Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 842/2014-T
Data da decisão: 2015-10-20  IRC  
Valor do pedido: € 128.741,85
Tema: Correções; exercícios de 2009, 2010 e 2011; benefícios fiscais; caducidade do direito à liquidação do ano de 2009; suspensão do prazo; perdão de dívidas; perdas por imparidade
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Acordam os Árbitros Juiz José Poças Falcão (presidente), Professor Doutor Manuel Pires e Dr. Paulo Mendonça, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem este Tribunal na seguinte

 

DECISÃO ARBITRAL

 

I – RELATÓRIO

A…, S.A., NIPC …, com sede na …  – … …, …-… …, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º n.º 1 alínea a), 5.º, 10.º n.º 1 alínea a), e seguintes do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, e com os fundamentos previstos nas alíneas a) e c) do artigo 99º do CPPT,  veio requerer a constituição de Tribunal Arbitral e deduzir pedido de pronúncia tendo por objeto sindicar a legalidade  dos actos de liquidação adicional de IRC, relativos aos anos de 2009, 2010 e 2011, resultantes da acção de inspecção efectuada pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de ..., ao abrigo das Ordens de Serviço n.º OI2012 … e OI2013 …, a saber:

Tipo de imposto           

Período

Nº da Liquidação

Montante

Juros

Total

Prazo pagamento

Voluntário

IRC

2009

2014 …

90.849,84€

14.595,71€

105.445,55€

26-09-2014

IRC

2010

2014 …

44.765,78€

4.734,39€

49.500,17€

29-09-2014

IRC

2011

2014 …

66.117,19€

5.325,60€

71.442,79€

02-10-2014

-

-

-

201.732,81

24.655,70€

226.388,51€

-

 

 

 

            Conclui a requerente pela formulação do seguinte pedido:

            “(...)Requer ao Tribunal Arbitral que decrete a anulação parcial das liquidações adicionais de IRC relativas aos anos de 2009, 2010 e 2011 identificadas no Capítulo I supra (do requerimento inicial), resultantes das correcções técnicas discriminadas no Capítulo II (do sobredito requerimento inicial), no valor de 128.741,85€, com as legais consequências. 

            A fundamentar o pedido assente, no essencial, na discordância das correcções efectuadas em sede de benefícios fiscais - descritas no ponto III.1.1 do Relatório de Inspecção (RIT); dos custos/gastos não aceites fiscalmente, em concreto do perdão de dívida - descritas no ponto III.1.2.1 pág. 5 do RIT e das perdas por imparidade não aceites - descritas no ponto III.1.2.1 pág. 22 do RIT, todas constantes do Processo Administrativo (PA), alegou[1]:

            O pedido de pronúncia arbitral abrange apenas a impugnação de parte dos actos de liquidação supra referidos, efectuados com base em correcções meramente aritméticas ao resultado fiscal declarado pela requerente A... em sede de IRC nos referidos exercícios, como discrimina no quadro abaixo (sendo que os valores nele indicados correspondem às correcções cuja apreciação arbitral se requer).

 

2009

2010

2011

III.1.1 Benefícios Fiscais

12.600,00€

13.300,00€

13.503,44€

III.1.2.1 Perdão de Dívida

80.229,61€

 

 

III.1.2.2 Seguros de Saúde

----

Aceite pelo SP

Aceite pelo SP

III.1.2.3 Gastos de 3º

----

----

Aceite pelo SP

III.1.2.4 B…

Aceite pelo SP

Aceite pelo SP

Aceite pelo SP

III.1.2.5 Perdas por Imparidade

 

 

128.741,85€

 

            No entanto, há uma questão prévia que cumpre apreciar e que se prende com a eventual caducidade do direito à liquidação de IRC de 2009 respeitante a factos relativamente aos quais não foi instaurado inquérito criminal.

            O procedimento de inspecção externa, relativo à ordem de serviço OI2012 …, de âmbito parcial (IRC/IVA), relativo ao ano de 2009, foi notificado à requerente A... no dia em 11-09-2013 (cfr. Doc. nº 1), tendo essa notificação, por efeito do disposto no n.º 1 do artigo 46.º da LGT, feito operar a suspensão, por 6 meses, do prazo de caducidade do direito à liquidação de IRC referente a esse ano de 2009.

Em 26-02-2014 (cfr. Doc. nº 2), a requerente A... foi notificada de que o prazo do procedimento de inspecção, inicialmente de âmbito parcial e depois convertido em geral, foi prorrogado, por mais 3 meses, por despacho do Director de Finanças por delegação de 25-02-2014, nos termos da alínea a) do n.º 3 do artigo 36.º do RCPIT.

            Porém, essa prorrogação já não teve qualquer efeito suspensivo do prazo de caducidade do direito à liquidação, por força do disposto no n.º 1 do artigo 46.º da LGT. ([2])

            Ora, em resultado da referida acção de inspecção a AT liquidou, à requerente A..., um adicional de IRC relativo ao período de 2009, através do acto de liquidação n.º 2014 … datado de 2014-07-28, cuja notificação se considera efectuada no 25.º dia posterior ao seu envio (cf. Demonstração da liquidação de IRC que se junta como Doc. n.º 3).

            O direito a liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro (cf. Artigo 45.º n.º 5 da LGT e artigo 101.º do CIRC).

            Esse prazo de caducidade conta-se, nos impostos periódicos - como é o caso do IRC - a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário (cf. artigo 45.º n.º 4 da LGT).

            Porém, o prazo de caducidade suspende-se com a notificação ao contribuinte, nos termos da lei, da ordem de serviço ou despacho no início da acção de inspecção externa, cessando, no entanto, esse efeito, contando-se o prazo do seu início, caso a duração da inspecção externa tenha ultrapassado o prazo de seis meses após a notificação (cf. Artigo 46.º, n.º 1, da LGT).

            Assim sendo, a requerente foi notificada do acto de liquidação depois de já ter decorrido o prazo de caducidade do direito à liquidação de IRC (4 anos), descontado o período de suspensão de 6 meses referente à acção de inspecção.

 

            Isto desde logo porque, tendo a acção de inspecção durado mais de 6 meses, “a suspensão do prazo de caducidade cessa no termo desse prazo, com efeitos retroactivos ao seu início, tudo se passando como se o prazo de caducidade jamais tivesse sido suspenso”, conforme estatui o n.º 1 do artigo 46.º in fine. ([3])

            Contudo, a requerente A... foi constituída arguida nos autos de inquérito 160/203.0 IDSTR que correm termos junto do Serviço de Investigação Criminal Fiscal da Direcção de Finanças de ... «por indícios da prática de crime(s) de Abuso de Confiança fiscal, Fraude e Fraude Qualificada, previsto(s) e punidos(s) pelo respectivamente Artigo 105.º, 103.º, e 104.º, n.º 2 do RGIT, substanciado Contabilização de facturação fictícia que não titula operações comerciais reais no(s) período(s) de imposto referentes a anos de 2009, 2010 e 2011.» (cf. Termos de Constituição de Arguida que se junta como Doc. n. 4).

            Esses factos sob investigação criminal dizem respeito, única e exclusivamente, à facturação emitida pela B... (cf. Relatório de Inspecção: capítulo III.1.2.4 B…), que a requerente não pretende contestar.

            De sorte que a questão prévia suscitada consiste apenas em saber se assiste à AT o direito de liquidar IRC relativo ano de 2009, relativamente a outros factos tributários que não aqueles que estão abrangidos pelo procedimento criminal acima enunciados (sendo que, conforme já se referiu, a notificação da liquidação adicional de IRC de 2009 ao SP só ocorreu após terem decorrido mais de 4 anos depois do termo do ano em que se verificaram os factos tributários, mesmo considerando o período de suspensão do prazo em razão da acção inspectiva).

            A questão coloca-se porque a redacção do n.º 5 do artigo 45.º da LGT limita o “alargamento” do prazo de caducidade do direito à liquidação aos factos relativamente aos quais foi instaurado o inquérito, a saber: «5. Sempre que o direito à liquidação respeite a factos relativamente aos quais foi instaurado inquérito criminal, o prazo a que se refere o n.º 1 é alargado até ao arquivamento ou trânsito em julgado da sentença, acrescido de um ano.»

            Trata-se, pois, de averiguar se o acto tributário em causa (liquidação de IRC de 2009) cumpre com todos os requisitos formais que o ordenamento jurídico lhe impõe ou, ao invés, apenas cumpre parcialmente, quanto a um segmento das correcções, havendo uma parte dele afectada pela ilegalidade.

            «Os actos administrativos são válidos, ou seja, conformes ao ordenamento jurídico quando cumprem determinadas condições ou requisitos que o próprio ordenamento jurídico lhes impõe. (…) As condições formais de validade dos actos administrativos compreendem todos os requisitos legais que se impõe ao acto administrativo para a sua elaboração obtenção, não incluindo o seu conteúdo.» ([4])

            Estando consagrada a revogação parcial ([5]) do acto administrativo e também a reforma do mesmo, como via pela qual se conserva de um acto anterior a parte não afectada de ilegalidade, ter-se-á de convir que a impugnação parcial da validade do acto tributário, por caducidade do direito à liquidação circunscrita aos factos tributários com mais de 4 anos relativamente aos quais não foi instaurado qualquer inquérito criminal, é processualmente admissível.

            “A caducidade do direito à liquidação constitui vício do acto tributário da liquidação, gerador da anulabilidade, não podendo ser apreciada, oficiosamente, pelo tribunal, devendo o impugnante arguí-la em tempo” (cf. Acórdão do STA, Acórdãos Doutrinais, n.º 481, ano XLI, Janeiro de 2002, p. 55 e seguintes).

            A requerente A... considera, com o devido respeito, que as referidas liquidações adicionais de IRC enfermam de ilegalidade na parte em que respeitam às correcções efectuadas pela AT aos exercícios de 2009, 2010 e 2011 com fundamento na falta de verificação dos requisitos legais para usufruir do benefício fiscal atribuído à criação de emprego para jovens consagrado no artigo 19º do EBF, a saber:

 

Funcionários 

Data de Admissão

Idade desta Admissão

Benefício não aceite

2009

2010

2011

C…

2007

28 anos

6.300,00€

6.650,00€

6.713,00€

D…

2007

23 anos

6.300,00€

6.650,00€

6.713,00€

 

 

 

     

 

 

 

 

 

 

Sustenta a AT que: «os contratos em questão tratam-se de contratos de trabalho a prazo (6 meses), renováveis, datados de 01-08-2004 e 16-03-2006, respectivamente», quando a lei (artigo 19º do EBF) «prevê a aplicação deste benefício a casos contemplados como “contrato de trabalho por tempo indeterminado”, logo a situação em análise não cumpre com o legalmente estipulado e portanto não poderá o SP beneficiar nos valores por si tidos em consideração, os quais serão corrigidos e acrescerão à matéria coletável declarada».

      A requerente A... não partilha do mesmo entendimento e advoga que essas correcções fiscais enfermam de errónea qualificação jurídica dos factos constitutivos do direito ao benefício fiscal (desagravamento fiscal) que tem por escopo incentivar o emprego com vínculo estável em detrimento da precaridade.

 

      O artigo 19º do EBF estabelece que:

«1 - Para a determinação do lucro tributável dos sujeitos passivos de IRC e dos sujeitos passivos de IRS com contabilidade organizada, os encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho para jovens e para desempregados de longa duração, admitidos por contrato de trabalho por tempo indeterminado, são considerados em 150% do respectivo montante, contabilizado como custo do exercício.

2 - Para efeitos do disposto no número anterior, consideram-se:

a) “Jovens” os trabalhadores com idade superior a 16 e inferior a 35 anos, inclusive, aferida na data da celebração do contrato de trabalho, com excepção dos jovens com menos de 23 anos, que não tenham concluído o ensino secundário, e que não estejam a frequentar uma oferta de educação-formação que permita elevar o nível de escolaridade ou qualificação profissional para assegurar a conclusão desse nível de ensino;

b) “Desempregados de longa duração” os trabalhadores disponíveis para o trabalho, nos termos do Decreto-Lei nº 220/2006, de 3 de Novembro, que se encontrem desempregados e inscritos nos centros de emprego há mais de 9 meses, sem prejuízos de terem sido celebrados, durante esse período, contratos a termo por período inferior a 6 meses, cuja duração conjunta não ultrapasse os 12 meses;

c) Encargos” os montantes suportados pela entidade empregadora com o trabalhador, a título da remuneração fixa e das contribuições para a segurança social a cargo da mesma entidade;

d) “Criação líquida de postos de trabalho” a diferença positiva, num dado exercício económico, entre o número de contratações elegíveis nos termos do nº 1 e o número de saídas de trabalhadores que, à data da respectiva admissão, se encontravam nas mesmas condições.

3 – O montante máximo da majoração anual, por posto de trabalho, é o correspondente a 14 vezes a retribuição mínima mensal garantida.

4 – Para efeitos da determinação da criação líquida de postos de trabalho, não são considerados os trabalhadores que integrem o agregado familiar da respectiva entidade patronal.

   5 – A majoração referida no n.º 1 aplica-se durante um período de cinco anos a contar do início da vigência do contrato de trabalho, não sendo cumulável, quer com outros benefícios fiscais da mesma natureza, quer com outros incentivos de apoio ao emprego previstos noutros diplomas, quando aplicáveis ao mesmo trabalhador ou posto de trabalho.

6 – O regime previsto no n.º 1 só pode ser concedido uma vez em relação ao mesmo trabalhador, qualquer que seja a entidade patronal.»

 

            De sorte que a questão concreta que se pede ao Tribunal Arbitral que aprecie consiste em saber se os contratos de trabalho dos funcionários C… e D…, em vigor nos anos de 2009 a 2011, são (ou não) subsumíveis na previsão desse artigo 19º do EBF.

            Os factos a ter em consideração dizem respeito, portanto, à natureza da relação jurídico-laboral estabelecida entre a A... e os seus dois funcionários, D… e C… – que assentam em factos distintos.

            Quanto ao vínculo laboral com D… relevam os seguintes factos:

·       Em 16/03/2006 celebrou Contrato de Trabalho a Prazo Certo com a E…, Lda., NIPC …, pelo prazo de 6 meses, com início em 16/03/2006 e termo em 15/09/2006 (cf. Doc. n.º 5)

 

·       A 1ª renovação desse contrato ocorreu em 16/09/2006 e vigorou até 15/03/2007.

 

·       A 2ª renovação desse contrato ocorreu em 16/03/2007 e vigorou até 15/09/2007.

 

·       Em 01/04/2007, por efeito da fusão por incorporação da E… ([6]) na A... esta integrou-o no seu quadro de pessoal como trabalhador efectivo.

 

·       Em 18/07/2007 o D… fez cessar, por sua livre iniciativa, o contrato de trabalho.

 

·       Em 01/09/2007 o D… foi admitido pela A... sem contrato escrito.

 

      Quanto ao vínculo laboral com C… relevam os seguintes factos:

·       Em 01/08/2004 celebrou Contrato de Trabalho a Prazo Certo com a E…, Lda., NIPC …, pelo prazo de 6 meses, com início em 01/08/2004 e termo em 31/01/2005 (cf. Doc. n.º 6).

 

·       A 1ª renovação desse contrato ocorreu em 01/02/2005 e vigorou até 31/07/2006.

 

·       A 2ª renovação desse contrato ocorreu em 01/08/2006 e vigorou até 31/01/2006;

 

·       Em 01/04/2007, por efeito da fusão por incorporação da E… na A... esta integrou o C... no seu quadro de pessoal como trabalhador efectivo.

 

      Portanto, no que respeita ao enquadramento factual importa salientar, como já se referiu, que as situações não são rigorosamente idênticas pese embora a AT as ter considerado como tal.

      No caso do jovem trabalhador D… a data de admissão a considerar para efeitos de verificação dos pressupostos ínsitos do artigo 19.º do EBF deverá corresponder, salvo melhor opinião, àquela data em que o mesmo foi “readmitido”, digamos assim, pela A... (01-09-2007), mas, desta feita, por contrato de trabalho por tempo indeterminado visto que o contrato não foi reduzido a escrito.

      Já no caso do jovem trabalhador C… a data de admissão a considerar para concessão do benefício terá de corresponder à data de integração do trabalhador (01-04-2007) no quadro de pessoal da A... por efeito da fusão por incorporação com a E… mediante a “informação” ao trabalhador, subscrita por este (cfr. Doc. n.º 7), de que o seu contrato de trabalho “se mantém inalterado com todos os direitos e obrigações dele decorrentes”.

      Ou seja, apenas neste caso, do jovem C…, a IT poderia reportar-se ao “tipo” de contrato de trabalho inicialmente celebrado com a sociedade incorporada E…, todavia, sem descurar, obviamente, os termos e condições do mesmo, pois, como adiante se verá, à luz do direito laboral não era um “contrato de trabalho a prazo” mas, antes, por vício de forma, um contrato de trabalho por tempo indeterminado. ([7])    

      Relativamente ao enquadramento jurídico evoca-se, em abono do reconhecimento do benefício fiscal à A..., o entendimento da AT veiculado na Informação Vinculativa proferida no âmbito do Processo n.º …/2008 ([8]) com despacho concordante do substituto legar do Director-Geral de 2008.09.10, constante da Ficha Doutrinária publicada no Portal das Finanças (info.portaldasfinanças.gov.pt), da qual consta:  

«A Lei do Trabalho não obriga, mas também não impede a redução a escrito do contrato de trabalho sem termo.

O Legislador Fiscal, no artigo 19º do EBF, é omisso quanto à necessidade do contrato de trabalho sem termo revestir a forma escrita.

Assim, o contribuinte deve munir-se dos elementos necessários que comprovem a existência do contrato de trabalho por tempo indeterminado e o momento do seu início.

Se, de acordo com a Lei Laboral, não há obrigatoriedade de celebração por escrito do contrato de trabalho sem termo, os Serviços da DGCI devem valorizar os elementos apresentados de acordo com as regras previstas nessa mesma lei e consequente interpretação.

Cabendo à entidade empregadora provar a existência do contrato sem termo para efeitos do benefício fiscal, parece relevante que esta tenha a cautela de reduzi-lo a escrito.

Contudo, para efeitos do benefício fiscal, em certas circunstâncias, é possível, através de outros elementos apresentados pelos sujeitos passivos, elaborar um raciocínio que permita atestar a celebração de contrato sem termo.

O que se deve exigir é que os elementos de prova sejam vinculativos para a entidade empregadora, envolvendo, pelo menos, as duas partes do contrato. A permanência ao serviço de determinado trabalhador após o decurso do período de duração máxima do contrato de trabalho a termo (este obrigatoriamente reduzido a escrito) é um facto que permite ajuizar da existência de contrato de trabalho sem termo.

Esta permanência ao serviço deve, no entanto, ser comprovada através de documentos que vinculem externamente a entidade.» (cf. Doc. n.º 8).

           

            É, pois, manifesto que a IT não seguiu a mesma interpretação que foi adoptada em decisões administrativas anteriores sobre esta mesma questão em torno dos pressupostos do benefício fiscal de criação de emprego para jovens previsto no artigo 19.º do EBF, nomeadamente no que diz respeito à falta de contrato escrito (contrato por tempo indeterminado), cingindo-se apenas à letra na lei, num interpretação estritamente literal e restritiva do preceito, sem ponderação da sua finalidade e desconsiderando conceitos e regras do direito laboral (i.e. sem atender ao elemento sistemático subjacente ao método de interpretação das leis que deve obedecer à unidade do sistema jurídico).

            Na interpretação da norma contida no artigo 19.º EBF, a AT não considerou o disposto no artigo 10º do Estatutos dos Benefícios Fiscais, a saber: «As normas que estabeleçam benefícios fiscais não são susceptíveis de integração analógica, mas admitem interpretação extensiva

 

            Salvo melhor opinião, a interpretação da AT é violadora do disposto no artigo 11º da Lei Geral Tributária:

«1. Na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis.

2. Sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se outro decorrer directamente da lei.

3. Persistindo a dúvida sobre o sentido das normas de incidência a aplicar, deve atender-se à substância económica dos factos tributários.

 

            Com efeito, à luz do estatuído na alínea c) do n.º 1 do artigo 147º do Código do Trabalho:

«Considera-se sem termo o contrato de trabalho: em que falte a redução a escrito, a identificação ou a assinatura das partes, ou, simultaneamente, as datas de celebração do contrato e de início do trabalho, bem como aquele em que se omitam ou sejam insuficientes as referências ao termo e ao motivo justificativo

            De sorte que para todos os efeitos legais, nomeadamente para efeitos do disposto no artigo 19º do EBF, a contratação do D… pela A... ocorreu em 01/09/2007 e sem contrato escrito, ou seja, à luz da lei, por contrato de trabalho por tempo indeterminado.

            Já no caso do jovem trabalhador C…, há que reconhecer que o “contrato de trabalho a prazo” ([9]) celebrado inicialmente pela sociedade incorporada E… não cumpria os requisitos legais do contrato a termo, pelo recurso a fórmula genérica e vaga de transposição daquilo que consta da lei sem concretização factual, a saber: “… justificando-se a aposição de um termo pela circunstância do incremento de maior actividade da empresa” (cf. cláusula 2ª).

            Aliás, a jurisprudência é pacífica quanto à insuficiência (irrelevância) dessas expressões genéricas e vagas. Haja em vista, por todos, o douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de Junho de 2008, cujo sumário se transcreve: «1. A indicação do motivo justificativo da celebração de contrato de trabalho a termo constitui uma formalidade ad substantiam, pelo que a insuficiência de tal justificação não pode ser suprida por outros meios de prova, donde resulta que o contrato se considera celebrado sem termo, ainda que depois se venha a provar que na sua génese estava uma daquelas situações em que a lei admite a celebração de contratos de trabalho a termo.

2. Isto significa que só podem ser considerados como motivo justificativo da estipulação do termo os factos constantes na pertinente cláusula contratual.

3. As expressões “devido à época que se está a passar” e “haver um aumento de clientes”, consignadas em cláusula contratual para justificar a celebração de um contrato de trabalho a termo certo, são de tal forma vagas e genéricas que não permitem estabelecer o nexo de causalidade entre o motivo invocado e o termo estipulado, tal como exige o nº 3 do artigo 131º do Código do Trabalho, o que determina a nulidade da estipulação do termo e transforma o contrato a termo num contrato sem termo, conforme se prevê no nº 4 do artigo 131º citado.»

            Consequentemente, a requerente A... integrou o jovem trabalhador C…no seu quadro de pessoal como trabalhador efectivo, porquanto em face da lei o respectivo contrato de trabalho não pode deixar de se considerar por tempo indeterminado.  

            Convirá referir que, na óptica da requerente, não está em causa a “conversão” de um contrato de trabalho a termo em contrato de trabalho por tempo indeterminado por “permanência ao serviço”, uma vez que é inequívoco que o contrato do jovem C… foi sempre – ab initio – um contrato “sem termo” à face da lei.([10])

            Em ambos os casos verificou-se a condição da “criação líquida de postos de trabalho para jovens” porquanto a A... passou a integrar no seu quadro de pessoal esses dois jovens trabalhadores com vínculo laboral sem limitação temporal, isto é, com a estabilidade e segurança de dois postos de trabalho duradouros para jovens, sendo essa a função social (criação de emprego estável) subjacente ao benefício fiscal de majoração dos encargos laborais.

            A AT fundamentou o acréscimo de 80.229,61€ à matéria colectável declarada pela requerente A..., em sede de IRC, no ano de 2009, nos seguintes termos:

 «Na análise levada a cabo ao exercício de 2009 foi possível detectar que a empresa A... acordou com o seu cliente F…, SA, deixar de receber parte da dívida em contrapartida do pagamento do restante (Nota de Crédito nº 64 de 03.04.2009).

De facto, a F… propôs à A... o pagamento de 64.900,00€ de um total de 145.129,61€, justificando encontrar-se numa fase de crescente agravamento da sua situação financeira tocando uma situação de eminente rutura financeira, razão pela qual recorreu, à data, a uma instituição financeira que abonaria a sua atividade mas em montante insuficiente para fazer face a todas as suas responsabilidades financeiras. Assim sendo, alegou junto da A... que aquele (64.900,00€) era o montante de que dispunha para liquidar a sua dívida.

A A... aceitou a proposta acima descrita, considerando a diferença (80.229,61€) para o valor da dívida total (145.129,51€) como custo extraordinário do exercício (crédito incobrável).

Nos termos da lei, de acordo com o art.º 39º do CIRC em vigor a 31-12-2009, os créditos incobráveis: “podem ser directamente considerados custos ou perdas do exercício na medida em que tal resulte de processo especial de recuperação de empresa e protecção de credores ou de processo de execução, falência ou insolvência, quando relativamente aos mesmos não seja admitida a constituição de provisão ou, sendo-o, esta se mostre insuficiente.”

Neste enquadramento, solicitámos junto do SP informação acerca da reunião das condições acima enumeradas para melhor avaliar da classificação e consideração fiscal do montante em causa. Em resposta o SP esclareceu que à data do movimento o crédito em causa não respeitava a empresa em processo especial de recuperação nem de execução, falência ou insolvência.

Estando registada a insolvência da F… em processo (n.º …/…) do Tribunal do Comércio de Lisboa – 3º Juízo, com sentença de declaração de insolvência proferida a 07-11-2011.

Sendo este processo de insolvência de 2011, no exercício da consideração do custo (2009), as condições para que o mesmo possa ser fiscalmente aceite não estão reunidas, pelo que à matéria colectável declarada pelo SP acrescerão 80.229,61€ aqui em causa.» (o sublinhado é nosso)

            Em síntese, a AT entendeu que a parte do crédito que a requerente A... não conseguiu efectivamente cobrar à devedora F…, no âmbito de um acordo transaccional que incluiu um “perdão de dívida” (remissão), não devia, ainda assim, ser considerada como custo ou perda desse exercício por tal não resultar de nenhum processo judicial de natureza falimentar nem de qualquer processo judicial de execução – ex vi artigo 39.º do CIRC.

            Dito de outro modo: a AT não aceitou que a parte do crédito não cobrada em resultado de uma transacção pudesse ser relevada como custo em 2009 na medida em que essa perda não resulta de processo especial de recuperação de empresa e protecção de credores nem de processo de execução, nem de processo de falência ou insolvência. ([11])

            A primeira crítica que ocorre fazer à bondade dessa fundamentação da AT atinge as razões da adequação do acto à finalidade pública que o justifica. É consabido que o procedimento tributário não está construído apenas como instrumento para a realização financeira do Estado, ou seja, as diligências instrutórias promovidas pela AT não têm como fim exclusivo a prova dos factos constitutivos da obrigação tributária ou dos factos que se traduzam numa ampliação do seu quantitativo, antes – nobili officium – se dirigem indistintamente a estes e aos que tenham carácter impeditivo daquela obrigação ou determinem uma diminuição do seu quantitativo. E é tal a relevância que a verdade material objectivamente tem no procedimento que chega mesmo a superar a eficácia preclusiva do acto tributário, de tal modo que, mesmo decorrido o prazo para a sua impugnação jurisdicional, a Administração fiscal pode ordenar a restituição do imposto quando o considere indevidamente cobrado. ([12])

            Uma vez que a acção inspectiva teve por base as Ordens de Serviço OI2012 … e OI2013 … referentes aos exercícios de 2009, 2010 e 2011, não se afigura justa, proporcional e adequada a correcção técnica de 80.229,61€, no exercício de 2009 (alusiva ao desreconhecimento parcial do crédito sobre a F…, extinto parcialmente por remissão contratual ocorrida em 2009 mas sem a co-existência de processo falimentar nessa data), sem que reflexa e simultaneamente tenha sido feita a correcção ex officio, no exercício de 2011, quando está provado (prova plena) que nesse exercício foi judicialmente decretada a insolvência da devedora, tal qual consta do Relatório de Inspecção: «Estando registada a insolvência da F… em processo (…/…) do Tribunal do Comércio de Lisboa – 3º Juízo, com sentença de declaração de insolvência proferida em 07-11-2011.».(cf. Relatório de Inspecção, p. 8)

            Por consequência, a requerente A... considera, com o devido respeito, que esse acréscimo à matéria colectável do exercício de 2009, no valor de 80.229,61€, deveria então espoletar ope legis (cf. artigo 103.º, n.º 1, alínea a) do CIRC com a redacção em vigor em 2011) a correlativa correcção/reforma oficiosa, para menos (decréscimo), da matéria colectável no exercício de 2011, seguida da anulação, parcial, do imposto devido nesse exercício, em que há prova plena da existência do processo de insolvência da devedora.

            Este entendimento escora-se, desde logo, no artigo 103.º, n.º 1, alínea a) do CIRC (em vigor em 2011):«A Direcção-Geral dos Impostos procede oficiosamente à anulação, total ou parcial, do imposto que tenha sido liquidado, sempre que este se mostre superior ao devido nos seguintes casos: a) Em consequência de correcção da liquidação nos termos dos n.ºs 9 e 10 do artigo 90.º ou do artigo 100.º;»

            E, também, nos princípios gerais do procedimento tributário, com particular ênfase nos princípios da justiça e da imparcialidade, e, bem assim, no princípio da proporcionalidade (cf. artigo 55º da LGT).

            Os princípios da justiça e imparcialidade impõem à AT que trate de forma justa e imparcial os que com ela entrem em relação (cf. artigo 6.º do CPA). No domínio do procedimento tributário, estes princípios reclamam que a AT se norteie por critérios de isenção na averiguação das situações fácticas, realizando todas as diligências que se afigurem como necessárias para averiguar a verdade material, independentemente dos factos a averiguar serem contrários aos interesses patrimoniais que à AT cabe defender. ([13])

            O princípio da proporcionalidade, por seu turno, obriga a AT a não afectar os direitos ou interesses legítimos dos administrados em termos não adequados e proporcionados aos objectivos a realizar (cf. artigo 5.º n.º 2 do CPA). Este princípio obriga a AT a abster-se da imposição aos contribuintes de obrigações que sejam desnecessárias à satisfação dos fins que a tributação visa prosseguir.

            Um acto injusto é um acto ilegal - a injustiça é um vício de legalidade e constitui violação de lei.

            A «actividade da administração fiscal não pode ser uma aplicação mecânica das leis às situações de facto, tendo de ter sempre presente o objectivo que a justifica, que é a prossecução do interesse público (arts. 266.º, n.º 1, da CRP e 5.º e 55.º da LGT). Por isso a administração fiscal deverá abster-se de actuar em situações em que, embora se preencham formalmente os pressupostos legais abstractos da sua actuação, esta não seja relevante para a prossecução do interesse público. Alguns exemplos tirados da prática dos tribunais ilustram estas situações e podem servir para demonstrar a conveniência em não dar prevalência absoluta às normas que definem a actuação da administração fiscal em determinadas situações, restringindo o seu alcance por forma a assegurar a sua compatibilidade com aqueles princípios. Tanto na contribuição Industrial como no IRC, vale o princípio da especialização dos exercícios, que determina, no que aqui interessa, que a cada ano fiscal de actividade da empresa devem ser imputados os proveitos e custos que nele tenham sido gerados ou suportados (arts, 22.º e 23.º e 26.º do CCI e art. 18.º do CIRC).

            Quando há divergência entre o critério do contribuinte e o da administração fiscal sobre a imputação de determinado ganho ou perda a determinado exercício esta deve proceder à correcção da matéria colectável, fazendo acrescer o proveito ou custo ao ano a que entende que ele deve respeitar e, correspondentemente, deveria abater tal proveito ou custo à matéria colectável do ano ao qual o contribuinte a imputou. (…)

Outro caso em que deve aplicar-se o mesmo princípio, é o da administração fiscal efectuar uma correcção relativamente à matéria colectável respeitante a um ano, de forma a nele arrecadar um maior imposto, sem fazer a correspondente correcção no outro ano em que ela deveria também ter sido corrigida, em que, reflexamente, a correcção provocaria uma menor liquidação de imposto. Também nestes casos, o dever de não gerar situações de injustiça impõe que não se possa efectuar uma correcção relativamente a um ano sem levar a cabo o que lhe corresponde noutro ano, pois, se não o fizer, estará a liquidação ao contribuinte de imposto superior ao quês este devia pagar.» ([14])

            Acresce que esse activo financeiro de 80.229,61€ (direito de crédito) extinguiu-se efectivamente no exercício de 2009, quando se operou a extinção da respectiva obrigação de pagamento por remissão (cf. artigo 863.º do Código Civil).     

            De maneira que em 2009 deixou de existir crédito – não fazendo sequer sentido falar em crédito de cobrança duvidosa no caso vertente, quando se está perante um caso de incobrabilidade de facto.

            Com efeito, no exercício de 2009 deixou de existir incerteza quanto à incobrabilidade do crédito em 80.229,61€ por força do “perdão” concedido pela requerente nesse exercício, no âmbito do acordo que ajustou com a devedora F….

            Provada, como está, a remissão parcial dos créditos sobre a F…, que ascendeu àquele referido valor, a requerente considerou (e considera) que numa perspectiva estritamente contabilística esse activo financeiro (extinto) devia ser desreconhecido nesse exercício de 2009 e não posteriormente.

            Aliás, esse seu entendimento é coincidente com aquele que foi sancionado pela AT no Processo 2013 … de Informação Vinculativa, com Despacho proferido pelo Director-Geral em 28-01-2014, do qual respigamos a seguinte fundamentação: «1. Com a publicação do Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de Julho, o Código do IRC foi alterado e adaptado aos novos normativos contabilísticos [Normas internacionais de Contabilidade, Sistema de Normalização Contabilística (SNC), entre outros] cuja adopção se tornou obrigatória para os sujeitos passivos de IRC.

2. Atenta a manutenção da estrita ligação entre a contabilidade e a fiscalidade e do modelo de dependência parcial da segunda em relação à primeira e não contendo o Código do IRC qualquer dispositivo que trate do desreconhecimento dos créditos de cobrança duvidosa, há que atender ao que diz o SNC sobre o assunto, concretamente a Norma Contabilística e de Relato Financeiro (NCRF) 27 – Instrumentos Financeiros.

3. Face à definição de activo financeiro presente no parágrafo 5 da NCRF 27, o crédito sobre um cliente representa um activo financeiro.

4. E, de acordo com o parágrafo 30 da mesma norma, um activo financeiro só deve ser desreconhecido, ou seja, só deve ser removido do balanço, quendo se verificar uma das seguintes situações:

(a) Os direitos contratuais aos fluxos de caixa resultantes do activo financeiro expiram; ou

(b) A entidade transfere para a outra parte todos os riscos significativos e benefícios relacionados com o activo financeiro; ou

(c) A entidade, apesar de reter alguns riscos significativos e benefícios relacionados com o activo financeiro, tenha transferido o controlo do activo para uma outra parte e esta tenha a capacidade prática de vender o activo na sua totalidade a uma terceira parte não relacionada e a possibilidade de exercício dessa capacidade unilateralmente sem necessidade de impor restrições à transferência. Se tal for o caso a entidade deve: (i) Desreconhecer o activo; e

(ii) Reconhecer separadamente qualquer direito e obrigação criada ou retida na transferência.

5. Em resumo, um activo financeiro só deve ser desreconhecido quando os direitos contratuais aos recebimentos dele resultantes se realizam, expiram ou são transferidos para outra entidade.

6. Reflexamente, a entidade devedora só pode desreconhecer o seu passivo financeiro (ou parte de um passivo financeiro) «quando este se extinguir, isto é, quando a obrigação estabelecida no contrato seja liquidada, cancelada ou expire» (cf. § 33 da NCRF 27).

7. Por sua vez, o Código Civil considera, para além do cumprimento previsto no art.º 762.º, outras causas de extinção das obrigações, como sejam: dação em cumprimento (art. 837.º), consignação em depósito (art. 841.º), compensação (art. 847.º), novação (art. 857.º), remissão (art.º 863) e confusão (art. 868.º).

8. Nesta esteira, a entidade credora apenas pode desreconhecer um crédito de que seja titular se, e somente se:

i) For satisfeita a obrigação – seja por satisfação do interesse específico da entidade credora (são os casos de cumprimento, seja este voluntário ou importe a realização coactiva da prestação ou a consignação em depósito), seja por satisfação de um interesse sucedâneo daquele que o vínculo obrigacional visava particularmente satisfazer (onde se enquadram situações como a dação em cumprimento, a compensação e a cessão de bens à entidade credora);

ii) For cancelada total ou parcialmente a obrigação (caso em que o desreconhecimento também deve ser total ou parcial) – inserem-se neste quadro as situações de extinção que não implicam a satisfação do interesse específico ou sequer sucedâneo da entidade credora (são situações, por exemplo, de novação, remissão, confusão, anulação, revogação e resolução);

iii) a obrigação expirar – trata-se da repercussão do tempo nas relações jurídicas. Determina a este propósito o art. 298.º do Código Civil que o não exercício de um direito por um lapso de tempo superior ao que a lei estabeleça terá como consequência a extinção desse mesmo direito (excepto no caso de direitos indisponíveis) – são sa figuras da caducidade, da prescrição do não-uso.

Em bom rigor, só nestes casos se extinguem verdadeiramente os direitos contratuais aos fluxos de caixa resultantes do activo financeiro.

(…)

             Assim, tendo em conta o presente contexto contabilístico, a estrita ligação entre a contabilidade e a fiscalidade e a actual preocupação do legislador em não inserir no Código do IRC qualquer norma que induza a um determinado procedimento contabilístico, não faz sentido que, para efeitos fiscais, continue a permitir-se o desreconhecimento de um crédito de cobrança duvidosa – ainda que esteja em mora há mais de dois anos e relativamente ao qual tenha sido reconhecida uma perda por imparidade de 100% - nas situações em que esse desreconhecimento não deva ser efectuado em termos contabilísticos.

            E uma das situações em que o crédito não deve ser desreconhecido em termos contabilísticos porque não se extingue o direito contratual do credor/da obrigação civil do devedor é quando o crédito tenha sido reclamado judicialmente ou em tribunal arbitral.

            Com efeito, se a empresa credora recorreu ao tribunal para ser ressarcida do montante em dívida é porque não pretende abdicar do direito contratual aos respectivos fluxos de caixa. Ainda que o processo esteja pendente de decisão há vários anos, o que é certo é que esse direito mantém até que, eventualmente, a entidade credora desista da reclamação.

            Não se tendo extinguido (por qualquer uma das causas previstas no Código Civil) o direito contratual aoa fluxos de caixa resultantes do activo financeiro, a entidade credora não deve, por força do disposto no parágrafo 30 da NCRF 27, desreconhecer o crédito.

            Se, ainda assim, a entidade credora decidir desreconhecer os referidos créditos, o seu montante tem de ser acrescido no Quadro 07 da Declaração Modelo 22, para efeitos de determinação do lucro tributável do período de tributação em que ocorreu o desreconhecimento, uma vez que não se observam os requisitos exigidos no art. 41.º do CIRC para a consideração do crédito como incobrável.

            Se, porém, o credor desistir do processo, o “gasto” associado ao desreconhecimento do activo só é aceite fiscalmente se for integrado no dossier fiscal (1) o documento comprovativo da desistência, (2) o documento subscrito pelo órgão de gestão da empresa que deliberou a desistência e a anulação do crédito, identificando o devedor, o montante em causa e a perda por imparidade, bem como as razões que o levaram à desistência do processo e (3) a demonstração da indispensabilidade da perda resultante da diferença entre o valor do crédito e ao valor eventualmente recebido. A aceitação fiscal do desreconhecimento só opera em relação à parte do crédito que haja sido objecto de desistência/perdão para a qual exista uma justificação.

            Nesta ou noutra situação em que o crédito possa ser desreconhecido do Balanço, a aceitação fiscal do respectivo “gasto” é posta em causa se o sujeito passivo continuar a manter relações comerciais ou financeiras com o devedor (cf. info.portaldasfinancas.gov.pt: Informação Fiscal, Informações Vinculativas, IRC arts. 36.º e 41.º, Ficha Doutrinária, Proc. 2013 …).

  • Correcção ao exercício de 2011 no valor de 128.741,85€.

 

  • Resumidamente, o quadro factual é o seguinte:

            A G…, S.A., devia à A... a quantia global de 128.741,85€ (cf. c/c, facturas e notas de débito de 2008 a 2010) relativa a contratos de aluguer de equipamento.

            Para cobrança desse seu crédito a A... propôs, em 2009, acção de condenação contra a G.., Lda., que correu termos sob o nº …/….5YIPRT pelo 2º Juízo do Tribunal Judicial de ....

            Em 14/05/2010 a A... celebrou um acordo de transmissão de dívida com a G… e a H…, S.A.    

            Em 25/05/2010 a A... desistiu da acção contra a G….

            A G… apresentou-se à insolvência em 16/06/2011, tendo sido proferida sentença a decretar a insolvência em 15/07/2011, a qual transitou em julgado em 22/08/2011 (cf. Certidão emitida pelo 2º Juízo do Tribunal de Comércio de Lisboa, Proc. nº …/…).

            A H… também se apresentou à insolvência em 17/02/2012, tendo sido proferida sentença a decretar a insolvência em 12/03/2012, a qual transitou em julgado em 02/05/2012 (cf. Certidão emitida pelo 4º Juízo do Tribunal de Comércio de Lisboa, Proc. nº …/…).

            Na relação de credores da H… consta a A... com um crédito reconhecido no valor de 137.812,28€ (cf. Certidão supra citada).

            A argumentação da AT para levar a cabo a correcção assenta nestes tópicos:

-        Ausência de registo contabilístico em 2010: nenhum dos contratos mereceu tratamento contabilístico em 2010;

-        Deficiente registo contabilístico em 2011: em 2011 a A... registou a “transferência” do crédito da G… para H…, mas não registou a sua anulação pelo pagamento do sinal; considera a AT que a A... devia ter registado a entrada de um activo futuro por contrapartida da anulação da dívida da H..

-        Inexistência de dívida: quer da G… quer da H…; 

-        Existência de um direito da A... sobre a H…: “(…) ao nível da propriedade do imóvel em questão que se extinguiria em 2012”. 

           

A “ausência do registo contabilístico” dos contratos em 2010 e o “deficiente registo contabilístico” dos mesmos em 2011 são argumentos juridicamente irrelevantes, uma vez que está em causa o exercício de 2011 e na génese dessa contratualização estiveram “créditos incobráveis” da A... sobre a G… que foram reclamados judicialmente.

            Por outro lado, é facilmente refutável a asserção da AT de que deixou de existir dívida (leia-se “direito de crédito”).

            A celebração de um contrato-promessa de compra e venda de imóvel, com entrega de uma determinada quantia a título de sinal e princípio de pagamento do preço (antecipação do preço), consubstancia um “direito de crédito” do promitente comprador sobre o promitente vendedor e não um “direito real” sobre o imóvel prometido comprar.

            Ou seja, dito de outro modo, a celebração de um contrato-promessa de compra e venda de imóvel produz apenas efeitos obrigacionais, isto é, só vincula as partes que neles intervêm - a não ser que as partes atribuam “eficácia real” a esse contrato, que não foi o caso. ([15]

            Afirma a AT: 

            “Existia sim um direito da A... para com a H... ao nível da propriedade do imóvel em questão, que se extinguiria no ano de 2012.

            Porém, no plano do direito civil não existia qualquer “…direito ao nível da propriedade” e no ordenamento jurídico tributário também não, caso contrário havia incidência de IMT. ([16])   

            Aliás, está plenamente provada ([17]) a existência do “crédito” através da certidão emitida pelo Tribunal do Comércio de Lisboa, que atesta o reconhecimento da sua existência, isto é, do crédito não cobrado da A... sobre a H..., no valor de 137.812,28€, logo, a AT não pode ter um entendimento diferente a respeito da “existência” desse direito de crédito. 

            Poderia quando muito sustentar que em 2011 esse direito de crédito ainda não estava vencido, porque estava em vigor o contrato-promessa (por ainda não ter caducado) e a promitente vendedora ainda não se encontrava em incumprimento definitivo.

            Mas os factos evidenciam o contrário.

            Com efeito, a H... tinha que ter a obra concluída até 30 de Junho de 2011 (cf. Cláusula 6ª, nº1).

            E tal não aconteceu.

            É verdade que estava contratualmente prevista uma “tolerância”, mas não ilimitada, para essa conclusão das obras, sendo certo que a “tolerância máxima” (sic) se fixou em 180 dias a contar do final do mês de Junho de 2011, ou seja, era esse o derradeiro prazo para conclusão das obras: até 26.12.2011. 

            O que também não aconteceu.

            Posto isso, é perfeitamente defensável que a A... tenha considerado (e bem) que a partir dessa data, 26.12.2011, o crédito (certo, líquido e exigível) que detinha sobre a H... devia ser tratado contabilística e fiscalmente como “crédito incobrável”, como, aliás, o tribunal veio a reconhecer.

            E não se diga que o facto de estar contratualmente consagrada a “caducidade automática” do contrato-promessa de compra e venda em 01/03/2012, nos termos previstos na Cláusula 8ª, nº 4, obstava a que a A... pudesse reclamar o seu crédito sobre a H... a partir de 26.12.2011 e/ou que estivesse impedida de o “qualificar” como crédito de “cobrança duvidosa” e evidenciando-o como tal na contabilidade.

            Com efeito, há que ter em consideração todo o histórico deste processo cuja génese resultou inquestionavelmente da “incobrabilidade” de créditos sobre a G... resultantes da actividade normal da A....

            No caso vertente, a AT propugna “a prevalência da forma sobre a substância” para poder sustentar a sua correcção, quando é inequívoco que a A... apenas quis obter a cobrança dos seus créditos e por isso - e só por isso - aceitou uma dação pro solvendo, que não era, obviamente, o que desejava.

            Objectivamente: tudo não passou de uma tentativa frustrada da A... de obter a cobrança de créditos provenientes da sua actividade que se tornaram incobráveis.

            Em suma: a correcção em apreço é, salvo melhor opinião, infundada.

            Subsidiariamente, caso assim não se entenda, evoca-se quanto referido supra a respeito da imponderação dos princípios da justiça e imparcialidade uma vez que a AT não procedeu à correcção dessa perda em exercício posterior nem tão pouco reconheceu esse direito ao sujeito passivo.     

 

            O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e, de imediato, notificado à Requerida nos termos legais.

 

            Nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do nº 2 do artigo 6º do RJAT, por decisão do Sr. Presidente do Conselho Deontológico, devidamente comunicada às partes, nos prazos legalmente previstos, foram designados árbitros, o Juiz Dr. José Poças Falcão, como Presidente, o Prof. Doutor Manuel Pires e o Dr. Paulo Mendonça, como vogais, que comunicaram ao Conselho Deontológico e ao Centro de Arbitragem Administrativa a aceitação do encargo no prazo estipulado no artigo 4º do Código Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa.

 

            O Tribunal foi constituído em 12 de Março de 2015, em consonância com a prescrição da alínea c) do nº 1 do artigo 11º do RJAT.

 

            Notificada, a AT apresentou oportuna e tempestivamente a sua resposta ao pedido em pugnou pela sua total improcedência.

 

            Em 22 de Junho de 2015, teve lugar na sede do CAAD, a reunião dos árbitros e dos mandatários das partes, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 18º do RJAT, seguida de produção da prova testemunhal requerida após o que ficaram as partes notificadas para apresentarem, por escrito, as suas alegações no prazo sucessivo de 10 dias (cfr acta respectiva).

 

            As alegações foram apresentadas em 2-7-2015, pela Requerente e 15-7-2015, pela Requerida, concluindo ambas, no essencial, pela mesma forma que o haviam feito nos articulados respectivos.

 

            O Tribunal é competente, o processo é o próprio e as partes legítimas e regularmente representadas por ad vogado, a Requerente, e por Juristas, em representação do Sr Diretor Geral dos Impostos.

 

Cumpre apreciar e decidir o litígio.

 

II.        FUNDAMENTAÇÃO

A.     QUESTÃO PRÉVIA RELATIVA À CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO

 

Impõe-se a apreciação da questão prévia suscitada pela Requerente que se prende, no essencial, com a alegada caducidade do direito à liquidação do IRC de 2009 respeitante a factos relativamente aos quais não foi instaurado inquérito criminal.

 

De acordo com o artigo 93º do Código do IRC (CIRC) a liquidação de IRC, ainda que adicional só pode efetuar-se nos prazos e nos termos previstos nos artigos 45.º e 46.º da Lei Geral Tributária (LGT).

 

Neste sentido, determina o n.º 1 do artigo 45º da LGT que “o direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro”.

 

Relativamente à contagem do prazo, rege o n.º 4 do mesmo artigo que, no caso dos impostos periódicos, tal prazo se conta a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário.

 

A caducidade regulamenta o prazo para o exercício do direito à liquidação pelo Estado, constituindo-se, quando se verifica, como um vício do ato tributário de liquidação.

 

Atente-se, ainda, ao estipulado no n.º 5 do antedito artigo, segundo o qual “sempre que o direito à liquidação respeite a factos relativamente aos quais foi instaurado inquérito criminal, o prazo a que se refere o n.º 1 é alargado até ao arquivamento ou trânsito em julgado da sentença, acrescido de um ano”.

 

Verificando-se que um dos factos tributários constitutivos de determinada liquidação adicional em sede de IRC é passível de constituir crime tributário, o n.º 5 do artigo 45.º da LGT, vem, na prática, permitir que à luz de passíveis consequências criminais, a Autoridade Tributária (AT) possa utilizar o eventual facto constitutivo de crime, para do mesmo retirar efeitos fiscais, à luz do qual o cômputo/decorrência de um prazo de caducidade do direito a liquidar (a favor do sujeito passivo) não se verificaria nos termos normais.

 

Sem prejuízo da necessária materialização e especificação da factualidade subjacente às correções realizadas pela AT, é importante salvaguardar que face às regras inerentes aos procedimentos de inspeção tributária (n.º 3 do artigo 63.º da LGT), só pode haver “(…) mais de um procedimento externo de fiscalização respeitante ao mesmo sujeito passivo ou obrigado tributário, imposto e período de tributação mediante decisão, fundamentada com base em factos novos, do dirigente máximo do serviço, salvo se a fiscalização visar apenas a confirmação dos pressupostos de direitos que o contribuinte invoque perante a administração tributária e sem prejuízo do apuramento da situação tributária do sujeito passivo por meio de inspeção ou inspeções dirigidas a terceiros com quem mantenha relações económicas”.

 

Neste sentido, veja-se a posição sustentada no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 18/01/2008, n.º 670/08, onde se determina que “se do probatório não constam os factos necessários a concluir-se pela instauração daquele inquérito-crime e/ou para concluir que esse inquérito criminal teve por objecto a averiguação da eventual prática de crimes fiscais, relacionados com a matéria objecto da Inspeção Tributária e da liquidação subsequente, nem os demais elementos probatórios constantes dos autos permitem a reapreciação da matéria de facto”.

 

Assim, considerando que a liquidação adicional respeita a um objecto único ainda que, eventualmente, constituído por diferentes factos tributários relacionados ou não entre si, o prazo de caducidade deve ser ampliado a todos eles pois, constituindo um deles crime tributário, a sua correlação e dependência em sede de uma mesma liquidação adicional de IRC (ato tributário uno) manifesta-se como corolário essencial do respeito do princípio da legalidade tributária e de indivisibilidade dos pressupostos de facto que lhe deram origem, até prova em contrário.

 

Pese embora todo o ato tributário seja susceptível de divisão, desde que se aplique como critério para determinar se o ato deve ser total ou parcialmente anulado, a determinação de que a “ilegalidade afecta o ato tributário no seu todo, caso em que o ato deve ser integralmente anulado ou apenas em parte, caso em que se justifica a anulação parcial” – vide, Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 10/03/2012, n.º 0298/12.

 

Como consequência, conclui-se que o alargamento para efeitos fiscais do prazo de caducidade por via de um facto tributário contido numa única e singular liquidação adicional, ao ser enquadrado como crime tributário, assegura à AT, o benefício do disposto no n.º 5 do artigo 45.º da Lei Geral Tributária quanto aos restantes factos tributários constantes da mesma liquidação.

 

Pelo exposto, não é possível, como pretende a Requerente, julgar procedente a alegada caducidade da liquidação 2014 … relativa a 2009, na parte não aceite pela mesma Requerente.

 

B.     FACTOS PROVADOS

Dão-se por provados, no que respeita ao litígio incidente sobre a dedução de custos ao abrigo do benefício fiscal à criação líquida de postos de trabalho, os factos seguintes:

 

·       D… foi trabalhador da E… , Lda. (E…), entre 16/03/2006, data em que celebrou contrato de trabalho a termo certo com esta entidade, objeto de duas renovações, e 01/04/2007, data em que transitou, por via de um processo de fusão, para a A..., SA (A...).

·       À data da dita fusão, o trabalhador mantinha o seu vínculo laboral estribado num contrato de trabalho a termo.

·       Que não sofreu qualquer alteração aquando da sua integração, por virtude da já mencionada fusão, nos quadros da A....

·       Em 18/07/2007, D… fez cessar o contrato de trabalho a termo com a sua nova entidade patronal, a A....

·       Em 01/09/2007, foi admitido, com contrato sem termo,  pela A....

·       Por outro lado, C… foi trabalhador da E… entre  01/08/2004, data em que celebrou contrato de trabalho a termo com esta entidade, objeto de duas renovações, e 01/04/2007, quando transitou, por via de um processo de fusão, para a A....

Dão-se por provados, no que respeita ao litígio relativo à questão dos custos/gastos não aceites fiscalmente, os factos seguintes:

 

·       No exercício de 2009 a A... acordou com o seu cliente F…, SA, deixar de receber parte da dívida desta última em contrapartida do pagamento do restante, mais concretamente aceitou receber o pagamento de 64.900,00 Euros, de um total em dívida de 145.129,61 Euros.

·       Foi, para o efeito, emitida pela A... a Nota de Crédito nº 64 de 03/04/2009.

·       A A... aceitou a proposta da F…, SA, considerando a diferença, no montante de 80.229,61 Euros, como custo extraordinário do exercício de 2009 (crédito incobrável).

·       A … acabou por ser declarada insolvente em resultado de processo que correu no Tribunal do Comércio de Lisboa, com sentença de declaração de insolvência proferida em 07/11/2011.

Dão-se por provados, no que respeita ao litígio incidente sobre a questão das perdas por imparidade não aceites, os factos seguintes:

·       A A... detinha um crédito sobre a G..., S.A. (G...), no valor global de 128.741,85 Euros relativo a contratos de aluguer de equipamento, suportado em faturas e notas de débito emitidas entre 2008 e 2010.

·       Com vista à cobrança desse crédito, a A... propôs, em 2009, ação de condenação contra a G..., que correu no  Tribunal Judicial de ....

·       Em 14/05/2010 a A... assinou um contrato promessa de compra e venda com a H..., SA (H...), cujo objeto era a fracção autónoma correspondente ao escritório número 1, sito no piso 2 e respetivos lugares de estacionamento, do Edifício sito na …, lote ….

·       No referido contrato acordaram as partes proceder ao contrato definitivo de compra e venda pelo valor de 293.129,00 Euros.

·       Para o efeito, a H... obrigou-se a ter a obra concluída até 30/06/2011.

·       Estando contratualmente previsto um período de tolerância para a conclusão das obras, fixado em 180 dias a contar do final do mês de Junho de 2011, ou seja, até 26/12/2011.

·       Nenhum dos prazos foi cumprido pela H....

·       Encontra-se contratualmente consagrada a caducidade automática do contrato-promessa de compra e venda em 01/03/2012.

·       A A... registou, no exercício de 2011, perdas por imparidade em dívida a receber, no valor de 128 741,85 Euros, relativa à H....

·       A G... apresentou-se à insolvência em 16/06/2011, tendo sido proferida sentença a decretar a insolvência em 15/07/2011, a qual transitou em julgado em 22/08/2011.

·       A H... apresentou-se à insolvência em 17/02/2012, tendo sido proferida sentença a decretar a insolvência em 12/03/2012, a qual transitou em julgado em 02/05/2012.

·       Na relação de credores da H... consta a A... com um crédito reconhecido no valor de 137.812,28 Euros.

 

C.     FACTOS NÃO PROVADOS

Dão-se por não provados, no que respeita ao litígio incidente sobre a dedução de custos ao abrigo do benefício fiscal à criação líquida de postos de trabalho, os factos seguintes:

·       Que à data da consideração para efeitos fiscais do benefício, e nomeadamente nos anos controvertidos de 2009, 2010 e 2011, o trabalhador D… não se encontrava ao serviço da A....

·       Que o mesmo não reunisse qualquer outra condição prevista no regime legal aplicável no sentido que a sua entidade patronal não pudesse usufruir do benefício fiscal associado à sua contração no âmbito de um contrato sem termo.

·       Que o trabalhador C… tenha alguma vez celebrado um contrato de trabalho sem termo quer com a E…, quer com a A....

 

D.    FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO

A decisão da matéria de facto baseia-se na análise crítica dos documentos incorporados no processo e no processo administrativo instrutor, em conjugação com o depoimento prestado em audiência pela testemunha arrolada pela AT, a inspetora tributária I…, que procedeu à inspeção tributária e elaborou o relatório a que aludem os autos.

 

E.     FUNDAMENTAÇÃO (Continuação)

O Direito aplicável

 

1.         A questão do benefício fiscal à criação líquida de postos de trabalho

Os factos em litígio centram-se na temática do benefício fiscal à criação líquida de postos de trabalho, embora com caraterísticas diferentes no que tange aos dois trabalhadores em causa.

 

Tanto C… como D… prestaram serviços à E…, numa primeira fase, no âmbito de contratos a termo que, no primeiro caso, se sucedem por via de renovações entre 2004 a 2007 e, no segundo, entre 2006 a 2007.

 

Ambos se encontravam ao serviço da E…, em regime de contrato a termo, quando esta empresa foi incorporada na A..., no âmbito de um processo de fusão, em 2007. E nessa qualidade transitaram para os quadros desta última sociedade.

 

A A..., considerando, embora por motivos diferentes, que os contratos relativos aos dois trabalhadores, se converteram em contratos sem termo em 2007, decidiu aproveitar o benefício fiscal à criação líquida de postos de trabalho nos anos subsequentes.

 

A AT, não se conformando com esta posição, procedeu a correções ao lucro tributável relativo aos exercícios de 2009, 2010 e 2011.

 

Essas correções ascenderam, respetivamente, a 6.300 Euros, 6.650 Euros e 6.650 Euros, a cada um dos dois trabalhadores.

 

O benefício fiscal à criação líquida de postos de trabalho foi introduzido no sistema fiscal português pela Lei n.º 72/98, de 3 de Novembro, produzindo efeitos a 1 de Janeiro de 1999.

 

Trata-se de um desagravamento fiscal com as características de benefício fiscal, que se traduz, nos termos do nº 1 do artigo 2º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), numa “medida de carácter excecional instituída para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes superiores aos da própria tributação que impedem”.

 

O benefício encontra-se inserido, sistematicamente, na parte do EBF relativa a benefícios fiscais com carácter estrutural e, ainda que sujeito à cláusula de caducidade de limitação temporal de vigência de cinco anos, tem-se mantido em vigor desde 1999.

 

Em traços gerais, o regime deste benefício fiscal, estatuído no artigo 19.º do EBF, consiste na majoração, em 50%, dos montantes contabilizados como gasto, relativos à remuneração fixa e contribuições para a segurança social dos trabalhadores subsumíveis nos conceitos de “jovens” e “desempregados de longa duração”, admitidos por contrato de trabalho por tempo indeterminado.

 

A majoração anual por posto de trabalho não pode ultrapassar 14 vezes o valor da retribuição mínima mensal garantida. Esta majoração pode ser utilizada por um período máximo de 5 anos, a contar a partir da data de início de vigência do contrato, não podendo ser cumulável com outros benefícios fiscais da mesma natureza nem com incentivos de apoio ao emprego.

 

Para melhor compreender este benefício, importa considerar os principais conceitos:

 

·       “Jovens” – subsumem-se neste conceito os trabalhadores com idade superior a 16 anos e inferior a 35 anos, inclusive, na data da celebração do contrato sem termo. Contudo, os jovens com menos de 23 anos e que não tenham concluído a escolaridade obrigatória não são considerados elegíveis.

·       “Desempregados de longa duração” – são considerados os trabalhadores que se encontravam desempregados e inscritos nos centros de emprego há mais de 9 meses, sem prejuízo de terem sido celebrados, durante esse período, contratos a termo por período inferior a 6 meses, mas que cuja duração conjunta não ultrapasse os 12 meses.

·       “Encargos” – são os montantes registados em gasto pela entidade empregadora a título da remuneração fixa e as contribuições para a segurança social.

·       “Criação líquida de postos de trabalho” - é a diferença positiva, num dado período de tributação, entre o número de contratações elegíveis nos termos acima descritos e o número de saídas de trabalhadores que, à data da respectiva admissão, se encontravam nas mesmas condições.

 

Diversa legislação avulsa e, sobretudo, os sucessivos Orçamentos do Estado (OE), têm introduzido alterações ao regime associado ao benefício fiscal.

 

A primeira alteração relevante verificou-se com o OE para 2003[18], no que respeita ao limite máximo do benefício fiscal. Até 2002, o limite máximo, 14 vezes o salário mínimo nacional, era aplicável por cada mês e não por ano. Reconhecendo que o benefício assim calculado excedia claramente a inicial intenção do legislador, procedeu-se, com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 2003, à alteração da norma, no sentido de que a majoração operasse em relação à remuneração anual e não mensal.

 

Mas foi com o Orçamento de Estado para 2007[19] que este benefício sofreu o maior número de alterações: redução do limite máximo de idade para menos de 30 anos (anteriormente, 31 anos), a obrigatoriedade da conclusão da escolaridade obrigatória para os jovens com menos de 23 anos e extensão deste benefício para os desempregados de longa duração[20].

 

Foram ainda densificados por lei diversos conceitos cruciais. Assim, por exemplo, até 2007 não era explicitada a data da aferição do benefício, que passou a ser a da celebração do contrato de trabalho, foi adaptada a tipologia dos contratos laborais ao Código do Trabalho, introduziu-se a restrição de que o benefício só podia ser concedido uma vez em relação ao mesmo trabalhador, qualquer que fosse a entidade patronal, e os encargos majoráveis passaram a estar limitados às remunerações fixas e contribuições para a Segurança Social (anteriormente, quaisquer remunerações, incluindo as variáveis).

 

Também a partir de 2007, este benefício passou a ser extensível às pessoas singulares, com contabilidade organizada, dado que anteriormente apenas os sujeitos passivos de IRC podiam usufruir do mesmo. Assinale-se, ainda, que a partir de 2007 passaram a estar excluídos deste benefício os colaboradores que integravam o agregado familiar da respectiva entidade patronal.

 

A partir de 2009[21], o limite máximo de idade passou dos 29 para os 35 anos inclusive.

 

O OE de 2011[22] também estabeleceu importantes alterações, ao eliminar a limitação da utilização do benefício em mais do que uma entidade empregadora (exceto nos casos de entidades em situação de relações especiais, nos termos do artigo 63.º do Código do IRC), e, consequentemente, a obrigação de obtenção por escrito de confirmação do benefício junto das anteriores entidades patronais.

 

A aplicação prática do benefício ao longo dos anos não tem sido isenta de problemas, suscitando numerosas situações de contencioso entre os contribuintes e a AT a que não será alheia a observada instabilidade legislativa.

 

Vejamos agora, de forma mais detalhada, a aplicação prática do regime aos casos controvertidos:

 

·       O trabalhador D… em 16/03/2006 celebrou contrato a termo com a E…, pelo prazo de 6 meses, com início em 16/03/2006 e termo em 15/09/2006.

·       A primeira renovação desse contrato ocorreu em 16/09/2006, e vigorou até 15/03/2007.

·       A segunda renovação desse contrato ocorreu em 16/03/2007 e vigorou até 15/09/2007.

·       Em 01/04/2007, ocorre a fusão por incorporação da E… na A..., transitando D… para a última sociedade.

·       Em 18/07/2007, D… fez cessar, por sua livre iniciativa, o contrato de trabalho.

·       Em 01/09/2007, D… foi admitido pela A... sem contrato escrito.

Face ao enquadramento contratual do trabalhador, constata-se que o mesmo prestou serviços durante um período inicial à E… com base num contrato a termo, sucessivamente renovado, tendo, no decurso da última renovação, ocorrido uma reorganização empresarial, na modalidade de fusão, através da qual se dá a alteração da entidade patronal. A permanência de D… nos quadros da nova entidade patronal subsiste apenas por três meses.

 

Em 01/09/2007 o colaborador em questão volta a ser admitido pela A..., mas sem celebrar qualquer contrato de trabalho por escrito.

 

A este propósito, determina taxativamente o artigo 110º do Código do Trabalho que “o contrato de trabalho não depende da observância de forma especial, salvo quando a lei determina o contrário”.

 

Tal significa que as partes, como refere Bernardo da Gama Lobo Xavier (Manual de Direito do Trabalho, Verbo-pág. 616), “podem celebrar o contrato verbalmente ou por qualquer outro meio”.

 

O termo, enquadrado como um acontecimento futuro e certo de cuja verificação depende a produção ou a cessação dos efeitos de um contrato de trabalho, configura um elemento acidental do mesmo, ou seja, não tem necessariamente que existir para que o contrato se possa celebrar.

 

É inequívoco o pendor protecionista do trabalhador prevalecente no Direito do Trabalho, manifestando-se, por um lado, através da consagração da regra da consensualidade, que facilita a constituição de relações laborais e, por outro, porque a inobservância da forma requerida para certas declarações negociais não implica, por regra, a invalidade do contrato, mas sim a consideração deste como um contrato sem termo.

 

Como, de resto enuncia, de forma taxativa, João Leal Amado (Contrato de Trabalho, Coimbra Editora-pág. 184) “(...) assim, o contrato a termo não reduzido a escrito considera-se sem termo”.

 

Conclusão que não fica prejudicada caso a entidade entidade patronal não forneça ao trabalhador, como lhe incumbe, por escrito, informações sobre os dados fundamentais do respectivo contrato ou relações de trabalho, nos termos do art.° 106.° do Código de Trabalho. De facto, e recorrendo de novo a João Leal Amado (pág. 185), “(...) é claro que a violação patronal deste dever de informação não se repercute na validade do contrato, consistindo uma mera contra-ordenação laboral”.

 

Tendo o trabalhador sido contratado em 01/09/2007 no âmbito de um contrato sem termo, decorrência natural da não celebração de um contrato por escrito, deverá ser essa a data relevante para a determinação das condições de aplicação do benefício fiscal à criação líquida de postos de trabalho.

 

O período anterior, em que o regime contratual aplicável era o do contrato a termo, que configuraria um impedimento ao aproveitamento do benefício fiscal nos exercícios de 2009, 2010 e 2011, passa assim para segundo plano na análise e consideração dos factos controvertidos.

 

Estando provada a existência de uma situação laboral suportada em contratos a termo durante parte dos anos de 2006 e 2007, tal factualidade não pode deixar de ficar ultrapassada pela consagração de um vínculo laboral posterior, num modelo de contrato sem termo. Embora, importa salientar, o benefício é atribuído à criação de “postos de trabalho”, conceito que remete para uma associação à ideia de função exercida, i.e., à posição do trabalhador na organização da empresa e não tanto para um contrato individual de trabalho.

 

Nem a fusão ocorrida em 01/04/2007 releva para o caso concreto.

 

Estabelecido um vínculo laboral sem termo em 01/09/2007, e não tendo ficado provado pela AT que o trabalhador não se encontrava ao serviço da empresa durante os anos de 2009, 2010 e 2011, está verificada, a partir daquela data, a condição necessária para o aproveitamento do benefício, nos termos estatuídos no artigo 19.º do EBF, durante o período de 5 anos que, naturalmente, abrange os exercícios relativamente aos quais a AT promoveu as correções.

 

No que respeita ao trabalhador C…, importa considerar os seguintes factos:

 

·       Em 01/08/2004 celebrou um contrato a termo com a E…, pelo prazo de 6 meses, com início em 01/08/2004 e termo em 31/01/2005.

·       Contrato esse objeto de primeira renovação em 01/02/2005, vigorando  até 31/07/2006.

·       E de uma segunda renovação em 01/08/2006, que vigorou até 31/01/2007.

·       Em 01/04/2007, por efeito da fusão por incorporação da E… na A..., processou-se ope legis a transferência do trabalhador C… da primeira para a segunda empresa.

Nos termos do nº1 do art. 285º do Código do Trabalho, “em caso de transmissão, por qualquer título, da titularidade da empresa, ou estabelecimento ou ainda de parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, transmitem-se para o adquirente a posição do empregador nos contratos de trabalho dos respetivos trabalhadores (...)”.

 

Logo, ter-se-á que deduzir que a A... recebeu o contrato sem termo que dizia respeito ao trabalhador em consequência da fusão que materializou a transferência dos ativos e passivos (direitos e responsabilidades) da E… para a sua esfera.

 

O que leva a concluir, em concreto, pela não aplicação do benefício fiscal à criação líquida de postos de trabalho ao trabalhador C… nos anos de 2009, 2010 e 2011, dado que na esfera da A..., de facto, não ficou provado que ocorreu a situação que faz nascer o direito ao benefício fiscal: a criação de postos de trabalho enquadrados por um contrato sem termo.

 

Considerando-se, por outro lado, ilegal a liquidação e cobrança de IRC relativa ao benefício fiscal à criação líquida de postos de trabalho do trabalhador D… no que concerne ao mesmo período referenciado no parágrafo anterior, devendo ser anuladas as liquidações 2014 …, 2014 … e 2014 …, na parte correspondente a este trabalhador.

 

2.         A questão dos custos / gastos não aceites fiscalmente

Quanto à específica questão de saber se o custo extraordinário registado pela A... em 2009, no montante de 80.229,61 Euros poderia, ou não, ser dedutível, haveria em primeiro lugar que ajuizar da sua indispensabilidade, enquanto requisito da regra geral do artigo 23.º do mesmo Código.

Nesta medida, dispõe o n.º 1, do artigo 23.º do Código do IRC, na sua redação à data da ocorrência dos factos, que os custos ou perdas terão que ser havidos como indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos ou para a manutenção da fonte produtora.

Note-se, todavia, que um ponto prévio de análise prende-se com a existência do referido custo, no sentido da sua documentação enquanto suporte à comprovação. No caso concreto, o tema encontra-se ultrapassado, pois o reconhecimento do custo está suportado na emissão, por parte da A..., da Nota de Crédito nº 64 de 03/04/2009.

Neste aspeto, a jurisprudência na matéria[23] é marcada por um certo casuísmo sustentado na necessidade de se partir da questão de facto para a resolução da questão de direito que se coloca. Algumas linhas jurisprudenciais orientadoras poderão sintetizar-se da seguinte forma:

 

·       A existência de um documento justificativo em boa ordem cria uma presunção da existência do custo, que à administração fiscal caberá ilidir.

·       A falta de determinados requisitos formais do documento justificativo não implica, necessariamente, a sua desconsideração enquanto meio de prova.

·       As insuficiências da prova documental e/ou as dúvidas que o negócio subjacente à sua emissão suscitem podem ser esclarecidas através do recurso a outros meios de prova, nomeadamente, a testemunhal.

·       O princípio da dedutibilidade dos custos efetivamente suportados carece de ser temperado com exigências de prevenção e de combate à fraude fiscal.

 

Uma vez constatada a existência do custo, caberia, no âmbito do critério da indispensabilidade ajuizar se ele possui ou não as características que o tornam subsumível ao conceito de custo fiscal, pelo que se trata de um problema de qualificação legal.

O custo deve, antes de mais, ser indispensável para a realização dos proveitos ou ganhos ou para a manutenção da fonte produtora. A expressão manutenção da fonte produtora não pode ser entendida num sentido estático, uma vez que as empresas visam o seu desenvolvimento e o seu crescimento.

Um outro elemento interpretativo de algum valor para análise em apreço seria o elemento histórico, na medida em que, com o desaparecimento do critério da razoabilidade, vertido no artigo 26.º do Código da Contribuição Industrial, abandonou-se o pendor dirigista que subjazia à problemática da dedutibilidade. De facto, ganhou maior intensidade a ideia segundo a qual os sujeitos passivos são livres nas suas escolhas, nomeadamente para decidirem como gerir as suas empresas, para decidirem quais (na sua espécie e montante) os encargos por eles tidos por convenientes.

Como faz notar Rui Duarte Morais (Apontamentos ao IRC, Almedina, 2009, p. 86), um custo não deixa de o ser pelo facto de, numa avaliação a posteriori, se revelar inútil ou ineficaz (por exemplo, por não se mostrar gerador de proveitos) ou, simplesmente, excessivo na ótica dos interesses fazendários, até porque uma tal avaliação resultaria, muitas vezes, viciada pelo facto de, no momento em que é realizada, serem conhecidos factos novos, não presentes aquando da tomada de decisão do sujeito passivo. Esta constatação é igualmente válida para a situação inversa, em que um sujeito passivo leva a cabo um juízo de prognose, ponderando o risco das suas decisões em função do `know how´ que detém sobre o negócio ou sobre o sector de atividade.

Como tal, e ainda de acordo com Rui Duarte Morais (Idem, p. 88) é defensável que a questão da indispensabilidade se deva solucionar a partir do intuito objetivo da transação. Nessa ótica, o intuito objetivo que levou a contrair o encargo que originou o custo não se identifica com o concreto ânimo de quem tomou tal decisão, mas sim é determinado a posteriori, por referência a todas as circunstâncias conhecidas no momento da tomada de decisão.

Também Tomás Tavares (“A dedutibilidade dos custos em sede de IRC”, Fisco, 101-102, 2002, pp. 40 ss...) manifesta uma preferência por uma aceção ampla do termo indispensabilidade, que leve a considerar como custos indispensáveis todos os custos verdadeiros e reais da empresa, ainda que ligados a negócios que se revelaram negativos para a empresa.

Os custos indispensáveis equivalem, assim, aos gastos incorridos no interesse da empresa. A dedutibilidade fiscal do custo deve depender apenas de uma relação justificada com a atividade produtiva da empresa e esta indispensabilidade verifica-se sempre que – por funcionamento da teoria da especialidade das pessoas coletivas – as operações societárias se insiram na sua capacidade, por subsunção ao respetivo escopo societário e, em especial, desde que se conectem com a obtenção de lucro ainda que de forma indireta ou mediata[24].

Na jurisprudência tributária, tem sido cada vez mais intensa a preocupação de enquadramento do juízo da indispensabilidade no contexto da atividade empresarial. O acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA) de 23/09/1998 (relator Brandão de Pinho), entendeu que “a indispensabilidade constitui um conceito indeterminado e, necessitando embora de preenchimento, aí não só o poder do Fisco é rigorosamente vinculado, como não existe qualquer margem de livre apreciação por parte da mesma, não havendo que formular juízos de oportunidade, mas do tipo cognoscitivo”.

Por seu turno, o acórdão do STA de 08/03/2001 (relator Brandão de Pinho) sustenta de forma expressa a necessidade de aferição da indispensabilidade em função da atividade da empresa. Na mesma linha, o acórdão do STA de 03/05/2000 (relator Benjamim Rodrigues).

Em conclusão, dever-se-ia considerar, no plano da dedução do custo no caso concreto, o disposto no artigo 23.º do Código do IRC, considerando que se encontrariam preenchidos os requisitos gerais de dedutibilidade (efetividade, contabilização e imputação temporal), bem como os requisitos específicos que se reportam à comprovação, à indispensabilidade e à ligação aos ganhos sujeitos a imposto.

Como tal, atendendo aos dois últimos requisitos específicos, i.e., indispensabilidade e ligação aos ganhos sujeitos a imposto, entendemos que seria defensável que a situação em análise configurasse uma decisão de gestão avisada, na medida em que se terá baseado em critérios de know how e prognose que permitiriam à empresa a recuperação de um montante do seu crédito em larga medida superior àquele que teria recuperado em situação de concurso com os restantes credores nos autos insolvenciais.

Com efeito, no exercício de 2009 a empresa A... acordou com o seu cliente F…, SA, deixar de receber parte da dívida em contrapartida do pagamento do restante, tendo para o efeito emitido uma nota de crédito relativa ao valor não recebido.

Em concreto, a F… propôs à A... o pagamento de 64.900,00 Euros de um total de 145.129,61 Euros, com a justificação que se encontrava numa fase de crescente agravamento da sua situação financeira, e em risco real de rutura financeira a curto prazo. Alegou o recurso a uma instituição financeira que abonou a sua atividade, mas em montante não suficiente para fazer face a todas as responsabilidades financeiras.

Assim sendo, informou a A... que aquele (64.900,00 Euros) era o montante que dispunha para liquidar a sua dívida.

A A... aceitou a proposta acima descrita, considerando a diferença (80.229,61 Euros) para o valor da dívida total (145.129,51 Euros) como custo extraordinário do exercício.

A insolvência da F… foi registada com sentença de declaração de insolvência proferida a 07/11/2011.

No entanto, toda esta factualidade deveria ser ainda enquadrada à luz do princípio da especialização dos exercícios. Princípio consagrado, com grande rigidez, na lei fiscal portuguesa dado, como explicita Rui Duarte Morais (Apontamentos ao IRC, Almedina, 2009, p. 69) “o temor de práticas de manipulação do cálculo do lucro tributável, visando o adiamento da tributação e/ou a sua concentração em exercícios onde a tributação possa resultar mais favorável (…)”.

Na mesma senda Manuel Henrique Freitas Pereira (Fiscalidade, Almedina, 2011, p. 430) quando clarifica que “é, no entanto, a ocorrência do facto gerador que é o aspecto temporal decisivo (…) e, está muitas vezes ao alcance do sujeito passivo a antecipação ou o diferimento da tributação através da escolha do momento em que as operações são realizadas ou os gastos contabilizados”.

No entanto, não será possível deixar de enquadrar a parte “perdoada” pela A... à F… como um custo subordinado à disciplina dos créditos incobráveis, matéria regulada no artigo 39º do CIRC. Vejamos, em concreto, o que dispõe este artigo:

“Os créditos incobráveis podem ser directamente considerados custos ou perdas do exercício na medida em que tal resulte de processo especial de recuperação de empresa e protecção de credores ou de processo de execução, falência ou insolvência, quando relativamente aos mesmos não seja admitida a constituição de provisão ou, sendo-o, esta se mostre insuficiente”. 

Tendo sido reconhecido o custo em 2009, ao passo que a insolvência da F… apenas foi decretada em 2011, e face à redacção do artigo 39º do CIRC, não se vislumbra qualquer possibilidade de aceitação do custo, por falta de enquadramento legal, nos termos preconizados pela Requerente naquele exercício.

 

 3.        A questão dos custos / gastos não aceites fiscalmente

Da factualidade dada como provada, conclui-se, pelo menos até à data da celebração do contrato promessa entre a A... e a H..., que existia, tanto do lado do promitente vendedor como do promitente comprador, uma perceção que os créditos detidos sobre a G... no valor global de 128.741,85 Euros seriam objeto de cumprimento.

De outra forma, não se compreenderia como é que o promitente vendedor aceitaria esses créditos como forma de liquidação do sinal acordado.

Embora, diga-se em abono da verdade, tal facto não seja facilmente entendível à luz da circunstância da A... ter proposto, em 2009, ação de condenação contra a G..., com vista à cobrança de tais créditos. Opção aparentemente avisada, atendendo aos acontecimentos posteriores, ou seja, a insolvência desta última empresa decretada já em 2012.

No entanto, em 14/05/2010 a A... ao assinar um contrato promessa de compra e venda com a H..., cujo objeto era a fração autónoma e estacionamentos correspondente ao escritório na Zona …, liquidou o valor correspondente ao sinal com recurso a esses créditos sobre a G.... Desta forma ficou, num primeiro momento, com um crédito sobre a H..., e esta com um crédito sobre a G....

Contrato promessa esse que não chegou a ser cumprido pelo promitente vendedor que, por sua vez, acabou por se apresentar à insolvência em 2012.

No plano contabilístico, a A... apenas reconheceu a transferência dos créditos sobre a G... em 2011, e não em 2010, ano em que tal transmissão ocorreu.

Mas, ao fazê-lo, em parte alguma deixou evidenciado o facto de o crédito agora subsistente, sobre a H..., ter como pressuposto o pagamento de um sinal relativo a um contrato promessa de compra e venda de um imóvel e não, como anteriormente, uma dívida de natureza distinta.

 A perceção de incumprimento por parte da H... no que respeita ao objecto do contrato promessa de compra e venda levou a A... a registar, no exercício de 2011, uma perda por imparidade em dívida a receber, no valor de 128 741,85 Euros, relativa à H....

A H... apresentou-se à insolvência em 17/02/2012, tendo sido proferida sentença a decretar a insolvência em 12/03/2012, a qual transitou em julgado em 02/05/2012.

Na relação de credores da H... consta a A... com um crédito reconhecido no valor de 137.812,28 Euros.

Vejamos, em primeiro lugar, o que dispõe o Código do IRC, e mais concretamente o art. 123º, em matéria de obrigações contabilísticas das empresas.

 1 — As sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, as cooperativas, as empresas públicas e as demais entidades que exerçam, a título principal, uma atividade comercial, industrial ou agrícola, com sede ou direção efetiva em território português, bem como as entidades que, embora não tendo sede nem direção efetiva naquele território, aí possuam estabelecimento estável, são obrigadas a dispor de contabilidade organizada nos termos da lei comercial e fiscal que, além dos requisitos indicados no n.º 3 do artigo 17.º, permita o controlo do lucro tributável.

.

2 — Na execução da contabilidade deve observar-se em especial o seguinte:

 a) Todos os lançamentos devem estar apoiados em documentos justificativos, datados e susceptíveis de serem apresentados sempre que necessário;

b) As operações devem ser registadas cronologicamente, sem emendas ou rasuras, devendo quaisquer erros ser objeto de regularização contabilística logo que descobertos.

3 — Não são permitidos atrasos na execução da contabilidade superiores a 90 dias, contados do último dia do mês a que as operações respeitam.

4 — Os livros, registos contabilísticos e respectivos documentos de suporte devem ser conservados em boa ordem durante o prazo de 10 anos.

5 — Quando a contabilidade for estabelecida por meios informáticos, a obrigação de conservação referida no número anterior é extensiva à documentação relativa à análise, programação e execução dos tratamentos informáticos.

6 — Os documentos de suporte previstos no n.º 4 que não sejam documentos autênticos ou autenticados podem, decorridos três períodos de tributação após aquele a que se reportam e obtida autorização prévia do diretor-geral dos Impostos, ser substituídos, para efeitos fiscais, por microfilmes que constituam sua reprodução fiel e obedeçam às condições que forem estabelecidas.

7 - É ainda permitido o arquivamento em suporte electrónico das faturas ou documentos equivalentes, dos talões de venda ou de quaisquer outros documentos com relevância fiscal emitidos pelo sujeito passivo, desde que processados por computador, nos termos definidos no n.º 7 do artigo 52.º do Código do IVA.

8 — As entidades referidas no n.º 1 que organizem a sua contabilidade com recurso a meios informáticos devem dispor de capacidade de exportação de ficheiros nos termos e formatos a definir por portaria do Ministro das Finanças.

9 — Os programas e equipamentos informáticos de faturação dependem da prévia certificação pela Direção-geral dos Impostos, sendo de utilização obrigatória, nos termos a definir por portaria do Ministro das Finanças.

Face ao disposto no artigo do Código do IRC supra, fica claro que o tratamento contabilístico dado ao crédito sobre a G... e, posteriormente, sobre a H..., suscita diversas reservas quanto à sua compatibilidade com os requisitos legalmente impostos.

A este respeito importa ainda trazer à colação o disposto no artigo 31º da LGT no que respeita às obrigações dos sujeitos passivos:

1 - Constitui obrigação principal do sujeito passivo efectuar o pagamento da dívida tributária.

2 - São obrigações acessórias do sujeito passivo as que visam possibilitar o apuramento da obrigação de imposto, nomeadamente a apresentação de declarações, a exibição de documentos fiscalmente relevantes, incluindo a contabilidade ou escrita, e a prestação de informações.

Tendo ficado provada uma falha nos procedimentos contabilísticos da A..., que não refletem quer a forma quer a substância das operações, que envolvem a  H...,  importa considerar o impacto desta circunstância no plano da determinação do lucro tributável. Veja-se, a este propósito, o disposto no art. 17º do Código do IRC: 

1 — O lucro tributável das pessoas coletivas e outras entidades mencionadas na alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do período e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não refletidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos termos deste Código.

2 — Para efeitos do disposto no número anterior, os excedentes líquidos das cooperativas consideram-se como resultado líquido do período.

3 — De modo a permitir o apuramento referido no n.º 1, a contabilidade deve:

a) Estar organizada de acordo com a normalização contabilística e outras disposições legais em vigor para o respectivo sector de atividade, sem prejuízo da observância das disposições previstas neste Código;

b) Refletir todas as operações realizadas pelo sujeito passivo e ser organizada de modo que os resultados das operações e variações patrimoniais sujeitas ao regime geral do IRC possam claramente distinguir-se dos das restantes.

Ora, como refere J. L. Saldanha Sanches (Os Limites do Planeamento Fiscal no Direito Português, Coimbra Editora, P. 129) “as questões de forma mantêm a sua importância como princípio de ordenação da contabilidade na escrita ou escrituração comercial: do valor probatório prima facie da contabilidade decorre a necessidade de que esta seja verdadeira, de que nela se possa confiar com um grau mínimo de certeza”.

Ultrapassada a questão contabilística dos factos com relevância no plano fiscal, importa ainda endereçar, em concreto, a questão da tempestividade do reconhecimento das perdas por imparidade em dívida a receber, no valor de 128 741,85 Euros, relativa à H....

A este respeito, veja-se o disposto no art. 18 do Código do IRC no que concerne à periodização do lucro tributável:

1 — Os rendimentos e os gastos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao período de tributação em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento, de acordo com o regime de periodização económica.

2 — As componentes positivas ou negativas consideradas como respeitando a períodos anteriores só são imputáveis ao período de tributação quando na data de encerramento das contas daquele a que deviam ser imputadas eram imprevisíveis ou manifestamente desconhecidas.

Ou seja, a avaliação do momento apropriado ao reconhecimento do custo tem que assentar na regra básica em matéria de imputação temporal de custos temporal, que como refere Freitas Pereira (A Periodização do Lucro Tributável, cadernos de Ciência e Técnica Fiscal nº 152, P. 138) “é a de que para a determinação do lucro devem ser deduzidos aos proveitos realizados num exercício os custos que se tornou necessário suportar para os obter”.

Mas, face ao exposto, e abstraindo das insuficiências já referenciadas no plano do tratamento contabilístico,mas sem deixar de retirar das mesmas as devidas implicações, haveria que questionar se, no exercício de 2011, se verificou algum facto que justificasse o reconhecimento do custo. A resposta não poderá ser positiva.

Atente-se no clausulado do contrato promessa de compra e venda entre a A... e a H..., cujo objeto era a fração autónoma e estacionamentos correspondente ao escritório na Zona ….

A cláusula sexta do contrato estabelece o final do mês de Junho de 2011 para a finalização da obra, prazo esse prorrogável por mais 180 dias. No entanto, não decorre, no plano da eficácia do contrato em causa, qualquer consequência resultante do incumprimento dos prazos antes mencionados, para além do eventual direito a uma indemnização.

Já o nº 4 da cláusula oitava dispõe que, “em qualquer caso, a data limite para a celebração do contrato definitivo será o dia 1 de Março de 2012. Se até essa data o promitente vendedor não proceder à marcação da escritura de compra e venda o presente contrato caducará automaticamente, em 1/3/2012, com a consequente obrigação da promitente vendedora devolver o sinal pago, bem como os juros de mora à taxa Euribor a 3 meses, acrescida de 2,5%, vencidos desde a celebração do presente contrato até ao efetivo reembolso. Tal restituição deverá ocorrer até ao dia 15 de Março de 2012, independentemente de interpelação nesse sentido.”

Destarte, não se antevê qualquer justificação do ponto de vista legal que possa suportar o reconhecimento do custo em 2011 como pretende a Requerente, devendo manter-se na íntegra a liquidação 2014 …, na parte relativa à questão das perdas por imparidade não aceites.

 

 

 

III.       DECISÃO

Em face do exposto, o presente Tribunal Arbitral decide:

a) Julgar improcedente o pedido da Requerente relativo ao alegado vício de caducidade do ato de liquidação 2014 …, correspondente ao ano de 2009.

b) Julgar parcialmente procedente o pedido da Requerente no que respeita à anulação dos atos de liquidação 2014 …, 2014 … e 2014 …, relacionados com o benefício fiscal à criação líquida de postos de trabalho, na parte correspondente ao trabalhador D…, condenando a Requerida a restituir as quantias indevidamente liquidadas correspondendo aos anos de 2009, 2010 e 2011.

c) Julgar improcedente o pedido da Requerente no que respeita à anulação dos atos de liquidação 2014 …, 2014 … e 2014 …, relacionados com o benefício fiscal à criação líquida de postos de trabalho, na parte correspondente ao trabalhador C…, nos anos de 2009, 2010 e 2011.

d) Julgar improcedente o pedido da Requerente no que respeita à anulação do ato de liquidação 2014 …, relacionado com a questão dos custos/gastos não aceites fiscalmente em 2009.

e) Julgar improcedente o pedido da Requerente no que respeita à anulação do ato de liquidação 2014 …, na parte relacionada com a questão das perdas por imparidade não aceites no ano de 2011.

Fixa-se o valor do processo em € 128.741,85 nos termos do artigo 97º-A, n.º 1, a), do CPPT, aplicável por força da alínea a) do n.º1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).

Custas calculadas nos termos da Tabela I do RCPAT em função do valor do pedido, a cargo da Requerente e Requerida na proporção dos respetivos decaimentos, ou seja, 85 % pela Requerente e 15% pela Requerida, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.

 

Notifique-se

Lisboa, Centro de Arbitragem Administrativa, 20 de Outubro de 2015

 

           

 

(José Poças Falcão - Presidente)

 

 

(Manuel Pires)

 

 

(Paulo Mendonça)

 



[1] Os sublinhados e “negritos” são da autoria da Requerente.

[2] Cf. Prof. DIOGO LEITE CAMPOS, Conselheiro BENJAMIM SILVA RODRIGUES, Conselheiro JORGE LOPES DE SOUSA, Lei geral Tributária, Comentada e Anotada, 1999, Reimpressão, Vislis Editores, 4.ª anotação ao artigo 46.º, p. 144.

[3] ANTÓNIO LIMA GERREIRO, Lei Geral Tributária Anotada, Editora Rei dos Livros, 200, 3.ª nota ao artigo 46.º, p. 221.

[4] DIOGO LEITE DE CAMPOS, SUSANA SOUTELINHO, Direito do Procedimento Tributário, 2013, Almedina, p. 211.

[5] Cf. Artigo 79.º da LGT.

[6] Artigo 285º, nº 1, do Código do Trabalho: «Em caso de transmissão, por qualquer título, da titularidade de empresa, ou estabelecimento ou ainda de parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, transmitem-se para o adquirente a posição do empregador nos contratos de trabalho dos respectivos trabalhadores, bem como na responsabilidade pelo pagamento de coima aplicada pela prática contra-ordenação laboral.» 

[7] Convirá referir, também, que não se trata aqui da “transmissibilidade de benefícios fiscais” em operação de fusão - que foi objecto de apreciação na douta Decisão Arbitral do CAAD de 11-04-2014, na qual foi árbitro o Dr. Ricardo Rodrigues Pereira.  

[8] Que, aliás, veio no mesmo sentido da doutrina que fora veiculada no âmbito do Processo 2691/2007, com Despacho do Subdirector-Geral, de 2007.11.26, proferido por subdelegação de competências, a respeito da interpretação do artigo 17.º do EBF (actual 19.º EBF) cujo conteúdo está igualmente acessível no Portal das Finanças, a saber: «Considera-se que um trabalhador é admitido por contrato sem termo quando no contrato não está determinado o número de meses ou anos que o trabalhador deverá prestar o serviço na respectiva empresa. Pelo que, só os contratos firmados nessas condições contam para o cálculo da criação líquida de postos de trabalho. Uma vez que os contratos com termo não relevam para efeitos do artigo 17.º do EBF, quando estes se transformam em contratos sem termo podem entrar, a partir do respectivo exercício, para aferição da criação líquida de postos de trabalho, desde que todos os outros requisitos de acesso estejam preenchidos.» (cf. Doc. n.º 8)

[9] O juiz – neste caso o árbitro - não está adstrito à “qualificação” dos factos efectuada pelas partes (cf. artigo 5º, n.º 3, do CPC, antigo 664º)

[10] Logo, salvo melhor opinião, o caso vertente não é idêntico àquele que foi objecto de apreciação no acórdão do STA de 25-02-2009, Proc. 916/08, pois, objectivamente, não se trata aqui de qualquer “transmissão” do benefício fiscal à majoração dos encargos dedutíveis por via da criação de emprego, mas, sim, do reconhecimento, que é automático, desse benefício fiscal à data da fusão pela sociedade incorporante. No entanto, apesar desse aresto não merecer a nossa concordância, tal como sucede com os outros em que o mesmo se escorou, e menos ainda, ressalvado o devido respeito, a decisão arbitral 83/2013-T do CAAD, que apesar de muito douta, assenta em situações hipotéticas de práticas desleais que não constituem certamente a regra no mundo empresarial, consideramos porventura útil a referência a esse entendimento jurisprudencial, no sentido de que este benefício fiscal no domínio da criação de emprego não se transmite por efeito da fusão para a sua sociedade incorporante, porquanto comporta uma premissa porventura útil para a análise da questão decidenda nestes autos, qual seja: o “momento” em que o intérprete deverá ajuizar se houve preenchimento dos pressupostos legais para a sociedade incorporante (ora requerente) poder beneficiar do desagravamento fiscal.       

[11] Concede-se que assim é, mas, ressalvado o devido respeito, também não se afigura que fosse sequer possível que a incobrabilidade pudesse “resultar” de qualquer uma dessas instâncias tendo em conta o circunstancialismo factual descrito pela AT. Com efeito, havendo “perdão” parcial da dívida, pelas razões enunciadas no relatório de inspecção, não seria lógico admitir a hipótese da requerente conservar legitimidade activa para poder deduzir “reclamação de crédito” estando o mesmo “extinto” por remissão.     

[12] Cf. Prof. ALBERTO XAVIER, Conceito e Natureza do Acto Tributário, Livraria Almedina, Coimbra, 1972, p. 171.; e artigo 78.º LGT.

[13] Cf. Sobre a necessidade de interpretar e conformar o princípio da especialização dos exercícios com o princípio da justiça, com consagração constitucional: Acs. STA de 02-042008, Proc. 0807/07, e de 25-06-2008, Proc. 0291/08, no site dgsi.pt.    

[14] DIOGO LEITE DE CAMPOS, Cons. BENJAMIM SILVA RODRIGUES, Cons. JORGE LOPES DE SOUSA, Lei Geral Tributária, Comentada e anotada, 1999, Reimpressão, Vislis Editores, 9.ª anotação ao artigo 55.º, p. 168 e seguintes.

[15] Para atribuir eficácia real é necessário reduzir a escritura pública o contrato-promessa, por força do disposto no artigo 413º, nº2, do Código Civil.

[16] A ser assim, a situação seria enquadrada como “transmissão” ou alienação desse direito real sobre imóvel, i.e. “ao nível da propriedade”, o que , como se disse, conduziria à liquidação de IMT.

[17] Essa “prova plena” não admite contraprova nem prova do contrário, logo, por maioria de razão, não cede perante meras considerações proferidas no âmbito de uma acção de inspecção tributária.  

[18] Aprovado por via da Lei n.º 32-B, de 31 de Dezembro de 2002.

[19] Aprovado por via da Lei n.º 53-A/2006 de 29 de Dezembro.

[20] Nos termos da norma constante da alínea b) do n.º 2 do então artigo 17.º do EBF introduzida pela Lei n.º 53-A/2006 de 29 de Dezembro, “desempregados de longa duração [são] os trabalhadores disponíveis para o trabalho, nos termos do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de Novembro, que se encontrem desempregados e inscritos nos centros de emprego há mais de 12 meses, sem prejuízo de terem sido celebrados, durante esse período, contratos a termo por período inferior a 6 meses, cuja duração conjunta não ultrapasse os 12 meses”.

[21] Por via da Lei n.º 10/2009, de 10 de Março, que criou o programa orçamental designado por Iniciativa para o Investimento e o Emprego.

[22] Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro

[23] Cf. António Moura Portugal, A Dedutibilidade dos Custos na Jurisprudência Fiscal Portuguesa, 2004, pp. 188 ss..

[24] Tomás Tavares, Da Relação de Dependência Parcial entre a Contabilidade e o Direito Fiscal na Determinação do Rendimento Tributável das Pessoas Coletivas: Algumas Reflexões ao Nível dos Custos, CTF, 396, Out. – Dez. 1999, p.167.