Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 229/2015-T
Data da decisão: 2015-12-07  Selo  
Valor do pedido: € 13.419,50
Tema: IS - Verba 28.1 TGIS;Terrenos para construção
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Decisão Arbitral

 

CAAD: Arbitragem Tributária

Processo nº 229/2015-T

Tema: Imposto do Selo, terrenos para construção, Verba 28.1 TGIS

 

 

REQUERENTE: A…, … Lda.

REQUERIDA: AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA

 

 

I. Relatório

 

A…, …, Lda, pessoa coletiva nº …, com sede na Avenida …, nº…, …, …, Lisboa, apresentou em 01/04/2015 um pedido de constituição de tribunal arbitral singular, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD em 06/04/2015 e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 10-04-2015.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou como árbitro do tribunal arbitral singular a ora signatária, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável, e notificou as partes dessa designação.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o tribunal arbitral ficou constituído em 11-06-2015.

A Requerente pede a declaração de ilegalidade da liquidação de Imposto do Selo emitida com o nº 2012 …, de 7 de novembro de 2012, relativa ao período de 01/01/2012 a 31/12/2012, referente ao prédio designado como terreno para construção, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ..., distrito de Faro, sob o artigo …, no valor de € 13.419,50.

A liquidação foi praticada fazendo aplicação da verba n.º 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo.

 

A Requerente pede a declaração de ilegalidade dessa liquidação e respetiva nota de cobrança, com todas as legais consequências. Entende, em suma, que a liquidação impugnada padece de vício de ilegalidade, na medida em que viola o disposto no artigo 99º, alínea a) do CPPT, por se tratar de um terreno para construção e, por isso, não estar abrangido no conceito de “prédio com afectação habitacional” que consta da referida verba n.º 28.1 da TGIS na versão em vigor aplicável ao período de tributação. Alega, ainda que, até 1 de janeiro de 2014 não existe fundamento, na medida em que a norma apenas tributava os prédios com afetação habitacional e a alteração introduzida pelo Orçamento do Estado para 2014 não pode ter aplicação retroativa. Invoca em defesa da sua tese numerosa jurisprudência arbitral.

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira (ATA) apresentou resposta em 03-09-2015, defendendo que o pedido de declaração de ilegalidade e consequente anulação da liquidação controvertida e da nota de cobrança respetiva, deve ser julgado improcedente, com a sua absolvição do pedido.

 

Por requerimento apresentado em 08-09-2015, veio a Requerente manifestar a sua concordância com o pedido de dispensa da reunião referida no artigo 18º do RJAT apresentado pela ATA, bem assim como da apresentação de alegações finais. Por despacho de 05-10-2015 foi dispensada a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e determinado que o processo prosseguisse para decisão final a proferir até 7/12/2015, com a advertência à requerente para, até àquela data, proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente.

 

As Partes não apresentaram alegações.

 

O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, à face do preceituado nos arts. 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do RJAT.

 

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março) e estão devidamente representadas.

 

O processo, não enferma de nulidades.

 

 

II. Matéria de facto

 

1. Factos que se consideram provados

 

a)                          A Requerente no ano de 2012 era proprietária do terreno para construção, sito na freguesia de ..., distrito de Faro, identificado pelo artigo matricial n.º …, substituído pelo artigo … da freguesia de ... e … (documento n.º 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

b)                          Este terreno tinha à data de referência para a liquidação impugnada (2012), o valor patrimonial tributário (VPT) de € 2.683.900,00, atualmente com um VPT de €1.503.900,00 e coeficiente de afetação serviços (cfr. documento nº 4 supra referido)

c)                           A Requerente foi notificada da liquidação de imposto de Selo (IS) n.º 2012 …, efetuada ao abrigo da verba 28.1. da Tabela Geral do Imposto do Selo, na quantia de € 13.419,50, relativa ao ano de 2012, com data limite de pagamento até 20/12/2012, com referência ao prédio supra descrito. (documentos n.ºs 2 e 3, juntos em anexo com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

d)                          Logo após esta notificação a requerente apresentou Modelo 1 de IMI para a reavaliação do prédio;

e)                          A reavaliação do prédio determinou a diminuição do VPT para € 1.503.900,00 e o coeficiente de afetação passou a serviços, a qual produziu efeitos retroativos a 2009 e o artigo matricial … foi anulado retroativamente dando origem a um novo artigo matricial;

f)                            Em consequência desta reavaliação foram anuladas a primeira liquidação e a respetiva nota de cobrança;

g)                          A seguir a ATA entendeu fazer a reavaliação oficiosa do prédio (por entender que não devia ter sido criado um novo artigo) e o artigo … foi reativado com o valor patrimonial anterior e com o coeficiente de localização “habitação”;

h)                         Em consequência foi também reativada a liquidação de IS e nota de cobrança relativamente ao período do ano de 2012, a qual foi notificada à Requerente, conforme documento nº3, junto em anexo ao pedido arbitral, com data limite de pagamento até 28/02/2015;

i)                            A Requerente interpôs recurso hierárquico, como consta do PA junto aos autos pela AT e do documento nº1 junto em anexo ao pedido arbitral, no qual foi proferida decisão de indeferimento.

j)                            Em 01-04-2015, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral (sistema informático do CAAD).

 

2. Factos que se consideram não provados

 

Não há factos não provados a considerar, com relevância para a decisão final.

 

3. Fundamentação da matéria de facto provada

 

Os factos provados baseiam-se nos documentos indicados para cada um dos pontos, cuja autenticidade e correspondência à realidade não foram questionadas.

 

 

III. Matéria de direito

 

A questão que é objecto da presente acção é a de saber se o terreno para construção se inseria ou não no âmbito de incidência do n.º 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS), na sua redacção inicial.

 

1. Regime da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro

 

A Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, efectuou várias alterações ao Código do Imposto do Selo e aditou à TGIS a verba 28, com a seguinte redacção:

 

            28 – Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1.000.000 – sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:

28.1 – Por prédio com afectação habitacional – 1 %;

28.2 – Por prédio, quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças – 7,5 %.

 

            Nas disposições transitórias que constam do artigo 6.º daquela Lei n.º 55-A/2012, estabeleceram-se as seguintes regras atinentes à liquidação do imposto previsto naquela verba:

 

1 – Em 2012, devem ser observadas as seguintes regras por referência à liquidação do imposto do selo previsto na verba n.º 28 da respectiva Tabela Geral:

a) O facto tributário verifica-se no dia 31 de Outubro de 2012;

b) O sujeito passivo do imposto é o mencionado no n.º 4 do artigo 2.º do Código do Imposto do Selo na data referida na alínea anterior;

c) O valor patrimonial tributário a utilizar na liquidação do imposto corresponde ao que resulta das regras previstas no Código do Imposto Municipal sobre Imóveis por referência ao ano de 2011;

d) A liquidação do imposto pela Autoridade Tributária e Aduaneira deve ser efectuada até ao final do mês de Novembro de 2012;

e) O imposto deverá ser pago, numa única prestação, pelos sujeitos passivos até ao dia 20 de Dezembro de 2012;

f) As taxas aplicáveis são as seguintes:

i) Prédios com afectação habitacional avaliados nos termos do Código do IMI: 0,5 %;

ii) Prédios com afectação habitacional ainda não avaliados nos termos do Código do IMI: 0,8 %;

iii) Prédios urbanos quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças: 7,5 %.

2 – Em 2013, a liquidação do imposto do selo previsto na verba n.º 28 da respectiva Tabela Geral deve incidir sobre o mesmo valor patrimonial tributário utilizado para efeitos de liquidação de imposto municipal sobre imóveis a efectuar nesse ano.

3 – A não entrega, total ou parcial, no prazo indicado, das quantias liquidadas a título de imposto do selo constitui infracção tributária, punida nos termos da lei.

 

Utilizou-se na referida verba 28.1 e nas subalíneas i) e ii) da alínea f) do n.º 1 do artigo 6.º da Lei n.º 55-A/2012, um conceito que não é utilizado em qualquer outra legislação tributária, nestes precisos termos, que é o de “prédio com afectação habitacional”.

Designadamente no CIMI, que em várias normas do Código do Imposto do Selo introduzidas por aquela Lei é indicado como diploma de aplicação subsidiária relativamente ao tributo previstos na referida verba n.º 28 [artigos 2.º, n.º 4, 3.º, n.º 3, alínea u), 5.º, alínea u), 23.º, n.º 7, e 46.º e 67.º do CIS], não é utilizado um conceito com aquela designação.

 

A Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro, alterou aquela verba n.º 28.1, dando-lhe a seguinte redacção:

 

28.1 - Por prédio habitacional ou por terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI – 1 %

 

            No caso em apreciação, note-se que, o período a quês e refere a liquidação de imposto impugnada respeita ao ano de 2012, relativa ao período previsto no artigo 6º, nº1 alíneas e) e f) da Lei nº55-A/2012, de 29 de outubro.

 

2. Conceitos de prédios utilizados no CIMI

 

No IMI, enumeram-se as espécies de prédios nos seus artigos 3.º a 6.º nos seguintes termos:

 

Artigo 2.º

Conceito de prédio

 

1Para efeitos do presente Código, prédio é toda a fracção de território, abrangendo as águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência, desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva e, em circunstâncias normais, tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontrem implantados, embora situados numa fracção de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial.

2Os edifícios ou construções, ainda que móveis por natureza, são havidos como tendo carácter de permanência quando afectos a fins não transitórios.

3Presume-se o carácter de permanência quando os edifícios ou construções estiverem assentes no mesmo local por um período superior a um ano.

4Para efeitos deste imposto, cada fracção autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio.

 

Artigo 3.º

Prédios rústicos

 

1São prédios rústicos os terrenos situados fora de um aglomerado urbano que não sejam de classificar como terrenos para construção, nos termos do n.º 3 do artigo 6.º, desde que:

a) Estejam afectos ou, na falta de concreta afectação, tenham como destino normal uma utilização geradora de rendimentos agrícolas, tais como são considerados para efeitos do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS);

b) Não tendo a afectação indicada na alínea anterior, não se encontrem construídos ou disponham apenas de edifícios ou construções de carácter acessório, sem autonomia económica e de reduzido valor.

2São também prédios rústicos os terrenos situados dentro de um aglomerado urbano, desde que, por força de disposição legalmente aprovada, não possam ter utilização geradora de quaisquer rendimentos ou possam ter utilização geradora de rendimentos agrícolas e estejam a ter, de facto, esta afectação.

3São ainda prédios rústicos:

a) Os edifícios e construções directamente afectos à produção de rendimentos agrícolas, quando situados nos terrenos referidos nos números anteriores;

b) As águas e plantações nas situações a que se refere o n.º 1 do artigo 2.º

4Para efeitos do presente Código, consideram-se aglomerados urbanos, além dos situados dentro de perímetros legalmente fixados, os núcleos com um mínimo de 10 fogos servidos por arruamentos de utilização pública, sendo o seu perímetro delimitado por pontos distanciados 50 m do eixo dos arruamentos, no sentido transversal, e 20 m da última edificação, no sentido dos arruamentos.

 

Artigo 4.º

Prédios urbanos

 

Prédios urbanos são todos aqueles que não devam ser classificados como rústicos, sem prejuízo do disposto no artigo seguinte.

 

Artigo 5.º

Prédios mistos

 

1Sempre que um prédio tenha partes rústica e urbana é classificado, na íntegra, de acordo com a parte principal.

2Se nenhuma das partes puder ser classificada como principal, o prédio é havido como misto.

 

Artigo 6.º

Espécies de prédios urbanos

 

1Os prédios urbanos dividem-se em:

a) Habitacionais;

b) Comerciais, industriais ou para serviços;

c) Terrenos para construção;

d) Outros.

2Habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços são os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins.

3Consideram-se terrenos para construção os terrenos situados dentro ou fora de um aglomerado urbano, para os quais tenha sido concedida licença ou autorização, admitida comunicação prévia ou emitida informação prévia favorável de operação de loteamento ou de construção, e ainda aqueles que assim tenham sido declarados no título aquisitivo, exceptuando-se os terrenos em que as entidades competentes vedem qualquer daquelas operações, designadamente os localizados em zonas verdes, áreas protegidas ou que, de acordo com os planos municipais de ordenamento do território, estejam afectos a espaços, infra-estruturas ou equipamentos públicos. (Redacção da Lei n.º 64-A/08, de 31-12)

4Enquadram-se na previsão da alínea d) do n.º 1 os terrenos situados dentro de um aglomerado urbano que não sejam terrenos para construção nem se encontrem abrangidos pelo disposto no n.º 2 do artigo 3.º e ainda os edifícios e construções licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal outros fins que não os referidos no n.º 2 e ainda os da excepção do n.º 3.

 

 

3. Normas sobre interpretação das leis

 

O artigo 11.º da Lei Geral Tributária estabelece as regras essenciais da interpretação das leis tributárias nos seguintes termos:

 

Artigo 11.º

Interpretação

 

            1. Na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam, são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis.

            2. Sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se outro decorrer directamente da lei.

            3. Persistindo a dúvida sobre o sentido das normas de incidência a aplicar, deve atender-se à substância económica dos factos tributários.

            4. As lacunas resultantes de normas tributárias abrangidas na reserva de lei da Assembleia da República não são susceptíveis de integração analógica.

 

Os princípios gerais da interpretação das leis, para que remete o n.º 1 do artigo 11.º da LGT, são estabelecidos no artigo 9.º do Código Civil, que estabelece o seguinte:

 

Artigo 9.º

Interpretação da lei

 

1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.

2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.

3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.

 

 

4. Conceito de «prédio com afectação habitacional»

 

Como se vê pelas normas do CIMI transcritas, não é utilizado na classificação dos prédios o conceito de «prédio com afectação habitacional».

Também não se encontra este conceito, com esta terminologia, em qualquer outro diploma.

Assim, na falta de correspondência terminológica exacta do conceito de «prédio com afectação habitacional» com qualquer outro utilizado noutros diplomas, podem aventar-se várias hipóteses interpretativas.

O ponto de partida da interpretação daquela expressão «prédios com afectação habitacional» é, naturalmente, o texto da lei, sendo com base nele que há que reconstituir o «pensamento legislativo», como impõe o n.º 1 do artigo 9.º do Código Civil, aplicável por força do disposto no artigo 11.º, n.º 1, da LGT.

 

 

5. Conceito de «prédio com afectação habitacional» como reportando-se aos prédios habitacionais

 

O conceito mais próximo do teor literal desta expressão utilizada é manifestamente o de «prédios habitacionais», definido no n.º 2 do artigo 6.º do CIMI como abrangendo «os edifícios ou construções» licenciados para fins habitacionais ou, na falta de licença, que tenham como destino normal fins habitacionais.

A entender-se que a expressão «prédio com afectação habitacional» coincide com o de «prédios habitacionais», é manifesto que as liquidações enfermarão de erro sobre os pressupostos de facto e de direito, pois todos os prédios relativamente aos quais foi liquidado o Imposto do Selo ao abrigo da referida verba n.º 28.1 são terrenos para construção, sem qualquer edifício ou construção, exigidos por aquele n.º 2 do artigo 6.º para se preencher aquele conceito de «prédios habitacionais».

Por isso, a adoptar-se a interpretação de que «prédio com afectação habitacional» significa «prédio habitacional», as liquidações cuja declaração de ilegalidade é pedida serão ilegais, por não haver em qualquer dos terrenos qualquer edifício ou construção.

No entanto, a não coincidência dos termos da expressão utilizada na verba n.º 28.1 da TGIS com a que se extrai do n.º 2 do artigo 6.º do CIMI aponta no sentido de não se ter pretendido utilizar o mesmo conceito.

 

A este propósito importa ainda referir que o conceito de «prédio com afectação habitacional» é um conceito distinto de «prédios habitacionais». A palavra «afectação», neste contexto de utilização de um prédio, tem o significado de «acção de destinar alguma coisa a determinado uso». [1]

«Quando, como é de regra, as normas (fórmulas legislativas) comportam mais que um significado, então a função positiva do texto traduz-se em dar mais forte apoio a ou sugerir mais fortemente um dos sentidos possíveis. É que, de entre os sentidos possíveis, uns corresponderão ao significado mais natural e directo das expressões usadas, ao passo que outros só caberão no quadro verbal da norma de uma maneira forçada, contrafeita. Ora, na falta de outros elementos que induzam à eleição do sentido menos imediato do texto, o intérprete deve optar em princípio por aquele sentido que melhor e mais imediatamente corresponde ao significado natural das expressões verbais utilizadas, e designadamente ao seu significado técnico-jurídico, no pressuposto (nem sempre exacto) de que o legislador soube exprimir com correcção o seu pensamento». ( [2] )

A relevância do texto da lei é especialmente acentuada em matéria de interpretação de normas de incidência do Imposto do Selo, que se reconduzem a uma amálgama, sob uma denominação comum, de um conjunto incongruente de tributos de naturezas completamente distintas (sobre o rendimento, sobre a despesa, sobre o património, sobre actos, etc.), que não deixa margem apreciável para aplicação do critério interpretativo primordial, que é a unidade do sistema jurídico, que reclama a sua coerência global.

Como se afirma no Acórdão arbitral proferido no processo nº 500/2014-T “A reconhecida falta de coerência do Imposto do Selo é particularmente exuberante no caso desta verba n.º 28.1, apressadamente incluída à margem do Orçamento Geral do Estado, por um legislador fiscal sem orientação fiscal global perceptível, que vai implementando sucessivamente normas de agravamento fiscal à medida dos reveses da execução orçamental, das imposições dos credores institucionais internacionais (representados pela «troika») e da fiscalização do Tribunal Constitucional.”

Na verdade, embora na «Exposição de Motivos» da Proposta de Lei n.º 96/XII/2.ª ([3]), em que se baseou a Lei n.º 55-A/2012, se faça referência à louvável preocupação do Governo de «reforçar o princípio da equidade social na austeridade, garantindo uma efectiva repartição dos sacrifícios necessários ao cumprimento do programa de ajustamento» e ao seu empenho «em garantir que a repartição desses sacrifícios será feita por todos e não apenas por aqueles que vivem do rendimento do seu trabalho», é manifesto, por um lado, que essas razões de equidade, decerto existentes, não começaram a valer em meados de 2012, já existindo no início do ano, quando entrou em vigor o Orçamento Geral do Estado e, por outro lado, que o alcance da verba n.º 28.1, ao tributar acrescidamente os prédios com afectação habitacional e não também os prédios que a não têm, deixa entrever que as preocupações de equidade social e a proclamada intenção de repartição dos sacrifícios por todos atinge muito mais alguns do que propriamente todos.

Neste contexto, não existindo elementos interpretativos seguros que permitam detectar coerência legislativa na solução adoptada na referida verba n.º 28.1 ou o acerto ou desacerto da solução adoptada (relevante para efeitos interpretativos à face do n.º 3 do artigo 9.º do Código Civil), o teor do texto legal tem de ser o elemento primacial da interpretação, em conformidade com a presunção, imposta pelo mesmo n.º 3 do artigo 9.º, de que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.

À face daqueles significados das palavras «afectação» e «afectar», que são «dar destino» ou «aplicar», a fórmula utilizada naquela verba n.º 28.1 da TGIS, abrange, manifestamente, os prédios que a que já foi dado destino para habitação, os prédios que já estão aplicados a fins habitacionais, pelo que importa indagar se abrangerá também os prédios que, apesar de não estarem ainda aplicados a fins habitacionais, estão a estes destinados.

Para tal, haverá que esclarecer quando é que se pode entender que um prédio está afectado a fim habitacional, designadamente se é quando lhe é fixado esse destino num alvará de loteamento ou acto de licenciamento ou semelhante, ou apenas quando a efectiva atribuição desse destino é concretizada.

Desde logo, o confronto da verba n.º 28.1 da TGIS com n.º 2 do artigo 6.º do CIMI, que define o conceito de prédios habitacionais, aponta no sentido de ser necessária uma afectação efectiva.

Na verdade, um edifício ou construção licenciado para habitação ou, mesmo sem licença, mas que tenha como destino normal a habitação, é, à face do n.º 2 daquele artigo 6.º um prédio habitacional, pois nele se dá tal classificação aos «edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins».

Por isso, no pressuposto de que o legislador da Lei n.º 55-A/2012 soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (como impõe o artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil que se presuma), se pretendesse reportar-se a esses prédios já licenciados para habitação ou que tenham a habitação como destino normal, decerto teria utilizado o conceito de «prédios habitacionais», que expressaria perfeita e claramente o seu pensamento, à face da definição dada por aquele n.º 2 do artigo 6.º do CIMI.

Consequentemente, deve presumir-se que o uso de uma expressão diferente tem em vista uma realidade distinta, pelo que, em boa hermenêutica, «prédio com afectação habitacional», não poderá ser um prédio apenas licenciado para habitação ou destinado a esse fim (isto é, não bastará que seja um «prédio habitacional»), tendo de ser um prédio que tenha já efectiva afectação a esse fim.

Que é este o sentido da expressão «afectação», no mesmo contexto de classificação de prédios que faz o CIMI, confirma-se pelo artigo 3.º em que, relativamente aos prédios rústicos, se faz referência aos que «estejam afectos ou, na falta de concreta afectação, tenham como destino normal uma utilização geradora de rendimentos agrícolas», que evidencia que a afectação é concreta, efectiva. Na verdade, como se vê pela parte final deste texto, um prédio pode ter como destino uma determinada utilização e estar ou não afecto a ela, o que evidencia que a afectação é, a nível da ligação de um prédio a determinada utilização, algo mais intenso que o mero destino e que pode ou não ocorrer, a jusante deste e não a montante. ( [4] )

De resto, o texto da lei ao adoptar a fórmula «prédio com afectação habitacional», em vez de «prédios urbanos de afectação habitacional», que aparece na referida «Exposição de Motivos», aponta fortemente no sentido de que se exige que a afectação habitacional já esteja concretizada, pois só assim o prédio estará com essa afectação.

No caso em apreço, está-se perante uma realidade ainda mais longínqua em relação à afectação habitacional que é a de nem sequer existir nenhum edifício ou construção e, por isso, não se poder considerar existente uma afectação que pressupõe a sua existência.

Por outro lado, a intenção legislativa de não estender o âmbito de incidência a terrenos construção foi expressamente referida pelo Governo ao apresentar no Plenário da Assembleia da República a Proposta de Lei 96-XII ao dizer, pela voz do Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais:

«Em primeiro lugar, o Governo propõe a criação de uma taxa especial para tributar prédios urbanos habitacionais de mais elevado valor. É a primeira vez que em Portugal é criada uma tributação especial sobre propriedades de elevado valor destinadas à habitação. Esta taxa será de 0,5% a 0,8%, em 2012, e de 1%, em 2013, e incidirá sobre as casas de valor igual ou superior a 1 milhão de euros. Com a criação desta taxa adicional, o esforço fiscal exigido a estes proprietários será significativamente aumentado em 2012 e em 2013». ( [5] )

 

A referência expressa a «casas» como alvo da incidência do novo tributo não deixa margem para dúvidas sobre a intenção legislativa.

Por outro lado não se encontra na discussão da referida proposta de Lei qualquer referência a «terrenos para construção».

No que concerne ao artigo 45.º do CIMI, não tem qualquer relação com a classificação de prédios apenas indicando os factores a ponderar na avaliação de terrenos para construção. O que se pondera aí, ao fazer referência ao «edifício a construir» é a ponderação do destino do terreno, que, como se viu, é algo que, no contexto do CIMI, não implica afectação e ocorre antes desta.

Por isso, no pressuposto de que o legislador da Lei n.º 55-A/2012 soube exprimir o seu pensamento em termos adequados se pretendesse reportar-se também aos prédios (terrenos para construção) apenas licenciados para habitação ou que tenham a habitação como destino normal, decerto não teria utilizado a expressão “prédios com afectação habitacional”. E, por ser assim, o legislador reavaliou a situação e introduziu uma nova versão da lei, a entrar em vigor a partir de 01-01-2014, incluindo agora os terrenos nestas circunstâncias. Isso mesmo é bem demonstrativo de que não era essa a situação que resultava da versão da lei até finais de 2013.

 

Nestes termos, deve presumir-se que o uso de uma expressão diferente pelo legislador teve em vista alcançar uma realidade distinta, pelo que, “prédio com afectação habitacional”, não poderá ser um prédio apenas licenciado para habitação ou destinado a esse fim, tendo de ser um prédio que tenha já efetiva afetação a esse fim. Note-se que no caso dos presentes autos o prédio em causa, caracteriza-se como terreno para construção, sendo que, da Certidão junta aos autos pela Requerente como documento nº 2, é possível extrair que no prédio não existe qualquer edificação. Por isso mesmo o único sentido possível para a expressão “afectação” é a de tratar-se de uma “afectação efectiva”. Veja-se que o artigo 3.º do CIMI, relativamente aos prédios rústicos, faz referência aos que “estejam afectos ou, na falta de concreta afectação, tenham como destino normal uma utilização geradora de rendimentos agrícolas”, que evidencia que a afetação é concreta, efetiva. Como se vê, ainda, pela parte final deste texto, um prédio pode ter como destino uma determinada utilização e estar ou não afeto a ela, o que evidencia que o pressuposto de uma afetação efetiva.

 

6. O caso concreto em discussão nos presentes autos

 

No caso em apreço não existia nenhum edifício ou construção ao tempo da liquidação de imposto impugnada (2012), pelo que não podemos considerar que o prédio em causa tivesse, uma afetação efetiva para habitação. Acresce ainda que, à luz da versão da lei então em vigor, a intenção legislativa de não estender o âmbito de incidência a terrenos para construção foi expressamente referida pelo Governo ao apresentar no Plenário da Assembleia da República a Proposta de Lei 96-XII ao dizer, pela voz do Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, a saber: “Em primeiro lugar, o Governo propõe a criação de uma taxa especial para tributar prédios urbanos habitacionais de mais elevado valor. É a primeira vez que em Portugal é criada uma tributação especial sobre propriedades de elevado valor destinadas à habitação. Esta taxa será de 0,5% a 0,8%, em 2012, e de 1%, em 2013, e incidirá sobre as casas de valor igual ou superior a 1 milhão de euros. Com a criação desta taxa adicional, o esforço fiscal exigido a estes proprietários será significativamente aumentado em 2012 e em 2013.” (sublinhados nossos).

A referência expressa a “casas” como alvo da incidência do novo tributo não deixa margem para dúvidas sobre a intenção legislativa. Por outro lado não se encontra na discussão da referida proposta de Lei qualquer referência a “terrenos para construção”. No que concerne ao artigo 45.º do CIMI, não tem qualquer relação com a classificação de prédios apenas indicando os fatores a ponderar na avaliação de terrenos para construção. O que se pondera aí, ao fazer referência ao «edifício a construir» é a ponderação do destino do terreno, que, como se viu, é algo que, no contexto do CIMI, não implica afetação e ocorre antes desta. Pelo que, a invocação da AT na sua resposta, das regras aplicáveis para efeitos de avaliação deste tipo de prédios não colhe quanto ao propósito relevante para a questão a decidir nos presentes autos.

 

Por fim, é importante referir que a Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro, também contraria a posição aqui defendida pela ATA, pois não veio esclarecer o elemento lógico subjacente à redação inicial da verba n.º 28.1, antes veio confirmar, indiretamente, a interpretação de que ela não abrangia os terrenos para construção. Aliás, se a primitiva redação da verba n.º 28.1 em análise, ao falar de “prédio com afetação habitacional” pretendesse abranger os edifícios e construções que constituíam “prédios habitacionais” e os terrenos para construção para que estivesse autorizada ou prevista habitação, então o natural deveria atribuir à nova redação natureza interpretativa, à semelhança do que faz noutras disposições nela contidas, como por exemplo o artigo 177.º, n.º 7, relativamente às alíneas a) e b) do n.º 3 do artigo 17.º-A do Código do IRS.

 

Por tudo o que se deixa exposto é entendimento deste Tribunal que a verba 28.1, na redação introduzida pela Lei nº55-A/2012 de 29 de outubro, não se aplica aos terrenos para construção, ainda que estes revelem potencialidade para construção de habitação. Importa referir que, sobre esta mesma questão foram já proferidas algumas decisões arbitrais, entre as quais se salientam as proferidas nos processos arbitrais nºs: 42/2013 T, 48/2013-T, 53/2013- T, 144/2013-T, 180/2013 – T e 189/2013-T, 306/2014 – T; 500/2014-T, 589/2014 – T, 602/2014 – T, 737/2014-T, entre outras.

 

Também o Supremo Tribunal Administrativo já se pronunciou, no mesmo sentido, sobre esta questão, nomeadamente, nos Acórdãos proferidos, nomeadamente, em 9 e 23 de Abril de 2014 (nos quais foi relatora a Sra. Juiz Conselheira Isabel Marques da Silva) e, ainda, em 9 de Maio de 2014 (no qual foi relatora a Sra. Juiz Conselheira Dulce Neto).

 A este propósito, o acórdão do STA de 9 de Abril de 2014 (no qual se faz referência expressa à decisão arbitral nº 144/2013-T) conclui que “não tendo o legislador definido o conceito de “prédios (urbanos) com afectação habitacional”, e resultando do artigo 6.º do Código do IMI - subsidiariamente aplicável ao Imposto do Selo previsto na nova verba n.º 28 da Tabela Geral - uma clara distinção entre “prédios urbanos habitacionais” e “terrenos para construção”, não podem estes ser considerados, para efeitos de incidência do Imposto do Selo (Verba 28.1 da TGIS, na redacção da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro), como prédios urbanos com afectação habitacional.”

 

De acordo com o supra exposto, se a letra da lei – da Verba 28.1 da TGIS – (elemento gramatical) se não apresenta suficientemente clara para, sem sobressaltos, precisar o conceito de “prédio com afetação habitacional”, já o elemento lógico (“o elemento sistemático e a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada”), para que aponta o n.º 1, do artigo 9º, do Código Civil, permite concluir, como tem vindo a ser concluído em diversas decisões arbitrais e, ainda, pelo Supremo Tribunal Administrativo nos supra citados Acórdãos que, resultando do artigo 6.º do Código do IMI uma clara distinção entre prédios urbanos “habitacionais” e “terrenos para construção”, não podem estes ser considerados como “prédios com afetação habitacional” para efeitos do disposto na verba n.º 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, na sua redação originária, que lhe foi conferida pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro”.

 

Nestes termos, deve ser considerado procedente o presente pedido arbitral, e anulada a liquidação impugnada, referente ao ano de 2012, sobre o prédio (terreno para construção) identificado nos presentes autos, por erro nos pressupostos em que assentou a sua emissão.

 

 

IV. Questão da não retroatividade da alteração à verba 28 da TGIS

 

A Requerente alega a este propósito, ancorada em jurisprudência arbitral Decisão arbitral nº 215/2013T, que a alteração introduzida à verba 28 da TGIS não assume a natureza de norma interpretativa, pelo que não pode ter aplicação retroativa. Como já referimos no ponto anterior, a nova redação da verba 28 da TGIS não tem natureza interpretativa, pelo que não se afigura tolerável, face aos princípios gerais previstos na lei (artigos 9º a 12º do Código Civil) quer face à Constituição da República (artigo 103º, nº3) a sua aplicação retroativa. Assim, afigura-se correto o entendimento invocado pela Requerente.

Este é, na verdade, o entendimento consentâneo com a natureza da alteração introduzida, a qual não veio esclarecer o sentido da norma, mas antes alargar o âmbito de incidência do imposto, também a terrenos para construção, certamente para alcançar ainda maior receita fiscal. E, considera-se assim, porquanto não havia controvérsia ou dúvida, quer na doutrina, quer na jurisprudência quanto ao sentido da lei anterior. De resto, se assim fosse, sempre teria de estar expressamente consagrado no texto da nova norma a sua natureza interpretativa. Assim, não resta dúvida que não estamos perante uma norma interpretativa.

A Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro, ao contrário do que defende a Autoridade Tributária e Aduaneira, não visou esclarecer o elemento lógico subjacente à redação inicial da verba n.º 28.1, antes veio confirmar, indirectamente, a interpretação de que ela não abrangia os terrenos para construção.

Na verdade, se a primitiva redacção daquela verba n.º 28.1, ao falar de «prédio com afectação habitacional» já pretendesse abranger os edifícios e construções que constituíam «prédios habitacionais» (nos termos do artigo 6.º, n.º 2, do CIMI), e os terrenos para construção para que estivesse autorizada ou prevista habitação, seria natural que se atribuísse à nova redacção natureza interpretativa, à semelhança do que a mesma Lei n.º 83-C/2013 faz noutras disposições [artigo 177.º, n.º 7, relativamente às alíneas a) e b) do n.º 3 do artigo 17.º-A do Código do IRS, e artigo 185.º, n.º 1, relativamente ao artigo 3.º-A do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado] e que é usual fazer-se nas leis orçamentais, quando se pretende que as novas redações se apliquem às situações potencialmente abrangidas pelas anteriores redações.

Por isso, o facto de não se ter atribuída natureza interpretativa à nova redacção aponta no sentido de se ter pretendido alterar o âmbito de incidência da referida verba n.º 28.1 da TGIS e não mantê-lo, esclarecendo-o.

Pelo exposto, a liquidação impugnada enferma de vício de erro sobre os pressupostos de direito, consubstanciado em violação da verba n.º 28.1 da TGIS, que justifica a sua anulação (artigo 135.º do Código do Procedimento Administrativo). ( [6] )

 

V. Decisão

 

Nestes termos, decide este Tribunal Arbitral:

a)      Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;

b)      Anular a liquidação de Imposto do Selo impugnada nos presentes autos, referente ao ano de 2012 e no valor de €13.419,50, com as legais consequências, nomeadamente, a obrigação de reembolso da (s) quantia (s) que tenham sido pagas pela Requerente com referência à liquidação impugnada, acrescidas de juros à taxa legal, até integral pagamento.

c)      Condenar a entidade requerida no pagamento das custas arbitrais.

 

 

VI. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto no art. 315.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 13.419,50

 

 

VII. Custas

 

Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 918,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

 

Notifique.

 

Lisboa, 07 de dezembro de 2015

 

 

A Juiz Árbitro

 

 

(Prof. Dra. Maria do Rosário Anjos)

 

 

 



[1]  Neste sentido vd. entre outras, a seguintes decisões arbitrais: Acórdão arbitral proferido no processo 504/2014 – T; 602/2014-T; 500/2014-T; 559/2014-T; 306/2014-T; 737/2014-T e 764/2014-T.

( [2] )          BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, página 182.

( [3] )          A Proposta de Lei n.º 99/XII/2.ª está disponível em:

http://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=37245

( [4] )          Outras normas do CIMI, deixam perceber que o termo «afectação» é utilizado para referenciar situações já existentes e não meramente futuras, mesmo que previsíveis, como o «destino».

É o caso do artigo 9.º do CIMI, que, depois de estabelecer que «o imposto é devido a partir» «do 4.º ano seguinte, inclusive, àquele em que um terreno para construção tenha passado a figurar no inventário de uma empresa que tenha por objecto a construção de edifícios para venda» ou «do 3.º ano seguinte, inclusive, àquele em que um prédio tenha passado a figurar no inventário de uma empresa que tenha por objecto a sua venda» [alíneas d) e e) do n.º 1], determina que «para efeitos do disposto nas alíneas d) e e) do n.º 1, devem os sujeitos passivos comunicar ao serviço de finanças da área da situação dos prédios, no prazo de 60 dias contados da verificação do facto determinante da sua aplicação, a afectação dos prédios àqueles fins». A «afectação dos prédios àqueles fins», no contexto deste artigo 9.º, reconduz-se à atribuição concreta aos prédios do fim «para venda», materializado pela sua inventariação, não bastando que tenham sido construídos ou adquiridos tendo em vista a sua venda.

( [5] )          Página 32 do Diário da Assembleia da República, n.º 9 da 2.ª Sessão Legislativa da XII Legislatura, relativo à Reunião Plenária de 10-10-2012, disponível em http://app.parlamento.pt.

( [6] )          Neste sentido tem vindo a decidir o Supremo Tribunal Administrativo, como pode ver-se pelos acórdãos de 09-04-2014, proferidos nos processos n.ºs 01870/13 e 048/14, e de 23-04-2014, proferidos nos processos n.ºs 0271/14, 0270/14 e 0272/14, disponíveis em http://www.dgsi.pt.

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