser aplicadas aos pacientes em simultâneo.
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Primeiro aplica-se o implante e só depois de se ter verificado que não existe rejeição ao mesmo é que pode ser colocado o pilar e as peças de ligação.
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Sendo do conhecimento geral que a prótese não é implantada de uma só vez. É efetuada por fases uma vez que é um trabalho delicado, e que depende da adaptação do paciente a cada componente;
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A maioria dos componentes são feitos por medida, pelo que se justifica a sua compra por fases à medida que vão sendo aplicados.
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Na terminologia médica actual, considera-se prótese a peça ou dispositivo artificial utilizado para substituir um membro, um órgão, ou parte dele, como, por exemplo, prótese dentária, ocular, articular, cardíaca, vascular etc;
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Conforme consta, por exemplo, do Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, prótese, é a “substituição de um órgão do corpo ou parte dele, por uma peça artificial”;
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Ou ainda, segundo o mesmo dicionário, um “aparelho ou peça artificial que substitui um órgão do corpo ou parte dele”;
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Verifica-se, assim, que prótese não é apenas o conjunto do implante + peças de ligação + dente, mas que, qualquer dos referidos componentes é ele próprio, e só por si, uma prótese;
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Ou seja, qualquer dos artigos comercializados pela Requerente, com excepção das ferramentas para odontologia, são de considerar como próteses, como tal enquadradas na verba 2.6 da Lista I anexa ao Código do IVA, sendo a sua transmissão tributada à taxa reduzida e não à taxa normal;
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Daí que, com excepção das ferramentas, todos os restantes artigos comercializados pela Requerente (implantes, pilares e peças de ligação) devam ser considerados como próteses, sendo a sua transmissão de tributar à taxa reduzida;
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E, os mesmos só não são adquiridos em conjunto pelos seus clientes, pelo simples facto de as referidas próteses não poderem ser aplicadas em simultâneo;
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Primeiro aplica-se o implante e só depois de se ter verificado que não existe rejeição ao mesmo é que pode ser colocado o pilar e as peças de ligação;
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Daí que não faça sentido, para evitar encargos financeiros com a constituição de stocks, que os seus clientes adquiram, simultaneamente, todas as próteses que vão ter que colocar nos seus pacientes;
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Aliás, nem se entende que a questão seja colocada, dado que a referida verba 2.6 contempla expressamente, como se viu “artefactos e demais material de prótese ou compensação destinados a substituir, no todo ou em parte, qualquer membro ou órgão do corpo humano”;
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Ou seja, a interpretação da verba que a Autoridade Tributária fez, na referida Informação Vinculativa, tem que ser considerada abusiva, já que o texto legal é perfeitamente claro, ao não restringir a sua aplicação a próteses que substituam integralmente um membro ou órgão humano, bastando que substitua em parte esse membro ou órgão para que seja de tributar à taxa reduzida;
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Com efeito, nenhuma clínica ou médico dentista adquire as próteses completas para cada cliente, de uma só vez, até pela simples razão que, quando se inicia o tratamento, ainda não existe a certeza absoluta do número de dentes que é necessário substituir, do número de implantes, de pilares ou de peças de ligação que vai ser necessário aplicar;
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Em face do exposto e tendo em conta como se processa os implantes só podemos concluir que as operações levadas a cabo pela Requerente estão em plena correspondência com a verba 2.6 supra referenciada, sendo de aplicar a taxa reduzida a todas as próteses;
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Só assim se respeitando o princípio da neutralidade e os princípios da generalidade, da igualdade, da legalidade e da justiça material.
Por sua vez a AT alega, em síntese, o seguinte:
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De acordo com a verba 2.6 da lista I anexa ao Código do IVA, estão sujeitos à taxa reduzida os “Aparelhos ortopédicos, cintas médico-cirúrgicas e meias medicinais, cadeiras de rodas e veículos semelhantes, accionados manualmente ou por motor, para deficientes, aparelhos, artefactos e demais material de prótese ou compensação destinados a substituir, no todo ou em parte, qualquer membro ou órgão do corpo humano ou a tratamento de fracturas e as lentes para correcção de vista, bem como calçado ortopédico, desde que prescrito por receita médica, nos termos a regulamentar pelo Governo no prazo de 30 dias.”;
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Os materiais de prótese apenas são tributados à taxa reduzida se se destinarem ao fim definido na verba, ou seja, à substituição de parte do corpo com deficiência ou enfermidade ou da sua função;
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Tal interpretação implica, também, que os bens que consistam em peças, partes e acessórios daquelas próteses não sejam abrangidos pela verba 2.6, dado que, para além de não serem próteses, não são aptos a cumprir, considerados individualmente, a função de substituição de uma parte do corpo ou da sua função;
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A verba 2.6 apenas abrange a transmissão do artigo que, em si, configure uma peça artificial que substitua o órgão do corpo humano ou parte dele, ou seja, autonomamente ou unitariamente;
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Na prótese dentária por implante, aplica-se a taxa normal do imposto à transmissão das peças de ligação ou fixação, dado que as mesmas, não cumprem, em si, objectivamente, a função descrita na verba 2.6. da Lista I anexa ao Código do IVA;
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Tendo em consideração que as situações de tributação à taxa reduzida constituem excepções à aplicação da taxa normal do IVA e, por via disso, representam um desvio à aplicação do regime geral do imposto, o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) tem-se orientado, nesta matéria, pela aplicação do princípio da interpretação estrita;
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Tendo presente este pressuposto de exegese, e no que ao presente caso concerne, compreendem-se na verba 2.6 da Lista I, anexa ao CIVA, sendo tributados à taxa reduzida, os “(…) aparelhos, artefactos, e demais material de prótese ou compensação destinados a substituir, no todo ou em parte, qualquer membro ou órgão do corpo humano”;
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Assim, partindo do elemento literal da norma, note-se que não basta estarmos perante “aparelhos, artefactos e demais material de prótese ou compensação”, sendo necessário que estes bens sejam aptos a substituir, no todo ou em parte, qualquer membro ou órgão do corpo humano;
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Neste sentido, importa distinguir o conceito de implante do conceito de material de prótese;
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Por «material de prótese» deve entender-se aquele que se destine ou seja apto à substituição de um membro ou órgão do corpo humano, de forma total ou parcial;
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As próteses dentárias visam substituir o aparelho dentário, total ou parcialmente. Essa substituição verifica-se não só fisicamente mas, também, na substituição das suas funções: mastigação, verbalização, função estética;
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Conforme esclarece a Ordem dos Médicos Dentistas, em parecer de 20 de Fevereiro de 2013, sob a epígrafe “Dispositivos médicos – regulação”, a “prótese dentária constitui um dispositivo médico feito por medida destinado a restabelecer a função mastigatória e estética dos dentes perdidos ou fraturados, desempenhando um papel fundamental na área da reabilitação oral.”;
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E prossegue, acerca do conceito de implante, dizendo: “[e]sclarece-se que o implante dentário é um dispositivo médico para uso único ao qual são atribuídas as finalidades acima descritas apoiando a reabilitação oral, referentes à alínea t) do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 145/2009, de 17 de junho, servindo de suporte à prótese dentária, carecendo de elementos designados conectores – peças de ligação – também estes acessórios específicos e com finalidade médica.”
“Ocorrendo uma dada reabilitação oral (…), tal resultará na necessidade de colocação de uma peça de ligação e de uma prótese, em períodos que podem ser temporalmente desencontrados. E bem assim em caso de deterioração de um daqueles componentes que, ali existindo previamente, podem carecer de uma sua substituição sem que os restantes elementos sejam eliminados ou descartados”.
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Na prótese por implante, agora em discussão, e como deriva do próprio conceito, o implante é o modo de fixação da prótese. A prótese, construída ou elaborada por um técnico especializado, por referência ao paciente a que se destina, consiste na peça designada por coroa (dente artificial em porcelana), a qual não é fornecida pelo sujeito passivo;
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Na realidade, o implante (a forma de fixação da prótese) não beneficia do mesmo tratamento fiscal da prótese, como sucede, aliás, com os componentes utilizados na elaboração das demais próteses;
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Refira-se que as próteses dentárias em geral, independentemente do método de aplicação, têm, no seu destino final, o mesmo tratamento fiscal, ou seja, a isenção prevista no artigo 9.º do CIVA, ou seja, como refere a Requerente, o que aqui releva é o produto final e é esse que beneficia da taxa reduzida;
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Não podemos esquecer que a prótese, em si, pode ser objecto de comercialização em estágios anteriores à colocação à disposição do paciente, caso em que é tributada à taxa reduzida;
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De facto, a questão deve ser centrada em saber se a verba 2.6 da Lista I tem por finalidade tributar à taxa reduzida a transmissão de próteses, seja de que tipo forem, ou se o legislador pretendeu abranger aqui, também, a venda de todos os tipos de dispositivos de fixação que não são prótese, são fabricados em série e que, quando considerados isoladamente, nomeadamente no momento da sua transmissão por fornecedores como o sujeito passivo, não substituem um membro ou um órgão do corpo humano;
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Note-se, aliás, atendendo ao elemento literal da interpretação da norma, que o legislador se refere a material de prótese e não a material para prótese (para aplicação numa prótese), o que indica excluir as peças de ligação ou fixação de próteses, como as transaccionadas pelo sujeito passivo;
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Ainda por referência à letra da verba 2.6, veja-se que a norma restringe a aplicação da taxa reduzida aos bens que sejam, eles próprios, aptos à função de substituição de um membro ou órgão do corpo humano;
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Daí que seja forçoso concluir, nas diversas informações emitidas pela DSIVA, pela aplicação da taxa reduzida a “aparelhos completos”, por contraposição às operações tributáveis sobre partes, peças e acessórios, que não cumprem a função acima descrita, e que, como tal, devem ser tributadas à taxa normal do imposto, por falta de enquadramento nas Listas I e II, anexas ao CIVA;
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Neste sentido, e ao contrário do que o sujeito passivo pretende, afigura-se não ter acolhimento na letra da lei a tese de que a verba 2.6 engloba a comercialização de todo o tipo de peças destinadas à fixação de próteses ou à sua ligação, em vez de se referir à prótese em si, produto acabado apto à substituição de um órgão ou parte do corpo humano;
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Tendo em consideração que estamos a analisar a subsunção de um determinado bem ao teor da Lista I anexa ao Código do IVA, é ainda de extrema relevância ter em consideração o disposto no Acórdão proferido pelo STA, no âmbito do processo 01689/13;
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Com efeito, como resulta da leitura do douto aresto, os números em que a Lista I anexa ao Código do IVA se divide “ não são passíveis de uma interpretação extensiva susceptível de incluir em cada um deles os produtos que de alguma forma participem da natureza dos que o conceito abrange. (…) Significa o exposto que todo o produto que expressamente não seja contemplado de forma inequívoca na Lista I não pode beneficiar da taxa reduzida de IVA.”;
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A Requerente alega, ainda, que não consta da verba o conceito de aparelho completo ou de unidade única de implante e que inexistindo estes conceitos na prática, a conclusão que se extrairia da posição da AT seria a de que às próteses por implante nunca se pode aplicar à taxa reduzida;
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A verba 2.6 restringe-se aos “bens completos” como sendo aqueles que, por si mesmos, podem substituir um órgão ou membro do corpo humano e não quaisquer elementos que sejam utilizados individualmente no processo de substituição;
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E chega-se, assim, àquilo que se entende ser a ratio da norma, ou o elemento teleológico, ou seja, tributar à taxa reduzida produtos especificamente concebidos para a correcção ou compensação de deficiências ou para a substituição, total ou parcial, de órgãos ou membros do corpo humano;
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A verba 2.6 aplica-se, pois, aos aparelhos e próteses em si, produto final, no caso em apreço, ao dente artificial (prótese). Significa que não se aplica aos bens transaccionados pela Requerente;
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Com efeito, o implante de titânio e o pilar são apenas componentes, cada um desempenhando a função para a qual foram concebidos, de suporte e fixação da prótese, mas que, de per si, objectivamente considerados, não desempenham nem substituem a função do órgão dentário;
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Não obstante a sua aplicação ser geralmente usada em medicina dentária, são, tão-somente, peças acessórias ou instrumentais, que contribuem para o resultado final da reabilitação oral.
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É a própria Requerente que admite que podem até existir situações em que os bens por si comercializados podem nunca vir a ser aplicados, o que significa que a sua função efectiva nunca se concretizaria, não chegando a cumprir o fim a que se deveria destinar quando ligados aos restantes componentes;
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Cabe concluir que a transmissão das citadas peças (de ligação ou implantação da prótese) são tributadas à taxa normal, por falta de enquadramento em qualquer das listas anexas ao CIVA, nomeadamente a verba 2.6 da lista I;
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Tenha-se presente que o princípio da neutralidade decorre do Tratado de Roma e encontra-se vertido na Directiva IVA (2006/112/CE), sendo sistematicamente invocado pela Comissão para se opor às legislações nacionais tidas por incompatíveis com as regras comunitárias, bem como pelas administrações fiscais e pelos contribuintes dos diversos Estados membros, tendo sido, inúmeras vezes, aplicado pelo TJUE;
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O princípio da neutralidade fiscal opõe-se a uma diferenciação na tributação de bens ou serviços de idêntica natureza, considerando-se verificado quando o imposto não influi na escolha do consumidor;
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Portanto, se estamos a falar da neutralidade sobre a tributação dos diferentes tipos de prótese temos de comparar a transmissão da prótese amovível com a da prótese fixa. E não com a da prótese fixa acrescida de peças de fixação e de ligação;
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De facto, quando o técnico especializado adquire os mais diversos materiais ou peças para construir uma prótese, fá-lo à taxa normal do imposto. Questiona-se, então, se a venda, à taxa reduzida, das peças necessárias à fixação de uma prótese por implante não imporia uma distorção de concorrência, pela violação da neutralidade do imposto, face à venda, à taxa normal, das peças necessárias à construção de uma dentadura artificial removível;
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Efectivamente, só a aplicação de uma mesma taxa às peças, partes e acessórios, no caso, a taxa normal, garante a neutralidade do imposto, impedindo qualquer tratamento discriminatório entre os diferentes tipos de próteses.
Face ao exposto, relativamente à posição das Partes e aos argumentos apresentados, para determinar se os actos de liquidação de IVA são ou não ilegais será necessário verificar qual é a interpretação que deve ser efectuada da verba 2.6 da Lista I anexa ao Código do IVA, nomeadamente saber se a taxa reduzida de IVA deve ser aplicada às transações separadas de implantes dentários, pilares e peças de ligação.
Vejamos o que deve ser entendido.
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Interpretação das normas
Resulta do artigo 11.º da Lei Geral Tributária (LGT) que a interpretação da lei fiscal deve ser efectuada atendendo aos princípios gerais de interpretação.
Os principais gerais de interpretação estão estabelecidos no artigo 9.º do Código Civil (CC), nos seguintes termos:
“1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.
2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.
3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.”
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Estabelece-se, assim, que são três os elementos de interpretação da Lei, a saber: o elemento literal, o elemento sistemático, o elemento racional e o elemento histórico, de acordo com os quais deve ser analisada a verba 2.6 da Lista I anexa ao Código do IVA, que dispõe o seguinte:
“Aparelhos ortopédicos, cintas médico-cirúrgicas e meias medicinais, cadeiras de rodas e veículos semelhantes, acionados manualmente ou por motor, para deficientes, aparelhos, artefactos e demais material de prótese ou compensação destinados a substituir, no todo ou em parte, qualquer membro ou órgão do corpo humano ou a tratamento de fraturas e as lentes para correção de vista, bem como calçado ortopédico, desde que prescrito por receita médica, nos termos a regulamentar pelo Governo no prazo de 30 dias” – Sublinhado nosso.
Atendendo ao elemento literal da norma aqui em discussão, importará, em primeiro lugar, reconstruir o pensamento legislativo através das palavras da lei que, no caso em análise, determina que seja aplicável a taxa reduzida de IVA “(…) aos aparelhos, artefactos e demais material de prótese ou compensação destinados a substituir, no todo ou em parte, qualquer membro ou órgão do corpo humano”;
Resulta desde logo da letra do preceito que devem ser tributados à taxa reduzida os materiais de prótese ou compensação que se destinem à substituição de parte do corpo com deficiência.
Nos termos do Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, Prótese é a “substituição de um órgão do corpo ou parte dele, por uma peça artificial” ou um “aparelho ou peça artificial que substitui um órgão do corpo ou parte dele”.
Conforme esclarece a Ordem dos Médicos Dentistas, em parecer de 20 de Fevereiro de 2013, sob a epígrafe “Dispositivos médicos – regulação”, a “prótese dentária constitui um dispositivo médico feito por medida destinado a restabelecer a função mastigatória e estética dos dentes perdidos ou fraturados, desempenhando um papel fundamental na área da reabilitação oral.”
De acordo com o Dicionário de Língua Portuguesa da Porto Editora, Implante (medicina dentária) constitui: “raiz metálica que, após ser colocada dentro do ossomaxilar, acaba por formar com ele uma estrutura única, suportando uma coroa artificial ou servindo de base para uma ponte fixa.”
Assim, parece que os implantes dentários se encontram abrangidos pela taxa reduzida de IVA aplicável aos bens descritos na verba 2.6., na medida em que se destinam a substituir um órgão do corpo humano, no caso, o aparelho dentário.
Tal parece ser, também, o entendimento da Requerida ao referir-se a prótese dentária por implante.
Como é do conhecimento geral, sendo o procedimento médico de colocação de implante dentário faseado, a constituição do implante pode ocorrer também de forma faseada.
Por essa razão, e sendo o fim último do implante sempre o mesmo – a substituição do aparelho dentário – o demais material de prótese associado ao implante, está também abrangido pela letra da lei.
Na verdade, e contrariamente ao defendido pela AT, nada na letra da lei nos leva a restringir a aplicação da taxa reduzida de IVA às situações de transmissões de “bens compostos” de implante + peças de ligação + dente.
Neste sentido, esclarece-se na decisão arbitral proferida no processo 429/2014-T, sobre o conceito de “bens completos” o seguinte:
“ (…) tal conceito não existe enquanto tal, existindo sim implantes constituídos pelas três peças de que ora tratamos – coroa, implante e pilar, que, de acordo com a técnica cirúrgica, são introduzidas por fases na boca do paciente, dando então origem no seu conjunto, a um implante. Na realidade, estas três peças são incindíveis e inutilizáveis salvo para a composição de um implante enquanto prótese composta.”
Tendo em conta que a norma em causa deve ser interpretada atendendo às demais disposições que formam o complexo normativo em que se integra a norma interpretanda, considerando o fim visado pelo legislador ao elaborar a norma e o contexto histórico da sua elaboração, debrucemo-nos de seguida sobre os demais elementos de interpretação de natureza lógica relativos à verba 2.6. Lista I anexa ao Código do IVA.
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Elemento Sistemático, Racional e Histórico
A verba 2.6 da Lista I anexa ao Código do IVA tem de ser interpretada atendendo às regras da Directiva 2006/112/CE, de 28 de Novembro, doravante Directiva IVA, que determina os bens a que se podem aplicar as taxas reduzidas de IVA, ao disposto no artigo 18.º do Código do IVA e à jurisprudência do TJUE e do CAAD.
De facto, a Directiva IVA instituiu um imposto geral sobre o consumo, indirecto de matriz comunitária e plurifásico, cuja principal característica é a sua neutralidade.
O princípio da neutralidade, que tem como corolário o princípio da não discriminação, impõe uma igualdade de tratamento de mercadorias similares e determina que o IVA deva incidir da mesma forma em todas as operações, independentemente da extensão das cadeias de produção e de distribuição.
O princípio da neutralidade encontra-se vertido nas Directiva IVA, sendo frequentemente invocado pela Comissão Europeia para se opor às legislações nacionais tidas por incompatíveis com as regras do Direito da União Europeia, bem como pelas administrações fiscais e pelos contribuintes dos diversos Estados membros, tendo sido, inúmeras vezes, aplicado pelo TJUE.
Na verdade, o TJUE tem procurado garantir a neutralidade da carga fiscal de todas as actividades económicas, sejam quais forem os seus objectivos ou resultados (que, como salienta, se consegue através do mecanismo das deduções que liberta o empresário da carga do IVA que pagou nas suas aquisições) - Cfr., nomeadamente, Acórdãos de 14 de Fevereiro de 1985, Caso Rompelman, Proc. 268/83, Rec., p. 655, n.º 19, de 22 de Junho de 1993, Caso Sofitam, Proc. C-333/91, Colect., p. I-3513, n.º 10, e de 6 de Abril de 1995, Caso BPL Group, Proc.C-4/94, Colect., p. I-983, n.º 26.
Desde logo, o TJUE procurou retirar as devidas consequências da igualdade de tratamento em IVA de actividades similares e da ausência do impacto da extensão das cadeias de produção e de distribuição no montante do imposto recebido pelas administrações fiscais.
Seguindo essa orientação, o Anexo III da Directiva IVA contém o elenco das transmissões de bens e prestações de serviços a que se podem aplicar as taxas reduzidas previstas no artigo 98.º, estabelecendo-se no ponto 4, o seguinte:
“Equipamento médico, material auxiliar e outros aparelhos normalmente utilizados para aliviar ou tratar deficiências, para uso pessoal exclusivo dos deficientes, incluindo a respectiva reparação, bem como assentos de automóvel para crianças.”.
Com base na referida possibilidade, os Estados membros podem ou não derrogar o princípio segundo o qual é aplicável a taxa normal, naturalmente limitada ao elenco de operações constante do Anexo III da Directiva IVA, que não pode deixar de respeitar o princípio da neutralidade fiscal.
Tem sido reiteradamente defendido pelo TJUE que a introdução e a manutenção de taxas reduzidas de IVA só são admissíveis se não violarem o princípio da neutralidade fiscal inerente ao sistema comum do IVA, “o qual se opõe a que mercadorias semelhantes, que estão, portanto, em concorrência entre si, sejam tratadas de maneira diferente do ponto de vista do IVA” – Cfr. Acórdão de 3 de Abril de 2008, Zweckverband zur Trinkwasserverorgung, processo n.º C-442/05 (ponto 42); Acórdão de 28 de Outubro de 2003, Comissão vs. Alemanha, processo n.º C-109/02 (ponto 20), entre outros.
Conforme explicitado nos Acórdãos do TJUE de 8 de Maio de 2003, Comissão vs Alemanha, processo C-384/01, a aplicação de taxas reduzidas deve ser interpretada de forma estrita, isto é, uma interpretação literal ou declarativa.
Ainda a este propósito, o TJUE tem entendido que em matéria de interpretação da Directiva IVA, se atender “não apenas aos respectivos termos mas também ao seu contexto e aos objectivos prosseguidos pela regulamentação em que está integrada” – Vide Acórdão de 3 de Abril de 2008, Zweckverband zur Trinkwasserverorgung, processo n.º C-442/05.
Seguindo de perto o entendimento perfilhado pelo TJUE, já foram proferidas decisões no CAAD (Decisão proferida no âmbito do processo 171/2013-T, de 12 de Junho de 2014 e n.º 429/2014-T, de 24 de Novembro de 2014), sobre a questão de saber se o legislador português visou restringir a aplicação da taxa reduzida, como pretende a Requerida, às transacções que incidem sobre implantes completos ou se a taxa reduzida se pode aplicar às transacções de implantes, pilares e peças de ligação porque são constituídos os implantes dentários quando transmitidos em separado.
Nas referidas decisões, que sufragamos, defende-se que “nada na letra da lei nos leva a restringir a sua aplicação às situações de transmissões de “bens completos” de implante.
“Não existindo tais “bens completos” de implante, na acepção que a AT pretende veicular, o entendimento da administração fiscal acaba por negar o benefício da taxa reduzida a este tipo de próteses, pondo assim em causa, sem um motivo racional atendível, a ratio legis que presidiu ao acolhimento desta verba nos termos em que se encontra redigida – a protecção da saúde pública.
(…)
De notar, por último que, da jurisprudência vinda de citar, ainda que supostamente existissem, tal como a AT pretende, “bens completos” de implante, na acepção que pretende veicular, sempre teríamos que reconhecer que a coroa, o pilar e o implante se configurariam como uma peça única ou, em último caso, ainda que erroneamente assim não se entendesse, como peças acessórias e, como tal, deveriam ser tributadas à taxa reduzida, seguindo o tratamento da operação principal.” – Processo 429/2014-T.
Conclui-se do exposto que a verba 2.6. do Anexo I do Código do IVA deve ser interpretada de forma estrita, uma vez que constitui uma derrogação ao princípio geral de tributação à taxa normal de IVA, como abrangendo as transacções que incidem sobre implantes completos ou de cada um dos componentes – coroa, implante, pilares e peças de ligação, porque são constituídos os implantes dentários quando transmitidos em separado.
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Aplicação ao caso concreto
Em face do exposto, importa aferir da legitimidade da pretensão da Requerente, determinando se na situação sub judice a taxa reduzida de IVA constante da verba 2.6 do Anexo I do Código do IVA é ou não aplicável.
Partindo de uma interpretação declarativa e não restritiva da verba 2.6 do Anexo I do Código do IVA, entende-se que os implantes dentários constituem material de prótese destinado a substituir o aparelho dentário, tal como é, aliás, considerado pela própria Requerida (Vide, entre outros, artigo 25.º da Resposta).
Enquanto próteses, os implantes dentários destinam-se a substituir um órgão do corpo humano.
Considera, contudo, a Requerida que a taxa reduzida de IVA ali prevista não é aplicável à transmissão das peças de ligação ou fixação, invocando o princípio da interpretação estrita.
No entanto, entende-se que considerando o disposto na letra da Lei, no seu sentido estrito - “(…) artefactos e demais material de prótese ou compensação destinados a substituir, no todo ou em parte, qualquer membro ou órgão do corpo humano”, assim como a sua ratio – tributar à taxa produtos especificamente concebidos para a correcção ou compensação de deficiências ou para substituição, total ou parcial, de órgãos ou membros do corpo humano -, não há qualquer fundamento para distinguir entre a tributação do implante, do pilar, da coroa e das peças de ligação, consoante a sua transmissão seja conjunta ou separada.
Uma vez que os implantes são constituídos por coroa, implante e pilar que, de acordo com a técnica cirúrgica, são introduzidos por fases na boca do paciente (Vide http://www.omd.pt/docs/folhetos/folhetoomdimplantesdentarios.pdf), dando então origem, no seu conjunto, a um implante ou prótese composta, a transmissão conjunta ou separada dos componente do implante não é relevante para efeitos de determinação da taxa de IVA aplicável.
De outro modo, (…) estaríamos essencialmente perante uma intolerável ofensa ao princípio da neutralidade que rege este imposto ao nível do Direito da União Europeia, tratando-se bens iguais de forma distinta sem qualquer motivo racional atendível, facto que viola as regras que regem este imposto bem como toda a jurisprudência do TJUE a que aludimos.” - Decisão n.º 429/2014-T do CAAD.
Acresce que, em face da formulação legal, nada indica que um restrição desta natureza estivesse incluída no pensamento legislativo, de molde a afastar as próteses compostas e não as próteses movíveis e amovíveis e/ou a distinguir a taxa de IVA aplicável consoante a facturação ou comercialização separada ou conjunta.
Ademais, a intenção do legislador ao criar uma taxa reduzida de IVA na verba 2.6., que constitui um benefício social, está presente quer a comercialização das próteses seja conjunta ou separada e prende-se com a saúde oral das pessoas.
Por fim,), “ainda que supostamente existissem, tal como a AT pretende, “bens completos” de implante, na acepção que pretende veicular, sempre teríamos que reconhecer que a coroa, o pilar e o implante se configurariam como uma peça única ou, em último caso, ainda que erroneamente assim não se entendesse, como peças acessórias, e como tal deveriam ser tributadas à taxa reduzida, seguindo o tratamento da operação principal.
Isto é: quer apenas por recurso às regras comunitárias quer por aplicação simples das boas regras de hermenêutica, o resultado é o mesmo – só poderá concluir-se que na verba 2.6 da Lista I anexa ao CIVA se incluem quer os implantes constituídos por uma peça única quer os implantes compostos.”- Decisão do CAAD, no processo 429/2014-T.
Tendo em conta o exposto, conclui-se que os actos de liquidação de IVA em apreço enfermam de erro sobre os pressupostos de direito, por errada interpretação desta verba 2.6. da Lista I anexa ao Código do IVA.
Em consequência, devem os actos de liquidação de IVA objecto da presente decisão, assim como as liquidações de juros compensatórios, enquanto actos consequentes, ser anulados.
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DECISÃO
Termos em que este Tribunal Arbitral decide:
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Julgar totalmente procedente o pedido de anulação dos actos de liquidação de IVA e de juros compensatórios, objecto do presente processo arbitral;
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Condenar a Requerida nas custas do presente processo, por ser a parte vencida.
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VALOR DO PROCESSO
Em conformidade com o disposto no artigo 306.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, 97.º-A do CPPT e artigo 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária o valor do pedido é fixado em €23.808.23.
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CUSTAS
Nos termos do disposto nos artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e no artigo 4.º, n.º 4 do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor da taxa de arbitragem em €1.224,00, nos termos da Tabela I do mencionado Regulamento, a cargo da Requerida, dada a improcedência integral do pedido.
Notifique-se.
Lisboa, 11 de Setembro de 2015
A Árbitro
Magda Feliciano
(O texto da presente decisão foi elaborado em computador, nos termos do artigo 131.º, n.º 5, do Código de Processo Civil, aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º 1, da alínea e) do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT) regendo-se a sua redacção pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.)
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