Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 741/2014-T
Data da decisão: 2015-06-05   
Valor do pedido: € 423.858,37
Tema: IRC/IVA - Tempestividade do pedido; Cumulação de pedidos; IVA relativo a alojamento; aplicação da taxa reduzida de IVA a “venda de golfe”
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Decisão Arbitral

 

            Os árbitros Dr. Jorge Manuel Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dr. Jaime Carvalho Esteves e Dr. Filipa Barros, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 05-01-2015, acordam no seguinte:

 

1. Relatório

           

A… - …, LDA., NIPC …, apresentou um pedido de constituição do tribunal arbitral colectivo, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.º, 3.º e 15.ºe seguintes do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT), em que é Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.

A Requerente optou pela não designação de árbitro.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 17-12-2014, as partes foram notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 05-01-2015.

A Requerente pretende que sejam declarados ilegais e anulados:

i)                o acto de correcção dos prejuízos fiscais declarados pela ora impugnante no ano de 2011, no valor corrigido de € 318.833,54, que fixou os seus prejuízos fiscais relativos ao exercício de 2011 no valor de € 21.561,84;

ii)              os actos de liquidação adicional de IVA e de juros compensatórios respeitantes aos períodos de 1103T, 1106T e 1109T, nos valores de, respectivamente, € 32.625,91, € 35.728,94 e € 26.541,80 e correspondentes juros compensatórios;

iii)            com a inerente condenação da Fazenda Pública a restituir à ora impugnante todo o respectivo imposto e correlativos juros já integralmente pagos, acrescidos de juros indemnizatórios nos termos do art.º 43º da Lei Geral Tributária corridos desde 25 de Junho de 2014.

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta em que suscitou as excepções da ilegalidade da cumulação de pedidos e da intempestividade do pedido relativo ao IRC e defendeu a improcedência dos pedidos.

A Requerente pronunciou-se por escrito sobre as excepções, juntando um documento tendo em vista provar que foi notificada do acto de correcção de prejuízos fiscais em 13-08-2014.

A Autoridade Tributária e Aduaneira pronunciou-se sobre o documento apresentado pela Requerente, dizendo, em suma, que ele não se reporta à notificação do acto de correcção de prejuízos fiscais que a Requerente impugna, mas a outro, e que, relativamente ao acto que é impugnado no presente processo, a Requerente acedeu em 19-04-2014 à caixa postal electrónica do ViaCTT.

Na reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, a Requerente pronunciou-se sobre as excepções suscitadas e requereu que, em caso de se reconhecer a intempestividade do pedido de pronúncia arbitral quanto ao IRC, lhe seja permitida a substituição do acto impugnado por outro, por ter havido lapso da sua parte na indicação do acto em causa.

Nessa reunião foi produzida prova testemunhal, tendo sido acordado que haveria lugar a alegações escritas sucessivas.

As Partes apresentaram alegações.

O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e as Partes estão devidamente representadas.

            As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

            Não se vislumbra qualquer outra nulidade.

 

            2. Questão intempestividade da impugnação da liquidação relativa ao IRC

 

            Começar-se-á por apreciar a questão da intempestividade do pedido relativo à correcção de IRC, por ser logicamente prioritária.

            O documento junto pela Requerente demonstrando que a notificação de correcção de prejuízos para efeitos de IRC ocorreu em 13-08-2014, reporta-se à «Correção de Prejuízos F (IRC-2014…)».

            Mas, como referiu a Autoridade Tributária e Aduaneira e foi aceite pela Requerente ao pronunciar-se sobre a questão da intempestividade, na reunião efectuada, essa notificação refere-se à correcção de prejuízos relativos ao ano de 2013, que passaram do valor declarado de € 99.378,80 para € 0,00 (documentos n.ºs 2 e 3, juntos pela Autoridade Tributária e Aduaneira em resposta ao documento apresentado pela Requerente) e a liquidação de IRC impugnada no presente processo reporta-se a ano de 2011, e a respectiva notificação electrónica tem o n.º de código notificação electrónica, identificada pelo código 2014… (documento n.º 4 junto pela Autoridade Tributária e Aduaneira e documento n.º 1, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos).

O acesso da Requerente a esta liquidação identificada pelo código 2014… ocorreu em 19-05-2014, como se vê pelo documento n.º 5 junto pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

Assim, tem de se concluir que o pedido de pronúncia arbitral, recebido no CAAD em 27-10-2014, não foi apresentado dentro do prazo de 90 dias a contar da notificação, previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do RJAT.

A tese defendida pela Requerente na reunião realizada, no sentido de se considerar que o prazo para impugnação de todos os actos baseados no Relatório da Inspecção Tributária deveriam ser os aplicáveis às liquidações de IVA, últimas com base nele efectuadas, não tem suporte legal, pois a alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do RJAT prevê a contagem dos prazos para impugnação dos actos de liquidação a partir «dos factos previstos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, quanto aos actos susceptíveis de impugnação autónoma», pelo que é relativamente a cada um dos actos impugnáveis autonomamente que tem de se contar o respectivo prazo de apresentação do pedido de pronúncia arbitral.

No que concerne à correcção do pedido de pronúncia arbitral, passando a considerar-se que nele é impugnado o acto de correcção relativo ao ano de 2013, em vez do de 2011, que a Requerente também aventou na referida reunião, também não encontra suporte legal.

Na verdade, nos termos do artigo 10.º, n.º 2, alínea b), do RJAT, é obrigatória a identificação do acto que é objecto do pedido de pronúncia arbitral, e essa identificação tem importância primordial, pois os processos arbitrais foram criados segundo o modelo de contencioso de objectivista do processo contra um acto, que caracteriza o processo de impugnação judicial. Por isso, um processo contra acto diferente do indicado no pedido de pronúncia arbitral é um processo diferente.

Desta perspectiva, as correcções das peças processuais a que alude a alínea c) do n.º 1 do artigo 18.º têm de ser entendidas como respeitando à sua falta de adequação para a apreciação da legalidade do acto que é objecto do pedido de pronúncia arbitral e não de qualquer outro, não sendo se estendendo essa possibilidade à substituição do acto que é objecto do pedido. Decerto que serão abrangidos pela possibilidade de correcção de deficiências na identificação do acto que o Sujeito Passivo impugnou, como erro na indicação do seu número ou sua data ou valor da liquidação, pois serão casos em que a correcção não envolve substituição do acto que é objecto do processo, apenas visando tornar clara a expressão da vontade de o Sujeito Passivo o impugnar. Mas, diferente de correcções desse tipo serão os casos em que está perfeitamente identificado o acto que foi objecto do pedido de pronúncia arbitral e não houve qualquer erro na expressão da vontade do Sujeito Passivo. A admissibilidade de substituição do acto não envolveria uma mera correcção do pedido de pronúncia arbitral, mas a apresentação de uma nova petição, que daria origem a um novo processo com novo objecto.

Confirmando que esta possibilidade de correcção não envolve a possibilidade de substituição do acto, constata-se que, mesmo nos casos de erro desculpável, o Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) apenas admite a correcção, no seu artigo 98.º, n.º 5, quando o erro é sobre a identificação do autor do acto, mas não quanto à indicação do acto. Em face da exigência feita no artigo 108.º, n.º 1, do CPPT de que seja efectuada na petição inicial a identificação do acto impugnado e da entidade que o praticou, não pode deixar de concluir-se que a não previsão, naquele n.º 5 do artigo 98.º, da possibilidade de regularização da petição quando o erro é sobre o próprio acto corresponde a uma intenção legislativa de não a admitir.

Esta conclusão no sentido da inviabilidade de regularização é reforçada pelo facto de no caso em apreço nem sequer haver erro sobre a identificação do acto que o Sujeito Passivo pretendeu impugnar, pois foi indicado o ano a que se refere a correcção e o valor que está em causa, bem como facturas relativas ao ano de 2011 e seus valores (artigo 22.º do pedido de pronúncia arbitral).

Assim, conclui-se que o pedido de pronúncia arbitral foi apresentado intempestivamente, quanto à liquidação de IRC relativa ao ano de 2011, e não se está perante uma situação em que seja viável correcção.

Procede, assim a excepção da intempestividade, pelo que é de absolver da instância a Autoridade Tributária e Aduaneira, quanto ao pedido de anulação da liquidação de IRC e pedidos dependentes.

 

            3. Questão ilegalidade da cumulação

 

Tendo-se concluído pela absolvição da instância quanto à liquidação de IRC, fica prejudicada a questão da ilegalidade da cumulação de pedidos, pois permanecem como objecto do processo apenas liquidações de IVA.

 

4. Matéria de facto

 

4.1. Factos provados

 

            Consideram-se provados os seguintes factos:

 

a)     A Requerente, constituída sob a forma de sociedade por quotas, iniciou a actividade de “Aldeamentos Turísticos com Restaurante”, CAE 55117, em 1987-12-01, encontrando-se enquadrada, no exercício em causa, para efeitos de IRC no regime geral e para efeitos de IVA no regime normal com periodicidade trimestral;

b)     O objecto social da Requerente compreende a “Promoção, construção, gestão e exploração de empreendimentos turísticos próprios, compra e venda de imóveis”;

c)     A Requerente é proprietária de um empreendimento turístico, sito na …, denominado “B”, composto por 77 moradias em banda e 55 apartamentos, onde para além do alojamento são prestados serviços acessórios na área do desporto, lazer, alimentação;

d)     A Requerente conferiu direitos de ocupação do empreendimento à sociedade denominada C…, com sede na Ilha de Man, Reino Unido, a qual gere o empreendimento através de um clube de membros;

e)     No empreendimento são prestados serviços ao público em geral, mas são oferecidas condições mais vantajosas aos designados membros do B - … (Clube), gerido pela C… (doravante C…);

f)      O direito de alojamento no empreendimento pertence aos membros do clube, nos termos contratados entre estes e a C…;

g)     A facturação desse alojamento é efectuada pela Requerente à C…, com base em valores estipulados num contrato celebrado entre as partes, de que consta, além do mais, o seguinte:

II Atividades desenvolvidas pelas outorgantes

- A A… é proprietária e gestora do empreendimento turístico sito na …, em Portugal, denominado B…, de ora em diante designado por empreendimento;

- A C… é detentora dos direitos de ocupação do empreendimento B… que gere através de um clube de membros:

- O direito de alojamento no empreendimento pertence aos membros do clube nos termos contratados entre estes e a C…, só podendo a A… alojar terceiros nos casos e nas condições especialmente previstos e autorizados pela C…:

- A A… explora diretamente os equipamentos e instalações do clube, incluindo as instalações designadas por "clubhouse" que abrangem o restaurante, cabeleireiro, lojas e o bar, cobrando o respetivo preço aos utilizadores quando assim for o caso.

h)      A Requerente foi sujeita a uma acção inspectiva de âmbito geral, ao abrigo da ordem de serviço nº OI2012…, na qual foram efectuadas correcções, em sede de IVA e de IRC, relativas ao ano de 2011;

i)      No Relatório da Inspecção Tributária, cujo teor se dá como reproduzido, refere-se além do mais, o seguinte:

III. 1 Faturação de alojamento

III.1.1 Faturação de alojamento - Os factos

Analisada a contabilidade, que foi disponibilizada pelo SP nas suas instalações, nomeadamente balancetes, extratos de conta, diários de lançamento e respetivos documentos de suporte, destacou-se a conta SNC 7222 - alojamento 23%, cujo extrato se apresenta:

É possível distinguir duas situações diferentes:

Situação 1:

Faturas nºs 13 e 14, emitidas pelo SP a C… (adiante também referida por C…) em 30-11-2011 e 31-12 2011 respetivamente (cujas cópias constam do processo do contribuinte) e contabilizadas sob os nºs 110.001 de novembro e 120.001 de dezembro, ambas do diário 53.

Na fatura nº 13 consta:

E na fatura nº 14 consta:

Foi solicitado ao TOC (Técnico Oficial de Contas. Dr. D… Nif….),do SP, por mail de 2013-11-08:

4 - Relativamente à fatura nº 13/2011 emitida a C…, contabilizada pelo doc. nº 110001 do diário 53, explicar;

- O que significa "Disturbance allowance" e " Reversal of uncoll Accom Serviço Fee" e como foram determinados os valores correspondentes..."

Ao que foi respondido, por mail de 2013-11 -21:

4.2 - O que significa "Disturbance allowance" e " Reversal of uncoll Accom Serviço Fee"e como foram determinados os valores correspondentes; Disturbance Allowance

Corresponde a reduções efetivas aos Serviços de Alojamento (Accomodation Services Fees), que ocorrem em regra nos meses de janeiro a março e de novembro a dezembro, por forma a ajustar o preço do alojamento à qualidade dos serviços oferecidos. O preço dos Serviços de Alojamento ignorava inicialmente a necessidade de diferenciação da semana face ao seu posicionamento em cada época do ano, sendo que o disturbance allowance introduz uma discriminação negativa (desconto para alguns membros), como consequência, de se verificar, p.e., que nos meses de época baixa, parte das villas é sujeita a trabalhos de renovação e remodelação, causando incómodo aos hóspedes (membros) das villas vizinhas, pelo que ao preço dos accomodation fees que é imputado a esses membros alojados é efetuado um desconto por forma a compensar os distúrbios causados. O valor desses descontos poderá corresponder a 25, 50, 75 ou 125 euros, dependendo da villa e semana a ocupar.

Reversal Of Uncoll Acoom Serv Fee

Corresponde a abatimentos relativos a Serviços de Alojamento (Accomodation Services Fees). Esta redução aos Serviços de Alojamento ocorre, comummente, por se verificar a suspensão dos membros, como consequência da existência de valores não liquidados, bem como a abatimentos relativos a Serviços de Alojamento (Accomodation Services Fees), como consequência da resignação dos membros. Os valores dos Serviços de Alojamento, cobrados para o exercício são assim revertidos na medida em que não seriam devidos, por se ter verificado a suspensão ou resignação anteriormente...."

Situação 2:

- Fatura nº 2, contabilizada pelo doc. 20001 de 2012-02-28 diário 53

Encontra-se contabilizado a crédito da conta SNC 7222 € 392.512,76 e a débito da mesma conta C 26.153,05 e C 23.619,82, cuja diferença corresponde ao montante de "Accomodation Fees" da fatura € 342.739.89

- Fatura nº 3, contabilizada pelo doc. 30001 de 2011-03-31

Encontra-se contabilizado na conta 7222, a crédito € 5.082,97, € 9.256,20 e € 420.623,69 e a débito da mesma conta 621.086,60, cuja diferença corresponde ao montante de "Accomodation Fees" da fatura € 413.876,26.

Foi remetido mail para o TOC em 13-02-2014 com o seguinte:

"No âmbito da ação inspetiva em curso, solicito os seguintes esclarecimentos:

- Faturas nºs 2, 3, 4 e 5 emitidas em 2010 pela A… à C.., que se encontram contabilizadas sob os documentos nº 20001, 30001, 40001 e 50001 do diário 53:

-Verifica-se que os movimentos que constam do diário de lançamento não correspondem ao descritivo da Fatura, a que se deve?

-Por favor demonstre como foi formado o preço constante em cada fatura (fatura 2: € 342,739.89, fatura € 413.876,26, fatura 4: € 412.910,68 e fatura 5: € 335.450,40)."

A resposta que consta do processo do contribuinte, foi recebida por mail em 03-03-2014, e dela consta:

"Verifica-se que os movimentos que constam do diário de lançamento não correspondem ao descritivo da fatura, a que se deve?"

Os descritivos apresentados no diário visam prestar informação suplementar à gestão relativamente à fatura emitida e integrada de forma automática na contabilidade.

Recuperando a informação que vos foi transmitida por email a 21/11/2013, na resposta ao ponto 4.2 O que significa "Disturbance allowance", refere-se que o preço dos Serviços de Alojamento, nos casos em apreço, é formado por duas componentes: o preço do alojamento durante determinada semana relativamente ao qual, eventualmente, poderá haver lugar a uma redução, pelo que o valor tributável para esses períodos, deve incluir os Serviços de Alojamento e a redução respetiva efetuada dentro da fatura.

No entanto não querendo a gestão perder a informação dos montantes relativos às Disturbance Allowance, é deixada evidência desses valores.

"Disturbance allowance - Corresponde a reduções efetivas aos Serviços de Alojamento (Accomodation Services Fees), que ocorrem em regra nos meses de janeiro a março e de novembro a dezembro, por forma a ajustar o preço do alojamento à qualidade dos serviços oferecidos. O preço dos Serviços de Alojamento ignorava inicialmente a necessidade de diferenciação da semana face ao seu posicionamento em cada época do ano, sendo que o disturbance allowance introduz uma discriminação negativa (desconto para alguns membros), como consequência, de se verificar, p.e,, que nos meses de época baixa, parte das villas é sujeita a trabalhos de renovação e remodelação, causando incómodo aos hóspedes (membros) das villas vizinhas, pelo que ao preço dos accomodation fees que é imputado a esses membros alojados é efetuado um desconto por forma a compensar os distúrbios causados. O valor desses descontos poderá corresponder a 25, 50, 75 ou 125 euros, dependendo dá vilta e semana a ocupar.',.."

Do explanado no ponto anterior, conclui-se que, embora o procedimento seja diferente, na prática, o que se verifica é que, aos serviços que são faturados pelo SP em determinado mês, são deduzidos diversos montantes, quer na fatura (situação 1), quer diretamente no lançamento contabilístico (que não corresponde diretamente à fatura, apenas ao valor líquido, conforme situação 2).

Conclui-se que, no caso da faturação das receitas de alojamento devidas pela C…, o SP funciona numa ótica de caixa, sendo reconhecido como ganho apenas o valor líquido da operação, quando o procedimento correto seria:

- Faturar o montante decorrente das prestações de serviços mensais, reconhecer contabilisticamente esse ganho e liquidar o correspondente IVA;

- Emitir nota de crédito a regularizar as situações faturação indevida ou de redução do valor faturado, como é o caso de descontos, desde que respeitadas as condicionantes contabilísticas e fiscais.

Acresce ainda que nas situações em que os valores deduzidos se referem a suspensões e resignações dos membros, que o SP designa por "Reversal Of Uncoll Acoom Serv Fee", entende-se que essa dedução aos ganhos não cabe ao SP, porquanto o cliente do SP é a empresa de direito inglês "C…" com sede na Ilha de Man, Reino Unido e não os sócios do clube de membros, que usufruem dos serviços de alojamento e serviços complementares prestados pelo SP e que celebraram um contrato com a C….

Veja-se a este respeito o contrato assinado entre o SP e a referida empresa, sua cliente, que consta do processo do contribuinte e de onde se transcreveu na página 6 do presente projeto de relatório a parte relacionada com a atividade desenvolvida pela empresa, mas que se volta a referir::

II Atividades desenvolvidas pelas outorgantes

- A A… é proprietária e gestora do empreendimento turístico sito na …, em Portugal, denominado B…, de ora em diante designado por empreendimento;

- A C… é detentora dos direitos de ocupação do empreendimento B… que gere através de um clube de membros:

• O direito de alojamento no empreendimento pertence aos membros do clube nos termos contratados entre estes e a C…, só podendo a A… alojar terceiros nos casos e nas condições especialmente previstos e autorizados pela C…:

A A… explora diretamente os equipamentos e instalações do clube, incluindo as instalações designadas por "clubhouse" que abrangem o restaurante, cabeleireiro, lojas e o bar, cobrando o respetivo preço aos utilizadores quando assim for o caso.

A A… vincula-se ainda.....:

....

- No âmbito da prática da boa gestão dos recursos disponíveis, promover a exploração das unidades disponíveis, tal considerando-se aquelas para as quais não exista reserva de alojamento.

Como contrapartida pelas prestações assumidas_pela A… no âmbito do presente contrato a C… obriga-se a_pagar àquela os valores apresentados no anexo 1..." (sublinhado nosso)

 

Acrescenta se ainda que no dossier de preços de transferência de 2011, que consta do processo do contribuinte, e referido na pag. 17:

" 5.3 Accomodation Fees

5.3.1 Breve descrição da operação vinculada

Proporcionar aos seus sócios/clientes da C…, o alojamento nas villas do empreendimento turístico da A… Lda, na … em Portugal..."

(sublinhado nosso)

Por outro lado, e conforme foi anteriormente transcrito, quando se referiu a "Reversal Of Uncoll Acoom Serv Fee" o SP assumiu que se tratam valores não cobrados aos membros do clube.

De acordo com o preconizado na NCRF 20, o rédito é reconhecido quando for provável que benefícios económicos futuros fluirão para a entidade e esses benefícios possam ser fiavelmente mensurados. O mesmo conceito é acolhido no nº 1 do artigo 18º do CIRC, segunda o qual os rendimentos são imputáveis ao período de tributação em que sejam obtidos, independentemente do seu recebimento, de acordo com o regime de periodização económica.

Pelo que se considera que o ganho decorrente dos serviços de alojamento deve ser reconhecido no exercício em que o membro tem direito a usufruir da moradia/semana e, caso não seja efetuado o respetivo pagamento, deverão ser tomadas as medidas previstas no CIRC, nomeadamente nos artigos 36º ou 41º, quando reunidas as condições neles previstas,

Ora, mesmo considerando a hipótese que se aceitava que este tipo de dedução aos ganhos cabe ao SP (e não se aceita pelo exposto nos parágrafos anteriores), mantém-se a incorreção ao nível do reconhecimento dos ganhos, por violação do disposto no nº 1 do artigo Í8º e na NCRF 20.

No que se refere ao designado pelo SP por "Disturbance Allowance", ou seja, reduções ao preço praticado em função da altura do ano, as mesmas estejam previstas no dossier de preço de transferência elaborado pelo SP no ponto 5.3.2.,e em termos práticos, consubstancia um desconto sobre o preço praticado.

(...)

III.1.2 Faturação de alojamento - Correções em imposto - IVA

O IVA funciona segundo o método do crédito de imposto, ou seja, "...aplicada a taxa ao valor global das transações da empresa, em determinado período, deduz-se ao montante assim obtido o imposto por ela suportado nas compras desse mesmo período, revelado nas respetivas faturas de aquisição. O resultado corresponde ao montante a entregarão Estado...." — 2º parágrafo ponto 4 do preâmbulo do Código do IVA.

Ou seja, ao IVA apurado nas operações ativas deduz-se o suportado nas operações passivas, não há lugar a encontro de contas.

As regularizações ao nível da retificação do valor tributável ou do imposto encontram-se previstas no artigo 78º do Código do IVA, concluindo-se que a prática do SP não respeita o estipulado neste artigo, pelo que as regularizações efetuadas são indevidas.

Procede-se ao apuramento das correções em IVA, imputando os montantes a corrigir aos períodos das faturas em que foram indevidamente deduzidos:

 

III. 2 Venda de golfe tributada à taxa reduzida

III. 2. 1 Venda de golfe tributada ã taxa reduzida - Os factos

A alínea a) do nº 1 do artigo 18º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA) refere que a taxa de 6% se aplica às prestações de serviços constantes da lista I anexa ao diploma e a alínea c) que se aplica a taxa de 23% às restantes prestações de serviços.

Até 2010-12-31 a verba 2.15 da lista referia: "Espetáculos, provas e manifestações desportivas, prática de actividades físicas e desportivas e outros divertimentos públicos. Excetuam-se a)...b)..."

Com a publicação da Lei nº 55-A/2010 de 31 de Dezembro (Orçamento de Estado para 2011), esta verba foi alterada, passando a constar: "Espetáculos, provas e manifestações desportivas e outros divertimentos públicos. Excetuam-se a)...b)..."

Em 2011-02-14 foi publicado o ofício circulado nº 30124 da Direcção de Serviços do IVA, onde no ponto 7 consta "... devendo entender-se que a verba 2.15 da Lista l Anexa ao CIVA contempla, apenas, as entradas ou bilhetes de ingresso em espetáculos, provas e manifestações desportivas e outros divertimentos públicos"., referindo ainda que o entendimento produz efeitos a partir de 1 de Março de 2011.

Depois de analisada a contabilidade do SP, constatou-se em 2011 foi aplicada a taxa reduzida nos serviços relacionados com a prática do golfe, nomeadamente nos "green fees" (valor cobrado ao golfista pela prática da modalidade desportiva no campo de golfe).

Nos documentos de receita consta que o IVA se encontra incluído, referindo a taxa de 6%.

Foi verificado que a contabilidade confere com as declarações periódicas (DP's) apresentadas pelo SP e que, o campo 3 (Imposto liquidado - taxa reduzida), contém os montantes de IVA liquidado nas contas 24331181 (IVA liq- vendas -tx 6% MN) e 24331281 (Iva Liq Op.Gerais --Tx 6% MN).

Na conta 24331181 encontra-se contabilizado o IVA liquidado, à taxa reduzida, nas vendas de golfe e na conta 72438 Golfe tx 6% a receita correspondente, cujos extratos constam no processo do contribuinte (de março a dezembro).

O SP procede ao reconhecimento dos ganhos e à liquidação do IVA pela receita diária, que e obtida por listagens geradas pelo sistema informático e que corresponde ao serviço efetivamente prestado, nomeadamente e no caso do alojamento os ganhos são reconhecidos nos dias das estadia efetiva, no caso da restauração ou do golfe, nas datas em que o serviço é prestado. A fatura é emitida no final do período de alojamento do cliente, pelo total, e não é contabilizada.

111. 2. 2 Venda de golfe tributada à taxa reduzida - Correções em Imposto - IVA

Logo, a correção a operar na presente ação inspetiva tem em consideração os valores a crédito constantes dos extratos da conta de proveitos (72438), deduzidos dos montantes a débito, tendo sido confirmadas as correções efetuadas a favor do SP.

No processo do contribuinte constam cópias exemplificativas da receita diária e faturas correspondentes de venda de golfe.

Conforme se referiu, em 2011 aos serviços de desporto, incluindo o golfe, deverá ser aplicada a taxa normal de IVA, ou seja, 23%.

Tendo o SP aplicado 6%, deverá ser liquidado adicionalmente 17% sobre a base tributável, conforme consta do quadro que compõe o anexo 1 (6 folhas impressas frente e verso, no total de 12 paginas) ao presente projeto de relatório e que se resume no quadro seguinte:

NOTA: No projeto de relatório foram considerados períodos mensais para efeitos de IVA, procede-se à reconfiguração em períodos trimestrais, de acordo com o enquadramento do SP em 2011. Não há alteração de valores.

III. 2. Correções totais em IVA

Decorrente das correções operadas nos pontos III.1.2 (alojamento) e III.2.2 (golfe), obtêm-se as correções totais em IVA:

NOTA: No projeto de relatório foram considerados períodos mensais para efe tos de IVA, procede-se à reconfiguração em períodos trimestrais, de acordo com o enquadramento do SP em 2011. Não há alteração de valores.

j)      A Requerente foi notificada para exercer o direito de audição sobre o Projecto de Relatório da Inspecção Tributária, mas não o exerceu;

k)     A Requerente factura periodicamente à C… as semanas que vão sendo objecto de uso pelos membros do Clube de acordo com os valores que são para o efeito fixados todos os anos;

l)      Quando um membro do Clube renuncia a essa condição ou quando falte a qualquer pagamento devido à C…, e por isso não exerça ou não possa exercer o seu direito de alojamento, não é, por sua vez, devido qualquer valor pela C…, porquanto não é prestado qualquer serviço pela ora impugnante;

m)    A condição do membro e o seu inerente direito de alojamento suspende-se ou extingue-se, caso este falte a qualquer pagamento que lhe é cobrado pela C…;

n)     Os valores que correspondam a alojamento que os membros não puderam ou não quiseram usar, porque não pagaram ou simplesmente porque se desinteressaram, não são cobrados pela Requerente à C…;

o)     Para controlo recíproco da C… e da impugnante, esses valores são reflectidos de acordo com o apuramento que anualmente é feito pela primeira e conferido pela segunda - nas facturas emitidas à C…, em regra na última do ano, sob a designação de reversal of uncoll accom serv fee;

p)     Tais valores são assim deduzidos em regra na última factura do ano porque só então é possível à C… identificar todas as semanas que não foram ocupadas pelos membros durante esse ano por qualquer uma das referidas razões que conduziram à suspensão ou extinção dos seus direitos de alojamento no aldeamento da impugnante;

q)     No ano de 2011 aqui em apreço, a ora impugnante incluiu nas suas facturas nºs 13/2011 e 14/2011, de 30 de Novembro de 2011 e de 31 de Dezembro de 201L respectivamente, ambas emitidas à C…, sob a rubrica reversal of uncoll accom serv fee valores negativos de € 57.203,25, € 24.230,08, € 74.623,46 e € 78.551,34, na factura de Novembro e de € 84.225,44 na factura de Dezembro (documentos n.ºs 6 e 7 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);

r)      Esses valores têm subjacentes serviços de alojamento que não chegaram a ser prestados aos membros no decurso de 2011;

s)     Disturbance allowance designa um desconto concedido à C… que incide sobre o preço do alojamento dos membros do Clube nos meses de época baixa;

t)      Esses descontos são reflectidos ora apenas na contabilidade da ora impugnante, ora também nas facturas emitida à C…, igualmente para controlo recíproco das partes:

u)     No ano de 2011, a Requerente emitiu à C… as facturas nº 2/2011 e nº 3/2011, de 28 de Fevereiro de 2011 e de 31 de Março de 2011, respectivamente, por contrapartida do serviço de alojamento que prestou nesses períodos aos membros do Clube, nos valores de € 421.570,06 e de € 509.067,80, IVA incluído (documentos n.ºs 9 e 10 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);

v)     Tais valores contemplaram um desconto de € 49.772,87 referente ao mês de Janeiro c de € 21.089,60 referente ao mês de Fevereiro, ambos a título de disturbunce allowance;

w)   Sobre esses valores a administração tributária liquidou IVA adicional de € 16.298,37, com fundamento na violação do artigo 78.º do CIVA, que incluiu na liquidação de 1103T;

x)     Em 2011, a impugnante contratou com várias empresas condições preferenciais de acesso dos seus clientes aos seguintes campos de golfe (documento n.º 11 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

y)     Entre Março e Dezembro de 2011 o total de partidas de golfe vendidas pela impugnante aos seus clientes ascendeu a € 674.657,19, acrescido de IVA de 6% (fls. 16 do Relatório e anexo I ao mesmo);

z)     A Requerente pagou as quantias referentes as liquidações de IVA e juros compensatórios (documento n.º 20 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

aa)  Em 27-10-2014, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.

 

3.2. Factos não provados

 

Não há factos relevantes para a decisão da causa que não se tenham provado.

 

3.3. Fundamentação da decisão da matéria de facto

 

Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos ao pedido de pronúncia arbitral e que constam do processo administrativo e com base nos depoimentos prestados na reunião realizada.

As testemunhas inquiridas aparentaram depor com isenção e com conhecimento dos factos sobre que se pronunciaram.

 

4. Matéria de direito

 

           

4.1. Questão do IVA relativo a alojamento

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou correcção em sede de IVA por entender que o IVA funciona segundo o método do crédito de imposto, devendo ser aplicada a taxa ao valor global das transacções da empresa em determinado período e deduzido ao montante assim obtido o imposto suportado nas compras desse mesmo período, relevado nas respectivas facturas de aquisição, baseando-se no 2º parágrafo ponto 4 do preâmbulo do Código do IVA.

No entender da Autoridade Tributária e Aduaneira, ao IVA apurado nas operações activas deduz-se o suportado nas operações passivas, não havendo lugar a encontro de contas, sendo que as regularizações ao nível da rectificação do valor tributável ou do imposto encontram-se previstas no artigo 78.º do Código do IVA, concluindo-se que a prática do SP não respeita o estipulado neste artigo, pelo que as regularizações efetuadas são indevidas.

A Requerente defende que a matéria não tem enquadramento no artigo 78.º do CIVA e que ao valor tributável serão excluídos os "descontos, abatimentos e bónus concedidos", como resulta expressamente do n.º 6 do artigo 16.º do Código do IVA. Defende a Requerente que, constituindo o designado «disturbance allowance» um desconto, como reconhecem os serviços de inspecção, nada proíbe, antes tudo impõe, que fosse este excluído do valor tributável das facturas n.ºs 2/2011, 3/2011, 13/2011 e 14/2011.

A correcção de IVA efectuada pela Autoridade Tributária e Aduaneira relativamente aos descontos efectuados relativamente aos alojamentos não tem fundamento legal.

Desde logo, o preâmbulo do CIVA não tem valor normativo, podendo ser relevante apenas para interpretar normas desse Código.

Por outro lado o artigo 78.º CIVA reporta-se a regularizações, posteriores à emissão de facturas, como resulta explicitamente do seu n.º 1, ao estabelecer, na redacção vigente em 2011, que «as disposições dos artigos 36.º e seguintes devem ser observadas sempre que, emitida a factura ou documento equivalente, o valor tributável de uma operação ou o respectivo imposto venham a sofrer rectificação por qualquer motivo».

No caso em apreço, no momento da emissão da factura foi efectuado uma redução, relativa a «disturbance allowance» e, por isso, a emissão da factura deveria ser efectuada, com foi, abatendo o valor do desconto ao valor global do serviço prestado, como decorre do artigo 16.º, n.º 6, alínea b), do CIVA que estabelece que «do valor tributável referido no número anterior são excluídos: (...) b) Os descontos, abatimentos e bónus concedidos».

Assim, tendo as facturas referidas sido emitidas quando já havia lugar à redução, esta norma dá suporte legal à não consideração do valor da redução, ao valor da transacção.

Por isso, a correcção efectuada enferma de vício de violação de lei, designadamente dos artigos 16.º, n.º 6, alínea b), e 78.º do CIVA, que justifica a anulação da liquidação relativa ao período 1103T na parte correspondente a € 16.297,68 (Relatório da Inspecção Tributária, página 14) ( [1] ).

 

4.2. Questão da aplicação da taxa reduzida de IVA

 

A Requerente estabeleceu contratos com empresas que exploram campos de golfe para proporcionarem acesso aos seus clientes em condições preferenciais.

Pela análise da contabilidade da Requerente, a Autoridade Tributária e Aduaneira constatou que, em 2011, foi aplicada a taxa reduzida de IVA, de 6%, nos serviços relacionados com a prática do golfe, nomeadamente nos denominados "green fees", que é o valor cobrado ao golfista pela prática da modalidade desportiva no campo de golfe.

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que, no ano de 2011, deveria ter sido aplicada a taxa normal de IVA, de 23%, com base na redacção da verba 2.15 da Lista I, anexa ao CIVA.

A taxa normal de IVA no ano de 2010 era de 23%, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 18.º do CIVA, na redacção da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro.

A Lista I anexa ao CIVA arrola os bens e serviços sujeitos a taxa reduzida, que era de 5% e4 passou a ser de 6% com a redacção dada pela Lei n.º 12-A/2010, de 28 de Agosto, à alínea a) do n.º 1 do artigo 18.º do CIVA.

Com a Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a redacção da verba 2.15 da Lista I, passou a ser a seguinte:

 

2.15 - Espectáculos, provas e manifestações desportivas e outros divertimentos públicos.

 

Na redacção anterior esta verba tinha a seguinte redacção:

2.15 - Espectáculos, provas e manifestações desportivas, prática de actividades físicas e desportivas e outros divertimentos públicos

 

Isto é, na redacção vigente em 2011 suprimiu-se a referência à «prática de actividades físicas e desportivas» entre as prestações de serviços a que é aplicável a taxa reduzida.

A interpretação que decorre linearmente desta alteração legislativa é a de que deixou de se aplicar a taxa reduzida aos serviços relacionados com a «prática de actividades físicas e desportivas», desde que esta não esteja conexionada com espectáculos, provas e manifestações desportivas.

O Supremo Tribunal Administrativo tem-se pronunciado repetidamente, de modo uniforme, no sentido de que, à face deste nova redacção da verba 2.15 (actualmente revogada), o chamado «green fee», que constitui uma «taxa de utilização do campo», não se encontra abrangido pela taxa reduzida.

Refere-se no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 08-04-2015, proferido no processo n.º 0744/14:

«É comumente aceite que os “green fees” se tratam de taxas de utilização dos “greens” por parte dos jogadores de golfe, nos campos dos quais não sejam sócios ou membros, ou dos campos meramente comerciais, já que nos campos explorados por clubes ou associações de que os jogadores sejam membros a utilização do “green” é um dos direitos do membro, decorrente dessa sua qualidade.

No dizer do TJUE, aqueles “green fees” tratam-se da contrapartida económica pela concessão do direito de utilizar esse campo de golfe aos visitantes não membros desse mesmo organismo, cfr. Acórdão datado de 19/12/2013, Processo n.º C-495/12, Commissioners for Her Majesty’s Revenue and Customs contra Bridport and West Dorset Golf Club Limited.

Mais esclarece o TJUE que, “Atendendo a que o acesso ao campo de golfe é necessário para praticar este desporto, a prestação que consiste na concessão do direito de utilizar um campo de golfe está estreitamente relacionada com a prática de desporto na acepção do artigo 132.º, n.º 1, alínea m), da Directiva 2006/112, independentemente do facto de se saber se a pessoa em questão pratica golfe de forma regular ou organizada, ou tendo em vista participar em competições desportivas.”.

Deste excerto, já podemos começar a ter uma ideia do tipo de utilização do “green” que está intimamente ligado ao dito “green fee”.

Conforme se pode também colher do site da Federação Portuguesa de Golf (http://portal.fpg.pt/web/guest/clubes), pode-se constatar que são seus filiados, Clubes, Associações e Sociedades - tais como a recorrida -, do conjunto destes membros há alguns que dispõem de “Campo” próprio - tal como a recorrida -, e do conjunto de filiados com “Campo” próprio, só alguns estão habilitados à organização de Torneios – onde não se insere a recorrida.

Além disso, e como se depreende das “Regras de Golfe”, também inseridas na página daquela Federação (http://portal.fpg.pt/web/guest/regra-7-treino), na Regra 7, está previsto o treino por contraposição às competições, sendo certo que estas “Regras” estão estabelecidas para a realização de competições entre atletas (profissionais ou amadores), não estando aí expressamente previstas todas as possíveis utilizações do “Campo” de golfe em situações de não competição.

Além disso, por regra, todas as competições de golfe têm um regulamento próprio, onde é estabelecido um número máximo de inscrição de jogadores, o valor a pagar pela inscrição, a modalidade, demais regras e respectiva informação técnica.

Ou seja, daqui se pode concluir, com alguma facilidade, que o chamado “green fee” não se destina a permitir o acesso do jogador ao campo de golfe para participar numa competição, prova ou manifestação desportiva, antes se destina a que o jogador tenha acesso ao campo, para treinar o seu jogo individual, ou acompanhado de outros jogadores, mas sem que se possa atribuir a tal actividade desportiva as características próprias de uma manifestação desportiva, ou prova, enquanto tal.

Na verdade, o conceito de manifestação desportiva, tal como usado pelas Leis Fiscais, na Lei de Bases da Actividade Física e do Desporto, artigo 32º, e no Decreto Regulamentar n.º 2-A/2005 de 24/03, artigos 2º e 6º, implica que a manifestação desportiva, quer se destine à competição, quer se destine à divulgação de actividades desportivas, exige uma preparação anterior, uma organização anterior que implica divulgação pública, adequação de espaços, disponibilização de pessoal qualificado para tarefas auxiliares ou de arbitragem, obtenção de licenças, etc… Sendo certo, também, que a expressão “manifestação desportiva”, sem carácter de competição, está sempre intimamente ligada a actividade desportiva no espaço público, cfr. os preceitos legais acima referidos.

De resto, o estabelecimento do “Handicap” de cada jogador de golfe, que (pode) ocorre(r) fora de competição, não está intimamente ligado ao pagamento do “green fee”, uma vez que cada jogador pode fazer a “volta” ao campo para estabelecimento desse “Handicap” no âmbito da qualidade de associado de um Clube filiado na FPG (cfr. http://portal.fpg.pt/web/guest/sistema-de-handicaps-ega) e no caso de o fazer no campo do clube de que é membro, como já vimos, não carece de pagar o dito “green fee”, uma vez que já paga uma quota anual.

Assim, e ao abrigo do disposto nos artigos 9º do Código Civil e 11º da Lei Geral Tributária, as normas em apreço não são susceptíveis de outra interpretação que não seja esta, posto que, as mesmas expressões usadas pelo legislador nos diversos diplomas legais assumem sempre o mesmo sentido, referem-se sempre à mesma realidade material, ao mesmo facto da vida real que pretendem regular e regulamentar».

 

Esta jurisprudência foi reiterada nos acórdãos de 08-04-2015, proferidos nos processos n.ºs 745/14 e 0797/14, e nos acórdãos de 22-04-2015, proferidos nos processos n.ºs 0763/14 e 0747/14.

À face desta interpretação, que tem manifesto apoio no texto da verba n.º 2.15 na redacção introduzida pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, o que é decisivo para enquadramento de uma prestação de serviços no seu âmbito não é a circunstância de se tratar ou não de uma actividade desportiva regulamentada, mas sim a de ela se inserir num espectáculo, prova ou manifestação desportiva de natureza pública.

Por isso, é correcta a posição assumida pela Autoridade Tributária e Aduaneira, ao entender que não é aplicável a taxa reduzida às prestações de serviços que se consubstanciam em proporcionar acesso aos campos de golfe, fora do âmbito de espectáculos, provas e manifestações desportivas.

Assim, improcede o pedido de pronúncia arbitral, quanto a esta questão.

 

5. Reembolso das quantias pagas e juros indemnizatórios

 

Como resulta do exposto, apenas procede o pedido de pronúncia arbitral quanto à questão da anulação da correcção relativa ao IVA respeitante a prestação de serviços de alojamento.

Nessa parte, o erro da liquidação é imputável a Autoridade Tributária e Aduaneira, já que a Requerente em nada c0ntribuiu para que ele fosse praticado.

Por isso, tendo a Requerente pago as quantias de IVA e juros compensatórios que foram liquidadas, tem direito ao seu reembolso e a juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º, n.º 1, da LGT, na parte correspondente ao IVA e juros compensatórios que pagou relativamente àquela prestação de serviços de alojamento.

Os juros indemnizatórios são devidos, à taxa legal supletiva, desde a data em que foram pagas as quantias referidas (24-06-2014) até à data em que vier a ocorrer o reembolso.

No que concerne às outras quantias pagas, improcedendo o pedido de pronúncia arbitral, improcedem também os pedidos de reembolso e juros indemnizatórios, pois pressupunham a ilegalidades das liquidações.

 

6. Decisão

 

Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:

 

a)     Julgar procedente a excepção da intempestividade quanto à impugnação da liquidação de IRC e absolver a Autoridade Tributária e Aduaneira da instância, na parte respectiva;

b)     Julgar parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral quanto à questão do IVA relativo ao alojamento e anular a liquidação de IVA relativa ao período 1103T na parte correspondente a € 16.297,68, bem como a liquidação de juros compensatórios na parte correspondente a esta quantia, e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a reembolsar a Requerente dessa quantia e respectivos juros compensatórios, bem como a pagar à Requerente juros indemnizatórios calculados à taxa legal supletiva sobre a quantia a reembolsar desde 24-06-2014, até integral pagamento;

c)     Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral quanto às liquidações de IVA e juros compensatórios relativas aos períodos 1106T e 1109T, nos montantes de € 35.728,94 e € 26.541,81, respectivamente, e absolver a Autoridade Tributária e Aduaneira dos pedidos de anulação, reembolso e juros indemnizatórios respeitantes a estas liquidações;

d)     Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral quanto à liquidação relativa ao período 1103T na parte correspondente ao IVA respeitante às despesas referentes ao golfe (€ 16.328,24) e juros compensatórios respeitantes a esta quantia, e absolver a Autoridade Tributária e Aduaneira de anulação, reembolso e juros indemnizatórios respeitantes a esta parte da liquidação relativa ao período 1103T e respectivos juros compensatórios;

 

 

7. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto no art. 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 423.858,37.

 

8. Custas

 

Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 6 732,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

Lisboa, 05 de Junho de 2015

 

Os Árbitros

 

 

(Jorge Manuel Lopes de Sousa)

 

 

 

(Jaime Carvalho Esteves)

 

 

 

 

(Filipa Barros)

 

 

 



[1]             A liquidação relativa ao período 11/12T não é impugnada no presente processo.