DECISÃO ARBITRAL
I – Relatório
1. Em 10 de Fevereiro de 2015, a sociedade A… CRL, NIPC …, com sede na Rua do … n.ºs … a …, …-… …, apresentou pedido de constituição de Tribunal Arbitral ao abrigo do disposto nos n.ºs 1 e 2 do art. 10.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (doravante designado por RJAT), previsto no Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, e nos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, com vista à anulação dos seguintes actos tributários:
a) anulação da liquidação de Imposto do selo, consubstanciada no documento com o n.º 2013 …, referente ao ano de 2012, com data de 22/03/2013, da qual resultou uma colecta no montante de € 21.262,53, a liquidar em três prestações, relativa ao prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo …, da freguesia e concelho de …;
b) anulação da liquidação de imposto do selo, consubstanciada no documento com o n.º 2014 …, referente ao ano de 2013, com data de 18/03/2014, da qual resultou uma colecta no montante de € 21.262,53, a pagar em três prestações, relativa ao prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo …, da freguesia e concelho de …;
c) anulação da liquidação de imposto de selo, consubstanciada no documento com o n.º …/2013, referente ao ano de 2012, com data de 21/03/2013, da qual resultou uma colecta no montante de € 11.015,80, a pagar em três prestações, relativa ao prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo …, da freguesia de … (actual art. ….º da freguesia de União das Freguesias de …, concelho de …);
d) anulação da liquidação de imposto de selo, consubstanciada no documento com o n.º 2014 …, referente ao ano de 2013, com data de 18/03/2014, da qual resultou uma colecta no montante de € 11.594,13, a pagar em três prestações, relativa ao prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ….º, da freguesia de União das Freguesias de …, concelho de …
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No pedido de pronúncia arbitral a Requerente optou por não designar árbitro.
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O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Ex.mo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante ATA) em 18/02/2015.
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Nos termos da alínea a) do nº 2 do artigo 6º e da alínea b) do nº 1 do artigo 11º do RJAT, o Conselho Deontológico designou como árbitros os signatários, que aceitaram o cargo no prazo legalmente estipulado.
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O Tribunal Arbitral ficou constituído em 21 de Abril de 2015.
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A Requerida apresentou a sua resposta no dia 1 de Junho de 2015.
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Nessa mesma data, a Requerida apresentou um requerimento a solicitar que fosse dispensada a reunião a que alude o art. 18.º do RJAT, em virtude de a Requerente não ter requerido a produção de prova para além da que apresentou de início e por ela própria não haver suscitado qualquer excepção susceptível de inviabilizar o conhecimento do mérito da causa desde já.
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Notificada a Requerente do requerimento identificado no número anterior, a mesma veio aos autos dizer “nada ter a opor ao conhecimento imediato do pedido”.
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A posição da Requerida foi deferida pelo Tribunal, por despacho de 6 de Junho de 2015.
II. Posição das Partes
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A Requerente sustenta, em síntese, que:
10.1. É uma cooperativa de habitação que tem por objecto principal a construção, promoção e a aquisição de fogos para habitação dos seus membros.
10.2. Ter por finalidade, através da cooperação e entreajuda dos seus membros, a satisfação, sem fins lucrativos, das suas necessidades habitacionais e ainda o fomento da cultura em geral e dos princípios e prática do Cooperativismo.
10.3. É titular do direito de superfície sobre o prédio urbano correspondente a um terreno para construção localizado no …, em …, inscrito na matriz predial da freguesia e concelho de … sob o artigo ….º, cujo valor patrimonial tributário é de € 2.126.252,50.
10.4. É proprietária do prédio urbano correspondente a um terreno para construção localizado na …, Lote n.º …, na antiga freguesia de …, concelho de …, encontrando-se então inscrito na respectiva matriz sob o artigo ….º, fazendo actualmente parte da União das Freguesias de … (… e …), correspondente actualmente ao artigo ….º, com o valor patrimonial tributário de € 1.101.580,00.
10.5. Relativamente ao prédio inscrito na matriz sob o artigo ….º, da freguesia e concelho de …, alega que:
a) em 22 de Março de 2013, a Requerida comunicou-lhe que procedeu à liquidação n.º 2013 …, referente ao ano de 2013, de que resultou a colecta de € 21.262,53;
b) em 18 de Março de 2014, a Requerida comunicou-lhe que procedeu à liquidação 2014 …, referente ao ano de 2014, de que resultou uma colecta de € 21.262,53.
10.6. No que respeita ao prédio inscrito na matriz sob o artigo matricial ….º da freguesia de …, concelho de … (actualmente, artigo ….º da União das Freguesias de … (… e …), do mesmo concelho):
a) a Requerida procedeu à liquidação n.º …/2013, referente a 2012, tendo apurado uma colecta de € 11.015,80;
b) a Requerida procedeu à liquidação n.º 2014 …, relativa a 2013, tendo apurado uma colecta de € 11.594,13.
10.7 Ambos os prédios correspondem a terrenos para construção, cujo valor patrimonial tributário (individual) é superior a € 1.000.000,00.
10.8 Todas as liquidação sobre os já mencionados prédios dizem respeito a liquidações de Imposto de Selo relativo à verba n.º 28.1 da TGIS, referente aos anos de 2012 e 2013, à taxa de 1% sobre o valor patrimonial tributário (doravante VPT).
10.9 A Requerente apresentou reclamação graciosa de cada uma daquelas liquidações, bem como recurso hierárquico de duas delas, todas indeferidas pela Requerida.
10.10 Fundamenta a Requerente o seu pedido, nos presentes autos, no facto de, sendo uma cooperativa estar isenta de imposto de selo ao abrigo do disposto no art. 66.º-A do Estatuto dos Benefícios Fiscais (doravante EBF), cujo n.º 12 estabelece que “as cooperativas estão isentas de imposto de selo sobre os atos, contratos, documentos, títulos e outros factos, incluindo as transmissões gratuitas de bens, quando este imposto constitua seu encargo”.
10.11 Discorda ainda a Requerente do entendimento sufragado pela Administração Tributária nas decisões de indeferimento das reclamações graciosas e recursos hierárquicos que sustenta que apenas as isenções estabelecidas no art. 44.º do EBF seriam aplicáveis à verba n.º 28 da TGIS.
10.12 Mais alega a Requerente a ilegalidade das liquidações pelo facto da norma constante 1.º do Código do Imposto do Selo (doravante CIS), conjugada com a verba n.º 28 da respectiva Tabela Geral e o art. 6.º da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, ter como objecto os prédios urbanos "com afectação habitacional", excluindo os "terrenos para construção", os quais, por natureza, não têm aptidão habitacional.
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A Requerida alega, em síntese, que:
11.1. O art.º 6.º, n.º 1 do Código de Imposto Municipal sobre Imóveis (doravante CIMI) integra nas espécies de prédios urbanos os terrenos para construção;
11.2. A noção de afectação do prédio urbano tem assento na parte relativa à avaliação dos imóveis porque este incorpora valor ao imóvel, constituindo um facto de distinção determinante (coeficiente) para efeitos de avaliação;
11.3. Conforme resulta da expressão “valor das edificações autorizadas”, constante do art. 45.º, n.º 2 do CIMI o legislador optou por determinar a aplicação da metodologia de avaliação dos prédios em geral, à avaliação dos terrenos para construção, sendo-lhes por isso aplicável o coeficiente de afectação previsto no art. 41.º do CIMI;
11.4. O conceito de “prédios com afectação habitacional” para efeitos do disposto na verba n.º 28 da TGIS compreende quer os prédios edificados, quer os terrenos para construção, desde logo atendendo ao elemento literal da norma;
11.5. O legislador não refere “prédios destinados a habitação”, antes optou pela noção “afectação habitacional”, noção diferente e mais ampla, cujo sentido há-de ser encontrado na necessidade de integrar outras realidades para além das identificadas no art.º 6.º, n.º 1, a) do CIMI;
11.6. A mera constituição de um direito de potencial construção faz aumentar imediatamente o valor do imóvel em causa, daí a regra constante do art.º 45.º do CIMI que manda separar as duas partes do terreno;
11.7. Conclui que as liquidações em crise configuram uma correcta interpretação e aplicação do direito aos factos, não padecendo de vício de violação de lei, seja da CRP ou do CIS, devendo julgar-se improcedente a pretensão da Requerente e absolver-se a Requerida do pedido.
C – Factos provados
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Com base nos factos alegados pelas partes e não contestados, assim como na documentação junta aos autos, fixa-se a seguinte factualidade relevante:
12.1. A Requerente é uma cooperativa que tem por objecto principal a construção, promoção e a aquisição de fogos para habitação dos seus membros.
12.2. A Requerente é titular do direito de superfície sobre o prédio urbano correspondente a um terreno para construção localizado no …, …, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ….º, da freguesia e concelho de …, com o valor patrimonial tributário de € 2.126.252,50.
12.3. A Requerente é proprietária do prédio urbano correspondente a um terreno para construção sito na …, Lote …, na antiga freguesia de …, do concelho de …, encontrando-se então inscrito na respectiva matriz sob o artigo ….º, que correspondente ao actual artigo ….º, da União das Freguesias de … (… e …), concelho de …, com o valor patrimonial tributário de € 1.101.580,00.
12.4. Sobre o prédio referido em 12.2, a ATA procedeu à liquidação do Imposto do Selo relativo à verba n.º 28.1 da TGIS referente ao ano de 2012, à taxa de 1% sobre o respectivo VPT, de que resultou a colecta de € 21.262,53;
12.5. Sobre o prédio referido em 12.2, a ATA procedeu à liquidação do Imposto do Selo relativo à verba 28.1 da TGIS referente ao ano de 2013, à taxa de 1% sobre o respectivo VPT, de que resultou a colecta de € 21.262,53;
12.6. Sobre o prédio referido em 12.3, a ATA procedeu à liquidação do Imposto do Selo relativo à verba n.º 28.1 da TGIS referente ao ano de 2012, à taxa de 1% sobre o respectivo VPT, de que resultou a colecta de € 11.015,80;
12.7. Sobre o prédio referido em 12.3, a ATA procedeu à liquidação do Imposto do Selo relativo à verba n.º 28.1 da TGIS referente ao ano de 2013, à taxa de 1% sobre o respectivo VPT, de que resultou a colecta de € 11.594,13;
12.8. Tanto as reclamações como os recursos hierárquicos apresentados pela Requerente foram indeferidos.
II – SANEAMENTO
13. O Tribunal é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos art.ºs 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º n.º 2, e 6.º, n.º 1, todos do RJAT.
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos art.s 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e do art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.
O processo não enferma de vícios que o invalidem, nem existem questões prévias para serem decididas
III. FUNDAMENTAÇÃO
A questão fundamental de direito, controvertida nos presentes autos, consiste em saber o âmbito de incidência da verba n.º 28.1 da TGIS, na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, mais especificamente, saber se nela estão incluídos os terrenos para construção. Sinteticamente a questão que se coloca é a de saber se um terreno para construção é um prédio com afectação habitacional para efeitos de aplicação da verba n.º 28.1 da TGIS, aditada pelo art.º 4.º da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro.
O Tribunal Arbitral Tributário é novamente chamado a pronunciar-se sobre a questão de saber se os terrenos para construção, com VPT igual ou superior a € 1.000.000,00, podem subsumir-se ao conceito de prédios (urbanos) “com afectação habitacional”, a que alude a já identificada verba n.º 28.1 da TGIS.
Esta questão foi já apreciada em vários processos, tanto no âmbito da Arbitragem Tributária (cf. decisões proferidas no âmbito dos processos números 54/2015-T, 42/2013-T, 48/2013-T, 49/2013-T, 51/2013-T, 144/2013-T, entre outros[1]), como pelos sucessivos acórdãos proferidos pelo Supremo Tribunal Administrativo (cf. Ac. STA de 17/06/2015 proferido no processo 1479/14, 27/05/2015 proferido no processo n.º 387/15, 22/04/2015 proferido no processo 347/15, e toda a jurisprudência aí citada, e Ac. STA de 29/04/2015 proferido no processo 21/15, entre outros[2]), que se pronunciaram, reiteradamente e de forma uniforme, sobre a questão decidenda, não se identificando, até agora, argumentos que permitam quebrar a unanimidade que vem sendo alcançada pelas decisões já proferidas, importando assim reiterar a jurisprudência firmada, que decidiu que os “terrenos para construção” não podem ser considerados, para efeitos de incidência do Imposto de Selo, previstos na verba n.º 28.1 da TGIS, na redacção da Lei n.º 55/2012, de 29 de Outubro, como prédios (urbanos) com afectação habitacional.
Não obstante a jurisprudência firmada, a Requerida continua a sustentar que o “conceito de prédios com afectação habitacional” para efeitos do disposto na verba n.º 28 da TGIS compreende quer os prédios edificados, quer os terrenos para construção.
A verba n.º 28 da TGIS anexa ao CIS foi aditada pelo art. 4.º da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, vigente à data da liquidação em causa nos presentes autos e tinha o seguinte conteúdo:
“28 – Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, seja igual ou superior a € 1.000.000 – sobre o valor patrimonial tributário para efeitos de IMI:
28.1 – Por prédio com afectação habitacional – 1%;
28.2 – Por prédio, quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministério da Justiça – 7,5%.”
A redacção da verba n.º 28.1 foi, entretanto, alterada pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro, que aprovou o Orçamento de Estado para 2014, passando o ponto 28.1 a utilizar o conceito de prédio habitacional e a dispor o seguinte: “28.1 Por prédio habitacional ou por terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI – 1%”. Porém, a alteração legislativa operada não tem aplicação aos presentes autos que têm por referência o ano de 2013. Com efeito, como já foi salientado pelo Ac. do STA de 29/04/2015, esta alteração não tem aplicação a situações pretéritas (liquidações de 2012 e 2013), como a que está em causa nos autos.
Como já aludimos, a questão que se coloca nos presentes autos é a de saber qual o âmbito de incidência da verba n.º 28.1 da TGIS na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, ou seja, apurar se os terrenos para construção podem subsumir-se ao conceito de prédios (urbanos) com afectação habitacional.
Não se vendo razões para divergir da fundamentação constante das anteriores decisões, tanto mais que a Requerida não traz argumentos inovatórios e, por outra lado, existe uma identidade da questão de facto e da matéria de direito das decisão anteriormente proferidas, seguimos de perto o que se deixou exarado no processo 54/2015-T[3].
O conceito de prédio (urbano) com afectação habitacional não foi definido pelo legislador. Nem na Lei n.º 55-A/2012, que o introduziu, nem no CIS ou no CIMI para o qual o n.º 2 do art. 67.º do CIS remete a título subsidiário, quando estejam em causa matérias não reguladas respeitantes à verba 28.1 da TGIS, se definiu o conceito de prédio com afectação habitacional.
Da leitura do CIMI verificamos uma distinção entre prédios urbanos e prédios rústicos, definindo-se como prédios urbanos todos aquele que não devem ser classificados como rústicos – cf. art.º 4.º do CIMI. Diz-nos o n.º 1 do art. 6.º daquele diploma que os prédios urbanos se dividem em: habitacionais [al. a)]; comerciais, industriais ou para serviços [al. b)]; terrenos para construção [(al. c)] e outros [(al. d)].
O CIMI define prédios habitacionais, comerciais ou industriais ou para serviços como os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins – cf. art. 6.º, n.º 2. Os terrenos para construção são os terrenos situados, dentro ou fora de um aglomerado urbano, para os quais tenha sido concedida licença ou autorização, admitida comunicação prévia ou emitida informação prévia favorável de operações de loteamento ou de construção, e ainda aqueles que assim tenham sido declarados no título aquisitivo, exceptuando-se os terrenos em que as entidades competentes vedem qualquer daquelas operações, designadamente, os localizados em zonas verdes, áreas protegidas ou que, de acordo com os planos municipais de ordenamento do território, estejam afectos a espaços, infra-estruturas ou equipamentos públicos – cf. art. 6.º, n.º 3.
Resulta, pois, que o CIMI não oferece uma definição específica do que sejam prédios com afectação habitacional, tendo-se colocado, nos vários litígios a que deu azo a redacção da verba 28.1, na sua versão originária, a questão de saber qual o âmbito de incidência da mesma.
Como tem sido sufragado nos vários acórdãos e decisões arbitrais a que já aludimos, a expressão afectação habitacional não pode ter outro sentido que não o de “utilização” habitacional, ou seja, prédios urbanos com efectiva utilização para fins habitacionais, seja porque para tal estão licenciados, seja porque têm esse destino normal.
Os terrenos para construção, não estando edificados, não satisfazem per si qualquer condição de serem considerados prédios com afectação habitacional, uma vez que não possuem licença de utilização para habitação e, por outro lado, não são, pela sua própria natureza, habitáveis.
Com efeito, a afectação habitacional que refere o CIMI surge sempre referida a “edifícios” ou “construções” existentes, autorizados ou previstos, porque apenas estes podem ser habitados, o que não acontece, naturalmente, com os terrenos para construção. Ou, dito de outro modo mais sintético, os terrenos para construção não são susceptíveis de serem utilizados para habitação.
O facto de na determinação do VPT dos prédios urbanos classificados como terrenos para construção se levar em conta a afectação que será para ele autorizada ou prevista para determinação do respectivo valor da área de implantação (cf. art. 45.º, n.º 1 e 2 do CIMI) não transforma os terrenos para construção em prédios com afectação habitacional.
A expressão prédio urbano com afectação habitacional que encontramos na verba n.º 28.1. da TGIS, no confronto com as espécies de prédios que surpreendemos no art. 6.º n.º 1, afasta do âmbito de aplicação daquela os prédios urbanos que não sejam habitacionais, como sucede aos que tenham destinos comerciais, industriais, sejam terrenos para construção e outros, cujas categorias encontramos nas alíneas b) a d) do n.º 1 do art. 4.º do CIMI.
Por outro lado, como já foi salientado em anteriores decisões sobre esta matéria, aquando da apresentação e discussão, no Parlamento, da proposta de lei n.º 96/XII (2.ª), o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais referiu expressamente[4]:
“O Governo propõe a criação de uma taxa especial sobre os prédios urbanos habitacionais de mais elevado valor. É a primeira vez que em Portugal é criada uma tributação especial sobre propriedades de elevado valor destinadas à habitação. Esta taxa será de 0,5% a 0,8% em 2012 e de 1% em 2013, e incidirá sobre as casas de valor igual ou superior a 1 milhão de euros.”
Como realçou a decisão n.º 144/2013-T do CAAD, o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais apresentou esta proposta de lei referindo as expressões “prédios urbanos habitacionais”, que são os que constam da alínea a) do n.º 1 do art.º 6.º do CIS e “casas”, sendo manifesto que, num caso e noutro, nesses conceitos não cabem os terrenos para construção, referidos que são na alínea c) do citado preceito[5].
Assim, os terrenos para construção não se subsumem ao conceito de prédio com afectação habitacional, prevista no ponto 28.1 da TGIS.
A Requerente alegou ainda que estaria isenta de imposto de selo, por ser uma cooperativa de habitação e construção, ao abrigo do art. 66.º-A do Estatuto dos Benefícios Fiscais, cujo n.º 12 estabelece que “as cooperativas estão isentas de imposto de selo sobre os atos, contratos, documentos, títulos e outros factos, incluindo as transmissões gratuitas de bens, quando este imposto constitua seu encargo”.
Uma vez que o tribunal arbitral entendeu que não se verificam os pressupostos legais de sujeição a Imposto de Selo, para efeitos de aplicação de verba n.º 28.1 da TGIS, surge prejudicada e processualmente inútil a apreciação da questão referente à isenção aí prevista. Com efeito, tendo-se concluído que os “terrenos para construção” não podem ser considerados como “prédios com afectação habitacional” para efeitos do disposto na verba n.º 28 da TGIS não faz sentido ajuizar a aplicação, in casu, de uma isenção que pressupõe, logicamente, que aqueles terrenos estivessem sujeitos a tributação, o que não acontece.
Em face do exposto, reitera-se, na esteira das decisões já proferidas, que os terrenos para construção não estão abrangidos pelo conceito de prédio (urbano) com afectação habitacional constante da verba 28.1 da TGIS, na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, ou seja, na redacção anterior à lei do Orçamento de Estado para 2014.
Decisão:
Pelos fundamentos expostos, o tribunal arbitral decide:
a) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral e, em consequência, declarar ilegais as liquidações de Imposto do Selo, referente aos anos de 2012 e 2013, constante dos documentos com o números 2013 …, 2014 …, …, 2014 …, no valor global de € 65.134,99 e, consequentemente, anular aquelas liquidações, com todas as legais consequências;
b) Condenar a Requerida nas custas do presente processo.
Valor do processo:
Nos termos do disposto no n.º 2 do art. 315.º do CPC, conjugado com a al. a) do n.º 1 do art. 97.º-A do CPPT e n.º 2 do art. 3.º do Regulamento de Custas nos Processo de Arbitragem Tributária, fixa-se à causa o valor de € 65.134,99.
Custas:
Para os efeitos do disposto no n.º 2 do art.º 12.º e no n.º 4 do art.º 22.º do RJAT e do n.º 4 do art.º 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em € 2.448,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento, a suportar integralmente pela Requerida.
Lisboa, 3 de Julho de 2015
Os Árbitros
(Manuel Luís Macaísta Malheiros)
(Alexandra Gonçalves Marques)
(Nina Aguiar)
[1] Todos disponíveis na base de dados do CAAD, com excepção do processo n.º 54/2015-T cuja publicação se aguarda.
[3] Cf. Decisão proferida em 22 de Junho de 2015, pelos árbitros Ex.mo Senhor Desembargador Manuel Malheiros (relator), Alexandra Gonçalves Marques (vogal) e Nuno Pombo (vogal).
[4] Cf. DAR I Série n.º 9/XII-2, de 11 de Outubro, pág. 32.
[5] Cf. Decisão arbitral proferida em 12 de Dezembro de 2013, no processo 144/2013-T, disponível na base de dados do CAAD, proferida pelo Dr. Nuno Pombo, aqui árbitro vogal e, também, Ac. do STA de 29/04/2015 e 23/04/2014, disponíveis em www.dgsi.pt.