Decisão Arbitral
CAAD: Arbitragem Tributária
Processo nº 103/2015-T
Tema: IVA
Requerentes: A… e B…
Requerida: Autoridade Tributária e Aduaneira
I. RELATÓRIO
A…, NIF … e B…, NIF …, casados entre si, com domicílio fiscal na Urbanização …, …, Apartado …, ..., ... (doravante apenas designados por Requerentes), apresentaram, em 17/02/2015, um pedido de constituição do tribunal arbitral singular, nos termos dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT), em conjugação com as alíneas a) do art. 99.º do CPPT, em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada apenas por Requerida).
Os Requerentes pedem a declaração de ilegalidade dos actos de liquidação adicional de IVA referentes aos primeiros, segundos, terceiros e quartos trimestres dos anos de 2012 e 2013, num total de Euro 9.126,28, e respectivos juros compensatórios, num total de Euro 546,85. Mais requerem a condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira ao pagamento de indemnização pelos custos suportados pelos Requerentes com a prestação de garantia com vista à suspensão do processo executivo.
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD a 19-02-2015 e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira nessa mesma data.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou como árbitro do tribunal arbitral singular a ora signatária, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.
Em 13-04-2015 foram as Partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o tribunal arbitral singular foi constituído em 28-04-2015.
No dia 02-07-2015 teve lugar a reunião prevista no art. 18.º do RJAT, durante a qual e mediante acordo das partes, foram prestadas declarações pelo Requerente marido, foi ouvida a testemunha C…, arrolada pelos Requerentes, e dispensada a inquirição da testemunha D…, também arrolada pelos Requerentes. Foi concedida às Partes prazo para alegações sucessivas, o que ambas vieram fazer.
Juntamente com as suas alegações, os Requerentes vieram juntar novos documentos aos autos sobre os quais a Requerida se pronunciou nas suas alegações. Por sua vez, a Requerida também procedeu à junção de documentos com as suas alegações. Por requerimento de 25-09-2015, os Requerentes vieram exercer o contraditório relativamente aos documentos juntos com as alegações da Requerida.
O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é competente.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de nulidades e não se suscita qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa.
II. DO PEDIDO DOS REQUERENTES
Os Requerentes solicitam a declaração de ilegalidade das liquidações de IVA dos anos de 2012 e 2103, e respectivos juros compensatórios, por considerarem que os serviços prestados pela Requerente mulher à E… (Sucursal em Portugal) beneficiam da isenção prevista na alínea e) do n.º 27 do art. 9.º do CIVA.
A E… (Sucursal em Portugal) dedica-se à venda de direitos de utilização turística mas não negoceia directamente a venda dos seus títulos, atribuindo essas operações à sua força de vendas composta por diversos vendedores, incluindo a Requerente mulher.
Para esse efeito, a E… (Sucursal em Portugal) fixa um preço mínimo de venda que deverá ser respeitado pela Requerente mulher e pelos demais vendedores, podendo atribuir um incentivo adicional - designado profit sharing - que se traduz num aumento progressivo das comissões para vendas acima do preço mínimo fixado.
Nos anos de 2012 a 2103, no âmbito da sua actividade, a Requerente mulher identificava potenciais clientes a quem acompanhava até à formalização do contrato de aquisição dos direitos de utilização turística da gama F que eram comercializados pela referida entidade. Competia-lhe, assim, indicar aos clientes as ocasiões para celebrar o contrato – esclarecendo para cada produto, designadamente, as suas características, estrutura e prazo – e negociava alguns dos seus principais aspectos, em particular o respectivo preço. A actividade da Requerente mulher não se limitava, pois, à prática de actos ou operações de natureza administrativa, material ou técnica, sendo-lhe atribuídos efectivos poderes de negociação, sobretudo no que se refere ao preço final do contrato.
A actividade desenvolvida pela Requerente mulher subsume-se, assim, ao conceito de “negociação” a que se refere a alínea e) do n.º 27 do art. 9.º do CIVA, tal como este vem sendo enquadrado, quer pela Autoridade Tributária – através das informações da Autoridade Tributária n.º …, de 07-12-2010, n.º …, de 23/12/2010, e n.º A… 2008…, de 31-03-2009 –, quer pelo próprio TJUE, em especial o acórdão C-435/05 (Volker Ludwing), de 21-06-2007.
De acordo com a decisão proferida no referido acórdão do TJUE, a actividade de “negociação” corresponde a “uma actividade de mediação que pode consistir, entre outras coisas, em indicar a uma parte no contrato as ocasiões para celebrar determinado contrato, em entrar em contacto com a outra parte”, realçando-se a circunstância de que a “a actividade de negociação pode limitar-se a indicar a uma parte no contrato as ocasiões para celebrar tal contrato”.
Não contraria este entendimento o facto de a Requerente mulher não actuar em nome e representação da E… (Sucursal em Portugal) na medida em que a lei não exige a verificação de um vínculo contratual específico, nomeadamente um mandato com representação. Não relevando, também, o facto de as cláusulas típicas do contrato de transmissão dos títulos de direito de utilização turística terem sido previamente fixados pela referida entidade face ao conceito de “negociação” fixado pelo supra referido acórdão C-435/05 (Volker Ludwing) do TJUE.
Face ao exposto, concluem os Requerentes pela ilegalidade das liquidações contestadas por violação da alínea e) do n.º 27 do art. 9.º do CIVA pelo que requerem a sua anulação e dos juros compensatórios liquidados.
Em consequência, requerem ainda a condenação da Requerida a indemnizar os Requerentes dos custos incorridos com a garantia prestada no respectivo processo de execução.
III. DA RESPOSTA DA FAZENDA PÚBLICA
Em resposta, a Requerida considera totalmente improcedente o pedido dos Requerentes por entender que a actividade desenvolvida pela Requerente mulher não é subsumível ao conceito de “negociação” a que se refere a alínea e) do n.º 27 do art. 9.º do CIVA.
Desde logo, a Requerida considera que os Requerentes não lograram demonstrar que a actividade desenvolvida pela Requerente mulher não era mais do que a mera promoção dos títulos de direitos de utilização turística comercializados pela E… (Sucursal em Portugal). Na verdade, a Requerente mulher limitar-se-ía a angariar clientes a quem divulgava os produtos E… (Sucursal em Portugal), sem qualquer outro tipo de actuação em matéria de negociação, concretização e formalização do negócio de venda desses títulos.
De acordo com o conceito de “negociação” delimitado no acórdão C-235/00 (CSC Financial Services) do TJUE, de 13-12-2001, “a expressão negociação relativa a títulos não se refere aos serviços que se limitam a fornecer informações relativas a um produto financeiro e, eventualmente, a receber e processar os pedidos de subscrição dos títulos correspondentes, sem proceder à respectiva emissão”.
Ainda, à luz deste aresto, para se concluir pela existência de uma efectiva negociação é necessário que o sujeito passivo faça mais do que a mera actividade de mediação entre as partes contratantes, negociando em nome e por conta do cliente os detalhes das prestações recíprocas, não tendo o sujeito passivo interesse próprio no conteúdo do contrato. Ora, no caso em apreço não se pode concluir que a Requerente mulher não tinha interesse no conteúdo do contrato uma vez que as comissões a que tinha direito dependiam do preço de venda fixado.
Considera, também, a Requerida que a proceder a interpretação dos Requerentes, às inúmeras empresas de intermediação imobiliária que prestam serviços na área da prospecção de clientes e intermediação na venda e locação de imóveis, também lhes aproveitariam as isenções que aproveitam ao negócio principal, o que não sucede. Portanto, se na angariação de clientes para contratos de venda ou arrendamento de imóveis não é aplicável qualquer isenção do art. 9.º, também o mero angariador de potenciais clientes na aquisição de um título relativo a um direito real menor ou um título meramente obrigacionista, não pode beneficiar da isenção tipificada no art. 9.º do CIVA.
Nessa medida, considera a Requerida não ter ficado devidamente demonstrado que a actividade desenvolvida pela Requerente mulher a favor da E… (Sucursal em Portugal) possa beneficiar da isenção prevista na alínea e) do n.º 27 do art. 9.º do CIVA porquanto, tanto quanto apurado pela Requerida, tal actividade não integra o conceito de “negociação”.
Como indício relevante deste facto, refere ainda a Requerida que, a ser essa a actividade da Requerente mulher, não se compreenderá a existência de valores de comissões tão dispares como os declarados pela Requerente mulher, em especial, comissões de € 7,85 ou € 3,75, que dificilmente se poderão considerar como resultantes de comissões por negociação de venda de títulos representativos de direitos de utilização turística com prazos superiores a 20 anos.
Conclui, assim, pela improcedência do pedido dos Requerentes, considerando não poder ser assacada aos actos de liquidação contestados a ilegalidade invocada pelos Requerentes, ou seja, a violação da alínea e) do n.º 27 do art. 9.º do CIVA.
IV. MATÉRIA DE FACTO
A. Factos provados
Consideram-se provados os seguintes factos:
1. A E… (Sucursal em Portugal), NIPC …, dedica-se à venda de títulos de direitos de utilização turística sobre bens imóveis, por fracções semanais, incidentes sobre o “G”, no “H” e “I”.
2. Ao adquirir o título, o seu titular fica com direito a gozar férias nas instalações exploradas pela E… (Sucursal em Portugal) pelo período, nas condições e com os serviços fixados contratualmente.
3. Os direitos de utilização turística têm várias gamas com características diferentes, havendo um serviço básico, um serviço mais elaborado e um serviço de topo que corresponde ao serviço / cliente F.
4. Os direitos de utilização turística da gama F são direitos perpétuos.
5. Para vender os direitos de utilização turística, a E… (Sucursal em Portugal) recorre a prestadores de serviços independentes sem qualquer vínculo laboral.
6. Estes prestadores de serviços são remunerados com base nas vendas realizadas pelo que só recebem se venderem direitos de utilização turística.
7. Por cada comissão recebida, o prestador de serviços emite o competente recibo verde em nome da E… (Sucursal em Portugal).
8. A empresa tem uma tabela de preços mínimo e máximo, sendo que a fixação final do preço depende muito do tipo de negociação feito pelos vendedores.
9. Dentro dos valores mínimos e máximos fixados, o vendedor é livre de anunciar e negociar o preço que quiser.
10. Nalguns casos, a E… (Sucursal em Portugal) acorda com os vendedores uma modalidade de profit share em que é atribuído ao vendedor um prémio pelas vendas feitas acima do preço mínimo.
11. As vendas por valor inferior ao preço mínimo fixado têm que ser autorizadas pela E… (Sucursal em Portugal) ou implicam a redução da comissão a pagar ao prestador de serviços.
12. Desta prática, resulta que os preços médios de venda variam de vendedor para vendedor.
13. Para além da comissão devida pelas vendas, os prestadores de serviços têm direito a comissões por alterações contratuais negociadas com clientes que impliquem uma alteração do direito inicialmente adquirido com pagamento adicional a cargo do cliente.
14. Os vendedores não têm poderes de representação da E… (Sucursal em Portugal).
15. Os contratos são assinados pelos legais representantes da E… (Sucursal em Portugal) e não pelos prestadores de serviços que negoceiam a venda.
16. Os contratos de venda de direitos de utilização turística são contratos tipo com base em cláusulas contratuais gerais.
17. Os prestadores de serviço têm poderes para negociar condições distintas das previstas nas cláusulas contratuais que ficarão sujeitas a aprovação por parte da E… (Sucursal em Portugal).
18. Quando as alterações propostas são aceites pela E… (Sucursal em Portugal), é preparado um aditamento ou um documento complementar com as cláusulas particulares acordadas que faz parte integrante do contrato de venda dos direitos de utilização turística.
19. Durante os anos de 2011, 2012 e 2013, a Requerente mulher prestou serviços à E… (Sucursal em Portugal).
20. Para o efeito, a Requerente mulher declarou início de actividade em sede de IVA no ano de 2011, tendo ficado enquadrada no regime de isenção do art. 53.º do CIVA.
21. A 12-01-2012, a Requerente mulher apresentou uma declaração de alteração de actividade, enquadrando-se no código de actividade do art. 151.º do Código do IRS 1319 (Comissionista), com de isenção ao abrigo do art. 9.º do CIVA, da qual consta a menção manuscrita “Exclusivamente Direito Real de Habitação Periódica a mais de 20 anos”.
22. Durante os anos de 2012 e 2013 a Requerente mulher colaborou com a E… (Sucursal em Portugal) na venda de direitos de utilização turística da gama F.
23. No desenvolvimento da sua actividade, competia à Requerente mulher o contacto com clientes e / ou potenciais clientes aos quais divulgava e perante os quais promovia os direitos de utilização turística da gama F.
24. A Requerente mulher negociava com os clientes as condições de aquisição dos direitos em causa ou de alteração do título de utilização já detido pelo cliente.
25. A Requerente mulher fixava o preço final de venda ou alteração de título e acordava com o cliente as condições de aquisição, em termos de período para gozo das férias, tipologia da unidade turística, serviços associados, etc., que melhor se enquadrassem no perfil do cliente, sem prejuízo de posterior validação pela E… (Sucursal em Portugal).
26. A Requerente mulher não tinha poderes de representação da E… (Sucursal em Portugal).
27. Os contratos de venda de títulos não eram formalizados ou assinados pela Requerente mulher.
28. A Requerente mulher auferia uma comissão por cada transacção efectuada, emitindo o competente recibo verde.
29. Pelos serviços prestados em 2012, a Requerente mulher auferiu comissões pagas pela E… (Sucursal em Portugal), num total de Euro 20.578,97.
30. Pelos serviços prestados em 2013, a Requerente mulher auferiu comissões pagas pela E… (Sucursal em Portugal), num total de Euro 19.100,50.
31. Todos os recibos emitidos pela Requerente mulher à E… (Sucursal em Portugal) foram emitidos sem liquidação de IVA por esta considerar haver lugar à isenção prevista na alínea e) do n.º 27 do art. 9.º do CIVA.
32. A Requerente mulher foi alvo de uma inspecção tributária interna, de âmbito parcial em sede de IVA, com referência aos exercícios de 2012 e 2013, que teve origem nas Ordens de Serviço OI 2014… e 2014….
33. A inspecção foi iniciada em 02/07/2014 e concluída em 05/08/2014.
34. No relatório de inspecção elaborado pela Autoridade Tributária e Aduaneira refere-se o seguinte:
“III – DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL (2012 e 2013)
III.1. Falta de Iiquidação de IVA nos recibos emitidos
Resultante da circularização efetuada ao único cliente do sujeito passivo, foi possível verificar que, nos anos em análise, bem como já havia ocorrido no ano de (2011), o sujeito passivo exerceu a atividade de angariação de potenciais clientes para a sociedade E… Sucursal em Portugal, NIPC …, que se dedica a comercialização de direitos de utilização sobre bens imóveis, emitindo pelas comissões auferidas, recibos electrónicos, que constam na nossa base de dados, a partir de 2011-01-01, aquela sociedade, cuja numeração e valor são indicados no final deste ponto, para 2012 e 2013.
Em sede de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), o sujeito passivo considerou-se isento nos termos do artigos 53° e 9° (2011.art. 53°- 2012 art°53° e 9° - 2013 .art°53° e 9°) do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA), encontrando-se coletado no Serviço de Finanças de ... (código …) pela atividade de Outras prestações de serviços (CAE: 1519), nos recibos acima identificados, o sujeito passivo assinalou, relativamente ao regime de IVA, isento art.° 9° e isento art. 53°, considerando assim, que a atividade de angariação de potenciais clientes de direitos de utilização sobre bens imóveis, se encontra isenta ao abrigo daquele artigo, e isento art.° 53° em 2013.
Embora o sujeito passivo considere que os serviços por ele prestados aproveitam a isenção do art. 9.° do CIVA, isso não acontece uma vez que os mesmos consistem na promoção dos direitos de utilização sobre imóveis dando-os a conhecer ao público em geral e angariando potenciais clientes que se mostrem disponíveis para os conhecer e comprar, não havendo qualquer intervenção do sujeito passivo na negociação dos contratos ou na venda dos mesmos.
Assim em termos de enquadramento fiscal em sede de IVA, o sujeito passivo surge indevidamente no art.° 9.° desde 2012-02-01, dado que apesar de receber à comissão, não desenvolve em absoluto qualquer atividade enquadrável no art.° 9.° do CIVA.
Logo, observa-se uma incongruência no enquadramento do IVA, pois tratando-se de prestação de serviços de angariação de potenciais clientes de direitos de utilização sobre bens imóveis e que não tem cabimento no art.° 9.° do CIVA, teria de se aferir qual o enquadramento a considerar.
Dado que o volume de negócios, no ano de 2011, ultrapassou o limite de isenção do art. 53° do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA) (10 000.00), também estaria afastada a possibilidade de aplicação do regime de isenção do art. 53.° do CIVA, restando então o enquadramento no regime normal de tributação com periodicidade trimestral, a partir de 2012-02-01, pelo que será elaborado Boletim de Alteração Oficioso (BAO), no sentido de alterar o enquadramento do SP em conformidade.
Assim sendo, os montantes auferidos pelo sujeito passivo a partir de 2012-02-01, relativos a angariação de potenciais clientes de direitos de utilização sobre bens imóveis, encontram-se sujeitos a IVA, porquanto os serviços prestados inserem-se no conceito de prestação de serviços nos termos dos artigos 1.°, n.º 1, al. a), 2.°, n.° 1, al. a) e 4.°, n.° 1 do CIVA, já que não se aplica a isenção prevista no CIVA (art.° 53.º).
Os citados serviços efetuados por intermediário agindo em nome e por conta de outrem ligados ao alojamento do setor hoteleiro (ou em setores com funções análogas) estão abrangidas pela regra geral de localização dos serviços prestados a sujeitos passivos, vertida no artigo 6.°, n.° 6, alínea a) do CIVA.
O valor tributável destas prestações de serviços é, nos termos do artigo 16.°, n.° 1 do CIVA, o valor das contraprestaçães obtidas dos adquirentes.
Decorrente deste procedimento resulta falta de liquidação de IVA, para os exercícios de 2012 e 2013, nos termos do artigo 18.°, n.º 1, al. c) do CIVA.
Ao valor trimestral conhecido das prestações de serviços, vai ser aplicada a taxa de IVA em vigor nas respetivas datas.
Pela falta de liquidação do IVA nos recibos emitidos, apuram-se os seguintes montantes de imposto em falta:
(…)
IX - DIREITO DE AUDIÇÃO - FUNDAMENTAÇÃO
O contribuinte foi notificado do projeto de correcções, e de que poderia exercer o direito de audição previsto no art. 60.º da L.G.T. e art° 60.º do R.C.P.I.T., pelo oficio n.º … de 2014-08-12, o qual foi recebido, em 2014-08-26 segundo a pesquisa de objetos no site CTT, e veio exercer o direito de audição em 2014-08-22, qual não veio alterar as conclusões do projeto de correcções, pelo que, após o tratamento do BAO, deverá ser elaborado o documento de correcção, DC único, e levantados os respetivos autos de noticia, por não ter regularizada a situação nem efectuado o pedido de redução de coimas.
No direito de audição apresentado pelo SP (direito de audição arquivado no processo), este refere resumidamente que:
Prestou serviços à sociedade E… (Sucursal em Portugal) de angariação de potenciais clientes da sociedade, recebendo uma comissão, que considera (ponto 10) como operação de negociação de títulos, referindo que os referidos serviços se encontram abrangidos pela isenção prevista na alínea e) do n.º 27 do artigo 9.º do ClVA (ponto 15).
Faz referência ao acórdão de 13-12-2001 do TJUE, 2, ao acórdão de 21-07-2007, (Volker Ludwig), e às informações n.º A…2008… de 31-12-2009, n.º … 7-12-2010 e n.º … de 23-12-2010, ambas sancionadas por despacho do Sudiretor Geral dos Impostos.
Analisados os argumentos apresentados pelo sujeito passivo, tecem-se os seguintes comentários. Considerados relevantes para a fundamentação da decisão da proposta de tributação.
As correcções propostas no presente relatório de inspecção encontram-se corroboradas pela informação prestada pela sociedade "E…" no sentido que os rendimentos pagos resultam da intervenção do sujeito passivo na venda do produto "J", não tendo o sujeito passivo, no exercício do direito de audição, feito prova que os rendimentos não resultam da simples prestação de um serviço de angariação de potenciais clientes para a empresa E.
No entanto, ainda que o sujeito passivo argumente que as comissões por si auferidas pela intermediação na venda dos títulos vendidos pela sociedade E estão abrangidas na alínea e) do n.º 27 do artigo 9.º do código do IVA, e por conseguinte isentas de imposto, demonstraremos que tais serviços não estão abrangidos em tal disposição legal.
Face ao disposto na alínea e) do n.º 27 do artigo 9.º do código o IVA, beneficiam da isenção as comissões auferidas pela intermediação na compra e venda de títulos representativos de operações sobre bens imóveis. No entanto, encontram-se afastadas da isenção as operações relacionadas com a "administração e gestão" dos referidos títulos.
Na situação em apreço, que se reporta a intervenção de uma entidade terceira nas operações financeiras relacionadas com a compra e venda de títulos representativos de operações sobre imóveis, importa verificar a interpretação atribuída ao termo "negociação" que consta da referida alínea.
Assim, o entendimento resultante da apreciação do Tribunal de Justiça proferido no Acórdão de 13 de dezembro de 2001 - Processo C-235/00, expresso nos pontos 39 a 41 é o seguinte:
"39 Sem que seja necessário averiguar o alcance exacto do termo «negociação», que, aliás, aparece noutras disposições da Sexta Directiva, designadamente no artigo 13.°, a, alínea d), n.ºs 1 a 4, há que concluir que, no contexto do n. ° 5, se refere a uma actividade executada por um intermediário que não ocupa o lugar de uma parte num contrato relativo a um produto financeiro e cuja actividade é diferente das prestações contratuais típicas efectuadas pelas partes em contratos desse tipo. Efectivamente, a actividade de negociação e um serviço prestado a uma parte contratual e por esta remunerado como actividade distinta da mediação. Entre outras coisas, pode consistir em indicar-lhe as ocasiões para celebrar determinado contrato, entrar em contacto com a outra parte e em negociar em nome e por conta do cliente os detalhes das prestações recíprocas. A finalidade desta actividade e, assim, proceder ao necessário para que ambas as partes celebrem um contrato, sem que o negociador tenha um interesse próprio quanto ao conteúdo do contrato.
40 Em contrapartida, não se está perante uma actividade de negociação quando uma das partes no contrato confia a um subcontratante uma parte das operações materiais ligadas ao contrato, como a informação da outra parte, a recepção e o processamento dos pedidos de subscrição dos títulos que são objecto do contrato. Neste caso, o subcontratante ocupa o mesmo lugar que o vendedor do produto financeiro e não constitui, assim, um intermediário que não ocupa o lugar de uma das partes no contrato na acepção da disposição em causa.
41 Tendo em conta todas as considerações que antecedem, deve responder-se ao órgão jurisdicional de reenvio que o artigo 13º, a, alínea d), n.º 5, da Sexta Directiva deve ser interpretado no sentido de que
- a expressão «operações relativas a títulos» se refere a operações susceptíveis de criar, modificar ou extinguir os direitos e obrigações das partes sobre títulos,
- a expressão «negociação relativa a títulos» não se refere aos serviços que se limitam a fornecer informações relativas a um produto financeiro e, eventualmente, a receber e processar os pedidos de subscrição dos títulos correspondentes, sem proceder à respectiva emissão. "
Nestes termos, as prestações de serviços realizadas pelo sujeito passivo em análise não se encontram abrangidas pelo conceito de negociação contido na alínea e) do n.° 27 do artigo 9.º do CIVA, sendo consideradas, no âmbito do CIVA, prestações de serviços, nos termos do n.º 1 do artigo 4..º, sujeitas a IVA e dele não isentas, tributáveis à taxa definida na alínea c) do n.º 1 do artigo 18.º do CIVA.
Uma vez que estas operações relativas a Direitos de Habitação Turística não se enquadram no âmbito da isenção contida na subalínea e) da alínea 27) do artigo 9.º do CIVA, as comissões pagas relativas a prestações de serviços ligados a sua comercialização também não se enquadra no âmbito da isenção contida na subalínea e) da alínea 27) do artigo 9.º do CIVA.
Face ao exposto podemos concluir que os argumentos apresentados pelo s.p. não vêm alterar as correcções propostas, pelo que as conclusões do projeto de correcções transitam para o presente relatório.”
35. Em execução das conclusões da inspecção tributária, a Autoridade Tributária e Aduaneira procedeu aos seguintes actos de liquidação:
i) n.º 2014 …, referente ao IVA do 201203T, no montante de € 549,70;
ii) n.º 2014 …, referente ao IVA do 201206T, no montante de € 1.124,70;
iii) n.º 2014 …, referente ao IVA do 201209T, no montante de € 2.437,76;
iv) n.º 2014 …, referente ao IVA do 201212T, no montante de € 621,00;
v) n.º 2014 …, referente ao IVA do 201303T, no montante de € 530,15;
vi) n.º 2014 …, referente ao IVA do 201306T, no montante de € 1.076,52;
vii) n.º 2014 …, referente ao IVA do 201309T, no montante de € 1.934,30;
viii) n.º 2014 …, referente ao IVA do 201312T, no montante de € 852,15;
ix) n.º 2014 …, referente aos juros compensatórios de 201306T, no montante de € 52,25;
x) n.º 2014 …, referente aos juros compensatórios de 201206T, no montante de € 99,87;
xi) n.º 2014 …, referente aos juros compensatórios de 201203T, no montante de € 54,45;
xii) n.º 2014 …, referente aos juros compensatórios de 201309T, no montante de € 74,48;
xiii) n.º 2014 …, referente aos juros compensatórios de 201303T, no montante de € 31,17;
xiv) n.º 2014 …, referente aos juros compensatórios de 201209T, no montante de € 192,02;
xv) n.º 2014 …, referente aos juros compensatórios de 201212T, no montante de € 42,61.
B. Factos não provados
Não se provaram outros factos com relevância para a decisão arbitral.
C. Fundamentação da matéria de facto
A matéria de facto dada como provada assenta na prova documental apresentada e não contestada, bem como nas declarações prestadas pelo Requerente marido e no depoimento da testemunha C. Os depoimentos referidos assumiram-se como sérios e isentos aos olhos do Tribunal, na medida em que, a par com as características de espontaneidade dos mesmos, se mostraram logicamente estruturados e coerentes.
O depoimento da testemunha indicada foi, aliás, essencial para a clara apreensão da actividade desenvolvida pela E… (Sucursal em Portugal), entidade com a qual manteve uma relação profissional até ao ano de 2012, pelo que teve conhecimento directo dos factos e da actividade desenvolvida pela Requerente mulher.
V. QUESTÕES A DECIDIR
A. Da ilegalidade das liquidações de IVA
O contencioso tributário – através da impugnação judicial e do pedido de pronúncia arbitral – reconduz-se a um contencioso de anulação ou declaração de nulidade de actos tributários pelo que o objecto do mesmo está delimitado pelo acto tributário posto em crise e respectiva fundamentação.
Assim sendo, no que se refere aos presentes autos, cumpre decidir se os actos de liquidação de IVA contestados pelos Requerentes devem ou não ser anulados por ilegais.
Resulta das conclusões do relatório de inspecção junto aos autos e respectiva fundamentação que, no entender da Requerida, a actividade desenvolvida pela Requerente mulher não se subsumirá ao conceito de “negociação” a que se refere a e) do n.º 27 do art. 9.º do CIVA, pelo que a isenção de IVA aí prevista não será aplicável aos serviços prestados, nos anos de 2012 e 2013, pela Requerente mulher à E… (Sucursal em Portugal).
Cumpre, assim, decidir.
Antes de mais, há que ter em conta que, de acordo com a extensa jurisprudência do TJUE, as isenções previstas na Directiva 2006/112/CE, do Conselho, constituem noções autónomas de direito da União que deverão ser interpretadas de forma estrita por constituírem excepções ao sistema comum do IVA.
No entanto, esta exigência de interpretação estrita tem que estar em conformidade com os objectivos das isenções previstas e respeitar o princípio da neutralidade fiscal sob pena de, esvaziando-as de conteúdo, pôr em causa os efeitos jurídicos e económicos pretendidos.
Assim, tendo em conta o que vem sendo a jurisprudência comunitária sobre o tema, considera este tribunal que o conceito de “negociação” se refere a “uma actividade executada por um intermediário que não ocupa o lugar de uma parte num contrato relativo a um produto financeiro e cuja actividade é diferente das prestações contratuais típicas efectuadas pelas partes em contratos desse tipo. Efectivamente, a actividade de negociação é um serviço prestado a uma parte contratual e por esta remunerado como actividade distinta da mediação. Entre outras coisas, pode consistir em indicar-lhe as ocasiões para celebrar determinado contrato, entrar em contacto com a outra parte e negociar em nome e por conta do clientes os detalhes das prestações recíprocas. A finalidade desta actividade é, assim, fazer o necessário para que ambas as partes celebrem um contrato, sem que o negociador tenha um interesse próprio quanto ao conteúdo do contrato” – cfr. acórdão C-259/11 (DTZ Zadelhoff vof), de 5-07-2012, e C-235/00 (CSC Financial Services) de 13-12-2001.
A ideia de negociar pressupõe a noção de transigir, ceder, dispor de direitos ou interesses para chegar a um acordo; pressupõe uma actividade de procura de consensos, conjugação de interesses e posições contratuais com vista à concretização de um determinado negócio jurídico, em proveito próprio e / ou de terceiros no interesse.
Daí que se considere que não integram o conceito de “negociação” o simples fornecimento de informação relativa a um produto financeiro, recebimento e processamento de pedidos de subscrição dos títulos correspondentes, sem proceder à respectiva emissão – cfr. C-235/00 (CSC Financial Services) de 13-12-2001. Os serviços meramente administrativos e técnicos que permitirão às partes a celebração de um contrato, sem qualquer interferência quanto ao conteúdo desse mesmo contrato, não poderão, assim, considerar-se como característicos de um processo de negociação.
Ora, tendo em conta a actividade desenvolvida em concreto pela Requerente mulher, este tribunal conclui que a mesma integra o conceito de “negociação” da alínea e) do n.º 27 do art. 9.º do CIVA. Com efeito, e contrariamente ao que vem alegado pela Requerida, na sua actividade, a Requerente mulher não só contactava clientes para a E… (Sucursal em Portugal) como apresentava os produtos que esta entidade tinha para fornecer, negociando com os clientes as condições contratuais que melhor se lhes adequavam, tendo total liberdade na fixação do preço. Note-se, aliás, que a existência de um preço mínimo de venda não era impedimento a que a Requerente mulher, à semelhança do que se verificaria com qualquer outro vendedor, acordasse com o cliente um preço inferior (apesar de tal ser desaconselhado) ou superior. Havia, aliás, um incentivo a que os preços de venda fossem superiores aos mínimos fixados.
Esta liberdade de fixação de um elemento essencial do contrato – o preço – tem como implicação imediata o que a testemunha C declarou no sentido de que o preço médio de venda variava de vendedor para vendedor. Tal não sucederia se os vendedores, tais como a Requerente mulher, se limitassem a fornecer informação relativa aos títulos de utilização turística, a receber e processar os pedidos de aquisição por parte dos clientes.
Contra este entendimento, não procederá a alegação da Requerida no sentido de que a Requerente mulher não tinha qualquer liberdade na fixação das cláusulas contratuais, limitando-se a vender um “produto” final, sem qualquer possibilidade de conformação ou adaptação das vontade das partes.
E não procede porque, como se considerou provado supra (cfr. pontos 17 e 25 dos Factos Provados), a E… (Sucursal em Portugal) autorizava a negociação de condições contratuais especificas que estariam sempre sujeitas à sua aprovação final. No entender do tribunal, este facto permite concluir que a Requerente mulher, à semelhança do que se verificava com os demais vendedores, tinha poderes negociais para adaptar e conformar o conteúdo contratual, embora sujeito a posterior aprovação da E… (Sucursal em Portugal).
E não se pense que esta necessidade de aprovação final das condições especiais negociadas com o cliente por parte da E… (Sucursal em Portugal) não afasta tal actividade do conceito de “negociação”. A esta mesma conclusão chegou o TJUE no processo C-453/05 (Ludwig) do TJUE supra invocado, num processo com muitas semelhanças à situação em apreço.
Com efeito, resulta do ponto 10 desse acórdão que “Se a pessoa optar por um crédito, o consultor prepara uma proposta de contrato vinculativa que transmite, após assinatura pelo cliente, à DVAG, que aprecia a sua regularidade. Esta última envia a proposta de contrato ao estabelecimento financeiro mutuante, que pode aceitar, recusar ou alterar os respectivos termos” (sublinhado nosso). Ora, também neste caso – em que o TJUE concluiu ser aplicável a isenção prevista na alínea f) do n.º 1 do art. 135.º da referida Directiva, correspondente à nossa alínea e) do n.º 27 do art. 9.º do CIVA – o intermediário que representava a entidade concedente do crédito discutia a proposta de crédito com o cliente final, fixando os termos e condições do mesmo, dentro dos limites e condições previamente determinados pela própria entidade concedente do crédito, para posterior remessa da proposta para validação ou recusa dos termos negociados.
Ou seja, também neste caso, o intermediário negociava as operações de crédito dentro de condições gerais previamente fixadas pela entidade concedente do crédito e, dado que não tinha poderes de representação da entidade concedente do crédito, a proposta apresentada – com carácter vinculativo da parte do cliente final - estava sempre dependente de aprovação por parte daquela.
Não procede, também, a alegação feita pela Requerida de que a interpretação proposta pelos Requerentes implicaria que a actividade dos mediadores imobiliários também estaria de isenta de IVA. Isto porque as isenções previstas nos n.ºs 29 e 30 do art. 9.º do CIVA não incluem expressamente a actividade de “negociação”, ao contrário da alínea e) do n.º 27 do art. 9.º do CIVA; e a isenção prevista nesta norma refere-se a operações sobre acções, outras participações em sociedades ou associações, obrigações e demais títulos, não abrangendo operações (de venda ou arrendamento) directamente incidentes sobre bens imóveis. Uma coisa são operações sobre acções, obrigações ou outros títulos sobre imóveis, outra coisa são operações directamente incidentes sobre imóveis. As duas normas têm âmbitos de aplicação distintos pelo que não se podem confundir, nem sobrepor.
Por fim, a existência de comissões de valores bastante variados, em especial comissões de poucos euros, não é demonstrativa de que a Requerente mulher não negoceia em operações relativas a títulos sobre bens imóveis de prazo superior a 20 anos. Como explicado pela testemunha C, esses valores resultarão de comissões pagas pela negociação de operações de alteração dos direitos de utilização turística (operações de upgrade) e não pela venda de tais direitos (cfr. ponto 13 dos Factos Provados). Ora, estas operações de alteração estão, também, inequivocamente abrangidas pela isenção da alínea e) do n.º 27 do art. 9.º do CIVA, na medida em que se traduzem em operações susceptíveis de criar, modificar ou extinguir direitos e obrigações das partes, relativos a títulos – cfr. acórdão C-235/00 (CSC Financial Services).
Face a tudo o que vem exposto, concluímos pela aplicação da isenção alínea e) do n.º 27 do art. 9.º do CIVA aos serviços prestados pela Requerente mulher à E… (Sucursal em Portugal), nos anos de 2012 e 2013. Assim sendo, as liquidações de IVA efectuadas pela Requerida com referência a estes anos e dos respectivos juros compensatórios são ilegais por violação da referida norma pelo que deverão ser anuladas, como pedido pelos Requerentes.
Não tendo este tribunal dúvidas quanto à interpretação e aplicação da norma em causa, entende este tribunal não haver lugar a reenvio prejudicial para o TJUE conforme hipótese colocadas em sede de alegações pelos Requerentes.
B. Do pedido de indemnização por prestação de garantia
Os Requerentes formulam, no final do pedido de pronúncia arbitral, pedido de indemnização pelos custos em que incorreram com a prestação de garantia para suster o processo de execução fiscal.
No entanto, não se provou que tivesse sido instaurado qualquer processo de execução fiscal para cobrança das quantias liquidadas, nem que os Requerentes tenham prestado qualquer garantia que tenha gerado custos.
O processo arbitral é o meio adequado para o reconhecimento do direito a indemnização por garantia indevidamente prestada, pois é aplicável subsidiariamente o artigo 171.º do CPPT, por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT.
Sucede que só quando a garantia é efectivamente prestada é que poderá ser requerido o direito à indemnização.
Assim, não tendo sido alegado e provado que (i) foi instaurado processo de execução fiscal e que (ii) foi prestada garantia com vista à sustação do mesmo, tem de ser julgado improcedente o pedido de reconhecimento do direito a indemnização, sem prejuízo de esse direito poder vir a ser reconhecido inclusivamente em execução de julgado, caso tal prestação ocorra.
VI. DECISÃO
De harmonia com o exposto, decide este Tribunal Arbitral em:
a) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral, quanto ao pedido de anulação das liquidações de IVA dos primeiros, segundos, terceiros e quartos trimestres de 2012 e 2013, e respectivos juros compensatórios, devidamente identificadas no ponto 35. dos Factos Provados;
b) Anular as referidas liquidações;
c) Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral na parte em que é pedida a indemnização pelos custos incorridos com a prestação de garantia em processo de execução fiscal, absolvendo a Requerida do pedido nesta parte.
Valor do processo: De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 9.126,28.
Custas: Nos termos do n.º 4 do art. 22.º do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 918,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida.
Registe-se e notifique-se esta decisão arbitral às partes.
Lisboa, 02-10-2015
O Árbitro Singular
(Maria Forte Vaz)