Processo n.º 120/2015-T
Os Árbitros Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, Dr. Hélder Faustino e Dr. Ricardo Marques Candeias, designados pelo Conselho Deontológico do CAAD para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 04-05-2015, acordam no seguinte:
1. Relatório
A…, S.A., pessoa colectiva n.º …, com sede na Rua …, n.º …, 1.º andar, …-… …, notificada do Despacho da Senhora Subdirectora Geral dos Impostos, de 24-10-2014, que determinou o indeferimento do recurso hierárquico interposto contra o acto de liquidação de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares - IRS (Retenções na Fonte) n.º 2012 … e dos correspondentes Juros Compensatórios n.ºs 2012 … a 2012 …, no montante global de € 208.778.10, veio apresentar, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante “RJAT”), pedido de pronúncia arbitral com vista à anulação daqueles actos.
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (AT).
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 23-02-2015.
O Conselho Deontológico do CAAD designou como Árbitros os signatários que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
Nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 7 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do CAAD informou as Partes dessa designação em 15-04-2015.
Assim, em conformidade com o preceituado no n.º 7 artigo 11.º do RJAT, decorrido o prazo previsto no n.º 1 do artigo 13.º do RJAT sem que as Partes nada viessem dizer, o Tribunal Arbitral Colectivo ficou constituído em 04-05-2015.
A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou Resposta, defendendo a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.
Por despacho de 04-09-2015, foi decidido dispensar a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e, com a concordância das Partes, que fosse utilizada no presente processo a prova testemunhal produzida no processo arbitral n.º 118/2015-T e junta a respectiva gravação.
Foi ainda decidido que o processo prosseguisse com alegações escritas sucessivas.
As Partes apresentaram alegações.
O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é competente.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março) e estão devidamente representadas.
O processo não enferma de nulidades e não são suscitados obstáculos ao conhecimento do mérito da causa.
2. Matéria de facto
2.1. Factos provados
a) A Requerente é uma sociedade anónima que se dedica à actividade de cedência temporária a favor de empresas utilizadoras de trabalhadores que, para esse efeito, a Requerente contrata e remunera;
b) A empresa utilizadora que, mediante um contrato de utilização do trabalhador temporário que celebra com a Requerente, ocupa o trabalhador temporário sob a respectiva autoridade e direcção;
c) No exercício da sua actividade, a Requerente celebrou diversos contratos de trabalho temporário com trabalhadores temporários, nos quais foi estipulado o local onde os trabalhadores em causa iriam desempenhar as respectivas funções, sendo também aí expressamente previsto o pagamento de, para além da remuneração mensal base, determinadas importâncias a título de ajudas de custo;
d) Em 22-02-2012, teve início uma acção inspectiva nos termos que constam da Ordem de Serviço n.º 01 …, de âmbito geral, referente ao exercício de 2010;
e) Nessa acção inspectiva foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária que consta do documento do processo administrativo denominado «RG6.pdf», cujo teor se dá como reproduzido em que se refere, além do mais, o seguinte:
Da análise ao balancete analítico antes de apuramento de resultados do exercício de 2010, verifica-se que a A… contabilizou no mesmo, em diversas subcontas da conta POC "63-Gastas com Pessoal", verbas pagas a título de ajudas de custo aos seus funcionários, no montante anual de 1.766.666.13C€ excluindo as que já considerou rendimentos da Categoria A de IRS, no montante anual de 457.800,00€.
Da consulta às declarações Modelo 10 (anterior Anexo J) do ano de 2010 remetida à Administração Fiscal pela A..., verifica-se que, relativamente aos rendimentos do trabalho dependente (categoria A de IRS), declarou os seguintes dados:
Da análise aos valores anuais constantes neste quadro, e comparando com o total das ajudas de custo não consideradas como rendimentos da Categoria A de IRS patentes na última linha do quadro, verifica-se que as ajudas de custo atribuídas representam, 83% em 2008, 69% em 2009 e 51% em 2010, do total dos rendimentos que a A... considerou como rendimentos da Categoria A de IRS, nos quais se incluem desde logo algumas ajudas de custo que o contribuinte considerou logo à partida rendimentos da categoria A de IRS.
(...)
1.3 - Contratos de trabalho e boletins itinerários dos trabalhadores temporários
1.3.1- Contratos Trabalho.
Os contratos de trabalho celebrados pela A... com os trabalhadores temporários estabelecem, normalmente na cláusula sexta, qual o local de trabalho do trabalhador temporário, local este que corresponderá ao local de trabalho necessário previsto nos Decreto-Lei n.º 106/98. de 24 de Abril, e Decreto-Lei n º 192/95, de 28 de Julho.
O abono de quantias a título de ajudas de custo rege-se pelo mesmo regime aplicado ao pessoal da Administração Pública (Decreto-Lei n.º 106/98, de 24 de Abril, e Decreto-lei n.º 192/95, de 28 de Julho)
Nos contratos de prestação de serviços celebrados com os seus clientes, não são identificados os trabalhadores cedidos, ficando estabelecido o salário de referência para cada categoria de trabalhador (tudo incluído), bem como o valor hora a facturar pela A... por categoria por cada trabalhador cedido.
Nas facturas emitidas aos seus clientes, a A... não menciona o número de trabalhadores cedidos e não identifica os mesmos e não discrimina os valores facturados a título de prestação de serviço e a título de ajudas de custo para cada um deles, constando nas suas facturas apenas uma única rubrica "Cedência de pessoal para trabalhos na vossa obra n.º —" com a indicação do período a que respeita a facturação, sendo que na zona inferior das suas facturas surge um carimbo com o título "Declaração" seguido do seguinte texto "Para efeitos do dispositivo na alínea f) do artigo 42º do CIRC, nova redacção dada peto n.º 1 do artº 30º da Lei n.º 87-B/98, de 31 de Dezembro, declaramos que a presente factura inclui de forma expressa Ajudas de Custo no montante de ---" surgindo aposto manualmente, num espaço para o efeito o valor de ajudas de custo supostamente incluídas no total facturado.
1.3.2 - Boletins itinerários.
A A... possui boletins itinerários mensais elaborados pela própria empresa e sem a assinatura dos funcionários a que respeitam, identificando o trabalhador (nome e categoria profissional) e demonstrando os dias tipo de serviço, o local e compensação diária que originaram a sua atribuição.
Na análise por nós realizada conjuntamente com a Dr.ª B…, funcionária da A... designada para nos acompanhar durante a nossa inspecção, verificámos que grande parte das referidas ajudas de custo visam compensar os trabalhadores por deslocações por estes efectuadas aos seus domicílios necessários, localidades nas quais aceitaram contratualmente exercer a sua actividade laboral, pelo que estas compensações ora citadas consubstanciam realmente remunerações efectivas nos termos da alínea d) do n.º 3 do artigo 2 do CIRS, conjugada com o Decreto-Lei n.º 106/98, de 24 de Abril, que deveriam ter sido, aquando da sua atribuição, alvo de retenção na fonte, sendo a A..., nos termos do n.º 4 do artigo 103º do CIRS responsável solidário pelo pagamento das verbas não retidas.
A A..., pelo simples facto de os trabalhadores irem trabalhar para determinada obra da empresa utilizadora de trabalho temporário e tal implicar deslocações, entende que desse facto decorre o direito ao abono de ajudas de custo.
No entanto, compensação por deslocação em serviço só se verifica se determinado trabalhador, de determinada empresa, possuindo um determinado local de trabalho, tiver que se deslocar ao serviço da empresa a outro local, não contratualmente fixado, para aí, excepcionalmente, realizar qualquer tarefa ou função, e regressar depois ao seu local de trabalho contratualmente fixado o que não é manifestamente o caso.
Portanto, dado que a A... e os trabalhadores sabiam que o local de trabalho iria ser num local distinto da residência do trabalhador ou até mesmo num país estrangeiro, ao assinarem os contratos de trabalho tiveram oportunidade de ajustar o salário em função dessa condicionante, não relevando para o efeito a residência do trabalhador, a sede da empresa de trabalho temporário ou a sede da empresa utilizadora de trabalho temporário, pelo que não são despesas efectuadas ao serviço e em favor da entidade patronal.
Portanto, em razão do que se encontra disciplinado na alínea d) do n.º 3 do artigo 2.º do CIRS, Decreto-Lei n.º 106/98, de 24 de Abril, verifica-se que as referidas verbas não são susceptíveis de serem consideradas ajudas de custo, mas antes como já afirmado, configuram efectivas remunerações de trabalho sujeitas a IRS.
(...)
1.5 - Correcções.
Face ao exposto, não podemos deixar de concluir que as prestações auferidas a título de 'ajudas de custo' que correspondem a deslocações ao local de trabalho patente nos contratos de trabalho integravam a respectiva atribuição ou remuneração de trabalho, constituindo um complemento desta, pois foram atribuídas ao trabalhador independentemente da existência nesses mesmos dias de quaisquer deslocações ocasionais efectuadas em serviço e a favor da entidade patronal, pelo que será de considerar essas verbas como rendimentos do trabalho dependente sujeitos a IRS, nos termos do artigo 2º do CIRS e do Decreto-Lei 106/98.
Em conformidade com o n.º 1 do artigo 103º do CIRS, em caso de substituição tributária, a entidade obrigada à retenção, neste caso a A..., é responsável pelas importâncias retidas e não entregues nos cofres do Estado, ficando os substituídos desobrigados de qualquer responsabilidade no seu pagamento.
No entanto, nos termos do n.º 4 do artigo 103º do CIRS, como se trata de rendimentos sujeitos a retenção que não foram contabilizados nem comunicados como tal aos respectivos beneficiários, o substituto, a A... assume responsabilidade solidária pelo imposto não retido, no montante de € 194.355,00 referente ao ano do 2010, conforme Coluna Y da folha ("Ajudas_Custo_Tributáveis_2010") do ficheiro Excel com o título "OI2012 …_Ajudas_Custo_Tributáveis" patentes no CD com o título OI2012 …, que se encontra anexo ao presente relatório, ficheiro no qual se podem visualizar todas as rubricas inerentes à consideração da compensação atribuída aos trabalhadores como rendimento da Categoria A de IRS nos termos da alínea d) do n º 3 do artigo 2º do CIRS.
f) Em 09-08-2012, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a liquidação de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares - IRS (Retenções na Fonte) n.º 2012 … e dos correspondentes Juros Compensatórios n.ºs 2012 … a 2012 …, no montante global de € 208.778.10, sendo € 194.355,00 de IRS e € 14.423,10 de juros compensatórios (documento n.º 2, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
g) A Requerente foi notificada, em 09-08-2012, dos actos de liquidação e de juros compensatórios referidos, nestes termos:
h) A Requerente apresentou reclamação graciosa da liquidação referida que foi indeferida;
i) A Requerente interpôs recurso hierárquico da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, e foi indeferido por despacho da Senhora Subdirectora-Geral dos Impostos de 24-10-2014 (documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
j) A decisão de indeferimento do recurso hierárquico manifesta concordância com a Informação n.º …/14 reproduzida no documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido), em que se refere, além do mais, o seguinte:
B. APRECIAÇÃO DO RECURSO HIERÁRQUICO
B.1. A recorrente tem legitimidade (cf. n.º 1 do art. 9º do CPPT), o Recurso Hierárquico foi interposto em tempo e para a entidade competente em conformidade com o estabelecido no art. 66º do CPPT, e sobre a liquidação objeto dos autos não foi interposta Impugnação Judicial.
B.2. As Ajudas de Custo:
B.2.1. São importâncias atribuídas pela entidade patronal aos seus trabalhadores dependentes quando estes se desloquem ao serviço da entidade patronal, destinando-se a compensar os gastos acrescidos por essa deslocação (alimentação e alojamento) sem apresentação do documento de despesa, sendo imprescindível que a sociedade possa comprovar os encargos efetivamente suportados respeitantes a ajudas de custo através de mapa itinerário e necessário dar a conhecer o nome do beneficiário, o local e a data da deslocação, tempo e objetivo de permanência, bem como o montante diário que foi atribuído, de molde a aferir se o mesmo excede os limites legais de sujeição a IRS.
8.2.2. Têm a natureza de rendimento de trabalho dependente na parte em que excedam os limites legais ou não sejam observados os pressupostos da sua atribuição aos servidores do Estado (cf. al. d), n.º 3, do art. 2º do CIRS), recaindo sobre a Administração Tributária, o ónus da prova de tal excesso bem como de que as verbas auferidas pelo trabalhador a título de ajudas de custo não se destinam a cobrir o acréscimo de despesa por ele suportadas em resultado da deslocação de sua residência habitual.
B.3. Em termos do enquadramento jurídico-tributário das remunerações auferidas pela celebração de contratos de trabalho temporário, opera a Informação Vinculativa proferida em sede do Processo n.º …/2002, com despacho concordante datado de 2003-10-25, do Sr. Diretor-Geral dos Impostos, assim:
B.3.1 A atividade das empresas de trabalho temporário encontra-se regulada (atualmente pela Lei n.º 13/07, de 22/5) no DL n.º 358/89, de 17/10, alterado pela Lei n.º 146/99, de 1/9. A Lei n.º 99/2003, de 27/8, que aprovou o Código do Trabalho, em vigor desde 2003-12-01, revogou os artigos 26º a 30º do DL. n.º 358/89, de 17/10.
B.3.2. A celebração de contrato de trabalho, ao abrigo deste diploma, encontra-se, desde logo, condicionada pela verificação de alguma das situações previstas para a celebração do contrato de utilização.
8.3.3. O contrato de trabalho temporário é meramente instrumental do contrato de utilização: a empresa de trabalho temporário celebra os contratos de trabalho quando tem a perspetiva da celebração de um contrato de utilização e neste tem de ser identificado o local de trabalho,
B.3,4. E ainda que estes trabalhadores não tenham qualquer vínculo contratual com o utilizador, é o local em que este pretende que seja cumprido o contrato de utilização que constitui o seu local de trabalho e que, como tal deve ser identificado no contrato de trabalho temporário, como a lei exige, devendo este ser assumido como o seu domicílio necessário.
B.3.5. É, exatamente, este conceito de domicílio necessário que justifica o pagamento de Ajudas de Custo aos trabalhadores, que tendo o centro da sua atividade previamente definido, são ocasionalmente enviados pela entidade empregadora para fora da localidade onde o mesmo se situa, para aí realizarem a sua prestação, suportando encargos que a remuneração não tem em conta.
B.3.6. Essencial para aferir a existência de uma deslocação está sempre uma prévia determinação de um local para a realização da prestação, pelo que, considerar que este corresponde à sede da empresa de trabalho temporário, constituiria uma forma de ficcionar uma deslocação.
B.3.7. Tal entendimento levaria a que se considerasse que quase todos os trabalhadores contratados pelas empresas de trabalho temporário teriam direito a ajudas de custo, acabando por receber parte da contrapartida pelo seu trabalho sob aquela designação.
B.3.8. Atendendo a que a celebração do contrato de trabalho temporário tem sempre como pressuposto a existência de um cliente com quem a empresa de trabalho temporário celebrou um contrato de utilização, no momento da celebração daquele, a Empresa de Trabalho Temporário já conhece o local de trabalho do trabalhador contratado pelo que a remuneração terá que ser acordada em função das despesas adicionais que o mesmo vai ter da suportar, nomeadamente, se o local de trabalho for em país diverso.
B.3.9 A remuneração, assim determinada, é considerada retribuição e, como tal, esta sujeita a tributação como rendimento da categoria A do IRS, neste sentido a jurisprudência constante do acórdão do TCAN, Proc. n.º 01006/04.6BEBRG, de 2007-11-08.
B.4. Feito o enquadramento jurídico-tributária das remunerações auferidas pela celebração de contratos de trabalho temporário, importa decidir sobre cada uma das alegações formuladas pela recorrente, assim:
Da ilegalidade do procedimento inspetivo
B.4.1. Em causa aferir se as eventuais irregularidades imputáveis ao procedimento de Inspeção tributária instaurado contra a recorrente, inquinam a liquidação objeto dos autos, designadamente pelo facto da Nota de Diligência ter sido notificada à recorrente já depois da data de elaboração e sancionamento do projeto de RIT, em violação do disposto nos arts. 60º e 61º do RCPIT.
B.4.2. Tem sido doutrina e jurisprudência sancionada pelos Tribunais, ainda que em sede do exercício do direito de audição, de que a preterição de formalidade pode, em certos e específicos casos, degradar-se em formalidade não essencial, sem que daí resulte qualquer ilegalidade determinante da anulação do ato de liquidação.
Assim, e nos autos, verifica-se que a recorrente foi notificada pessoalmente à data de 2011-11-28 (cf. fls. 133 a 136 da RG) do projeto de RIT, a mesma data em que lhe foi notificada a Nota de Diligência, que respeita à conclusão dos atos de inspecão, não advindo daí qualquer restrição no exercício do direito subsequente de audição prévia, que foi exercido pela recorrente e cujos argumentos foram identificados e tidos em conta na decisão constante do RIT final, pelo que se mostra de improceder a presente alegação,
Da preterição de formalidade legal essencial
B.4.3. Na petição de Reclamação Graciosa, invocam-se duas alegações, uma relativa ao não cumprimento do disposto no art. 40º do CPPT, por não terem os mandatários sido notificados da liquidação objeto dos autos, a outra, por a notificação em causa realizada à reclamante na qualidade de sociedade comercial não ter sido efetuada na forma pessoal, como resulta do art. 41º do CPPT.
B.4.4. Sobre estas alegações, a fundamentação aduzida no projeto de indeferimento da Reclamação Graciosa (cf. item 8 a fls. 156 - 157 da RG), não foi objeto de contestação em sede do exercício do direito de audição materializado em 2012-06-29, nem novamente alegadas na petição de Recurso Hierárquico, exceto a da recorrente não ter sido notificada nos termos previstos na al. a) do n.º 1 do art. 60º da LGT - falta de audiência prévia antes da liquidação, o que é de improceder pois este não é o meio próprio para analisar o requerido dado não ter sido objeto da decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa.
Da falta da fundamentação do ato de liquidação
B.4.5. Na doutrina e jurisprudência, é assente que a fundamentação há-de ser:
B.4.5.1 Expressa: exposição sucinta dos fundamentos de facto e de direito da decisão.
B.4.5.2. Clara: permitindo através do seus termos que se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide.
B.4.5.3. Suficiente: possibilita ao administrado/contribuinte, um conhecimento concreto da motivação do ato, das razões de facto e de direito que determinaram o órgão ou agente a atuar como atuou.
B.4.5.4. Congruente: de molde s que a decisão constitua conclusão lógica a necessária dos motivos invocados como sua justificação, envolvendo entre eles um juízo de adequação, não podendo existir contradição entre os fundamentos e a decisão (cf. STA, Proc. 0759/06, de 15-11-2006).
B.4.5.5. A fundamentação é um conceito relativo que varia em função do tipo lega de ato, que visa responder às necessidades de esclarecimento do administrado/contribuinte, procurando-se através dela informá-lo do itinerário cognoscitivo e valorativo do ato e permitir-lhe conhecer as razões, de facto e de direito, que determinaram e porque motivo se decidiu num sentido e não outro, pelo que um ato está fundamentado sempre que o administrado/contribuinte, na posição de destinatário normal, fica devidamente esclarecido acerca das razões que o motivaram, ficando consequentemente habilitado a impugná-lo convenientemente nos termos da al. c) do art. 99 do CPPT.
B.4.5.6. Todavia, a fundamentação não necessita de ser uma exaustiva descrição de todas as razões que estivaram na base da decisão, basta que se traduza numa "sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito" ou ato numa "mera conclusão de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, Informações ou propostas que constituirão neste caso parte integrante do respetivo ato, nos termos do art. 125º do CPA, a que se designa fundamentação por adesão ou remissão (cf. STA Proc. 742/03, de 26-05-2004, Proc. 0759/06, de 15-11-2006, Proc. 0247/08 de 04-06-2006).
B.4.6. Os atos praticados pela AT no decurso da ação de inspeção tributária, esclarecem convenientemente a recorrente das razões que motivaram as correções, depois, estando em causa atos de liquidação de IRS, a lei não exige para o efeito senão a observância dos requisitos gerais de fundamentação constantes dos n.ºs 1 e 2 do art. 77º da LGT, materializada de forma "padronizada" e "informatizada", atenta a natureza de "processo de massa" destas liquidações (cf. STA, Proc. 0246/09, de 17-08-2009),
Mas ainda que a nota de liquidação de Retenções na Fonte de IR do ano de 2010 (cf. fls. 25 da RG), não refira expressamente a título informativo que a sua origem esteve na ação inspetiva, esses documentas são sempre passíveis de implicitamente serem correlacionados, é que sendo a recorrente notificada do RIT, aí era informada da realização a breve prazo da respetiva liquidação, constando do RIT os valores de fixação do rendimento coletável, igualmente plasmados na respetiva nota de liquidação, pois essa circunstância de ausência expressa a título informativo, não impediria a recorrente de Reclamar Graciosamente da liquidação, dado que sempre lhe foi facultada a fundamentação constante do RlT (incluindo o projeto), que esteve na sua génese, não podendo dizer-se que daí tenha resultado prejuízo para a sua defesa (cf. STA, Proc. 0246/09, de 17/6),
Da nulidade da liquidação por inexistência do facto tributário
B.4.7. Resulta dos autos estarmos na presença de remunerações decorrentes da celebração de contrato de trabalho temporário, que inclusive consignam o pagamento de ajudas de custo (Cf. fls, 37 da RG), e sobre este tipo de abonos, como se referiu no item B.3., em face do enquadramento jurídico-tributário firmado na Informação Vinculativa (Proc. …/2002), com despacho concordante datado de 2003-10-25, do Sr. Diretor-Geral dos Impostos, a remuneração (ajudas de custo), assim determinada, é considerada retribuição e, como tal, está sujeita a tributação como rendimento da Categoria A do IRS, peto que tendo em conta a previsão do n.º 1 do art. 68º-A da LGT, este enquadramento vincula a AT.
B.4.8. Questão diversa prende-se com a imputação da responsabilidade solidária, nos termos do n.º 4 do art. 103º do CIRS, relativamente ao valor das retenções na fonte não efetuadas sobre os abonos em questão, sobre a qual a recorrente deduziu vasta fundamentação, vejamos:
B.4.8.1. Estando em causa retenções na fonte com natureza de pagamento por conta, opera o mecanismo de substituição tributária quando a lei determina que a prestação tributária seja exigida a pessoa diferente do contribuinte (cf. art. 20º da LGT), cabendo ao substituído - pessoa quanto à qual se verificam os factos tributários (verdadeiro contribuinte ou trabalhador) a responsabilidade originária pelo imposto não retido e ao substituto - ligado ao contribuinte por uma relação subjacente de direito privado, nos termos da qual é devedor da prestação de rendimentos (entendida abonadora dos rendimentos), a responsabilidade subsidiária, ficando este ainda sujeito aos juros compensatórios devidos desde o termo do prazo de entrega até ao termo do prazo para a apresentação da declaração peio responsável originário ou até à data da entrega do imposto retido, se anterior (cf. n.º 2 do art. 27º da LGT).
B.4.8.2. Todavia, na redação dada pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, com entrada em vigor a 2007-01-01, a Lei do OE2007 veio aditar o n.º 4 ao art. 103º do CIRS, dispondo que "Tratando-se de rendimentos sujeitos a retenção que não tenham sido contabilizados nem comunicadas como tal aos respetivos beneficiários, o substituto assume a responsabilidade solidária pelo imposto não retido."
B.4.8.3. Sobre o alcance desta norma, referencia o Relatório OE2007 de que se trata da instituição de um regime de responsabilização solidária do substituto pelo imposto não retido aos beneficiários dos rendimentos em situações qualificada como práticas fraudulentas relacionadas com a omissão ou redução do montante das remunerações pagas, seja pela sua não contabilização, seja pela sua caracterização como rendimentos não sujeitos a tributação (v,g. ajudas de custo).
B.4.8.4. Citando Manuel Faustino, esta alteração veio conferir base legal à liquidação imediata do montante das retenções que deveriam ter sido efetuadas e não o foram à própria entidade devedora, acrescidas, naturalmente, dos correspondentes juros compensatórios, mas que se deveria ter definido o substituto também como responsável subsidiário e definido a responsabilidade subsidiária como solidária, o que nem sequer é novo, porque os responsáveis subsidiários são, em regra, solidários entra si, não consagrando a alteração em causa, para os titulares dos rendimentos, o direito de invocaram, na declaração de rendimentos, que necessária a sequencialmente vão ter de apresentar caso não o tenham feito antes, o valor da "retenção" que a AT tiver "liquidado" ao substituto, sob pena de se cobrar o mesmo imposto a dois sujeitos passivos distintos, incorrendo, aparentemente, no que tecnicamente se denomina de "duplicação de coleta".
B.4.8.5. Tendo em conta a redação estabelecida no n.º 4 do art. 103 do CIRS, improcede a alegação de que a responsabilidade solidária opere na fase da cobrança executiva, pois, não cabe à AT, nos termos do art. 281º da CRP, apreciar o vício de inconstitucionalidade relativo ao princípio constitucional da capacidade contributiva, por violação do disposto nos n.ºs 1 e 2 do art. 104º do CRP.
Da ilegalidade da liquidação dos juros compensatórios
B.4.9. Em relação aos juros compensatórios, os mesmos são devidos quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do Imposto retido ou a reter no âmbito da substituição tributária (cf. n.º 1 do art. 35º da LGT, e n.º 1 do art. 91º do CIRS), contando-se dia a dia desde o termo do prazo de entrega do imposto retido ou a reter, até à cessação da falta que motivou o retardamento da liquidação (cf. n.º 3 do art. 35º da LGT), integrando-se na própria dívida do imposto, com a qual são conjuntamente liquidados (cf. n.º 8 do art. 35º da LGT), sendo que a liquidação deva sempre evidenciar claramente o montante principal da prestação e os juros compensatórios, explicando com clareza o respetivo cálculo e distinguindo-as de outras prestações devidas (cf. n.º 9 do art. 35º da LGT).
B.4.9.1. Na jurisprudência dos Tribunais, é dado como assente que a mínima fundamentação exigível em matéria de atos de liquidação de juros compensatórios nem sequer refira a norma legal ao abrigo do qual os juros compensatórios foram liquidados, pois é do conhecimento geral que se o atraso na liquidação do Imposto devido for imputável ao contribuinte haja lugar à liquidação de juros compensatórios, que a mesma se baste com a mera referência ao ato omitido que o originou, ao montante de imposto sobre o qual foram liquidadas os juros compensatórios, à taxa ou taxas aplicáveis e ao período de tempo em que tais juros compensatórios são exigíveis (cf. STA, Proc. 0928/11, de 29-02-2012), constando da nota da liquidação todos os elementos atrás referenciados, inclusive a referência de que para consulta, na totalidade, das demonstrações de liquidação deverá dirigir-se a um Serviço de Finanças, igualmente constando do RIT, um capítulo específico para as infrações verificadas, improcedendo as alegações invocadas nesta matéria, não se apreciando a relativa à preterição de formalidade legai essencial, ao arrepio do disposto no art. 60º da LGT, por a mesma não ter sido objeto da decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa.
k) A Requerente prestou garantia bancária até ao limite de € 265.473,98, para suspender a execução fiscal n.º … 2012 …, instaurada para cobrança da quantia liquidada de € 208.778,10, acrescida de juros de mora no montante de € 921,83 e custas no valor de € 762,09 (documentos n.ºs 7 e 8, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
l) Em 20-02-2015, a Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao presente processo.
2.2. Factos não provados
Não se provou que a Requerente tivesse prestado o «depósito de caução» que no artigo 159.º do pedido de pronúncia arbitral pretendeu provar com o documento n.º 8, pois este documento não lhe faz qualquer referência.
2.3. Fundamentação da decisão da matéria de facto
Os factos dados como provados com base nos documentos juntos com o pedido de pronúncia arbitral e no processo administrativo, não havendo controvérsia sobre eles.
A prova testemunhal obtida através de gravação não se afigura relevante para apreciar as questões que são colocadas pela Requerente.
3. Matéria de direito
3.1. Ordem de conhecimento dos vícios
De harmonia com o disposto no artigo 124.º do CPPT, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, do RJAT, não sendo imputados aos actos impugnados vícios que conduzam à declaração de inexistência ou nulidade, nem indicada uma relação de subsidiariedade, a ordem de apreciação dos vícios deve ser a, que segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz à tutela dos interesses ofendidos.
No caso em apreço, interpretando o pedido de pronúncia arbitral, infere-se que a Requerente pretende que seja apreciado, em primeiro lugar, vício de falta de fundamentação e, depois, vício de preterição de direito de audição.
Em seguida, a Requerente diz que «todavia, por mera cautela, sempre sem conceder, importa ainda dizer e ponderar o seguinte:» (artigo 38.º do pedido de pronúncia arbitral), passando a imputar aos actos impugnados vícios de inexistência o facto tributário e de violação princípios constitucionais e legais, ilegalidade do procedimento administrativo e ilegalidade da liquidação de juros compensatórios (por vício de forma e de vício de violação de lei).
Da expressão utilizada, «por mera cautela», poderia inferir-se, numa primeira análise, que a Requerente apenas imputa este último vício subsidiariamente, como precaução para a hipótese de improcederem os dois primeiros vícios.
No entanto, no artigo 47.º do pedido de pronúncia arbitral a Requerente refere que «conforme resulta do Relatório de Inspecção Tributária elaborado por referência ao exercício de 2010 - cuja relação com o acto de liquidação ora contestado se desconhece, mas se admite, por uma questão de cautela, ainda que sem conceder -, as correcções aí efectuadas estão relacionadas com os seguintes factos», o que permite concluir que a Requerente não pretende que não sejam apreciados os vícios de vício de violação de lei que a seguir imputa às liquidações impugnadas.
No caso em apreço, o que a Requerente defende, em primeira linha, é que, na falta de uma remissão expressa no acto de liquidação para o Relatório da Inspecção Tributária não poderá entender-se que esta se baseie nele, mas, se assim não se entender, deverá anular-se o acto por vício de violação das normas da LGT, do CIRC e princípios e normas constitucionais que invoca, para além de ilegalidade do procedimento inspectivo.
Apreciar-se-ão os vícios tendo em conta esta posição assumida pela Requerente, mas apreciar-se-á a questão da falta de fundamentação das liquidações de juros compensatórios conjunto com a questão da falta de fundamentação da liquidação de IRS, atenta a sua afinidade.
3.2. Vício de falta de fundamentação
A Requerente imputa ao acto impugnado vício de falta de fundamentação em duas vertentes: numa delas, reporta-se à globalidade do acto de liquidação, em que se inclui o valor dos juros compensatórios, defendendo, em suma, que não há nele indicação das normas legais em que assenta qualquer remissão explícita para qualquer documento que contenha essa fundamentação; para além disso, relativamente às liquidações de juros compensatórios, a Requerente imputa vício ainda por não ser «feita qualquer referência a que o suposto retardamento da liquidação do imposto resulta de facto imputável ao contribuinte».
3.2.1. Questão da falta de fundamentação quanto à parte da liquidação relativa ao IRS (retenções na fonte)
A exigência de fundamentação de actos administrativos lesivos consta do n.º 3 do artigo 268.º da CRP, em que se estabelece que «os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei, e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos».
Especialmente para a fundamentação dos actos tributários, o artigo 77.º, n.ºs 1 e 2, da LGT, estabelece que «a decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária» e que «a fundamentação dos actos tributários pode ser efectuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo».
O Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a entender uniformemente que a fundamentação do acto administrativo ou tributário é um conceito relativo que varia conforme o tipo de acto e as circunstâncias do caso concreto, mas que a fundamentação é suficiente quando permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do acto para proferir a decisão, isto é, quando aquele possa conhecer as razões por que o autor do acto decidiu como decidiu e não de forma diferente, de forma a poder desencadear dos mecanismos administrativos ou contenciosos de impugnação. ( [1] )
Embora seja de distinguir entre o acto de liquidação e o acto de notificação através do qual ele é comunicado ao destinatário, no caso em apreço não se provou que haja qualquer outro documento referente ao acto de liquidação que não seja o que está reproduzido no documento n.º 2 junto com o pedido de pronúncia arbitral, pelo que se tem de partir do pressuposto que ele é cópia do acto que foi praticado, que não terá outro conteúdo para além do que dele consta.
Pelo documento referido constata-se que dele consta apenas, quanto ao imposto:
– o ano a que respeita;
– a indicação de que se trata de «RETENÇÕES NA FONTE DE IR» e de «trabalho dependente»;
– a quantia liquidada;
– uma referência ao «período a que respeita o imposto» em que se indicam os números de 01 a 12.
Quanto aos juros compensatórios, indica-se a forma como foram calculados, designadamente os valores base, os períodos a que respeitam, a taxa aplicada e o valor correspondente a cada período.
Não se faz qualquer referência a qualquer acto inspectivo anterior, ou qualquer relatório da inspecção tributária ou a qualquer outro documento que possa ser considerado fundamentação do acto de liquidação.
É, assim, manifesto que o acto de liquidação não está fundamentado nos termos exigidos pelo artigo 77.º, n.ºs 1 e 2, da LGT, pois, para além de não conter «exposição das razões de facto e de direito» em que baseia, não contém sequer qualquer declaração de concordância com os fundamentos de qualquer outro acto, designadamente o Relatório da Inspecção Tributária referido nos autos.
Na verdade, como bem refere Autoridade Tributária e Aduaneira na sua Resposta, a fundamentação «deve ser clara, suficiente e congruente, demonstrativa das razões de facto e de direito da decisão, por forma a permitir que um destinatário normal possa compreender o sentido e alcance da desta».
No caso em apreço, mesmo que se considerasse que a indicação dos meses a que se reportam as «retenções na fonte» e a indicação de que se trata de imposto sobre o rendimento derivado de «trabalho dependente» constituem suficiente exposição das razões de facto em que se baseia a liquidação, é incontornável a falta de fundamentação relativamente às razões de direito que a motivaram, cuja exposição tem de constar do acto, directamente ou através de uma declaração de concordância com as que constem de outro documento.
Por outro lado, a tese defendida pela Autoridade Tributária e Aduaneira de que «a circunstância de nela terem sido identificadas as liquidações como respeitantes a retenções na fonte e juros compensatórios do ano 2008, no montante global de € 127.763,02, permitia a qualquer destinatário, com o nível de conhecimento técnico e assessoria da Requerente, associá-las ao Relatório dos Serviços de Inspecção, de cuja fundamentação lhe havia sido recentemente notificada» ( [2] ) não permite suprir a deficiência de fundamentação que consiste em não haver qualquer alusão ao Relatório da Inspecção Tributária que possa considerar-se como uma «declaração de concordância» com ele, pois, em face da exigência constitucional de que a fundamentação seja expressa (artigo 268.º, n.º 3, da CRP), é imprescindível que essa «declaração» tenha um mínimo de suporte textual.
Para além disso, relativamente aos juros compensatórios, o próprio Relatório da Inspecção Tributária é completamente omisso quanto às razões de facto e de direito por que a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu serem devidos e a simples indicação dos períodos e taxa que foram utilizados no seu cálculo, mesmo que esclareça alguns dos pressupostos de facto, nada revela sobre os fundamentos de direito.
Neste contexto, sendo manifesto que a liquidação impugnada enferma de vício de falta de fundamentação, a questão que se coloca, que a Autoridade Tributária e Aduaneira aborda no artigo 24.º da Resposta, é a de saber a relevância que se pode atribuir ao facto de, pelo pedido de pronúncia arbitral, se poder concluir «que a Requerente bem compreendeu a essência de todos os pressupostos que sustentaram os actos tributários sindicados» e que «houve a assimilação de todo o percurso decisório da AT nas correcções e subsequentes liquidações que promoveu».
De facto, decorre do pedido de pronúncia arbitral e das impugnações administrativas que o precederam que a Requerente se apercebeu de que o Relatório da Inspecção Tributária estava subjacente às correcções efectuadas, cuja fundamentação foi expressamente assumida nas decisões da reclamação graciosa e do recurso hierárquico, que precederam a apresentação do pedido de pronúncia arbitral.
É certo que a fundamentação sucessiva ou a posteriori de actos tributários ou administrativos não é admissível, como vem sendo pacificamente. ( [3] )
No entanto, é admissível, dentro do respectivo condicionalismo legal, a revogação de actos administrativos válidos (art. 140.º do CPA) ou inválidos (art. 141.º do mesmo Código), e a sua substituição por outros com diferente fundamentação, o que, no caso de o primitivo acto enfermar de vício de falta de fundamentação ou ela for errada, configurará ratificação-sanação.
Na verdade, tem sido admitida pelo Supremo Tribunal Administrativo a possibilidade de convalidação de actos que enfermem de vício de forma por falta de fundamentação ( [4] ), designadamente através de um acto posterior praticado por entidade com poderes de reexame que mantenha o acto impugnado com alteração da fundamentação, o que tem suporte legal na previsão genérica da possibilidade de ratificação de actos anuláveis, prevista no art. 137.º do CPA de 1991 e no art. 79.º, n.º 1, da LGT. Porém, tal possibilidade só pode ser reconhecida nos casos em que estiverem satisfeitos os objectivos que se visam com a imposição legal da fundamentação dos actos administrativos, designadamente a nível da ponderação do autor do acto e das garantias de impugnação contenciosa. Por isso, só se poderá aceitar a convalidação do acto com base na fundamentação posterior adoptada por entidade com poderes de reexame se, por um lado, os elementos nela invocados não forem posteriores à prática do acto e não sejam elementos que não tenham sido considerados pelo seu autor ao praticá-lo e, por outro lado, se essa fundamentação for levada ao conhecimento dos destinatários a tempo de não prejudicar o seu direito de impugnação contenciosa. ( [5] )
No contencioso tributário os poderes das entidades competentes para o conhecimento das impugnações administrativas, designadamente a reclamação graciosa e o recurso hierárquico, abrangem sempre a globalidade da decisão recorrida, como se infere do n.º 3 do art. 47.º do CPPT, ao falar de «reapreciação da decisão». Por isso, o recurso hierárquico no contencioso tributário assume «a natureza do recurso de tipo reexame e não recurso de revisão (os recursos de reexame são aqueles que, incidindo sobre uma realidade mais ampla, implicam efectivamente um novo exame da causa, e os recurso de revisão são aquele que têm apenas por objecto o acto recorrido)». ( [6] )
No caso em apreço, apesar da falta de referência expressa à fundamentação no acto de liquidação, a Requerente impugnou-o através de reclamação graciosa e de recurso hierárquico, em cujas decisões ficou claro que a fundamentação do acto de liquidação é a que consta do Relatório da Inspecção Tributária que antecedeu a liquidação, que foi adoptada, no essencial, por último, na decisão do recurso hierárquico como se vê pela reprodução parcial da respectiva decisão que se incluiu na alínea j) da matéria de facto fixada.
Por outro lado, quanto ao IRS, a quantia liquidada é exactamente a que foi indicada no Relatório da Inspecção Tributária, pelo que não há razão para duvidar que foi com base neste Relatório que foi efectuada a liquidação e, tendo o pedido de pronúncia arbitral sido apresentado na sequência da notificação da decisão do recurso hierárquico, tem de se concluir que pode considerar-se convalidado o acto de liquidação do IRS, na linha da jurisprudência citada.
Para além disso, esta fundamentação foi levada ao conhecimento da Requerente a tempo de exercer adequadamente o direito de impugnação contenciosa, que a Requerente efectivamente exerceu, como se constata pelo pedido de pronúncia arbitral.
Assim, a liquidação de IRS deve considerar-se convalidada quanto à falta de fundamentação, pela decisão do recurso hierárquico, pelo que o vício originário da liquidação não tem eficácia invalidante.
3.2.2. Questão da falta de fundamentação quanto à parte da liquidação relativa aos juros compensatórios
No que concerne às liquidações de juros compensatórios constata-se que há também falta de fundamentação, pois aquelas limitam-se a referir os períodos e a taxa que foram considerados para calcular os juros e no Relatório da Inspecção Tributária nada se refere sobre juros compensatórios.
A exigência de juros compensatórios não decorre necessariamente da constatação da existência de numa correcção a efectuar.
Na verdade, o artigo 35.º, n.º 1, da LGT estabelece que «são devidos juros compensatórios quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente, ou retido ou a reter no âmbito da substituição tributária».
A responsabilidade objectiva é excepcional, só ocorrendo nos casos especificados na lei (art. 483.º, n.º 2, do Código Civil) e, por isso, deverá entender-se que, para efeitos de responsabilidade por juros compensatórios, só se está perante um «facto imputável ao sujeito passivo» quando puder formular-se um juízo de censura em relação à sua conduta.
Nesta linha, o Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a entender, uniformemente, que a imputabilidade exigida para responsabilização pelo pagamento de juros compensatórios depende da existência de culpa, por parte do contribuinte. ( [7] )
Perante a falta de indicação na liquidação e no Relatório da Inspecção Tributária da razão por que se entendeu que são devidos juros compensatórios, fica-se sem saber se a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que a responsabilidade por juros compensatórios é automática, decorrendo do próprio facto de terem sido efectuadas correcções, ou se concluiu que se pode formular um juízo de censura em relação à actuação da Requerente, susceptível de preencher o requisito da imputabilidade, situação em que a fundamentação deveria conter indicação dos factos subjacentes a esse juízo de censura.
Por outro lado, o esclarecimento no recurso hierárquico das razões da liquidação de juros compensatórios, sem qualquer indicação que permita concluir que elas foram ponderadas pela entidade que procedeu à liquidação é uma fundamentação a posteriori, que é pacífico ser irrelevante para efeitos de aferir a legalidade dos actos tributários.
Aliás, contendo o artigo 35.º várias situações em que se pode justificar a liquidação de juros compensatórios, uma fundamentação expressa e suficiente exigiria que se indicasse em qual parte daquele artigo se entendeu enquadrar-se a actuação da Requerente.
Em qualquer caso, há falta de fundamentação relativa à verificação de todos os requisitos previstos no artigo 35.º, n.º 1, da LGT, pelo que a liquidação de juros compensatórios enferma de vício de falta de fundamentação.
Não havendo no Relatório da Inspecção Tributária qualquer referência aos juros compensatórios, não se coloca em relação as liquidações de juros compensatórios a referida possibilidade de convalidação, pois é indispensável para esta ser viável que se possa concluir que as razões invocadas na impugnação administrativa foram efectivamente ponderadas pelo autor do acto.
Por isso, as liquidações de juros compensatórios impugnadas enfermam de vício de falta de fundamentação.
3.3. Preterição do direito de audição
A Requerente imputa ao acto impugnado vício procedimental, por não lhe ter sido proporcionada audição prévia, nos termos do artigo 60.º, n.º 1, alínea a), da LGT.
A Autoridade Tributária e Aduaneira entende que a Requerente não tem razão, invocando, em suma, a dispensa que decorre do n.º 3 do art. 60.º da LGT, já que a Requerente exerceu o direito de audição no procedimento de inspecção.
O artigo 60.º da LGT estabelece o seguinte:
Artigo 60.º
Princípio da participação
1. A participação dos contribuintes na formação das decisões que lhes digam respeito pode efectuar-se, sempre que a lei não prescrever em sentido diverso, por qualquer das seguintes formas:
a) Direito de audição antes da liquidação;
b) Direito de audição antes do indeferimento total ou parcial dos pedidos, reclamações, recursos ou petições;
c) Direito de audição antes da revogação de qualquer benefício ou acto administrativo em matéria fiscal;
d) Direito de audição antes da decisão de aplicação de métodos indirectos, quando não haja lugar a relatório de inspecção;
e) Direito de audição antes da conclusão do relatório da inspecção tributária.
2 - É dispensada a audição:
a) No caso de a liquidação se efectuar com base na declaração do contribuinte ou a decisão do pedido, reclamação, recurso ou petição lhe seja favorável;
b) No caso de a liquidação se efectuar oficiosamente, com base em valores objectivos previstos na lei, desde que o contribuinte tenha sido notificado para apresentação da declaração em falta, sem que o tenha feito.
3 - Tendo o contribuinte sido anteriormente ouvido em qualquer das fases do procedimento a que se referem as alíneas b) a e) do n.º 1, é dispensada a sua audição antes da liquidação, salvo em caso de invocação de factos novos sobre os quais ainda se não tenha pronunciado.
4. O direito de audição deve ser exercido no prazo a fixar pela administração tributária em carta registada a enviar para esse efeito para o domicílio fiscal do contribuinte.
5. Em qualquer das circunstâncias referidas no n.º 1, para efeitos do exercício do direito de audição, deve a administração tributária comunicar ao sujeito passivo o projecto da decisão e sua fundamentação.
6. O prazo do exercício oralmente ou por escrito do direito de audição é de 15 dias, podendo a administração tributária alargar este prazo até o máximo de 25 dias em função da complexidade da matéria.
7. Os elementos novos suscitados na audição dos contribuintes são tidos obrigatoriamente em conta na fundamentação da decisão.
O direito de audição tem raiz constitucional, sendo postulado pelo artigo 267.º, n.º 5, da CRP, que estabelece que «o processamento da actividade administrativa será objecto de lei especial, que assegurará a racionalização dos meios a utilizar pelos serviços e a participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito».
Mas, como decorre desta norma, a Constituição não regula o regime do direito de audição, relegando para a «lei especial» a definição dos termos em que tal direito será exercido, termos estes em que poderão ser tidos em conta factores de vária ordem, inclusivamente de natureza económica e de praticabilidade.
É neste contexto que o n.º 3 do artigo 60.º da LGT, invocado pela Autoridade Tributária e Aduaneira no presente processo, prevê situações em que é dispensada a audição prévia antes da liquidação.
No caso dos autos, não é controvertido no presente processo que a alínea a) do n.º 1 do artigo 60.º da LGT garante aos contribuintes o direito de audição antes da liquidação, o que resulta do teor expresso desta norma, pelo que a questão a apreciar se reconduz a saber se se está perante uma situação em que audição antes da liquidação é dispensada pelo n.º 3 do mesmo artigo.
Este n.º 3 dispensa o direito de audição antes da liquidação se o contribuinte tiver sido anteriormente ouvido em qualquer das fases do procedimento a que se referem as alíneas b) a e) do n.º 1, salvo em caso de invocação de factos novos sobre os quais ainda se não tenha pronunciado.
No caso em apreço, a Requerente teve a possibilidade de exercer o direito de audição com base no projecto de Relatório da Inspecção Tributária, que é uma situação enquadrável na alínea e) do n.º 1 do artigo 60.º da LGT, pelo que, em princípio, se está perante uma potencial situação de aplicação da dispensa do direito de audição antes da liquidação.
Por isso, a necessidade de assegurar o direito de audição antes da liquidação só pode resultar da excepção prevista na parte final do n.º 3, isto é, de nela terem sido invocados factos sobre os quais o contribuinte ainda não teve previamente a possibilidade de se pronunciar.
Examinando a liquidação e o projecto de Relatório da Inspecção Tributária, que serviu de base ao exercício do direito de audição, constata-se que o único ponto sobre o qual a Requerente não teve oportunidade de se pronunciar é o dos juros compensatórios, pois a Requerente não incluiu no projecto de Relatório da Inspecção Tributária qualquer referência a juros compensatórios, só vindo a introduzi-la na parte final do próprio Relatório da Inspecção Tributária, depois de a Requerente já ter exercido o direito de audição.
Como a Autoridade Tributária e Aduaneira esclarece na decisão do recurso hierárquico, a liquidação de juros compensatórios teve por base o entendimento de que houve um retardamento da liquidação de IRS imputável à Requerente, pelo que tem de se concluir que nas liquidações de juros compensatórios a Autoridade Tributária e Aduaneira teve em consideração factos novos, inerentes à formulação de juízos sobre a existência do nexo de causalidade e de culpa.
Por isso, tem de se concluir que, quanto às liquidações de juros compensatórios, não se está perante uma situação de dispensa de audição antes da liquidação, pelo que a sua preterição constitui preterição de formalidade legal, como defende a Requerente.
Deve notar-se que, apesar de ser a consideração de novos factos ínsita na imposição dos juros compensatórios que justifica o afastamento da dispensa do direito de audição antes da liquidação, tratando-se de uma formalidade do procedimento de liquidação que deveria preceder o acto final, a sua preterição implica a invalidade do próprio acto final do procedimento de liquidação, não se colocando em relação a este vício a possibilidade de divisão do acto, para efeitos de anulatórios.
Isto é, não sendo caso de dispensa, o direito de audição tinha de ser assegurado antes do acto de liquidação, por força da alínea a) do n.º 1 do artigo 60.º da LGT, e, por isso, a prolação deste acto é globalmente ilegal.
Procede, assim o pedido de pronúncia arbitral quanto a este vício.
3.4. Questão da ilegalidade da liquidação por inexistência de facto tributário
No âmbito da imputação deste vício às liquidações impugnadas, a Requerente defende, em suma, que, sendo substituto tributário, não lhe pode ser exigido o pagamento do imposto na fase de pagamento voluntário.
A questão é suscitada pela Requerente relativamente ao IRS e não aos juros compensatórios.
O artigo 21.º do CIRS estabelece que «quando, através de substituição tributária, este Código exigir o pagamento total ou parcial do IRS a pessoa diversa daquela em relação à qual se verificam os respectivos pressupostos, considera-se a substituta, para todos os efeitos legais, como devedor principal do imposto, ressalvado o disposto no artigo 103.º». ( [8] )
Neste artigo 103.º, que está em consonância com o artigo 28.º da LGT, distinguem-se várias situações.
No seu n.º 1, prevêem-se as situações em que houve retenção sem entrega pelo substituto das quantias retidas, caso não em que o substituto é o único responsável pelo pagamento do imposto e, por isso, vale plenamente aquela regra do artigo 21.º.
No n.º 2 do mesmo artigo, para os casos de retenção for efectuada meramente a título de pagamento por conta de imposto devido a final, estabelece-se a regra de que «cabe ao substituído a responsabilidade originária pelo imposto não retido e ao substituto a responsabilidade subsidiária», o que se reconduz a um afastamento daquela regra do artigo 21.º.
Para os restantes casos, previu-se, no n.º 3 do artigo 103.º, a regra de que «o substituído é apenas subsidiariamente responsável pelo pagamento da diferença entre as importâncias que deveriam ter sido deduzidas e as que efectivamente o foram». Nestas situações vale também a regra do artigo 21.º.
A Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, aditou ao artigo 103.º do CIRS um n.º 4, em que estabelece que «tratando-se de rendimentos sujeitos a retenção que não tenham sido contabilizados nem comunicados como tal aos respectivos beneficiários, o substituto assume responsabilidade solidária pelo imposto não retido».
Foi neste n.º 4 que a Autoridade Tributária e Aduaneira se baseou para liquidar o IRS e juros compensatórios e notificar a Requerente para o seu pagamento.
Esta norma visa especificamente os pagamentos de rendimentos que constituam «remunerações» como deixou claro o Relatório do Orçamento do Estado para 2007, em que se refere, na página 29, o seguinte:
Responsabilidade Solidária
Instituição de um regime de responsabilização solidária do substituto pelo imposto não retido aos beneficiários dos rendimentos em situações qualificadas como práticas fraudulentas relacionadas com a omissão ou redução do montante das remunerações pagas, seja pela sua não contabilização, seja pela sua caracterização como rendimentos não sujeitos a tributação (v.g. ajudas de custo).
Trata-se, assim, de uma disposição potencialmente aplicável à situação em apreço, pois foi imputado à Requerente não ter retido IRS relativamente a quantias que foram contabilizadas e pagas como ajudas de custo, quando, no entender da Autoridade Tributária e Aduaneira, deveriam ser consideradas remunerações dos seus trabalhadores.
Este n.º 4 constitui uma excepção à regra do n.º 2, aplicável às restantes situações de retenção na fonte de rendimentos efectuada meramente a título de pagamento por conta de imposto devido a final, em que se estabelece que «cabe ao substituído a responsabilidade originária pelo imposto não retido e ao substituto a responsabilidade subsidiária». ( [9] )
Mas, como se vê pelo facto de neste n.º 4 se prever a responsabilidade do substituto como solidária, o devedor originário do imposto não retido continua a caber ao substituído, consubstanciando-se o regime excepcional do n.º 4 apenas na natureza da responsabilidade do substituto que, em vez de ser subsidiária, é solidária, para além de o substituto ser responsável exclusivo pelos «juros compensatórios devidos desde o termo do prazo de entrega até ao termo do prazo da apresentação da declaração pelo responsável originário ou até à data da entrega do imposto retido, se anterior».
Na verdade, devem distinguir-se as situações de devedores originários solidários e de responsabilidade solidária por dívidas de outrem.
A solidariedade entre devedores originários está prevista para as situações em que «os pressupostos do facto tributário se verifiquem em relação a mais de uma pessoa», em que, em rega, «todas são solidariamente responsáveis pelo cumprimento da dívida tributária» (artigo 21.º, n.º 1, da LGT).
Diferente desta é a situação do «responsável solidário», que é uma «pessoa alheia à constituição do vínculo tributário que, pelas suas particulares conexões com o originário devedor ou com o objecto do imposto, a lei considera garante do pagamento da dívida de imposto, numa posição de fiador legal». ( [10] )
Esta distinção aparece clara no artigo 22.º da LGT, referente à «Responsabilidade tributária» em que se refere que «para além dos sujeitos passivos originários, a responsabilidade tributária pode abranger solidária ou subsidiariamente outras pessoas», o que evidencia que o responsável solidário (como o responsável subsidiário) não passa a ser considerado sujeito passivo originário.
É uma situação de responsabilidade solidária que se prevê para o substituto no n.º 4 do artigo 103.º do CIRS, pois os pressupostos do facto tributário verificam-se em relação aos contribuintes de IRS que são os trabalhadores da Requerente.
Assim, como o artigo 21.º do CIRS, apesar de estabelecer a regra de que o substituto se considera «como devedor principal do imposto», ressalva o disposto no artigo 103.º, tem de se concluir que nestas situações enquadráveis no n.º 4, o substituto não é considerado como devedor principal do imposto não retido, mas sim responsável solidário, isto é, está numa situação de garante do pagamento da dívida de imposto, numa posição de fiador legal.
A questão que a Requerente coloca é a de saber se, nestas situações de responsabilidade solidária do substituto, lhe pode ser exigido o pagamento da dívida na fase de pagamento voluntário, designadamente sendo ele e não o devedor originário notificado para o pagamento voluntário da quantia liquidada.
A razão por que no n.º 2 do artigo 103.º do CIRS, para os casos de retenção «efectuada meramente a título de pagamento por conta de imposto devido a final», se afasta a regra do seu artigo 21.º de considerar o substituto como devedor principal do imposto, é a de que, à face do regime geral do IRS, na sequência dos pagamentos ocorridos em determinado ano, haverá, no ano subsequente, que fazer um acerto de contas, com base na globalidade dos rendimentos de várias categorias sujeitos a englobamento, depois de feitos abatimentos, deduções previstos (artigo 22.º, n.º 1 do CIRS) e também no imposto retido. E nesta liquidação relativa à globalidade dos rendimentos de determinado ano, é o respectivo sujeito passivo de IRS quem é o devedor originário, se houver imposto a liquidar e na medida em que houver impostos a liquidar.
Por isso, nestes casos de retenção efectuada a título de pagamento por conta do imposto devido a final, só depois de efectuada a liquidação de IRS se pode saber se há ou não a pagar imposto pelo sujeito passivo e se pode saber se será necessário ou não responsabilizar o substituto pelo imposto não retido.
É a esta luz que há que determinar o regime de exigência aos responsáveis solidários do pagamento das dívidas resultantes de incumprimento do dever de retenção na fonte.
Nem a LGT nem o CPPT prevêem explicitamente esse regime, pelo que há que inferi-lo das normas que se reportam aos responsáveis solidários.
O artigo 9.º, n.º 2, do CPPT estabelece que «a legitimidade dos responsáveis solidários resulta da exigência em relação a eles do cumprimento da obrigação tributária ou de quaisquer deveres tributários, ainda que em conjunto com o devedor principal».
Desta norma conclui-se que pode ser exigido o pagamento da obrigação tributária aos responsáveis solidários mesmo sem o ser o devedor principal, como revela a expressão final «ainda que em conjunto com o devedor principal», que deixa entrever que a exigência pode ser feita ao responsável solidário, sem que o seja também ao devedor principal.
No entanto, se é certo que desta norma se conclui que a exigência da dívida ao responsável solidário pode ser efectuada sem que o seja ao devedor principal e é seguro que tal possibilidade existe no caso de pagamento coercivo, também é certo que esta norma não permite concluir que essa «exigência» pode ser feita também na fase de pagamento voluntário.
Há, porém, outra norma que permite concluir que o responsável solidário também pode ser notificado para pagamento voluntário da dívida, que é o n.º 4 do artigo 22.º da LGT, que estabelece que «as pessoas solidária ou subsidiariamente responsáveis poderão reclamar ou impugnar a dívida cuja responsabilidade lhes for atribuída nos mesmos termos do devedor principal, devendo, para o efeito, a notificação ou citação conter os elementos essenciais da sua liquidação, incluindo a fundamentação nos termos legais».
Com efeito, a exigência de pagamento da dívida em relação ao responsável subsidiário é sempre feita através de «citação» no processo de execução fiscal [art. 23.º, n.ºs 1 e 4 da LGT e art. 191.º, n.º 3, alínea b), do CPPT], pelo que a referência a «notificação» contida naquele n.º 4 do art. 22.º só pode reportar-se aos responsáveis solidários, e só tem lugar antes da execução fiscal, pois o chamamento do responsável solidário ao processo de execução fiscal é também efectuada através de citação e não de notificação como se vê pelo referido art. 191.º, n.º 3, alínea b), do CPPT.
Aliás, esta possibilidade está em sintonia com a regra primacial da solidariedade passiva, enunciada no citado art. 512.º, n.º 1, do Código Civil, que é aplicável tanto à exigência da dívida quer por via judicial quer por via extrajudicial. ( [11] )
No entanto, relativamente à exigência da obrigação tributária, há que atender à especificidade das normas tributárias que prevêem a notificação da liquidação, pois elas pressupõem que a notificação da liquidação ao devedor originário, como se depreende das referências ao «contribuinte» e não também aos responsáveis solidários, que se fazem no art. 86.º, n.ºs 2 e 7, do CPPT e no art. 45.º, n.º 1, da LGT. ( [12] )
Nos códigos tributários também se faz referência a notificação da liquidação aos «sujeitos passivos», utilizando-se esta expressão para aludir aos devedores originários, como se pode ver, designadamente, pelos arts. 2.º e 110.º do CIRC, 13.º e 104.º do CIRS, 2.º, 91.º e 92.º do CIVA, 4.º, 31.º, n.º 4, e 43.º do CIMT. ( [13] ) No mesmo sentido de a intervenção do responsável solidário não poder substituir, antes do processo de execução fiscal, a intervenção do devedor principal, apontam as normas que prevêem a possibilidade de intervenção dos «contribuintes» e não também dos responsáveis solidários no procedimento tributário, como é o caso das dos arts. 59.º e 60.º da LGT.
Por isso, é de concluir tem de ser proporcionada sempre ao devedor principal a possibilidade de pagar voluntariamente a dívida tributária, na sequência da notificação da liquidação.
Assim, se é certo que o responsável solidário também pode ser notificado para pagamento voluntário da dívida, antes de ser instaurada execução fiscal, também será de entender que a sua notificação deverá ser posterior à do devedor originário, só tendo lugar no caso de o pagamento voluntário por este não ser efectuado.
De resto, será esta a interpretação que se compagina com o princípio constitucional da proporcionalidade, pois, sendo a responsabilidade solidária uma responsabilidade por dívidas de outrem e sendo apenas em relação ao devedor originário que se verifica a capacidade contributiva que justifica a tributação, não é razoável fazer-lhe a exigência da dívida sem se verificar uma situação de necessidade, que só se verifica em caso de incumprimento pelo devedor originário no prazo de pagamento voluntário.
Sendo este o entendimento que se deve adoptar em geral quanto à exigência de pagamento ao responsável solidário, a sua adopção justifica-se reforçadamente na situação excepcional de responsabilidade solidária prevista no artigo 103.º, n.º 4, do CIRS, desde logo, porque, antes de mais, é imprescindível apurar se há algum imposto devido pelo devedor originário e, em caso afirmativo, qual o seu montante, que, no caso de rendimentos sujeitos a englobamento para determinação do IRS, é óbvio que não tem de coincidir com o montante que seria retido na fonte se a retenção fonte fosse efectuada.
Conclui-se, assim, que por estas razões, a Requerente tem razão ao defender que inexiste facto tributário, quanto à liquidação de IRS, pois, o facto tributário que gera a responsabilidade solidária é constituído pelo não pagamento voluntário pelos devedores principais dos montantes de IRS não retidos possam ser exigido a cada um destes (e não pelo montante que devia ser retido, que é apenas o limite máximo da responsabilidade do responsável solidário, a nível do imposto), situação essa que não ocorreu.
Na verdade, como defende a Requerente, a deverem considerar-se remuneração as quantias pagas a título de ajudas de custo, é a situação daqueles a quem foram pagos os rendimentos sem retenção que necessita de correcção e só depois de ser apurado qual o montante do imposto a pagar por todos eles é que poderá existir uma situação de responsável solidário da Requerente, relativamente ao montante que se vier a ser apurado, na medida em que não for pago voluntariamente.
Justifica-se, por isso, a anulação da liquidação de IRS, com fundamento em vício de violação de lei, por inexistência de facto tributário.
Procedendo o pedido de pronúncia arbitral quanto à liquidação de IRS, por vício de violação de lei, fica prejudicado, por ser inútil, o conhecimento das questões de constitucionalidade que a Requerente coloca, relativamente à norma do artigo 103.º, n.º 4, do CIRS.
3.5. Ilegalidade do procedimento inspectivo
A Requerente imputa vício ao procedimento inspectivo, por, em suma, ter sido ultrapassado o prazo previsto no artigo 62.º, n.º 2, do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT).
O artigo 62.º, n.º 2, do RCPIT estabelece que «o relatório referido no número anterior deve ser notificado ao contribuinte por carta registada nos 10 dias posteriores ao termo do prazo referido no n.º 4 do artigo 60.º, considerando-se concluído o procedimento na data da notificação».
Trata-se, manifestamente, de um prazo ordenador, destinado a imprimir celeridade ao procedimento tributário de inspecção, pois a sua não observância não afecta o exercício de qualquer direito procedimental do destinatário da notificação.
O excesso de prazos para prática de actos pela Autoridade Tributária e Aduaneira no procedimento de inspecção tributária não tem efeito invalidante da decisão procedimental. ( [14] )
Por isso, improcede o pedido de pronúncia arbitral quanto a este vício.
3.6. Questão da ilegalidade da liquidação de juros compensatórios
Na notificação efectuada à Requerente para pagamento voluntário, foi incluída uma liquidação de IRS, com o n.º 2012 ..., e oito liquidações de juros compensatórios, com números seguidos de desde 2012 ... a 2012 ....
O artigo 103.º, n.º 2, do CIRS, vigente em 2010, estabelece, em consonância com o artigo 28.º, n.º 2, da LGT, que «quando a retenção for efectuada meramente a título de pagamento por conta de imposto devido a final, cabe ao substituído a responsabilidade originária pelo imposto não retido e ao substituto a responsabilidade subsidiária, ficando este ainda sujeito aos juros compensatórios devidos desde o termo do prazo de entrega até ao termo do prazo da apresentação da declaração pelo responsável originário ou até à data da entrega do imposto retido, se anterior».
Como se vê, esta parte final relativa aos juros compensatórios, não estabelece uma responsabilidade solidária ou subsidiária da entidade que deveria proceder a retenção, estabelecendo, antes, uma responsabilidade desta como devedor principal dos juros compensatórios, como a própria Requerente reconhece no artigo 88.º do pedido de pronúncia arbitral.
Para além da questão da falta de fundamentação, a que já se fez referência, a Requerente imputa vício às liquidações de juros compensatórios, por não ter tido oportunidade de participar em sede de audição prévia, na decisão de liquidação dos juros compensatórios pelo que as liquidações referidas serão ilegais «não apenas por falta de fundamentação, mas, também, por preterição de formalidade legal essencial, pelo que, nos termos e para efeitos do disposto no artigo 135.° do Código de Procedimento Administrativo, deverá ser anulada» (artigos 156.º e 157.º do pedido de pronúncia arbitral).
Já atrás se apreciaram estes vícios, nos pontos 3.2.2. e 3.3. deste acórdão, pelo que nada há a acrescentar.
3.7. Ilegalidade do despacho de indeferimento do recurso hierárquico
O despacho de indeferimento do recurso hierárquico, na medida em que manteve os actos de liquidação de IRS e juros compensatórios, está afectado pelos mesmos vícios de que aquele enferma, pelo que também se justifica a sua anulação.
4. Indemnização por garantia indevida
A Requerente formula pedido de reconhecimento de direito a indemnização por prestação de garantia indevida.
Como resulta da alínea k) da matéria de facto fixada, a Requerente prestou uma garantia bancária até ao valor de € 265.473,98, para obter suspensão do processo de execução fiscal relativo à cobrança da dívida de IVA liquidada.
De harmonia com o disposto na alínea b) do art. 24.º do RJAT a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito».
Relativamente ao pedido de condenação no pagamento de indemnização por prestação de garantia indevida, o art. 171.º do CPPT, estabelece que «a indemnização em caso de garantia bancária ou equivalente indevidamente prestada será requerida no processo em que seja controvertida a legalidade da dívida exequenda» e que «a indemnização deve ser solicitada na reclamação, impugnação ou recurso ou em caso de o seu fundamento ser superveniente no prazo de 30 dias após a sua ocorrência».
Assim, é inequívoco que o processo de impugnação judicial abrange a possibilidade de condenação no pagamento de garantia indevida e até é, em princípio, o meio processual adequado para formular tal pedido, o que se justifica por evidentes razões de economia processual, pois o direito a indemnização por garantia indevida depende do que se decidir sobre a legalidade ou ilegalidade do acto de liquidação.
O pedido de constituição do tribunal arbitral e de pronúncia arbitral tem como corolário passar a ser no processo arbitral que vai ser discutida a «legalidade da dívida exequenda», pelo que, como resulta do teor expresso daquele n.º 1 do referido art. 171.º do CPPT, é também o processo arbitral o adequado para apreciar o pedido de indemnização por garantia indevida.
O regime do direito a indemnização por garantia indevida consta do art. 52.º da LGT, que estabelece o seguinte:
Artigo 53.º
Garantia em caso de prestação indevida
1. O devedor que, para suspender a execução, ofereça garantia bancária ou equivalente será indemnizado total ou parcialmente pelos prejuízos resultantes da sua prestação, caso a tenha mantido por período superior a três anos em proporção do vencimento em recurso administrativo, impugnação ou oposição à execução que tenham como objecto a dívida garantida.
2. O prazo referido no número anterior não se aplica quando se verifique, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços na liquidação do tributo.
3. A indemnização referida no número 1 tem como limite máximo o montante resultante da aplicação ao valor garantido da taxa de juros indemnizatórios prevista na presente lei e pode ser requerida no próprio processo de reclamação ou impugnação judicial, ou autonomamente.
4. A indemnização por prestação de garantia indevida será paga por abate à receita do tributo do ano em que o pagamento se efectuou.
No caso em apreço, é manifesto que os vícios que afectam os actos de liquidação de IRS e juros compensatórios são imputáveis à administração tributária, pois as correcções foram da sua iniciativa e a Requerente em nada contribuiu para que esses erros fossem praticados.
Por isso, a Requerente tem direito a indemnização pela garantia prestada.
Não havendo elementos que permitam determinar o montante da indemnização, a condenação terá de ser efectuada com referência ao que vier a ser liquidado em execução do presente acórdão (arts. 609.º, n.º 2, do Código de Processo Civil e 565.º do Código Civil).
5. Decisão
De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em:
a) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;
b) Anular a liquidação de IRS n.º 2012 ... e as liquidações de juros compensatórios n.ºs 2012 ..., 2012 ..., 2012 ..., 2012 ..., 2012 ..., 2012 ..., 2012 ... e 2012 ...
c) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral quanto ao reconhecimento do direito a indemnização por garantia indevida e com denar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagar a quantia que for determinada em execução do presente acórdão.
6. Valor do processo
De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC de 2013, no artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e no artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 208.778,10.
7. Custas
Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 4.184,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Lisboa, 20 de Setembro de 2015
Os Árbitros
(Jorge Manuel Lopes de Sousa)
(Hélder Faustino)
(Ricardo Marques Candeias)
[1] Essencialmente neste sentido, podem ver-se, entre muitos, os seguintes acórdãos do STA: de 4-11-1998, processo n.º 40618; de 10-3-1999, processo n.º 32796; de 6-6-1999, processo n.º 42142; de 9-2-2000, processo n.º 44018; de 28-3-2000, processo n.º 29197; de 16-3-2001, do Pleno, processo n.º 40618; de 14-11-2001, processo n.º 39559; de 18-12-2002, processo n.º 48366.
[2] Há lapso na indicação do ano e do montante em causa.
[3] Neste sentido, entre muitos, podem ver-se os acórdãos da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 24-11-1999, processo n.º 23720; e 19-12-2007, recurso n.º 874/07.
[4] Neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos: de 17-5-88, processo n.º 23076, AP-DR de 20-1-94, página 2525; de 28-6-88, processo n.º 20131, AP-DR de 20-1-94, página 3508, e em AD, n.º 329, página 608; de 10-11-91, processo n.º 28532, AP-DR de 31-10-95, página 7166; de 30-9-93, do Pleno, processo n.º 28532, AP-DR de 14-11-95, página 606.
[5] Neste sentido, pode ver-se o acórdão da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo de 7-11-2001, processo n.º 38983, publicado em Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 37, página 26.
Neste acórdão entendeu-se que se deveria considerar sanada a falta de fundamentação da acta de um concurso em que foi elaborada uma lista de classificação final por ulteriormente ter sido apresentada fundamentação para as posições assumidas pelo júri e ela ter vindo a ser adoptada no acto que decidiu recurso hierárquico do acto de homologação dessa lista, por forma a o interessado a poder ter em conta na impugnação contenciosa.
[6] Neste sentido, pode ver-se o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 7-3-2012, processo n.º 1042/11, em que se entendeu que «o recurso hierárquico da decisão proferida em sede de reclamação graciosa que havia sido deduzida com vista à apreciação da legalidade do acto de liquidação implica um novo exame da questão em todos os seus aspectos, pela autoridade superior que se substitui àquela de cuja decisão se recorre, apreciando e resolvendo o assunto como se fosse apreciado pela primeira vez. E sendo permitido ao órgão “ad quem” faculdades confirmativas, revogatórias, modificativas e substitutivas, a administração tributária não só podia, como devia, na apreciação do recurso hierárquico, reapreciar ou reexaminar a legalidade do acto de liquidação à luz de toda a prova documental que foi apresentada nesse recurso, aferindo da sustentabilidade da pretensão anulatória aí formulada pela recorrente».
( [7] ) Neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo:
– de 20-3-1996, processo n.º 20042, publicado em Apêndice ao Diário da República de 13-3-1998, página 1067;
– de 2-10-1996, processo n.º 20605, publicado em Apêndice ao Diário da República de 28-12-1998, página 2707;
– de 18-2-1998, processo n.º 22325, publicado em Apêndice ao Diário da República de 8-11-2001, página 553;
– de 3-10-2001, processo n.º 25034, publicado em Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo, n.º 492, página 1615, e publicado em Apêndice ao Diário da República de 13-10-2003, página 2080;
– de 29-1-2003, processo n.º 1647/02, publicado em Apêndice ao Diário da República de 25-3-2004, página 164;
– de 12-3-2003, processo n.º 26800, publicado em Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo, n.º 506, 219 e publicado em Apêndice ao Diário da República de 25-3-2004, página 545;
– de 19-11-2008, processos n.ºs 325/08 e 576/08;
– de 11-3-2009, processo n.º 961/08.
( [8] ) Como explica SÉRGIO VASQUES, Manuel de Direito Fiscal, página 332, reportando-se à norma do artigo 28.º, n.º 3, da LGT, substancialmente equivalente ao n.º 3 do artigo 103.º do CIRS, «o legislador vê-se obrigado a sacrificar pontualmente o princípio da capacidade contributiva às razões mais imperiosas da praticabilidade. Também aqui a falha na retenção gera um reforço indevido da força económica do contribuinte substituído mas sucede, no entanto, que se mostra impraticável responsabilizá-lo em primeira linha pelo imposto, dado o particular campo de aplicação da retenção definitiva. Com efeito, a retenção a título definitivo materializa-se através da aplicação de taxas liberatórias que oneram preponderantemente rendimentos de não residentes ou rendimentos de capitais, relativamente aos quais a responsabilização do contribuinte substituído se mostra sempre difícil, por razões de facto presas com a distância ou por razões de direito ligadas ao sigilo bancário. Em virtude disso, o legislador dispõe no n° 3 do artigo 28° da LGT que o substituído apenas a título subsidiário é responsável "pelo pagamento da diferença entre as importâncias que deveriam ter sido deduzidas e as que efectivamente o foram", cabendo a responsabilidade primária ao substituto».
[9] Esta regra consta também do n.º 2 do artigo 28.º da LGT.
[10] ANTÓNIO BRAZ TEIXEIRA, Princípios do Direito Fiscal, 2.ª edição, Almedina, Coimbra, 1979, Página 204.
[11] Neste sentido, pode ver-se ANTUNES VARELA, Das Obrigações em Geral, volume I, 10.ª edição, página 767.
[12] Nesta linha, o acórdão do STA de 18-05-2005, processo n.º 381/05, decidiu que «o facto impeditivo da caducidade é a notificação ao contribuinte devedor no prazo legalmente fixado, não relevando para tal efeito a notificação aos responsáveis solidários ou subsidiários posterior a tal prazo», e que quanto às notificações ou citações dos responsáveis solidários ou subsidiários, a lei não reconhece qualquer relevo para efeitos de caducidade».
[13] Embora nem sempre seja rigorosa, a LGT, em regra, utiliza a expressão «sujeito passivo» para referenciar a generalidade dos obrigados tributários, como resulta do n.º 3 do seu art. 18.º, que estabelece que «o sujeito passivo é a pessoa singular ou colectiva, o património ou a organização de facto ou de direito que, nos termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte directo, substituto ou responsável».
No entanto, nos códigos acima citados, verifica-se pelas normas indicadas que as referências ao «sujeito passivo» se reportam ao devedor principal.
[14] Neste sentido, pode ver-se o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 27-02-2008, processo n.º 955/07.