Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 59/2015-T
Data da decisão: 2015-10-05  IRC  
Valor do pedido: € 184.759,37
Tema: IRC - Artigo 45º-3, do CIRC (redação de 2011); gastos resultantes da aplicação do “justo valor” em instrumentos financeiros; lucro tributável
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Decisão Arbitral

 

CAAD: Arbitragem Tributária

Processo nº 59/2015 – T

Tema: Artigo 45º-3, do CIRC (redação de 2011); gastos resultantes da aplicação do “justo valor” em instrumentos financeiros; lucro tributável

 

Autor/Requerente: A… – …, S.A.

Requerida: Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante AT)

 

I - RELATÓRIO

A… – …, S.A., pessoa colectiva n.º …, com sede na Rua …, …, …, …, …, doravante designada por Requerente, submeteu, em 02-03-2015, ao Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) o pedido de constituição de tribunal arbitral, com vista à declaração de ilegalidade de atos tributários de liquidação de imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (doravante IRC), relativos aos exercícios de 2010 e 2011, a saber,

i.          Liquidação n.º 2014 …, no valor de € 7.829,55, relativa ao período de 2010;

ii.         Liquidação n.º 2014 …, no valor de € 7.161,38, relativa ao período de 2011.

A Requerente peticiona a declaração de ilegalidade dos supra referidos atos de liquidação do Imposto sobre o Rendimento das pessoas Colectivas.

A Requerente alega, para tanto, que o regime constante do extinto art. 45.º, 3, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (doravante CIRC), não se aplica às situações em que o ajustamento de justo valor concorre para a formação do lucro tributável, quando se tratem de activos financeiros que representavam menos de 5% do capital social das sociedades pertencentes.

 

Este Tribunal Arbitral foi regularmente constituído em 13-4-2015.

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira foi devidamente notificada nos termos do artigo 17º, do RJAT e apresentou resposta.

 

Por despacho de 14-5-2015 foi dispensada, sem oposição das partes, a reunião prevista no artigo 18º, do RJAT, bem como a apresentação de alegações orais.

 

Ambas as partes apresentaram alegações escritas confirmativas, no essencial, das posições assumidas nos respetivos articulados.

 

II – FUNDAMENTAÇÃO

 

Os factos

Analisada a prova documental produzida pelas partes e o processo administrativo instrutor junto pela AT, consideram-se provados, e com interesse para a decisão da causa, os seguintes factos:

a) A requerente submeteu, em 2011 e em 2012, as suas declarações de rendimentos (Modelo 22) de IRC respeitantes, respectivamente, aos exercícios de 2010 e de 2011;

b)         Durante esses exercícios (2010 e 2011), a requerente deteve participações financeiras, constituídas por acções representativas do capital social do B…, S.A., C…, D…, E…, F…, G…, H… e I…;

c)         Essas acções representavam menos de 5% do capital social dessas sociedades, sendo que tais títulos estavam admitidos à negociação em mercado regulamentado;

d)        A requerente considerou o valor de 20% do saldo de ajustamento como variação patrimonial negativa e como ajustamento de transição do regime do Plano Oficial de Contabilidade (POC) para o regime do SNC, ou seja, o montante de € 2.447,39 (20% de – 12.236,95);

m)        A requerente registou na conta 6610000 — “Perdas por redução de justo valor” —, os quantitativos de € 105.666,70 (referente ao exercício de 2010) e de € 252.238,83 (referente ao exercício de 2011), que diziam respeito a ações da sua titularidade;

e)         A requerente inscreveu € 2.447,39 no campo 705 do Q07 de ambas as Declarações Modelo 22 de 2010 e de 2011:

 

AJUSTAMENTOS DE TRANSIÇÃO EFECTUADOS PELA REQUERENTE (EXERCÍCIO DE 2009)

 

 

Ajustamento - 2.447,39 (20% x  -12.236,95)

                             

 

 

f) Em cumprimento das ordens de serviço ns. OI 2013 … e OI 2014 …, a AT efectuou, em 2014, ações inspectivas à requerente, de âmbito parcial — IRC, relativas aos exercícios de 2010 e 2011;

f)         Como decorrência daqueles atos inspectivos, a AT não aceitou a variação patrimonial negativa apresentada, tendo rectificado os referidos valores;

h)         A AT estabeleceu como ajustamento de transição reflectido no Q07 da Declaração Modelo 22, como variação patrimonial, € 2.279,55, referente aos exercícios de 2010 e 2011:

 

 

AJUSTAMENTOS DE TRANSIÇÃO EFECTUADOS PELA AT

 

 

i)           A AT acrescentou € 455,91 às matérias colectáveis dos exercícios de 2010 e 2011;

l)          A AT corrigiu em sede de mensurações de justo valor, os resultados tributáveis de IRC da requerente, acrescendo os valores de € 52.833,35 (referente ao exercício de 2010) e de € 126.119,42 (referente ao exercício de 2011);

n)         Pelas operações de correcção realizadas pela AT, os resultados tributáveis de IRC da requerente acresceram € 455,91 (20% de 2.279,55) (2010) e € 455,91 (20% de 2.279,55) (2011);

o)         A AT liquidou a 08-11-2014 o IRC relativo aos anos de 2010 e 2011, da seguinte forma:

i.          Liquidação n.º 2014 …, no valor de € 7.829,55, relativa ao período de 2010;

ii.         Liquidação n.º 2014 …, no valor de € 7.161,38, relativa ao período de 2011;

p)         A Requente foi notificada para proceder ao pagamento das referidas notas de liquidação, no valor total de € 14.990,93.

 

O Direito

A questão decidenda prende-se com a de saber se a prescrição constante do defunto art. 45.º, 3, CIRC, é aplicável ou não às situações em que o ajustamento de justo valor concorre para a formação do lucro tributável, nomeadamente, quando em causa estejam menos-valias decorrentes de participações financeiras constituídas por acções representativas de menos de 5% do capital social de diversas sociedades.

No caso sub juditio a AT efectuou dois tipos de correções para efeitos de cálculo da base tributável:

i)          Por um lado, a perdas resultantes da aplicação do modelo do justo valor em instrumentos financeiros;

ii)         Por outro lado, a ajustamentos de transição, contabilizados como variações patrimoniais negativas, do Regime do Plano Oficial de Contabilidade (POC) para o Sistema de Normalização Contabilística (SN), respeitantes à aplicação do modelo do justo valor em instrumentos financeiros.

 

A questão de fundo prende-se com as consequências fiscais da mensuração ao justo valor, em 2010 e 2011, de participações financeiras da Requerente constituídas por acções representativas do capital social do B…, C…, D…, E…, F…, G…, H… e I…, todas elas correspondentes a menos de 5% do capital social dessas sociedades e admitidas à negociação em mercado regulamentado.

Trata-se aqui de questão já foi objecto de acórdãos do CAAD, nomeadamente, o proferido no processo 108/2013-T, que seguiremos de perto.

Dispunha o art. 45.º, 3, CIRC, que “a diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, bem como outros componentes do capital próprios, designadamente, prestações suplementares concorrem para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor.”.

Haverá antes de mais que ter presente que o supracitado art. 45.º, 3, CIRC decorre de uma alteração legislativa que se guiou, de acordo com o Relatório do Ministério das Finanças para o Orçamento de Estado de 2003, por “duas prioridade, a saber, o combate à fraude e evasão fiscais e o alargamento da base tributável,”, enquadrando-se a alteração que aqui interessa no âmbito do “Alargamento da base tributável e medidas de moralização e neutralidade”.

A redacção da norma em análise resultou da alteração implementada pela Lei n.º 60-A/2005 de 30 de Dezembro, sendo que nos termos do correspondente Relatório do Ministério das Finanças, a medida em causa se enquadrou no âmbito do “COMBATE À EVASÃO E FRAUDE FISCAIS E OUTRAS MEDIDAS DIRECCIONADAS À CONSOLIDAÇÃO ORÇAMENTAL”.

Assim, a norma passou a ter, com a Lei n.º 60-A/2005, de 30/12, uma redacção mais ampla, abrangendo, na limitação das perdas em 50%, não apenas a “diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital”, mas também “outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares”.

A norma voltou a ser alterada em 2014, com efeitos a partir de 1 de Janeiro desse ano. A referida alteração teve lugar dentro daquele que foi um dos desígnios da reforma IRC de 2014, ou seja a promoção da competitividade e investimento, através do “Regime da Participation Exemption”, sendo princípios basilares deste regime o aumento da competitividade (atração de investimento), bem como a melhoria da eficiência (redução de custos de contexto/prevenção de comportamentos de substituição).

De facto, com a reforma do IRC, aprovada pela Lei n.º 2/2014, de 16-01, o art. 45.º em apreço foi revogado. Surge entretanto o art. 23.º-A, do qual não consta a limitação à dedutibilidade fiscal, anteriormente prevista no nº 3 daquele art. 45.º, respeitante a outras perdas relativas a partes de capital, segundo a qual estas concorriam em apenas 50% para a formação do lucro tributável.

Com efeito, o art. 45.º, 3 do CIRC encontra-se, presentemente, revogado.

A controvérsia invocada nos autos está directamente relacionada com os seguintes artigos: art. 17.º, 1, CIRC; o n.º 9 do art. 18.º; o art. 20.º, 1, o art. 23.º, 1, o art. 21.º, 1, o art. 24.º, 1, o art. 46.º, 1, e, por fim o referido art. 45.º, 3.

Um dos aspectos jurídicos relevantes para a questão em análise é a aplicação do modelo contabilístico do justo valor como critério de valoração contabilístico com relevância fiscal. Este ponto resultou, igualmente, de uma alteração no regime jurídico da tributação dos rendimentos das pessoas colectivas, no que tange especificamente à aquisição de instrumentos financeiros, nomeadamente, ações representativas do capital social de sociedades admitidas à negociação em mercado regulamentado. Este é o ponto que nos diz directamente respeito.

Previamente à adopção do justo valor, as variações patrimoniais relativas aos instrumentos financeiros eram irrelevantes do ponto de vista da formação do lucro tributável de cada período, por efeito da norma do art. 21.º, 1, al. b) do CIRC. Apenas no momento da realização da mais ou menos-valia é que assumia relevância fiscal a variação patrimonial verificada.

Por outro lado, e atenta a relevância da vontade do sujeito passivo no mecanismo de relevância tributária da variação patrimonial, o sistema estabelecido adequava-se à adopção de mecanismos de condicionamento daquela vontade, no sentido de a conformar a comportamentos economicamente mais desejáveis, que, no caso, passam pela preferência de realização de mais-valias, em detrimento da realização de menos-valias.

No entanto, o modelo do justo valor veio alterar significativamente o panorama do CIRC e consequente, a interpretação a efectuar sobre as normas jurídicas afectadas, nomeadamente o art. 45.º, 3.

Um olhar crítico sobre o art. 45.º, 3, idem, que admitisse, no seu âmbito, não só as perdas (definidas no art. 23.º) mas também as variações patrimoniais negativas (tal como definidas no art. 24.º), assim como os custos (tal como definidos no art. 23.º), levaria a que, por exemplo, o custo de aquisição de partes de capital apenas concorresse em metade do respectivo valor para o apuramento do lucro tributável, o que seria, obviamente, inconcebível, num legislador minimamente razoável.

Por “perdas” deve-se entender os factos qualificáveis como tal à luz do CIRC e por “variações patrimoniais negativas” deve-se entender variações patrimoniais negativas não reflectidas no resultado líquido do exercício, tal como definidas no art. 24.º.

Deve então conceber-se, perante o panorama exposto, que o Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de julho, veio introduzir, no que respeita à parte abrangida pela aceitação da aplicação do modelo do justo valor em instrumentos financeiros, um regime especial de relevância para o cômputo do lucro tributável, justificado quer pela sua objectividade própria quer pela confessada intenção de aproximação da contabilidade à fiscalidade. Esta alteração não poderá ser desconsiderada quando se analise a questão jurídica a dirimir.

Ora, face à actual redacção do CIRC, aquela afirmação não gera dúvidas, como se verifica, designadamente, pela redacção dos arts. 20.º, 1 al. f) e h), 23.º, 1, al. i) e l), e, em especial art. 46.º, 1, al.b), face aos quais se evidencia de uma forma clara a intenção do legislador em afastar os ajustamentos decorrentes da aplicação do critério do justo valor em instrumentos financeiros, nos termos reconhecidos pelo CIRC, do regime das mais e menos-valias. Não obstante, a situação mostra-se diversa quando se trata do antigo art. 45.º, 3, CIRC, surgindo este artigo como uma antítese daquela congruência de normas que o rodeiam.

Ou seja: no regime para o qual foi pensada e instituída a norma do artigo 45.º, 3, a realização de menos-valias, e demais situações elencadas, estava dependente de uma actuação voluntária correspondente à realização das mesmas. Ora, neste quadro, será compreensível que o legislador institua mecanismos de desincentivo a uma actuação susceptível de ser considerada como desvaliosa, no caso a realização de menos-valias ou outras variações patrimoniais negativas. Ao dispor que tais situações apenas relevarão em 50% do montante contabilizado, o legislador fiscal está, objectivamente, a condicionar as actuações abrangidas pela previsão legal, impondo um incentivo negativo às mesmas.

Por outro lado, e estando em causa instrumentos financeiros de valor não objectivamente quantificável, a desconsideração em 50% das variações patrimoniais negativas verificadas, teria também uma função de “compensar” a natural tendência dos operadores económicos para, ao nível fiscal, inflacionarem os prejuízos.

Contudo, o mesmo já não se poderá concluir nas situações abrangidas pelo art. 18.º, 9, al. a) – como as do presente caso. Aqui, estando-se perante ajustes decorrentes da contabilização do justo valor, determinado por critérios objectivos (com “um preço formado num mercado regulamentado”), não há qualquer dúvida ou intervenção da vontade do sujeito passivo na verificação do ajustamento patrimonial negativo ou positivo. Ou seja, estes ocorrerão ou não, independentemente da actuação e da vontade do sujeito passivo.

Ora, penalizar, nestes casos, o sujeito passivo com uma desconsideração de 50% do gasto incorrido, seria de todo injustificado, quer de um ponto de vista económico quer de um ponto de vista jurídico e muito menos, ao nível contabilístico.

Posto que, no regime do defunto art. 45.º, 3, a realização de menos-valias, e demais situações previstas, estava dependente de uma actuação voluntária correspondente à realização das mesmas. Perante esta factualidade, será compreensível que o legislador institua mecanismos de desincentivo a uma atuação susceptível de ser considerada como desvaliosa, no caso a realização de menos-valias ou outras variações patrimoniais negativas. Ao dispor que tais situações apenas relevarão em 50% do montante contabilizado, o legislador fiscal está, objectivamente, a condicionar as atuações abrangidas pela previsão legal, impondo um desincentivo às mesmas.

A não aplicação do art. 45.º, 3, CIRC aos gastos e, concretamente, aos “Gastos resultantes da aplicação do justo valor em instrumentos financeiros”, com a consideração plena das repercussões patrimoniais verificadas, sejam positivas ou negativas, leva a uma congruência da tributação qualquer que seja a altura em que se verifique a alienação do instrumento financeiro.

Ao invés, se se aplicar a norma do art. 45.º, 3, CIRC, como pretende a AT, a partir do momento em que se verifique uma alteração patrimonial negativa, haverá uma disparidade entre a relevância fiscal das variações patrimoniais negativas e positivas, sem qualquer fundamentação.

Parece claro que resultados aleatórios e sem qualquer fundamento substancial que os sustente não podem ter sido queridos por um legislador razoável.

É certo que a solução alternativa, que exclui a aplicação do art. 45.º, 3 CIRC, leva a que, no caso de se verificar, a final, uma menos-valia, esta acabe por ter sido considerada a 100%, e não a 50%, como ocorreria ao abrigo do princípio da realização. Contudo, esta discriminação positiva (ou melhor, não discriminação negativa) pela opção pelo critério do justo valor, poderá justificar-se, desde logo, porquanto no regime do art. 18.º, 9, al. a), deixa de fazer sentido qualquer desincentivo à realização de menos-valias, uma vez que as mesmas relevarão fiscalmente independentemente da sua efectiva realização. Não se deverá desconsiderar igualmente que, por um lado, a contabilização pelo justo valor é considerada mais conforme à aproximação entre a contabilidade e a fiscalidade, finalidade confessadamente prosseguida pelo legislador do Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de Julho, e, por outro, a circunstância de estarmos perante realidades objectivamente avaliadas, sem que haja margem significativas para manipulações fiscalmente convenientes. Ou seja, como se havia adiantado já, não se verificam as razões de combate à fraude e evasão fiscal, nem as razões de consolidação orçamental, que demonstradamente estiveram na génese da norma do art. 45.º, 3 do CIRC.

 

A análise a efectuar deve ter em conta a perspectiva sistemática da integração da norma, ponderando, igualmente, o contexto histórico da respectiva génese, como já se elencou anteriormente.

Deste modo, como já tivemos oportunidade de expor, a norma do n.º 3 do art.45.º do CIRC, surge totalmente descontextualizada do manto normativo que a rodeia. Igual conclusão terá de ser retirada da actuação da AT.

Efectivamente, cada uma das normas tidas como relevantes para a apreciação da questão decidenda, deverá ser compreendida no correspondente enquadramento concreto, daí se retirando o seu conteúdo significante.

Em consequência do exposto, e em obediência às imposições hermenêuticas do art. 9.º, CCiv., entende-se ser de interpretar o art. 45.º, 3, CIRC, no sentido de na sua previsão não se incluírem os gastos resultantes da aplicação do justo valor em instrumentos financeiros que relevem para a formação do lucro tributável, nos termos da alínea a) do nº 9 do art. 18.º.

Atendendo à organização lógica, sistemática e racional do enquadramento jurídico da norma constante no art. 45.º, 3 do CIRC, no conjunto normativo em que a mesma se insere e que foi explanado anteriormente, denota-se uma clara incongruência entre a aplicação estrita deste preceito, conforme pretende a AT e os resultados implícitos (e erróneos) a que essa aplicação conduz.

Nomeadamente, operando-se uma aplicação rigorosa do art. 45.º, 3 do CIRC temos uma violação clara do princípio da equidade.

As correcções efectuadas pela AT denotam uma aplicação estrita da lei, mesmo que em termos contabilísticos se detecte que esse procedimento falha. De facto, a AT não é responsável pela interpretação das normas jurídicas. No entanto, cabe-lhe propugnar pela congruência dos resultados contabilísticos obtidos com os seus actos de correcção. Não foi este o procedimento que a AT respeitou. Olhando apenas para o art. 45.º, 3 do CIRC, a AT aplicou esta norma indiscriminadamente.

As correcções operadas pela AT aquando da sua inspecção parcial à Requerente resultaram de um erro na interpretação da lei fiscal, tentando fazer uma interpretação restrita do art. 45.º. 3 do CIRC, na redacção à data dos factos, que se mostra totalmente incompatível com o novo método de mensuração que passou a vigorar.

Em suma: todas as correções feitas pela AT neste Processo resultaram do mesmo vício na interpretação da lei fiscal que consistiu em tentar fazer uma interpretação extensiva do nº 3 do artigo 45º do CIRC na redação à data do litígio totalmente incompatível com um novo método de mensuração que passou a permitir, em certos e limitados casos, uma tributação com base em ganhos ou perdas potenciais e não efetivos.

Em razão do que se conclui pela ilegalidade das liquidações de imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas impugnadas pela Requerente e objeto dos autos, por errada aplicação do regime do art. 45.º, 3, do CIRC, enfermando os respectivos actos tributários de vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de direito.

 

III – DECISÃO

Em consequência do exposto acordam os árbitros que constituem este Tribunal Arbitral em julgar totalmente procedente o pedido de declaração de ilegalidade dos acto de liquidação de imposto objeto deste pedido de pronúncia arbitral (nºs 2014… e 2014…, referentes aos exercícios de 2010 e de 2011 – cf. Notas de Liquidação que foram juntas pela Requerente com os nºs 1 e 2), com as consequências legais inerentes.

 

•          Valor do processo: De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2 do CPC e artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor correspondente às correcções efectuadas pela Administração Tributária, ou seja, €184.759,37 (cento e oitenta e quatro mil seiscentos e cinquenta e nove euros e trinta e sete cêntimos).

•          Custas: Fixa-se o montante das custas em € 3.672,00 (artigo 2º-1, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e Tabela I anexa), ficando o respectivo pagamento a cargo da Requerida.

*

Lisboa e CAAD, 5 de Outubro de 2015                        

 

O Tribunal,

 

José Poças Falcão

(Presidente)

 

 

 

 

 

Ricardo Marques Candeias

(Vogal)

 

 

 

 

 

Luís Janeiro

(Vogal)

 

 

 

***

Texto elaborado em computador, nos termos do n.º 5 do artigo 131.º do CPC, aplicável por remissão da alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20/01.

A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia antiga.