Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 411/2015-T
Data da decisão: 2015-11-16  Selo  
Valor do pedido: € 10.297,40
Tema: IS – Verba 28.1 da TGIS; Propriedade vertical
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Decisão Arbitral

 

 

I – Relatório

1.      A herança indivisa aberta por óbito de A, com o número de contribuinte …, representada por B, natural do Brasil, divorciada, residente na …, em ..., na qualidade de cabeça-de-casal, apresentou, em 03-07-2015, no Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) pedido de constituição de tribunal arbitral singular, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante designado por «RJAT» e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), tendo em vista a declaração de ilegalidade e/ou inconstitucionalidade e a consequente anulação das liquidações do imposto do selo – verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS), no valor global de 10 927,40 €, relativas ao ano de 2014, respeitante a dezasseis divisões de utilização independente, destinadas a habitação, do prédio urbano sito na …, freguesia de …, concelho de ..., inscrito na respetiva matriz predial sob o artigo ..., e a condenação da AT no reembolso da quantis indevidamente paga com respeito a estas liquidações, acrescida dos devidos juros indemnizatórios.

2.      A Requerente optou por não designar árbitro.

3.      O pedido de constituição de tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e notificado à AT em 16 de julho de 2015.

4.      O Signatário foi designado pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD como árbitro de tribunal arbitral singular, nos termos do disposto no artigo 6.º do RJAT, e comunicado a aceitação do encargo no prazo aplicável.

5.      Em 28 de agosto de 2015, as Partes foram notificadas dessa designação, não se tendo oposto à mesma, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.

6.      Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o tribunal arbitral singular ficou constituído em 14 de setembro de 2015.

7.      A Requerida foi notificada, por despacho arbitral desta data, para, nos termos do artigo 17.º, n.º 1, do RJAT e no prazo de 30 dias, apresentar resposta e, querendo, solicitar a produção de prova adicional.

8.      Em 14 de outubro de 2015, a Requerida apresentou a sua resposta, defendendo a improcedência dos pedidos.

9.      Não remeteu cópia do processo administrativo em que se basearam os atos de liquidação por considerar verdadeiros os documentos juntos pela Requerente.

10.  Na mesma data requereu a dispensa da reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT bem como das alegações.

11.  Assim, considerando que as Partes não requereram a produção de qualquer prova, além da que a Requerente juntou ao pedido de pronúncia arbitral, nem foi invocada qualquer exceção, o Tribunal Arbitral, face aos princípios da autonomia na condução do processo, da celeridade, da simplificação e informalidades processuais, ínsitos no n.º 2 dos artigos 19.º e 29.º do RJAT, por despacho de 15 de outubro de 2015, dispensou a realização da reunião prevista no artigo 18.º do mesmo diploma bem como a apresentação de alegações finais por parte da Requerida, sendo fixado o prazo de 10 dias para a apresentação de alegações escritas facultativas por parte da Requerente.

12.  Foi ainda designada a data de 17 de novembro de 2015 para a prolação da respetiva decisão arbitral final.

13.  As Partes foram notificadas desse despacho em 15 de outubro de 2015.

14.  Em 21 de outubro de 2015, a Requerente vem manifestar a sua concordância com a dispensa da referida reunião, dispensando-se, também, do oferecimento de alegações finais.  

15.  Na mesma data a Requerente efetuou o pagamento da taxa de arbitragem subsequente, cfr. artigo 4.º, n.º 3, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

           

 

II - Saneamento

 

1.      As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março) e estão devidamente representadas.

2.      O Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente para conhecer e decidir o pedido, cfr. artigo 2.º, n.º 1, alínea a) do RJAT.

3.      O processo não enferma de nulidades.

 

III – Matéria de Facto (Fundamentação)

1.      Objeto do litígio

 

As questões controvertidas são as de saber se, num prédio urbano não submetido ao regime da propriedade horizontal, a sujeição a imposto de selo, nos termos da verba n.º 28.1, da TGIS, é determinada pelo Valor Patrimonial Tributário (VPT) que corresponde a cada uma das partes do prédio, economicamente independentes e com afetação habitacional, como propugna a Requerente ou se, pelo contrário, é determinada pelo VPT global do prédio, o qual corresponderia ao somatório de todos os VPT’s dos andares ou divisões de utilização independente e com afetação habitacional que o compõem, como sustenta a AT e se qualquer das interpretações em confronto é inconstitucional, por violação dos princípios da legalidade e da igualdade fiscal.

 

2.      Posição das Partes

 

A.  A Requerente sustenta o seu pedido de pronúncia arbitral, sinteticamente, da seguinte forma:

 

1.      “Dispõe o n.º 2 do art.º 67.º do CIS, que «às matérias não reguladas no presente Código respeitantes à verba n.º 28 da Tabela Geral, aplica-se, subsidiariamente, o disposto no CIMI»” (artigo 34, da p. i.);

 

2.      “ (…) seguindo a remissão ordenada pelo legislador, impõe-se ter em consideração o que dispõe o art.º 12.º, n.º 3 do CIMI que estatui que «cada andar ou parte suscetível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina também o respetivo valor patrimonial tributário»” (artigo 35, da p. i.);

 

3.      “(…) cada andar ou divisão suscetível de utilização independente tem o seu próprio VPT, nos termos do CIMI” (artigo 36, da p. i.);

 

4.      “Em sede de IMI (regime pelo qual se rege o Imposto de Selo (…) cada andar/divisão suscetível de utilização independente é individualizado, recebendo a sua própria liquidação anual de IMI, cujo pagamento poderá, ou não, consoante o valor, ficar repartido em várias prestações” (artigo 37, da p. i.);

 

5.      “Ao perfilhar a tese de que o VPT dos imóveis com afetação habitacional deverá ser calculado somando o VPT de cada um dos andares independentes, para efeitos de aplicação da verba 28 da TGIS, a AT contraria o regime legal instituído em matéria de cálculo do VPT” (artigo 38, da p. i.);

 

6.      “Revelador de que o CIMI quis individualizar os andares suscetíveis de utilização independente é (…) o art.º 15.º, alínea o) do DL 287/2003, quando se refere a prédio ou parte de prédio urbano»” (artigo 39, da p. i.);

 

7.      “A sujeição a imposto de selo dos prédios com afetação habitacional resulta do aditamento da verba 28 da TGIS, efetuada pelo art.º 4.º da Lei 55-A/2012, de 29 de outubro, que tipificou os seguintes factos tributários:

«28 – Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1 000 000,00 – sobre o valor patrimonial tributário para efeitos de IMI:

28.1 – Por prédio habitacional ou por terreno para construção cuja edificação autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI – 1%;

28.2 – Por prédio, quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeitos a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças – 7,5%»” (artigo 43, da p. i.);

 

8.      “É importante constatar que, ao afirmar que o VPT a considerar em sede desta verba de Imposto do Selo é o VPT constante da matriz, nos termos do CIMI, o legislador pretendeu expressamente estabelecer a unicidade deste valor para ambos estes impostos” (artigo 44, da p. i.);

 

9.      “(…) tem sido tem sido entendimento da AT (…), que deverá ser tido em conta o disposto no art.º 7.º, n.º 2, alínea b) do CIMI, o qual estabelece que «b) Caso as diferentes partes sejam economicamente independentes, cada parte é avaliada por aplicação das correspondentes regras, sendo o valor do prédio a soma dos valores das suas partes»” (artigo 45, da p. i.);

 

10.  “(…), se o art.º 7.º, n.º 2 estabelece que «o valor patrimonial tributário dos prédios urbanos com partes enquadráveis em mais do que uma das classificações do n.º 1 do artigo anterior …» é que é determinável somando as várias unidades, e se no caso todas as divisões consideradas cabem na mesma classificação, habitacional, esta norma não tem aplicação ao caso sub judice” (artigo 48, da p. i.);

 

11.  “A tributação do imóvel identificado em 9, em sede de Imposto do Selo, nomeadamente por aplicação da verba 28 da TGIS, constitui uma flagrante violação do princípio da igualdade, conforme consagrado no art.º 13.º, n.º 2 e, mais especificamente, no que aos impostos diz respeito, no art.º 104.º, n.º 3, ambos da CRP” (artigo 53, da p. i.);

 

12.  “(…) note-se que se o mesmo prédio, exatamente como se encontra de momento a nível físico, estivesse juridicamente constituído em propriedade horizontal, e ainda que os valores patrimoniais de cada uma das frações autónomas fosse igual ao atual, já não poderia ser tributado em sede de Imposto do Selo por via desta verba, ou de qualquer outra” (artigo 54, da p. i.);

 

13.  “Objetivamente, a interpretação propugnada pela AT (…) contribui para a desigualdade entre os cidadãos, sendo, por tal, materialmente inconstitucional (…)” (artigo 57, da p. i.);

 

14.  “No sentido da inconstitucionalidade de semelhante interpretação, veja-se a douta decisão arbitral proferida por este mesmo CAAD no processo n.º 132/2013-T, a cuja douta fundamentação aderimos por atual e pertinente” (artigo 58, da p. i.);

 

15.  “Importa considerar a ratio do legislador ao criar a verba 28 na TGIS, que tem subjacente (…) a ideia de que a uma capacidade contributiva muito acima da média deverá corresponder um esforço contributivo também superior  (artigo 54, da p. i.);

 

16.  “Tal raciocínio, porém, não pode coadunar-se com manobras interpretativas que levem a que uma realidade que, à partida, não se enquadraria nos pressupostos previstos para a dita sobrecarga no esforço contributivo ocorresse, acabe por levar às mesmas consequências … “ (artigo 60, da p. i.);

 

17.  “Como bem alude a douta decisão arbitral proferida por este mesmo CAAD no âmbito do processo 183/2013-T, a páginas 14, ponto 28:

      «A intenção do legislador parece, pois, indiciar que o escopo da norma de incidência é tributar realidades independentes, individualizadas e não resultantes de uma agregação ou soma, ainda que jurídica»” (artigo 63, da p. i.).

 

B.       A Requerida, sustentando a improcedência do pedido de pronúncia arbitral, respondeu, em síntese, nos seguintes termos:

 

1.      “A ora requerente é comproprietária (de uma parte incerta e indeterminada) de um prédio em regime de propriedade total ou vertical. Da noção de prédio do artigo 2.º do CIMI, só as fracções autónomas de prédio em regime de propriedade horizontal são havidas como prédios - n.º 4 do citado artigo 2.º do CIMI” (artigo 19 da resposta);

 

2.      “Encontrando-se o prédio de que é comproprietária, em regime de propriedade total, não possui fracções autónomas, às quais a lei fiscal, atribui a qualificação de prédio” (artigo 20 da resposta);

 

3.      “Assim, a ora requerente, para efeitos de IMI e também de imposto selo, por força da redacção da referida verba, não são proprietário de 21 fracções autónomas, mas sim de um único prédio” (artigo 21 da resposta);

 

4.      “Tendo por adquirido este facto, o que a ora requerente pretende é que a AT considere, para efeitos de liquidação do presente imposto, que exista analogia entre o regime da propriedade total e o da propriedade horizontal, já que não deve existir discriminação no tratamento jurídico-fiscal destes dois regimes de propriedade, por ser ilegal” (artigo 22 da resposta);

 

5.      “Como é consabido, a propriedade horizontal é um regime jurídico específico da propriedade previsto no artigo 1414.º e seguintes do Código Civil, cujo modo de constituição se encontra aí previsto, assim como as demais regras sobre direitos e encargos dos condóminos, tendo de se reconhecer nesta estatuição, a existência de um regime mais evoluído de propriedade” (artigo 23 da resposta);

 

6.      “(…), pretender que o intérprete e aplicador da lei fiscal, aplique, por analogia, ao regime da propriedade total, o regime da propriedade horizontal é que é abusivo e ilegal (…) (artigo 24 da resposta);

 

7.      “Estes dois regimes de propriedade são regimes do direito civil, os quais foram importados para o direito tributário, designadamente nos termos referidos pelo artigo 2.º do CIMI” (artigo 19 da resposta);

 

8.      “E o intérprete da lei fiscal não pode equiparar estes regimes, em consonância com a regra segundo a qual, os conceitos dos outros ramos de direito tem o sentido no direito tributário que lhes é dado nesses ramos de direito, ou nas palavras do artigo 11.º, n.º 2 da LGT, sobre a interpretação da lei fiscal:« Sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se outro decorrer directamente da lei»” (artigo 26 da resposta);

 

9.      “Por outro lado, ainda tendo em conta, que na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis, conforme artigo 11.º, n.º 1 da LGT que remete, assim, para o Código Civil, o seu artigo 10.º sobre a aplicação da analogia, determina que esta só será aplicável em caso de lacunas da lei” (artigo 27 da resposta);

 

10.  “Ora a lei fiscal não comporta qualquer lacuna! Determina o CIMI, para o qual a citada verba remete, que no regime da propriedade horizontal as fracções constituem prédios. Não estando o prédio submetido a este regime, juridicamente as fracções são partes susceptíveis de utilização independente, sem que haja partes comuns” (artigo 28 da resposta);

 

11.  “Não podemos, pois, aceitar que se considere, que para efeitos da verba 28.1 da Tabela Geral anexa ao CIS, que as partes susceptíveis de utilização independente tenham o mesmo regime fiscal das fracções autónomas do regime da propriedade horizontal” (artigo 29 da resposta);

 

12.  “Encontrando-se o prédio submetido ao regime de propriedade total, mas sendo fisicamente constituído por partes susceptíveis de utilização independente, a lei  fiscal atribuiu relevância a esta materialidade, avaliando estas partes individualmente, nos termos do artigo 12.º e consequentemente, nos termos do art. 12º, nº 3, do C.I.M.I., cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, mas na mesma matriz, procedendo-se à liquidação do IMI tendo em conta o valor patrimonial tributário de cada parte” (artigo 30 da resposta);

 

13.  “Os andares ou divisões independentes, avaliados nos termos do artigo 12.º, nº 3, do CIMI, são considerados separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina igualmente o respectivo valor patrimonial tributário sobre o qual é liquidado IMI” (artigo 31 da resposta);

 

14.  “A unidade do prédio urbano em propriedade vertical composto por vários andares ou divisões não é, no entanto, afectada pelo facto de todos ou parte desses andares ou divisões serem susceptíveis de utilização económica independente” (artigo 36 da resposta);

 

15.  “Sem prejuízo do regime de compropriedade, quando for o caso, a sua titularidade não pode ser atribuída a mais de um proprietário” (artigo 38 da resposta);

 

16.  “Porém, como afirmam Silvério Mateus e Leonel Curvelo de Freitas, “Os Impostos sobre o Património Imobiliário e o Imposto de Selo Comentados e Anotados”, ... 2005, págs. 159 e 160, cada uma das partes do prédio pode ser objecto de arrendamento ou qualquer outro tipo de utilização pelo titular, o que deve ficar expresso na respectiva matriz predial” (artigo 39 da resposta);

 

17.  “O facto de o IMI ter sido apurado em função do valor patrimonial tributário de cada parte de prédio com utilização económica independente não afecta igualmente a aplicação da verba 28º, nº 1, da Tabela Geral” (artigo 40 da resposta);

 

18.  “É o que resulta de o facto determinante da aplicação dessa verba da Tabela Geral ser o valor patrimonial total do prédio e não separadamente o de cada uma das suas parcelas” (artigo 41 da resposta);

 

19.  “Outra interpretação violaria, isso sim, a letra e o espírito da verba 28.1. da Tabela Geral e o princípio da legalidade dos elementos essenciais do imposto previsto no artigo 103º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP)” (artigo 42 da resposta);

 

20.  “Um tipo de incidência de acordo com o qual o valor patrimonial tributário dos prédios urbanos de que depende a aplicação da verba 28.1. da Tabela Geral é o valor patrimonial de cada andar ou divisão susceptível de utilização independente e não o valor patrimonial tributário global do prédio urbano com afectação habitacional não tem seguramente qualquer expressão na lei” (artigo 44 da resposta);

 

21.  “É, assim, inconstitucional, por ofensiva do princípio da legalidade tributária, a interpretação da verba 28.1. da Tabela Geral, no sentido de o valor patrimonial de que depende a sua incidência ser apurado globalmente e não andar a andar ou andar ou divisão a divisão” (artigo 45 da resposta);

 

22.  “Não se vislumbra como, por outro lado, como a tributação em causa possa ter violado o princípio da igualdade referido pelos requerentes” (artigo 46 da resposta);

 

23.  “Na verdade, a propriedade horizontal e a propriedade vertical são institutos jurídicos diferenciados” (artigo 47 da resposta);

 

24.  “A constituição da propriedade horizontal implica, é facto, uma mera alteração jurídica do prédio, não havendo uma nova avaliação (Ofício-circulado nº 40.025, de 11 de Agosto de 2000, da Direcção de Serviços de Contribuição Autárquica, D.S.C.A.)” (artigo 48 da resposta);

 

25.  “O legislador pode, no entanto, submeter a um enquadramento jurídico tributário distinto, logo, discriminatório, os prédios em regimes de propriedade horizontal e vertical, em especial, beneficiando o instituto juridicamente mais evoluído da propriedade horizontal, sem que essa discriminação deva ser considerada necessariamente arbitrária” (artigo 49 da resposta);

 

26.  “O facto dos ora requerentes legitimamente discordarem dessa discriminação não implica a violação de qualquer princípio constitucional” (artigo 51 da resposta);

 

27.  “O que se pretende concluir é que estas normas procedimentais de avaliação, inscrição matricial e liquidação das partes susceptíveis de utilização independente não permitem afirmar que existe uma equiparação do prédio em regime de propriedade total ao regime da propriedade vertical (…)” (artigo 53 da resposta);

 

28.  “Estes regimes jurídico-civilísticos são diferentes, e a lei fiscal respeita-os” (artigo 54 da resposta);

 

29.  “O facto tributário do imposto de selo da verba 28.1. ao consistir na propriedade, de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do C.I.M.I., seja igual ou superior a € 1.000 000,00, o valor patrimonial relevante para efeitos da incidência do imposto é, assim, o valor patrimonial total do prédio urbano e não o valor patrimonial de cada uma das partes que o componham, ainda quando susceptíveis de utilização independente” (artigo 55 da resposta);

 

30.  “Nesta senda, não logra vingar o pedido da requerente de que seja aplicado, por analogia ao seu prédio o regime da propriedade horizontal, considerando-se que cada uma das fracções susceptíveis de utilização independente constitua um prédio, pois isso não seria interpretar as normas do CIMI, e por consequência do CIS, isso seria subverter todo o regime aí instituído, com as violações dos princípios supra referidos” (artigo 57 da resposta).

 

 

 

3. Factos provados

  

    Consideram-se provados os seguintes factos:

a)      O prédio urbano sito na ..., n.ºs …, em ..., inscrito na matriz predial sob o artigo ... da freguesia de ..., integra a herança indivisa, com o número de contribuinte ..., aberta por óbito de A, residente que foi na …, 120/1404, …, Brasil.

 

b)      O referido prédio é constituído por vinte e um andares ou divisões de utilização independente, dezasseis das quais destinadas a habitação, não se encontrando constituído em propriedade horizontal;

 

c)      O valor patrimonial tributário (VPT) das diversas divisões de utilização independente foi apurado separadamente, nos termos do disposto no artigo 7.º, n.º 2, alínea b), do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (adiante, CIMI), perfazendo o valor global de € 1 083 139,68 €;

 

d)     O somatório dos VPT dos andares com afetação habitacional corresponde ao montante de 1 029 739,53 €;

 

e)      As liquidações de Imposto de Selo a que se referem os autos, respeitam ao ano de 2014 e foram efetuadas em 20 de março de 2015, para pagamento em três prestações, durante os meses de abril, julho e novembro do mesmo ano, respetivamente, contendo os seguintes elementos de identificação, conforme os documentos juntos à petição inicial:

 

 

 

N.º da liquidação

Descrição do prédio

Verba da TGIS

Valor Patrimonial (€)

Quota-Parte

Valor isento

Taxa

(%)

Coleta (€)

...5

RC D

28.1

62 312,25

1/1

0,00

1,00

623,12

...6

RC E

28.1

53 524,63

1/1

0,00

1,00

535,25

...3

1D

28.1

76 609,00

1/1

0,00

1,00

766,09

...4

1E

28.1

63 692,13

1/1

0,00

1,00

636,92

...5

2D

28.1

75 924,25

1/1

0,00

1,00

759,24

...6

2 E

28.1

62 997,00

1/1

0,00

1,00

629,97

...7

3D

28.1

75 924,25

1/1

0,00

1,00

759,24

...8

3E

28.1

62 997,00

1/1

0,00

1,00

629,97

...9

4D

28.1

75 924,25

1/1

0,00

1,00

759,24

...0

4E

28.1

62 997,00

1/1

0,00

1,00

629,97

...1

5D

28.1

75 924,25

1/1

0,00

1,00

759,24

...2

5E

28.1

62 997,00

1/1

0,00

1,00

629,97

...3

CV D

28.1

53 524,63

1/1

0,00

1,00

535,25

...4

CV E

28.1

57 342,63

1/1

0,00

1,00

573,43

...7

SC-1

28.1

53 524,63

1/1

0,00

1,00

535,25

...8

SC-2

28.1

53 524,63

1/1

0,00

1,00

535,25

TOTAL

           

10 297,40

 

 

4. Factos não provados -

Não existem factos com interesse para a decisão da causa que devam considerar-se não provados.

 

 

5. Motivação -

Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos com o pedido de pronúncia arbitral, pois a Autoridade Tributária e Aduaneira não juntou o processo administrativo.

Não há controvérsia sobre a matéria de facto.

 

IV - Matéria de Direito (fundamentação)

Questões a decidir:

 

Da ilegalidade das liquidações impugnadas; e

Do pedido de pagamento de juros indemnizatórios.

 

 

Da ilegalidade das liquidações impugnadas -

 

A Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, veio alterar o artigo 1.º do Código do Imposto do Selo, e aditar à Tabela Geral do Imposto do Selo, a Verba 28, criando uma nova realidade sujeita a imposto, consubstanciada na propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI) seja igual ou superior a € 1.000.000,00.

Como tem vindo a dizer o Supremo Tribunal Administrativo[1], «O conceito de “prédio (urbano) com afectação habitacional” não foi definido pelo legislador. Nem na Lei n.º 55-A/2012, que o introduziu, nem no Código do IMI, para o qual o n.º 2 do artigo 67.º do Código do Imposto do Selo (igualmente introduzido por aquela Lei), remete a título subsidiário. E é um conceito que, provavelmente mercê da sua imprecisão – facto tanto mais grave quanto é em função dele que se recorta o âmbito de incidência objectiva da nova tributação –, teve vida curta, porquanto foi abandonado aquando da entrada em vigor da Lei do Orçamento do Estado para 2014 (Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro), que deu nova redacção àquela verba n.º 28 da Tabela Geral, e que recorta agora o seu âmbito de incidência objectiva através da utilização de conceitos que se encontram legalmente definidos no artigo 6.º do Código do IMI.

Da letra da lei nada de inequívoco decorre, aliás, pois ela própria ao utilizar um conceito que não definiu e que também não se encontrava definido no diploma para o qual remeteu a título subsidiário prestou-se, desnecessariamente, a equívocos, em matéria – de incidência tributária – em que a certeza e a segurança jurídica deviam também ser preocupações cimeiras do legislador.

E do seu “espírito”, apreensível na exposição de motivos da proposta de lei que está na origem da Lei n.º 55-A/2012 (Proposta de Lei n.º 96/XII – 2.ª, Diário da Assembleia da República, série A, n.º 3, 21/09/2012, p. 44, disponível em www.parlamento.pt) nada mais decorre senão a preocupação de angariar novas receitas fiscais, sobre fontes de riqueza “mais poupadas” no passado à voragem do Fisco que os rendimentos do trabalho, em particular os rendimentos de capitais, mais-valias mobiliárias e a propriedade, motivos estes que nenhum contributo relevante trazem ao esclarecimento do conceito de “prédios (urbanos) com afectação habitacional”, porquanto o dão como assente, sem preocupação alguma de o esclarecer. Tal esclarecimento terá, porém, surgido – como informado na Decisão Arbitral proferida em 12 de Dezembro de 2013, no processo n.º 144/2013-T, disponível na base de dados do CAAD –, aquando da apresentação e discussão na Assembleia da República daquela proposta de lei, nas palavras do Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, que terá referido expressamente, conforme se colhe do Diário da Assembleia da República (DAR I Série n.º 9/XII – 2, de 11 de Outubro, p. 32) que: «O Governo propõe a criação de uma taxa especial sobre os prédios urbanos habitacionais de mais elevado valor. É a primeira vez que em Portugal é criada uma tributação especial sobre propriedades de elevado valor destinadas à habitação. Esta taxa será de 0,5% a 0,8% em 2012 e de 1% em 2013, e incidirá sobre as casas de valor igual ou superior a 1 milhão de euros” (sublinhados nossos), donde se colhe que a realidade a tributar tida em vista são, afinal, e não obstante a imprecisão terminológica da lei, “os prédios (urbanos) habitacionais”, em linguagem corrente “as casas”, e não outras realidades».

 

Como ficou dito na decisão do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD)[2], que acompanhamos, «Consultado o CIMI verifica-se que o seu artigo 6º apenas indica as diferentes espécies de prédios urbanos, entre os quais menciona os habitacionais (…)

Daqui podemos concluir que, na óptica do legislador, não importa o rigor jurídico-formal da situação concreta do prédio mas sim a sua utilização normal, o fim a que se destina o prédio.

Concluímos ainda que para o legislador a situação do prédio em propriedade vertical ou em propriedade horizontal não relevou, pois que nenhuma referência ou distinção é efectuada entre uns e outros. O que releva é a verdade material subjacente à sua existência enquanto prédio urbano e à sua utilização.

(…) Utilizando o critério que a própria lei introduziu no artigo 67.º, n.º 2 do Código do IS, «às matérias não reguladas no presente código respeitantes à verba 28 da Tabela Geral aplica-se subsidiariamente o Código do IMI».

Ou seja, tendo em consideração que a inscrição na matriz de imóveis em propriedade vertical, para efeitos do Código do IMI, segue as mesmas regras de inscrição dos imóveis constituídos em propriedade horizontal, sendo o respectivo IMI, bem como o novo IS, liquidados individualmente em relação a cada uma das partes, não parece, ao presente tribunal, que exista qualquer dúvida que o critério legal para definir a incidência do novo imposto tem de ser o mesmo.

Neste contexto, se a lei exige, relativamente ao IMI, a emissão de notas de liquidação individualizadas para as partes autónomas dos prédios em propriedade vertical, nos mesmos moldes em que o estabelece para os prédios em propriedade horizontal, exigirá, nos mesmos termos, relativamente à regra de incidência da Verba n.º 28 da TGIS.

Pelo que, o IS, no âmbito da Verba n.º 28 da TGIS, só poderia incidir em determinada fracção se esta, eventualmente, tivesse um VPT superior a € 1.000.000,00.

E, mais se diga, que foi esse inclusive o entendimento adoptado pela ATA.

Com efeito, esta (ATA) também emitiu notas de liquidação individualizadas, referentes a cada uma das fracções susceptíveis de utilização autónoma, demonstrando que, na sua opinião, as aludidas fracções, apesar de juridicamente não constituídas em propriedade horizontal, seriam, para todos os efeitos, independentes entre si.

Todavia, olvidou a ATA que não poderia, em virtude do enquadramento previamente vertido, proceder ao somatório dos VPTs individuais das fracções previamente mencionadas, almejando um valor que já caísse na base de incidência da Verba n.º 28 da TGIS.

Isto quando o próprio legislador estabeleceu uma regra diferente no âmbito do Código do IMI que, tal como previamente referido, é o Código aplicável às matérias não reguladas no Código do IS, no que se refere à Verba n.º 28 da TGIS.

Resumindo, o critério estabelecido pela ATA, de considerar o valor do somatório dos VPT individuais atribuídos às partes, andares ou divisões com utilização independente, servindo-se do facto de que o prédio não se encontra constituído em regime de propriedade horizontal, não encontra, aos olhos do presente tribunal, sustentação legal, sendo, nomeadamente, contrário ao critério aplicável em sede de IMI e, por remissão (nos termos mencionados supra), em sede de IS.

Neste contexto, considera o presente tribunal que o critério defendido pela ATA viola os princípios da legalidade e da igualdade fiscal, e, bem assim, o da prevalência da verdade material sobre a realidade jurídico-formal.

Paralelamente, note-se que o artigo 12.º, n.º 3 do Código do IMI não efectua qualquer distinção quanto ao regime dos prédios que se encontrem em propriedade horizontal ou vertical.
Como tal, e uma vez que se o prédio se encontrasse em regime de propriedade horizontal, nenhuma das suas fracções habitacionais sofreria incidência do novo imposto, a ATA não pode tratar situações materialmente iguais de forma diferente.

A este respeito, veja-se aquilo que foi dito a propósito deste tema na Decisão arbitral proferida no âmbito do Processo n.º 132/2013-T, de 16 de Dezembro, cujo entendimento o presente tribunal acolhe.

“Com efeito, não faz sentido distinguir na lei aquilo que a própria lei não distingue (ubi lex non distinguit nec nos distinguere debemus).

Acresce que distinguir, neste contexto, entre prédios constituídos em propriedade horizontal e em propriedade total seria uma «inovação» sem um suporte legal associado, até porque, como se tem aqui afirmado, nada denuncia, nem na verba n.º 28, nem no disposto no CIMI, uma justificação para essa particular diferenciação.

Note-se, exemplarmente, o que diz o artigo 12.º, n.º 3, do CIMI: cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina também o respectivo valor patrimonial tributário.

O critério uniforme que se impõe é, assim, o que determina que a incidência da norma em causa apenas tenha lugar quando alguma das partes, andares ou divisões com utilização independente de prédio em propriedade horizontal ou total com afectação habitacional, possua um VPT superior a € 1.000.000,00.

Fixar como valor de referência para a incidência do novo imposto o VPT global do prédio em causa, como pretendia a ora requerida, não encontra base na legislação aplicável, que é o CIMI, dada a remissão feita pelo citado artigo 67.º, n.º 2 do Código do IS.

(…) Acresce, ainda, que admitir a diferenciação de tratamento poderia produzir resultados incompreensíveis do ponto de vista jurídico e atentatórios dos objectivos que o legislador dizia ter para aditar a verba n.º 28. A título exemplificativo, suponha-se a seguinte hipótese, que parece plausível à luz da interpretação que foi feita pela ora requerida: um cidadão que é proprietário de um prédio constituído em propriedade total destinado a habitação, sendo o valor global das unidades autónomas igual ou superior a € 1.000.000,00 e o VPT de cada uma inferior a € 1.000.000,00, sujeita-se a uma tributação anual de 1% desse valor (como sucedeu na situação em análise); já um outro cidadão que detenha um prédio com as mesmas exactas características do anterior mas que tenha sido constituído em propriedade horizontal, sendo, igualmente, o valor global das fracções autónomas igual ou superior a € 1.000.000,00 e o VPT de cada uma inferior a € 1.000.000,00, não será sujeito a tributação nos termos da mencionada verba n.º 28.

Por outro lado, poder-se-ia perguntar: se tais fracções têm o mesmo proprietário, por que é que não faz sentido agregar, para efeitos de tributação, os respectivos VPTs? A resposta pode ser ilustrada através de uma outra hipótese: um cidadão que é proprietário de um prédio em propriedade horizontal, em que cada uma das suas 20 fracções possui um VPT inferior a €1.000.000,00, seria sujeito a tributação se – caso se admitisse tal agregação – o VPT global ultrapassasse aquele valor; já um outro cidadão com idênticas 20 fracções distribuídas por 5, 10 ou 20 prédios não estaria sujeito a qualquer tributação nos termos da referida verba n.º 28.

Se esta linha de raciocínio faz sentido – justificando-se, portanto, a não agregação dos VPTs das fracções de prédios em propriedade horizontal –, não se vê razão plausível para que a mesma não seja aplicada às unidades autónomas de prédios em propriedade total.

Observando, agora, o caso em análise, constata-se que os VPTs dos andares (unidades autónomas) do prédio com afectação habitacional variam entre (…), pelo que qualquer um deles é inferior a € 1.000.000,00.

Daqui se conclui, em resultado do que foi referido, que sobre os mesmos não pode incidir o IS a que se refere a verba n.º 28 da TGIS, sendo, portanto, ilegais os actos de liquidação impugnados pelo requerente”.

Um último ponto que interessa destacar (não obstante o prévio enquadramento ser bastante para reconhecer a ilegalidade dos actos de liquidação praticados pela ATA), assenta no entendimento preconizado, quer pelo legislador quer pelo próprio governo, aquando do aditamento da Verba n.º 28 à TGIS.

A este respeito, foquemo-nos agora na decisão arbitral proferida no âmbito do processo n.º 48/2013-T, de 9 de Outubro, que analisa, de forma extensiva, os objectivos subjacentes ao aditamento da aludida verba.

“A Lei nº 55-A/2012, de 29/10, não tem qualquer preâmbulo, daí que da mesma não é possível retirar a intenção do legislador.

Tal lei da Assembleia da República teve origem na proposta de lei n.º 96/XII (2.ª), a qual, na exposição de motivos fala na introdução de medidas fiscais inseridas num conjunto mais vasto de medidas de combate ao défice orçamental.

Na exposição de motivos da referida proposta de lei, é dito que, «estas medidas são fundamentais para reforçar o princípio da equidade social na austeridade, garantindo uma efectiva repartição dos sacrifícios necessários ao cumprimento do programa de ajustamento. O Governo está fortemente empenhado em garantir que a repartição desses sacrifícios será feita por todos e não apenas por aqueles que vivem do rendimento do seu trabalho. Em conformidade com esse desiderato, este diploma alarga a tributação do capital e da propriedade, abrangendo equitativamente um conjunto alargado de sectores da sociedade portuguesa».

Nessa exposição de motivos é ainda dito que, além do agravamento da tributação dos rendimentos de capitais e das mais-valias mobiliárias, é criada uma taxa em sede de imposto do selo incidente sobre os prédios urbanos de afectação habitacional cujo valor patrimonial tributário seja igual ou superior a um milhão de euros.

Ou seja, em tal exposição de motivos, também não é clarificado o que se entende por prédios urbanos com afectação habitacional.

Na sua intervenção na Assembleia da República, na apresentação e discussão da referida proposta de lei, o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais afirmou o seguinte:
«O Governo elegeu como princípio prioritário da sua política fiscal a equidade social.

Esta é ainda mais importante em tempos de rigor como forma de garantir a justa repartição do esforço fiscal.

No período exigente que o país atravessa, durante o qual se encontra obrigado a cumprir o programa de assistência económica e financeira, torna-se ainda mais premente afirmar o princípio da equidade. Não podem ser sempre os mesmos – os trabalhadores por conta de outrem e os pensionistas –, a suportar os encargos fiscais.

Para que o sistema fiscal seja mais justo é decisivo promover o alargamento da base tributável exigindo um esforço acrescido aos contribuintes com rendimentos mais elevados e protegendo dessa forma as famílias portuguesas com menores rendimentos.

Para que o sistema fiscal promova mais igualdade é fundamental que o esforço de consolidação orçamental seja repartido por todos os tipos de rendimentos abrangendo com especial ênfase os rendimentos de capital e as propriedades de elevado valor. Esta matéria recorde-se, foi amplamente abordada no acórdão do Tribunal Constitucional.

Finalmente, para que o sistema fiscal seja mais equitativo, é crucial que todos sejam chamados a contribuir de acordo com a sua capacidade contributiva, conferindo à administração tributária poderes reforçados para controlar e fiscalizar as situações de fraude e evasões fiscais.

Neste sentido o Governo apresenta, hoje, um conjunto de medidas que reforçam efectivamente uma justa e equitativa distribuição do esforço de ajustamento por um conjunto alargado e abrangente de sectores da sociedade portuguesa.

Esta proposta tem três pilares essenciais: a criação de uma tributação especial sobre prédios urbanos de valor superior a 1 milhão de euros; o agravamento da tributação sobre rendimentos de capital e sobre as mais-valias mobiliárias e o reforço das regras de combate à fraude e evasão fiscais.

Em primeiro lugar o Governo propõe a criação de uma taxa especial sobre os prédios urbanos habitacionais de mais elevado valor. É a primeira vez que em Portugal é criada uma tributação especial sobre propriedades de elevado valor destinadas à habitação. Esta taxa será de 0,5% a 0,8% em 2012, e de 1%, em 2013, e incidirá sobre as casas de valor igual ou superior a 1 milhão de euros. Com a criação desta taxa adicional o esforço fiscal exigido a estes proprietários será significativamente aumentado em 2012 e 2013»”.

De seguida, cumpre reunir as conclusões que permitam, sem margem para dúvidas, decidir sobre o tema em discussão (ou seja se, para efeitos da aplicação da Verba n.º 28 da TGIS, nos casos em que um prédio com várias fracções autónomas, susceptíveis de utilização independente, não se encontre constituído em propriedade horizontal, o VPT relevante é apurado mediante o somatório dos VPTs individuais, ou, alternativamente, é individualmente considerado).

Neste sentido, refira-se, em primeiro lugar, que a presente temática está, desde logo por força do artigo 67.º, n.º 2 do Código do IS, sujeita às normas do Código do IMI, “às matérias não reguladas no presente código respeitantes à verba 28 da Tabela Geral aplica-se subsidiariamente o CIMI”.

Como tal, e como já tantas vezes se mencionou, no entendimento do presente tribunal, o mecanismo para o apuramento do VPT relevante para efeitos da aludida verba, é o que se encontra estatuído no Código do IMI.

Ora, o artigo 12.º, n.º 3 do Código do IMI estabelece que “cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina também o respectivo valor patrimonial tributário”.

Desvalorizando o legislador, nos termos anteriormente mencionados, qualquer prévia constituição de propriedade horizontal ou vertical.

Com efeito, para este (legislador), o que releva é a verdade material subjacente à sua existência enquanto prédio urbano e à sua utilização.

Refira-se que a própria ATA parece concordar com o critério exposto, razão pela qual as liquidações que a própria emite são muito claras nos seus elementos essenciais, donde resulta o valor de incidência ser o correspondente ao VPT de cada um dos andares e as liquidações individualizadas.

Logo, se o critério legal impõe a emissão de liquidações individualizadas para as partes autónomas dos prédios em propriedade vertical, nos mesmos moldes em que o estabelece para os prédios em propriedade horizontal, claramente estabeleceu o critério, que tem de ser único e inequívoco, para a definição da regra de incidência do novo imposto.

Assim, só haveria lugar a incidência de IS (no âmbito da Verba n.º 28 da TGIS) se alguma das partes, andares ou divisões com utilização independente apresentasse um VPT superior a € 1.000.000,00.

Não podendo a ATA considerar como valor de referência para a incidência do novo imposto o valor total do prédio, quando o próprio legislador estabeleceu regra diferente em sede de IMI (e, tal como anteriormente mencionado, este é o código aplicável às matérias não reguladas no que toca à Verba n.º 28 da TGIS).

Em conclusão, o regime jurídico actual não impõe a obrigação de constituição de propriedade horizontal, pelo que a actuação da ATA traduz-se numa discriminação arbitrária e ilegal.

De facto, não pode a ATA distinguir onde o próprio legislador entendeu não o fazer, sob pena de violar a coerência do sistema fiscal, bem assim como o princípio da legalidade fiscal previsto no artigo 103.º da Constituição da República Portuguesa, e ainda os princípios da justiça, igualdade e proporcionalidade fiscal.

No caso em apreço, o[s] prédio[s] em causa encontrava[m]-se, à data relevante dos factos, constituído[s] em propriedade total e tinha[m] […] fracções com utilização independente, como resulta dos documentos […].

Dado que nenhuma dessas fracções tem valor patrimonial igual ou superior a € 1.000.000,00, como resulta dos documentos juntos aos autos, conclui-se pela não verificação do pressuposto legal de incidência».

 

No mesmo sentido passamos a transcrever parte da decisão do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD)[3], com a qual também concordamos,

«Perante as posições em confronto, começar-se-á por notar que a AT tem razão ao referir que um prédio constituído em propriedade horizontal é uma realidade jurídico-tributária distinta de um prédio urbano em “propriedade total” ou “propriedade vertical”.

A tanto obrigam as regras da interpretação, que tem o texto como partida, cabendo-lhes a função negativa de eliminar qualquer sentido que não tenha qualquer apoio na letra da lei[4].

Desde logo, porque o n.º 4 do artigo 2.º do CIMI, estabelece a ficção legal de que cada uma das frações autónomas de um prédio constituído em propriedade horizontal consubstancia um prédio, enquanto uma parte de utilização independente, de um prédio urbano não constituído em propriedade horizontal, continua a ser apenas isso – uma parte de um prédio e não um prédio, como, aliás, a AT reconhece nas suas alegações, ao afirmar que “a propriedade horizontal e a propriedade vertical são institutos jurídicos diferenciados”.

Tanto bastaria para concluir que, tendo o legislador fixado qualificações tributárias distintas para realidades juridicamente diferenciadas (prédios e partes de prédios), não será legítimo que o aplicador da norma, em nome das “necessárias adaptações” a que se refere o artigo 23º, n.º 7 do Código do Imposto de Selo (CIS), crie uma nova norma de incidência daquele imposto, determinando a tributação de partes de prédios, por se tratar de matéria submetida ao princípio da legalidade tributária, ínsito no artigo 103.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP), segundo o qual os elementos essenciais dos impostos – a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes – são estabelecidos por lei da Assembleia da República, salvo autorização legislativa ao Governo (artigo 165.º, n.º 1, alínea i) e n.º 2, da CRP).

Ora, a verba 28 da TGIS, aditada pelo artigo 4.º da Lei nº 55-A/2012 de 29 de outubro, veio determinar, na sua redação originária, aplicável ao caso em apreço, a incidência objetiva do imposto de selo sobre prédios urbanos com afetação habitacional (e não, como entende a AT, sobre partes de prédios), cujo valor patrimonial tributário, para efeitos de IMI, seja igual ou superior a € 1 000 000,00, ao estabelecer que o imposto de selo incide sobre:

 «28 — Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1 000 000 — sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:

28.1 — Por prédio com afetação habitacional — 1 %;

28.2 — Por prédio, quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças — 7,5 %.»

 

Também aqui o elemento literal da norma há-de ser o ponto de partida para a sua interpretação e, “na falta de outros elementos que induzam à eleição do sentido menos imediato do texto, o intérprete deve optar em princípio por aquele sentido que melhor e mais imediatamente corresponde ao significado natural das expressões verbais utilizadas, e designadamente ao seu significado técnico-jurídico, no suposto (nem sempre exato) de que o legislador soube exprimir com correção o seu pensamento[5]”.

 Em abono da tese de que o VPT relevante para a incidência do Imposto de Selo da verba 28.1, da TGIS, é o VPT global do prédio não constituído em propriedade horizontal, argumenta a AT que todas e cada uma das suas divisões de utilização independente foram “avaliadas nos termos do art. 12.º, n.º 3, do C. I. M. I”, norma que, segundo a Requerida, corresponde ao “corpo do art. 232, regra 1.ª, do Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola (…), que dispunha cada habitação ou parte de prédio ser tomada automaticamente (sic) para efeitos de determinação do rendimento coletável sobre o qual deva incidir a liquidação”, caso em que “o rendimento coletável tinha necessariamente de corresponder à soma da renda ou valor locativo de cada uma das componentes do prédio com autonomia económica”.

Porém, a transposição da interpretação dada no âmbito do Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola (CCPISIA), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 45 104, de 1 de julho de 1963 e, na sua maior parte, revogado pelo Decreto-Lei n.º 442-C/88, de 30 de novembro, para o Código do IMI, em que não existe norma idêntica à do artigo 232.º, do Código primeiramente citado, não se afigura viável por diversas ordens de razões, em especial, porque a antiga Contribuição Predial se configurava como um imposto sobre o rendimento, real ou presumido, como decorre do respetivo preâmbulo, em que se afirma que “Quanto aos prédios urbanos, tinha desde logo aplicação o princípio de tributar sempre que possível rendimentos reais, princípio que (…) no caso havia forçosamente que restringir aos prédios arrendados. (…) Quanto aos prédios não arrendados, (…) só havia que manter a tributação com base num rendimento estimado (…)”, enquanto o Imposto Municipal sobre Imóveis é um imposto sobre o património.

De facto, o § 1.º do artigo 232.º, do CCPISIA, dispunha que “Cada habitação ou parte de prédio novo suscetível de arrendamento separado será tomada autonomamente para efeito de determinação do rendimento coletável sobre que haja de incidir a liquidação,” (sublinhado nosso), mas tal autonomia apenas relevava para efeitos de lançamento nos verbetes e respetiva liquidação unitária, e já não para efeitos de inscrição matricial, que era única para cada prédio não constituído em propriedade horizontal, diferentemente do que atualmente determina o artigo 12.º, n.º 3, do CIMI.

O objetivo da autonomia a que fazia alusão o § 1.º do artigo 232.º, do CCPISIA, era, como é ainda o da inscrição matricial autónoma para cada andar ou divisão suscetível de utilização independente, o controlo do rendimento pela mesma gerado, em caso de arrendamento; contudo, esse rendimento é agora tributado em sede de IRS (categoria F).

No que respeita à determinação do valor dos prédios não constituídos em propriedade horizontal, rege o artigo 7.º, n.º 2, do CIMI, mas apenas para os “prédios urbanos com partes enquadráveis em mais de uma das classificações do n.º 1 do artigo anterior”, caso em que, de acordo com a sua alínea b) “(…) cada parte é avaliada por aplicação das correspondentes regras, sendo o valor do prédio a soma dos valores das suas partes”.

Nos termos do n.º 1 do artigo 6.º, do CIMI, os prédios urbanos dividem-se em a) Habitacionais; b) Comerciais, industriais ou para serviços; c) Terrenos para construção; d) Outros.

Da conjugação das normas do n.º 2 do artigo 7.º e n.º 1 do artigo 6.º, ambos do CIMI, decorre que, se um prédio urbano não constituído em propriedade horizontal, integrar exclusivamente partes ou divisões de afetação habitacional (o que não é o caso dos autos, como defende a Requerente, embora o valor tido em consideração nas liquidações efetuadas pela AT tenha sido o somatório dos VPT das divisões destinadas a habitação), o valor do prédio não equivale à soma das suas partes.

O mesmo que é dizer-se que cada uma das partes é autónoma e que, independentemente do VPT que lhe tenha sido atribuído, fica excluída da incidência do imposto de selo previsto na verba 28, da TGIS.

Aqui chegados, caberá questionar da sujeição a imposto de selo da verba 28, da TGIS, de uma parte ou divisão de utilização independente, com afetação habitacional, de um prédio não constituído em propriedade horizontal, em que se integrem partes ou divisões de utilização independente, enquadráveis em outra das classificações do n.º 1 do artigo 6.º, do CIMI, por exemplo, divisões destinadas a comércio indústria ou serviços, como é o caso em apreço, em que, dos 21 andares/divisões de utilização independente, apenas 16 se destinam a habitação.

Ora, a resposta há-de ser negativa, não obstante a previsão da alínea b) do n.º 2, do artigo 7.º, do CIMI, segundo a qual o valor do prédio é a soma dos valores das suas partes ou divisões de utilização independente, enquadráveis em mais do que uma das classificações do n.º 1, do artigo 6.º, do mesmo Código.

 É que aqui, repare-se, não se estão a cotejar duas realidades juridicamente distintas, como são as partes ou divisões de utilização independente de um prédio urbano não constituído em propriedade horizontal com as frações autónomas de prédios submetidos àquele regime, que, para efeitos de IMI, são elas próprias prédios.

Aqui, o que está em confronto são realidades em tudo idênticas, ou seja, partes ou divisões de utilização independente e afetação habitacional, integradas em prédios urbanos não constituídos em propriedade horizontal.

E a resposta à questão há-de ser negativa, pois nada justificaria que o legislador pretendesse tributar partes ou divisões de utilização independente e afetação habitacional de um prédio urbano não constituído em propriedade horizontal, integrado por outras partes ou divisões de utilização independente destinadas a outros fins e não tributasse partes ou divisões de utilização independente e afetação habitacional de um prédio urbano não constituído em propriedade horizontal, integrado exclusivamente por partes ou divisões de utilização independente, destinadas a habitação. Caso o legislador pretendesse tratar de forma desigual realidades em tudo idênticas, teria, então, de se concluir por uma flagrante violação do princípio da igualdade.

Não se afigurando ser essa a intenção legislativa, não se poderá aceitar que a AT formule uma norma de incidência ex novo, diversa da que foi criada pelo legislador, pretendendo tributar partes de prédios, ainda que económica e funcionalmente independentes e, como tal, separadamente inscritas na matriz, a qual discrimina também o respetivo valor patrimonial tributário (cfr. o n.º 3 do artigo 12.º, do CIMI), pois a lei é clara ao sujeitar a imposto de selo da verba 28.1, da TGIS, os prédios urbanos de afetação habitacional, cujo VPT, para efeitos de IMI, seja superior a € 1 000 000,00.

Diferente seria o caso de uma parte ou divisão de utilização independente e afetação habitacional, inserida em prédio urbano não constituído em propriedade horizontal, mas com um VPT, para efeitos de IMI, igual ou superior a € 1 000 000,00, atendendo à ratio legis da norma de incidência.

Efetivamente, tal como refere a Requerente nas suas alegações e já serviu de fundamento a outras decisões arbitrais, nomeadamente a proferida nos processo n.º 50/2013-T, “A ratio legis subjacente à regra da verba 28 da TGIS, introduzida pela Lei nº 55-A/2012 de 29 de outubro, em obediência ao disposto no artigo 9º do Código Civil, segundo o qual a interpretação da norma jurídica não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos e dos restantes elementos de interpretação o pensamento legislativo, tendo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.

O legislador ao introduzir esta inovação legislativa considerou como elemento determinante da capacidade contributiva os prédios urbanos, com afetação habitacional, de elevado valor, mais rigorosamente, de valor igual ou superior a € 1 000 000,00, sobre os quais passou a incidir uma taxa especial de imposto de selo, pretendendo introduzir um princípio de tributação sobre a riqueza exteriorizada na propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos de luxo com afetação habitacional. O critério foi de aplicação da nova taxa aos prédios urbanos com afetação habitacional, cujo VPT seja igual ou superior a € 1000 000,00.

Tal lógica parece fazer sentido quando aplicada a “habitação”, seja ela “casa”, “fração autónoma” ou “parte de prédio com utilização independente” “unidade autónoma”, porque se supõe uma capacidade contributiva acima da média e, nessa medida, se justifica a necessidade de realização de um esforço contributivo adicional, pouco sentido faria passar a desconsiderar os apuramentos "unidade a unidade" quando só através do somatório dos VPTs das mesmas, porque detidas pelo mesmo indivíduo, é que se superaria o milhão de euros.

Tal conclui-se da análise da discussão da proposta de Lei n.º 96/XII na Assembleia da República, disponível para consulta no Diário da Assembleia da República, I série, nº 9/XII/2, de 11 de outubro de 2012.”.

Temos pois que, para além do elemento gramatical da interpretação da norma de incidência contida na verba 28.1, da TGIS, também o seu elemento racional ou teleológico, a ratio legis ou fim visado pelo legislador ao elaborar aquela norma, aponta no sentido de a tributação incidir sobre prédios urbanos de elevado VPT e não sobre partes de prédios urbanos, ainda que de utilização independente, com VPT de valor inferior ao legalmente determinado».

 

Sobre esta temática existe uma vasta jurisprudência arbitral[6].

 

Chamado pela primeira vez a decidir idêntica questão, o Supremo Tribunal Administrativo pronunciou-se no mesmo sentido, cfr. acórdão de 09-09-2015, proferido no Processo n.º 047/15, assim sumariado:

I - Relativamente aos prédios em propriedade vertical, para efeitos de incidência do Imposto do Selo (Verba 28.1 da TGIS, na redacção da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro), a sujeição é determinada pela conjugação de dois factores: a afectação habitacional e o VPT constante da matriz igual ou superior a € 1.000.000.

II - Tratando-se de um prédio constituído em propriedade vertical, a incidência do IS deve ser determinada, não pelo VPT resultante do somatório do VPT de todas as divisões ou andares susceptíveis de utilização independente (individualizadas no artigo matricial), mas pelo VPT atribuído a cada um desses andares ou divisões destinadas a habitação”.

 

Face ao exposto, considerando que nenhum dos dezasseis andares ou divisões suscetíveis de utilização independente aqui em apreço e sobre os quais recaíram as liquidações objeto do presente pedido de pronúncia arbitral, atingem, individualmente, o valor de 1.000.000,00 €, considera-se verificado o alegado vício de violação de lei por erro sobre os pressupostos de Direito, o que determina a declaração de ilegalidade e consequente anulação das liquidações operadas.

Assim, fica prejudicado o conhecimento das questões relativas à alegada inconstitucionalidade das interpretações dadas pelas Partes à norma da verba 28.1, da TGIS, por violação dos princípios da legalidade e da igualdade fiscal, uma vez que tal norma não comporta a interpretação que dela fez, no caso, a Requerida AT, ao emitir as liquidações objeto do pedido de pronúncia arbitral, e que não poderão manter-se na ordem jurídica.

 

 

 

Do pedido de pagamento de juros indemnizatórios

 

A Requerente pede ainda que lhe sejam pagos juros indemnizatórios, por erro dos serviços, nos termos do n.º 1 do artigo 43.º, da Lei Geral Tributária (LGT), não tendo, contudo, provado ter pago a quantia liquidada de 10 927,40 €.

Este preceito, aplicável subsidiariamente ao processo arbitral tributário, por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, refere “São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.”

Considera-se verificada a existência de erro imputável aos serviços, segundo jurisprudência uniforme do STA[7], sempre que procederem a reclamação graciosa ou impugnação judicial do ato de liquidação (no mesmo sentido, a decisão no processo arbitral 218/2013-T).

Tendo ficado demonstrada a errada aplicação da norma de incidência objetiva contida na verba 28.1 da TGIS, que justifica a anulação das liquidações impugnadas, reconhece-se o direito da Requerente a juros indemnizatórios à taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43.º, n.ºs 1 e 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, artigo 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril, desde a data do efetivo pagamento de cada uma das prestações em que se dividiu o quantum liquidado, até à data do processamento da respetiva nota de crédito, conforme o disposto no n.º 5 do artigo 61.º do CPPT.

 

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V – Decisão

 

Em face do supra exposto, decide-se:

 

a)      Julgar procedente o pedido de declaração de ilegalidade das liquidações de Imposto do Selo (IS) do ano de 2014, referente à verba 28.1 da TGIS, efetuadas em 20-03-2015, no montante de 10 297,40 €, por erro nos pressupostos de Direito e, em consequência, anular as liquidações impugnadas;

b)      Julgar procedente o pedido de condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira a reembolsar as quantias indevidamente pagas pela Requerente, acrescidas de juros, à taxa legal, desde as datas dos pagamentos indevidos até à data da emissão das respetivas notas de crédito.

 

Valor do processo

De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC, 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de 10 297,40 .

 

Custas

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em 918,00 €, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

Notifique.

 

Lisboa, 16-11-2015

                                                                    

 

O Árbitro,

(Rui Ferreira Rodrigues)

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Texto elaborado em computador, nos termos do disposto

no artigo 131.º, n.º 5, do CPC, aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º 1, al. e), do RJAT.



[1] Acórdão do STA de 09-04-2014 - Proc. 01870/13 (disponível em “DGSI”)

[2] Decisão arbitral proferida no processo n.º 724/2014-T, de 29-04-2015 (disponível em “CAAD”)

[3] Decisão arbitral proferida no processo n.º 512/2014-T, de 20-01-2015 (disponível em “CAAD”)

[4] MACHADO, J. Baptista, “Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador”, Almedina, Coimbra, 1995, pág.s 182 a 185.

 

[5] Idem

[6] Processos do CAAD, designadamente os com n.ºs 311/2015, de 30-10-2015; 236/2015, de 15-10-2015; 110/2015, de 27-08-2015; 104/2015, de 23-10-2015; 102/2015, de 23-06-2015; 713/2014, de 05-06-2015; 705/2014, de 30-03-2015; 385/2014, de 15-05-2015; 512/2014, de 30-01-2015; 183/2013, de 19-03-2014; 132//2013, de 16-12-2013; 50/2013, de 29-10-2013.

[7] Acórdãos do STA de 22-05-2002, Proc. n.º 457/02; de 31.10.2001, Proc. n.º 26167; de 2.12.2009, Proc. n.º 0892/09