Decisão Arbitral
ACÓRDÃO
Requerentes: A... (NIF…) e B... (NIF …), doravante Requerentes, residentes na Rua … .
Requerida: Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante AT.
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RELATÓRIO
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Em 11 de Março de 2013, foi aceite o pedido de constituição de tribunal arbitral, nos termos do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), que os Requerentes submeteram ao Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), solicitando a anulação das liquidações adicionais de IRS e de juros compensatórios do ano de 2009 (liquidação de IRS n.º 2012 … e compensação n.º 2012 …), no montante global de €326.200,18.
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Nos termos do artigo 6.º, n.º 2, alínea a), do RJAT e por decisão do Conselho Deontológico foram designados árbitros do tribunal arbitral colectivo os Senhores Conselheiro Benjamim Silva Rodrigues, Prof. Doutor Manuel Pires e Dr. João Maricoto Monteiro, que aceitaram a nomeação no prazo legal para o efeito.
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O tribunal arbitral foi constituído no dia 14 de Maio de 2013 (cfr. Acta de constituição do tribunal arbitral), tendo a AT sido notificada para apresentar resposta, no prazo e termos legais. Foi designado o dia 9 de Julho de 2013 para realização da primeira reunião do tribunal arbitral, a que alude o art.º 18.º do RJAT, entretanto adiada e reagendada para o dia 17 de Setembro de 2013.
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A Requerida apresentou a sua resposta em 14 de Junho de 2013, pugnando, aí, pela manutenção do acto sindicado.
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Na reunião do tribunal arbitral, realizada nos termos e com os propósitos do artigo 18º do RJAT, foi, após apreciação e discussão, decidido por unanimidade pelos árbitros que compõem o colectivo estar em condições de conhecer o mérito da causa sem necessidade de audição das testemunhas arroladas pelas partes.
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Ouvidas as partes, foi também decidido dispensar a produção de alegações orais.
A.1) O Pedido dos Requerentes
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A fundamentar o pedido de decisão arbitral, a Requerente alegou, em síntese, que:
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Caducidade do direito à liquidação (artigo 63, n.º 3 do CPPT)
Verifica-se a caducidade do direito à liquidação do imposto, porquanto, em 2008, à data dos factos relevantes (transformação da sociedade e efectivação do facto tributário consistente na venda das acções por parte das Requerentes), o artigo 63.º, n.º 3, do CPPT [Código de Procedimento e de Processo Tributário] impunha que o procedimento por aplicação das normas anti-abuso só podia ser aberto no prazo de três anos a contar do início do ano civil seguinte ao da prática da operação.
Deste modo, o procedimento só podia ter sido iniciado até 31.12.2011 e, no caso presente, iniciou-se apenas em Junho de 2012.
Com efeito, a disposição que impunha a abertura do procedimento no referido prazo de três anos, só foi revogada pelo Orçamento de Estado para 2012, o qual apenas entrou em vigor em Janeiro de 2012, altura em que aquele prazo já tinha decorrido totalmente. Pelo que a extensão do prazo de abertura do processo não se aplica ao presente caso.
A abertura do procedimento teve lugar quando já estava esgotado o respectivo prazo, o que tem como consequência a ilegalidade da liquidação consequente, por violação de lei e das garantias dos contribuintes, traduzidas aqui na proibição da retroactividade da lei tributária.
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Violação do artigo 37º do CPPT
A liquidação operada não indicava que o contribuinte poderia aceder à arbitragem tributária, não indicando também o respectivo prazo e procedimento.
O contribuinte solicitou essa informação, tendo recebido uma resposta lacónica, em que não se nega o direito à arbitragem mas também não refere peremptoriamente como aceder.
Deste modo, a liquidação e fundamentação são ilegais por não conterem os elementos que a lei impõe.
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Vício de fundamentação (artigo 77.º da LGT e 63.º do CPPT)
A aplicação da cláusula geral anti-abuso exige uma especial ponderação e fundamentação na qual a autoridade tributária tem que explanar e provar detalhadamente o preenchimento dos respectivos pressupostos, estando a seu cargo o ónus de demonstrar a respectiva verificação.
O acto tributário em causa padece de quatro vícios de fundamentação:
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A fundamentação é deficiente, parcial e errónea ao desatender totalmente a declaração dos compradores que atestam ter sido uma exigência sua a transformação da sociedade em sociedade anónima em momento prévio à respectiva aquisição. Ao ignorar este facto, não dando crédito à declaração em causa, a autoridade tributária foi parcial e tornou a fundamentação errónea porque sustentada em factos que não correspondem à verdade;
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A fundamentação é também insuficiente porque, na pendência da inspecção, a autoridade tributária não efectuou as diligências a que estava obrigada na descoberta da verdade material, designadamente abstendo-se de confirmar junto dos compradores a declaração que estes apresentaram e, consequentemente, não indagando a motivação que determinou a transformação da sociedade.
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A fundamentação também não contradita minimamente a argumentação apresentada no âmbito do exercício do direito de audição prévia dos contribuintes, o que constitui o terceiro vício de fundamentação de que padece o acto tributário.
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Por último, existe um quarto vício de fundamentação consistente no facto de a mesma ser meramente conclusiva, sem indicação de factos concretos que a sustentem, numa atitude parcial e “persecutória”.
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Violação do art. 38.º, n.º 2, da LGT por inexistência dos respectivos pressupostos de aplicação
A aplicação do artigo 38.º, n.º 2, da LGT depende do preenchimento cumulativo de quatro requisitos: (1) elemento meio; (2) elemento resultado; (3) elemento intelectual e (4) elemento normativo
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O elemento meio impõe que a prática dos actos seja dirigida essencial ou principalmente à eliminação do imposto devido.
No presente caso, tal elemento só se teria por verificado se a transformação da sociedade (por quotas em anónima) tivesse sido dirigida à eliminação do imposto de mais-valias com a venda da participação na sociedade.
Ora, tal não é o caso presente, porquanto tal transformação foi uma condição imposta pelos compradores para a consumação do negócio, tal como consta do contrato-promessa de compra e venda de acções celebrado entre as partes.
E os compradores apresentaram seis razões ponderosas para justificar tal condição. Não foi, por isso, por vontade dos vendedores (ora Requerentes) que a transformação ocorreu em momento prévio à alienação.
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O elemento resultado, que determina que o fim da actividade do contribuinte seja a obtenção de uma vantagem fiscal (eliminação do imposto), também não se verifica no caso presente.
Com efeito, a Requerente procedeu à transformação da sociedade para cumprir uma condição imposta pelos compradores para a transmissão dos títulos, sem a qual não haveria negócio.
A transformação teve assim por objectivo único a criação de condições para que o negócio se realizasse. Os compradores apenas aceitavam comprar uma sociedade anónima; não queriam uma sociedade por quotas.
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Também o elemento intelectual, nos termos do qual o contribuinte pratica determinados actos ou contratos para obter a vantagem fiscal (essencial ou principalmente), não se encontra presente no caso em análise.
Com efeito, a contribuinte A... votou a transformação, não para obter uma vantagem fiscal (poupança de IRS de cerca de 280 mil euros), mas sim para viabilizar o negócio de quase três milhões de euros.
Se os compradores não quisessem comprar uma SA e não tivessem imposto a condição de a transformar para consumar o negócio, a contribuinte teria sempre vendido as suas quotas pois o seu intuito substancial era vender a sociedade, independentemente do regime fiscal que lhe fosse aplicável.
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Por último, o elemento normativo também não se preenche na venda em causa. Com efeito, a contribuinte não actuou por meios artificiosos ou fraudulentos e em abuso de formas jurídicas.
É que a transformação em sociedade anónima seguida de venda das acções, sem tributação porque detidas fiscalmente há mais de 12 meses por soma do prazo de detenção das acções e das quotas na sua origem, nunca se traduz em “meios artificiosos e fraudulentos e com abuso de formas jurídicas”.
Com efeito, é a própria lei fiscal que cria a exclusão de tributação (e não isenção) de acções detidas por mais de 12 meses e que, mais ainda, permite que o período de detenção de quotas conte para efeitos de detenção de acção da sociedade transformada. Isto resulta de uma vontade do Estado de fomentar a existência de sociedades anónimas para melhor governo, mais profissionalismo na gestão, melhor controlo e hipotética abertura do capital em bolsa, por um lado, e de fomentar a transmissão de acções (o mercado), por outro.
Pelo que nunca se poderia considerar verificado o elemento normativo num caso como o presente.
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Ilegalidade dos juros compensatórios (art.º 35º da LGT)
Por último, sustentam ainda os Requerentes que, mesmo que a liquidação operada não fosse ilegal – o que é considerado por mera hipótese académica –, sempre o seriam os juros compensatórios, porquanto os mesmos estão associados a um juízo de censura ou de culpa do contribuinte no atraso ou omissão do pagamento de impostos.
No caso presente, os Requerentes actuaram com base numa interpretação plausível da lei fiscal, pelo que não se lhes pode ser assacado qualquer comportamento intencional e culposo numa eventual errada interpretação e aplicação da lei fiscal.
Não se verifica, assim, um dos requisitos para aplicação de juros compensatórios, não podendo consequentemente ser os mesmos exigidos aos Requerentes.
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Em face do exposto, os Requerentes solicitam:
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a anulação da liquidação em causa com todas as consequências legais, nomeadamente em matéria de juros;
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a extinção do plano de pagamento prestacional que solicitaram cautelarmente com devolução das prestações pagas, acrescidas de juros de lei, bem como indemnização por danos por garantia devida (no caso de a autoridade tributária a exigir);
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a condenação da autoridade tributária nas custas do processo.
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Para prova do alegado, arrolam cinco testemunhas.
A.2) A Resposta da Requerida
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Na sua resposta, a Requerida pugnou pela total improcedência do pedido, sustentando o acto sindicato com a seguinte fundamentação:
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Quanto à caducidade
Foi já clarificado, designadamente pelo CAAD (Processo 123/2012-T) que o prazo de caducidade do artigo 63.º, n.º 3, do CPPT tem natureza procedimental, pelo que, verificando-se que no decurso do prazo de caducidade surgiu uma nova lei que alterou o termo inicial do prazo – o qual deixou de ser a data de ocorrência do facto tributário para passar a ser o ano civil seguinte àquele em que se verificou a exigibilidade do imposto – a mesma é de aplicação imediata.
Conclui assim que o prazo para abertura do procedimento de aplicação da cláusula anti-abuso tem por referência para início de contagem, no caso presente, o dia correspondente à venda das acções da sociedade.
Mesmo que assim não se entendesse, sempre diz que, na aplicação de normas anti-abuso - e no caso presente, em particular - há que considerar um conjunto complexo de actos sujeitos a uma arquitectura global (onde se encontram também actos preparatórios), pelo que somente na sua visão completa se pode detectar o desenho elisivo.
Ora, tal visão completa só se concretiza em 12.05.2009 quando os Requerentes apresentam a sua declaração modelo 3 de IRS, relativa ao ano de 2008, onde declaram (anexo G1) a operação de alienação de acções efectuada. Pelo que só a partir daquela data pôde iniciar o procedimento.
Pelo que o procedimento foi aberto em tempo ao abrigo do n.º 3 do art.º 63.º do CPPT, na redacção dada pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro.
Acresce ainda que, tendo o contrato promessa de venda de participações sociais sido celebrado em 15.07.2008 e com a entrada em vigor da Lei 64-B/2011 de 30.12, cujo artigo 152º veio alterar o artigo 63.º do CPPT, se considerarmos que o procedimento específico em causa foi iniciado em 12.07.2012, estando somente sujeito à redacção daquela norma, sempre lhe seria aplicável o prazo geral de caducidade.
Assim, partindo da referida data de 15.07.2008, a liquidação do imposto que se mostre devido por aplicação do art.º 45.º da LGT prolonga-se até 31.12.2012, tendo consequentemente o procedimento sido iniciado no prazo legal concedido para o efeito.
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Quanto aos requisitos de aplicação
Estão preenchidos todos os elementos de aplicação do artigo 38.º, n.º 2 da LGT. Senão vejamos:
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O elemento meio ou forma utilizada que corresponde à via escolhida pelos Requerentes para obter o desenhado ganho ou vantagem fiscal encontra-se claramente identificado nos negócios jurídicos considerados abusivos – porque obedecendo a um planeamento à medida - feito de uma forma inusual e cujo propósito só se pode justificar com a obtenção de uma vantagem fiscal.
A “conveniência” da condição prévia da transformação social não encontra, nem nos argumentos, nem na análise objectiva das motivações dos compradores, uma lógica intrínseca que não passe pelo ganho fiscal que de outra forma não seria possível obter.
Se tivesse ocorrido a transmissão de quotas e não de acções, se não se tivesse operado a transformação da sociedade, as mais-valias apuradas estariam sujeitas a tributação autónoma à taxa de 10%.
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O elemento resultado ou vantagem fiscal prosseguida pelos Requerentes teve como objectivo a eliminação da tributação de IRS em 2008 e para que tal se apresentasse perfeito e insuspeito, procuraram os Requerentes através do refinamento da estrutura de actos sequenciais adoptados afastar quaisquer dúvidas sobre a legalidade da operação.
Conclui-se que a alienação da totalidade das acções na posse dos Requerentes tivera o mesmo fim económico que a alienação da quota que anteriormente detinham: o controlo da titularidade da sociedade e da sua direcção ou administração (pelos compradores).
Dúvidas não há de que o que os Requerentes pretendiam, com a celebração do negócio em causa, era a eliminação dos impostos e não cumprir uma condição imposta pelos compradores.
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Quanto ao elemento normativo subjaz a desconformidade do resultado obtido com a ratio legis, o espírito ou propósito da lei e os princípios do sistema fiscal.
Relativamente a este elemento, não há quaisquer dúvidas que o mesmo está preenchido.
É que a exclusão das mais-valias provenientes da alienação das acções detidas por mais de 12 meses teve subjacente critérios exclusivos de política fiscal para incentivar o mercado de capitais e atrair investimento, mas sem deixar de tributar a mera especulação mobiliária de curto prazo ou qualquer forma artificiosa de exclusão, sendo esta última o que se passou no caso, ao atribuir aos actos forma diferente da substância.
Ora, o aproveitamento ilícito, através de meios artificiosos ou fraudulentos, não pode deixar de merecer censura normativo-sistemática por parte do ordenamento jurídico.
Tem sido este o entendimento seguido pelo Tribunal Central Administrativo que aponta para um sentido lato de antijuridicidade com remissão para os conceitos que, nesta matéria, vão sendo aclarados e fixados pelo Tribunal de Justiça das Comunidades.
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Em relação ao elemento intelectual, atentas as sequências lógica e cronológica em que foram celebrados os negócios jurídicos em questão, o mesmo permite que se considere este conjunto de negócios um esquema concebido e executado como mera ferramenta para obtenção de evasão fiscal, com manifesto abuso das formas jurídicas utilizadas.
O que resulta desde logo corroborado pelo facto do objecto social prosseguido por qualquer das duas sociedades nunca ter sofrido qualquer alteração, que seria natural no sentido da sua diversidade ou expansão.
Surpreende ainda que a sociedade em causa, já depois de redenominada de … S.A para …, S.A. ter sido objecto de um projecto de fusão na modalidade de incorporação na sociedade … UNIPESSOAL LDA, uma sociedade unipessoal por quotas cujo registo de constituição remonta a 14.03.2008.
Não se percebe porque queriam os compradores uma sociedade anónima para depois a incorporarem por fusão numa sociedade unipessoal por quotas.
Pelo que parece claro que o principal – senão único - escopo da transformação da sociedade pelos Requerentes era a eliminação da tributação incidente sobre a venda de participações sociais.
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Por último, quanto ao elemento sancionatório, que consiste na desconsideração dos efeitos fiscais dos contratos de compra e venda de acções celebrados pelos Requerentes (alienantes), sendo antes tributado o negócio jurídico considerado usual para obter o efeito económico em causa.
Pelo que está devidamente fundamentada a decisão e estão reunidos todos os pressupostos previstos no artigo 38º, n.º 2, da LGT que determinam a aplicação da cláusula geral anti-abuso para efeitos de liquidação do imposto que se mostre devido.
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Quanto à falta de fundamentação e do ónus da prova
A fundamentação da aplicação da cláusula geral anti-abuso foi efectuada em conformidade com os requisitos estabelecidos no artigo 63º do CPPT.
A cláusula geral anti-abuso é uma última reserva de legalidade que permite à Administração Fiscal declarar a ineficácia de negócios jurídicos que sejam feitos com o objectivo principal de reduzir, eliminar ou diferir impostos para reduzir a factura fiscal.
E se é facto que a liberdade de gestão fiscal tem a sua expressão nas liberdades de iniciativa económica e de empresa, que passam pela legitimação da empresa na escolha da sua forma e organização, em sociedade por quotas ou anónima, do financiamento ou do local da sede, esta liberdade só pode ser entendida no plano da razoabilidade e com base num relacionamento justo e equilibrado, sendo a subsistência e manutenção do sistema fiscal e a satisfação das necessidades do Estado num quadro de repartição justa do rendimento e da riqueza, alguns dos limites dessa liberdade.
Aceitar esta transformação de sociedade como legítima significaria a subversão do princípio da legalidade e da igualdade – da capacidade contributiva. Aceitar a actuação dos Requerentes é dar cobertura a uma operação abusiva.
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Por fim, os juros compensatórios
Os juros compensatórios integram-se na dívida de imposto, sendo liquidados em conjunto com este e formam com aquela a globalidade da quantia devida, sendo necessário naturalmente que exista um nexo de causalidade adequada entre a actuação do contribuinte e o retardamento da liquidação.
No caso em apreço, o retardamento da liquidação da mais-valia tributável deveu-se única e exclusivamente a factos susceptíveis de serem imputáveis aos contribuintes, pelo que se verifica tal nexo de causalidade adequada sendo consequentemente devidos os juros compensatórios liquidados.
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Conclui a autoridade tributária pela caracterização da operação como manifestamente artificial e abusiva, pois teve como objectivo a transformação artificial de uma mais-valia a pagar, numa mais-valia excluída de tributação, sem que, para o efeito, houvesse qualquer justificação económica.
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Termina arrolando três testemunhas.
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Com a sua resposta, juntou o Processo Administrativo.
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SANEAMENTO DO PROCESSO
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O tribunal é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído nos termos do RJAT.
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As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas.
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O processo não padece de vícios que o invalidem.
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THEMA DECIDENDUM
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Foi submetida a este Tribunal Arbitral a apreciação da legalidade da liquidação adicional de IRS n.º 2012 … e compensação n.º 2012 …, no montante global de €326.200,18, operada pela Autoridade Tributária por referência ao ano de 2009, com recurso à cláusula geral anti-abuso prevista no artigo 38.º, n.º 2, da LGT.
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MATÉRIA DE FACTO ASSENTE
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Com interesse para a decisão da causa e com base nos documentos juntos, foi dada como assente a seguinte factualidade:
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No dia 18.11.2002, a Requerente A... adquiriu uma quota no valor nominal de Euros 88.736,15, correspondente a 98,83% do capital social da sociedade por quotas …, Lda.
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No mesmo dia 18.11.2002, os Requerentes celebraram um contrato de Associação à Quota com …, nos termos do qual os Requerentes atribuíram aos demais contratantes 87,9% dos lucros e perdas que obtivessem da Farmácia.
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No dia 01.09.2006, os Requerentes celebraram com as mesmas supra identificadas partes do contrato de associação à quota um contrato promessa de compra e venda das suas participações na sociedade …, Lda., ficando o contrato prometido sujeito a duas condições, a saber: (1) confirmar-se a intenção legislativa de liberalização da propriedade das farmácias e (2) ser a sociedade transformada em sociedade anónima em momento prévio à transmissão (condição expressamente imposta em tal contrato pelos promitentes compradores, nos termos da redacção do mesmo).
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Em 30.06.2008, foi deliberado e executado um aumento de capital da sociedade para Euros 90.100 por entrada em dinheiro de Euros 316,37, com a entrada de três novos sócios: …, que subscreveu uma quota com o valor nominal de Euros 106,37, …, cada um deles subscrevendo uma quota com o valor nominal de Euros 105,00.
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Na mesma data e em acto subsequente, foi a sociedade … transformada em sociedade anónima.
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No dia 15 de Julho de 2008, os Requerentes venderam a sua participação na sociedade …, S.A. …, pelo valor global de Euros 2.954.913,80, realizando uma mais-valia de Euros 2.866.177,65.
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No dia 12.05.2009, os Requerentes apresentaram a sua declaração de rendimentos Mod. 3 de IRS relativa ao ano de 2008 onde declararam a mais-valia efectuada no respectivo anexo G1.
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A 18.05.2012, foi determinada uma acção inspectiva externa de âmbito parcial aos Requerentes, tendo por objecto o seu IRS de 2008. Tal inspecção teve início no dia 4 de Junho de 2012 e foi concluída a 15 de Outubro de 2012.
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De tal acção inspectiva resultou a intenção de liquidação de IRS sobre a mais-valia realizada à taxa de 10%, com recurso à cláusula geral anti abuso prevista no artigo 38.º, n.º 2 da LGT.
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Os Requerentes, em sede de direito de audição do Projecto de Relatório de Inspecção, opuseram-se a tal intenção.
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Posteriormente, foi operada a liquidação adicional de IRS e juros compensatórios, já identificada nos autos, no montante global (incluindo juros) de Euros 326.200,18.
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Por despacho proferido pelo Senhor Chefe de Divisão da Justiça Tributária da Direcção de Finanças de …, em 20.06.2013, foi aceite a prestação de garantia bancária no montante de Euros 419.131,81 para suspensão do processo de execução fiscal n.º … que havia sido instaurado para cobrança coerciva do montante de IRS e juros compensatórios acima identificado.
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FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
E.1) QUESTÃO PRIORITÁRIA – da eventual caducidade do procedimento de aplicação da cláusula geral anti-abuso
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Alegam os Requerentes que se operou a caducidade do direito a liquidar o imposto com recurso ao artigo 38.º, n.º 2, da LGT, por intempestividade da instauração do respectivo procedimento, nos termos do - então vigente – artigo 63.º, n.º 3, do CPPT.
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A proceder este fundamento do pedido, verificar-se-á a procedência de um vício que determina, sequencialmente e desde logo, a ilegalidade da liquidação operada e que prejudica o conhecimento dos demais fundamentos de ilegalidade alegados, face à ordem de conhecimento dos vícios imputados ao acto que se mostra estipulada no art.º 124.º do CPPT, aplicável subsidiariamente por mor do disposto no art.º 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT.
Estamos, assim, perante uma questão prioritária a decidir por este Tribunal.
E.1.1) O prazo do artigo 63.º, n.º 3, do CPPT como prazo de caducidade?
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Durante o período abstractamente relevante para a questão em apreciação (o correspondente às datas de aquisição das quotas, da transformação da sociedade por quotas em sociedade anónima e da venda das acções desta sociedade), sucederam-se no tempo as seguintes redacções deste preceito legal:
Artigo 63.º, n.º 3, do CPPT
“O procedimento referido no número anterior pode ser aberto no prazo de três anos após a realização do acto ou da celebração do negócio jurídico objecto de aplicação das normas anti-abuso”
(redacção originária – DL 433/99, de 26 de Outubro)
“O procedimento referido no número 1 pode ser aberto no prazo de três anos a contar do ano civil seguinte ao da realização do acto ou da celebração do negócio jurídico objecto de aplicação das normas anti-abuso”
(redacção dada pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro, com entrada em vigor no dia 01.01.2009)
“…”
(revogado pela Lei 64-B/2011 de 30 de Dezembro, com entrada em vigor no dia 01.01.2012)
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Esta norma, que sistematicamente se encontra inserida no Título II do procedimento tributário (Capítulo III, do procedimento de liquidação e Secção IV, procedimentos próprios), é, sem sombra de dúvida, uma norma procedimental do processo de liquidação de imposto efectuada com base na aplicação de normas anti-abuso.
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Por os factos tributários surpreendidos na aplicação de normas tributárias anti-abuso respeitarem, muitas vezes, a realidades fluidas e incaracterísticas, cuja percepção se torna mais difícil à medida que se sucedem o tempo e as relações económicas entre as pessoas, e por, em tal caso, a liquidação de impostos com base na aplicação deste tipo de normas, afectar de maneira singular a segurança jurídica dos cidadãos, decidiu o legislador tributário que “a liquidação de tributos com base em quaisquer normas anti-abuso nos termos dos códigos e outras leis tributárias depende da abertura de procedimento próprio” (n.º 1 do mesmo artigo).
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E, no n.º 3 do preceito, o legislador balizou o prazo durante o qual a administração tributária pode exercer o seu poder de fiscalização tributária tendente a uma eventual e posterior liquidação de imposto com base na aplicação de normas anti-abuso relativamente a certos e determinados factos tributários.
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A norma em questão é, assim, uma norma conformadora e condicionadora do exercício da competência de fiscalização da administração tributária: ela autoriza o exercício da competência administrativa de abertura do procedimento próprio estabelecido na lei para a aplicação de normas anti-abuso, mas apenas dentro do prazo nela indicado. Nesta perspectiva, a norma em questão é uma norma reguladora do procedimento administrativo específico previsto para esse tipo de situações.
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Nesta senda, a abertura deste típico procedimento administrativo tendente à liquidação de impostos com base em normas tributárias anti-abuso uma vez esgotado o prazo previsto no preceito tem como efeito imediato a ilegalidade do respectivo procedimento específico e, decorrente ou mediatamente, a ilegalidade do eventual e consequente acto de liquidação nele praticado.
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A norma em causa não estabelece qualquer prazo especial de caducidade do direito de liquidação de impostos, diferente do constante da regra geral enunciada no art.º 45.º da Lei Geral Tributária: desde que o procedimento se inicie dentro do prazo previsto no art.º 63.º, n.º 3, do CPPT, a caducidade do direito de liquidar só ocorrerá se e quando verificados os pressupostos estabelecidos no art.º 45.º da LGT.
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Só reflexamente a norma em questão alcança um efeito equivalente ao da norma que estabelece a caducidade do direito de liquidação. E dizemos reflexamente porque a ilegalidade de que o acto de liquidação fica a padecer é a de preterição da formalidade legal de abertura do procedimento no prazo legal [cf. art.º 99.º, alínea d), do CPPT]. Não podendo ser efectuada legalmente a liquidação quando o procedimento específico não se inicie dentro do prazo, não há que equacionar sequer a possibilidade da caducidade do direito de liquidação.
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Tratando-se de uma norma procedimental é evidente que a mesma é de aplicação imediata, de acordo com o disposto no artigo 12.º, n.º 3, da LGT que assim estatui:
“3. As normas sobre procedimento e processo são de aplicação imediata, sem prejuízo das garantias direitos e interesses legítimos anteriormente constituídos dos contribuintes”.
Porém, como é referido no Acórdão n.º 123/2012-T deste CAAD,
“A única “garantia” que daqui decorre para o sujeito passivo é que o procedimento não poderá ser aberto decorrido aquele prazo. Porém, tal não significa a constituição de um direito na sua esfera jurídica, antes a extinção de um direito potestativo – de abertura do procedimento de aplicação de norma anti-abuso – na esfera do sujeito activo (quando muito pode afirmar-se a constituição de um “direito negativo” do sujeito passivo após a preclusão do direito potestativo do sujeito activo).”
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Temos deste modo que o contribuinte não tem uma “garantia ou direito anteriormente constituído” durante o prazo determinado por lei para a autoridade tributária exercer o seu direito de liquidação de impostos. A única “garantia” que o contribuinte tem é que, decorrido tal prazo, o imposto já não poderá ser liquidado, pelo que não é aplicável a excepção prevista na segunda parte do n.º 2 do artigo 12.º da LGT.
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A ser assim, como é, a versão do artigo 63.º, n.º 3, do CPPT que deve aplicar-se à situação tributária em análise é a que foi dada pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro, com entrada em vigor no dia 01.01.2009, acima reproduzida.
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Porém, tendo-se já esgotado o prazo à face da lei antiga não se coloca qualquer questão de concorrência temporal de normas diferentes com aptidão para regular a situação, ao contrário do sustentado pela AT.
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Quando o efeito jurídico previsto na lei antiga já se verificou por virtude da ocorrência da sua causa jurígena – a verificação dos pressupostos de facto e de direito dos quais resulta a constituição do efeito jurídico – não se pode colocar qualquer questão de aplicação da lei nova que porventura altere esses pressupostos, salvo quando esta assuma eficácia retroactiva.
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Vale isto por dizer que a revogação do n.º 3 do art.º 63.º do CPPT que foi operada pela Lei 64-B/2011 de 30 de Dezembro, com entrada em vigor no dia 01.01.2012, já não tem aplicação ao caso. Na altura em que essa revogação entrou em vigor já o efeito impeditivo da proibição da abertura do concreto procedimento específico, por banda da administração tributária, se tinha constituído na Ordem Jurídica, bem como o direito subjectivo “negativo” do contribuinte em não ser incomodado com tal procedimento.
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Recordando os factos dados como provados, no que se refere ao negócio celebrado e ao início do procedimento de inspecção:
“13.6 No dia 15 de Julho de 2008, os Requerentes venderam a sua participação na sociedade …, S.A. a … pelo valor global de Euros 2.954.913,80, realizando uma mais-valia de Euros 2.866.177,65.
13.7 No dia 12.05.2009 os Requerentes apresentaram a sua declaração de rendimentos Mod. 3 de IRS relativa ao ano de 2008 onde declararam a mais-valia efectuada no respectivo anexo G1.
13.8 A 18.05.2012 foi determinada uma acção inspectiva externa de âmbito parcial aos Requerentes, tendo por objecto o seu IRS de 2008. Tal inspecção teve início no dia 4 de Junho de 2012 e foi concluída a 15 de Outubro de 2012.”
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Nos termos do artigo 63.º, n.º 3, do CPPT, na versão que entrou em vigor no dia 1 de Janeiro de 2009, a data determinante para o início de contagem do prazo de abertura do procedimento de inspecção é a do início do “ano civil seguinte ao da realização do acto ou da celebração do negócio jurídico objecto de aplicação das normas anti-abuso”.
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No caso presente, mesmo que se entenda – como a Autoridade Tributária - que existiu um conjunto de operações artificiosas tendentes a um determinado resultado, dúvidas não restam que a última operação em que tal se consuma é a da venda de participações efectuada pelos Requerentes, no dia 15 de Julho de 2008.
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Entender, como alega a Autoridade Tributária a título subsidiário, que a “consumação” só se verifica com a entrega das declarações de IRS do ano de 2008, a 12.05.2009, seria manifestamente contra legem e ao arrepio, também, das regras gerais de caducidade previstas no artigo 45.º da LGT que determinam que o prazo de caducidade nos impostos periódicos se conta a partir do “termo do ano em que se verificou o facto tributário”. Não dispõem que o prazo se começa a contar a partir da entrega da declaração.
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Sendo assim, o prazo para abertura do procedimento de aplicação da cláusula geral anti-abuso começou a sua contagem no dia 1 de Janeiro de 2009, tendo completando os três anos no dia 31 de Dezembro de 2011.
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Ora, a Lei 64-B/2011 de 30 de Dezembro, que revogou expressamente o n.º 3 do artigo 63º do CPPT só entrou em vigor no dia 1 de Janeiro de 2012, sem que tenha sido atribuída à revogação eficácia retroactiva e donde ser impertinente a abordagem de qualquer questão de retroactividade aplicativa da nova norma.
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E nesse dia já um prazo de três anos iniciado a 1 de Janeiro de 2009 tinha terminado.
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Pelo que, no dia 1 de Janeiro de 2012, já tinha precludido o direito da Autoridade Tributária a iniciar um procedimento inspectivo nos termos da cláusula geral anti-abuso para factos tributários ocorridos em 2008.
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Ora, é facto assente que, no caso sub judice, o procedimento inspectivo teve início no dia 4 de Junho de 2012, na sequência de um despacho proferido a 18 de Maio de 2012.
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Pelo que, quando teve início o procedimento de inspecção, já o respectivo prazo para a sua abertura se tinha completado, há mais de seis meses e constituído na ordem jurídica o direito subjectivo do contribuinte em não ser incomodado com o procedimento.
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O que determina, consequentemente, a ilegalidade da liquidação adicional de IRS n.º 2012 … (e compensação n.º 2012 …), incluindo naturalmente os respectivos juros compensatórios, tudo no montante global de €326.200,18.
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Ficam, assim, prejudicadas as demais questões suscitadas nestes autos, com excepção das concernentes à devolução de eventuais quantias pagas pelos Requerentes por conta da presente liquidação adicional e à indemnização por danos advindos da prestação de garantia indevida.
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Não foi feita prova nos autos da realização de qualquer pagamento por conta da presente liquidação, embora sempre se diga que, sendo a mesma anulada, as quantias eventualmente pagas hajam de ser restituídas.
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Por requerimento apresentado no dia 8 de Julho de 2013, os Requerentes fizeram prova da aceitação da Autoridade Tributária da prestação de garantia bancária no montante de Euros 419.131,81 para suspensão do processo de execução fiscal n.º … que havia sido instaurado para cobrança coerciva do montante de IRS e juros compensatórios decorrente da liquidação sindicada (cfr. Facto provado sob o n.º 13.12).
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E não pode deixar de considerar-se que a presente liquidação adicional decorre de erro imputável aos serviços da Autoridade Tributária, pois que iniciaram o procedimento de inspecção, que a precedeu, seis meses após decurso do prazo legal para o efeito.
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Deste modo, os Requerentes têm direito a ser indemnizados pelos danos incorridos com a prestação da garantia, nos termos do artigo 53.º da LGT.
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DECISÃO
Em face do exposto, acorda o colectivo dos árbitros deste Tribunal Arbitral em:
- julgando procedente o pedido arbitral, decretar a anulação da liquidação adicional de IRS n.º 2012 … (e compensação n.º 2012 …), relativa ao ano de 2008, bem como dos respectivos juros compensatórios, tudo no montante global de €326.200,18;
- condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento de indemnização pela prestação indevida de garantia a calcular nos termos e dentro dos limites estabelecidos pelo artigo 53.º da LGT.
Custas a cargo da Requerida Autoridade Tributária, no montante de € 5.814,00, por força do artigo 4.º do RCPAT e da Tabela I anexa a este último, considerando o valor da causa que se fixa em €326.200,18.
Notifique-se.
28 de Outubro de 2013
O Árbitro Presidente
(Benjamim Silva Rodrigues)
O Árbitro Vogal
(Manuel Pires)
O Árbitro Vogal
(João Maricoto Monteiro)