Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 771/2014-T
Data da decisão: 2015-04-30  IVA  
Valor do pedido: € 69.130,26
Tema: IRS – Mais-valias imobiliárias; aplicação da lei no tempo.
*Decisão arbitral anulada por acórdão do STA de 02 de dezembro de 2015, recurso n.º 734/15, que decide em substituição.
Versão em PDF

 

 

Acordam os Árbitros José Pedro Carvalho (Árbitro Presidente), Carlos Baptista Lobo e Manuela Roseiro designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem Tribunal Arbitral na seguinte

 

DECISÃO ARBITRAL

 

I – RELATÓRIO

 

  1. A…, casado, contribuinte fiscal número …, residente na Rua …, ….° …, …-… …, doravante por Requerente, apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral em matéria tributária e pedido de pronúncia arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2º nº 1 a) e 10º nº 1 a), ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, abreviadamente designado por RJAT), peticionando a declaração de ilegalidade da liquidação adicional de liquidação adicional de IRS, de 02 de Julho de 2014, com o número 2014 …, correspondente demonstração de liquidação de juros com os números 2010 … e 2014 … e demonstração de acerto de contas, efectuada pelo Senhor Director Geral dos Impostos, referente ao ano de 2010 e no valor total a pagar de €69.130,26.

 

  1. Como fundamento do pedido formulado, alega o Requerente, em suma, que a liquidação em crise incorre em violação da norma contida no n.º 2 do artigo 12.º da Lei Geral Tributária. 

 

  1. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 18-11-2014. 

 

  1. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

  1. Em 15-01-2015 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.° e 7.º do Código Deontológico.

 

  1. Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 30-01-2015.

 

  1. A Autoridade Tributária e Aduaneira respondeu, defendendo-se por impugnação e sustentando que o pedido deve ser julgado improcedente.

 

  1. Atenta a circunstância de, no caso, não se verificar qualquer das finalidades que legalmente lhe estão cometidas, as partes prescindiram da realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, bem como da apresentação de alegações, que foram, assim, dispensadas.

 

  1. O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro. 

 

  1. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março). 

 

  1. O processo não enferma de nulidades e não foram invocadas exceções.

 

  1. Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa.

 

Tudo visto, cumpre proferir

 

II. DECISÃO

 

A. MATÉRIA DE FACTO

A.1. Factos dados como provados

 

1- A liquidação objecto do presente processo arbitral tem origem na correcção meramente aritmética à matéria colectável em IRS de 2010, por omissão à declaração de rendimentos de mais-valias obtidas com a alienação de acções em 18/05/2010, as quais eram detidas pelo Requerente há mais de 12 meses.

 

2-A AT determinou um acréscimo à matéria colectável no montante de €308.498,00, sobre o qual fez incidir a taxa de tributação autónoma de 20% prevista no n.º 4 do artigo 72.º do CIRS (na redacção em vigor a 31/12/2010).

 

3- Como fundamento desta imposição, a AT considerou que a alteração ao Código do IRS introduzida pela Lei n.º 15/2010 de 26 de Julho é aplicável às mais-valias com venda de acções obtidas antes da sua entrada em vigor, nomeadamente quanto à revogação do n.º 2 do artigo 10.º do CIRS e à alteração da taxa de tributação constante do n.º 4 do artigo 72.º.

 

4- A liquidação em causa foi emitida na sequência de um procedimento de inspecção interna levado a cabo pela Direcção de Finanças de … da AT.

 

5-Não tendo sido paga a liquidação cuja legalidade aqui se discute, veio a AT a instaurar o competente processo de execução fiscal, no Serviço de Finanças da …, com o número … 2014 ….

 

6-Na sequência da citação para tal processo, o SP, ali executado, apresentou requerimento de suspensão do processo de execução fiscal, manifestando a intenção de discutir a legalidade da divida exequenda e oferecendo como garantia adequada, a hipoteca voluntária sobre um imóvel.

 

7-Em 30/0412010, o Requerente era detentor de 998 acções, de valor nominal de 10 euros cada, representativas de 19,96% do capital social da sociedade Agência Funerária B…, S.A..

 

8-A sociedade anónima denominada Agência Funerária B…, S.A., NIPC …, tinha, naquela data, o capital social de €50.000,00, constituído por 5000 acções do valor nominal de € 10 cada.

 

9-Em 30/04/2010 o Requerente alienou a totalidade das participações que detinha na sociedade Agência Funerária B…, S.A., correspondente a 998 acções, de valor nominal de € 10 cada, que foram adquiridas pela sociedade C… – Agências Funerárias, S.A., NIPC …, pelo valor de €310.000.00.

 

10- Tais participações haviam sido adquiridas pelo Requerente em 2005.

 

11- A referida alienação de acções foi a única realizada pelo Requerente no ano de 2010.

12- O Requerente não declarou quaisquer mais-valias resultantes da alienação daquelas participações sociais.

A.2. Factos dados como não provados

Com relevo para a decisão, não existem factos que devam considerar-se como não provados.

 

A.3. Fundamentação da matéria de facto provada e não provada

Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de seleccionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 659.º, n.º 2 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT). 

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. artigo 511.º, n.º 1, do CPC, aplicável por força do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT). 

Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, a prova documental e o PA juntos aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, de resto consensualmente reconhecidos e aceites pelas partes.

 

 

 

 

B. DO DIREITO

 

            A questão que se coloca nos autos é una e de simples formulação: trata-se de saber se mais-valias decorrentes da alienação de acções, obtidas através de transmissão ocorrida no ano de 2010, antes da entrada em vigor das alterações introduzidas no CIRS pela Lei n.º 15/2010, de 2 de Julho (o que ocorreu a 27/07/2010), concorrem ou não para o saldo a que alude o artigo 43.º daquele código.

            Vejamos, então.

 

*

            O Requerente sustenta que a resposta a dar à questão formulada deve ser negativa.

            Entende aquele que, face ao teor do n.º 2 do artigo 12.º da LGT[1], o regime resultante da lei nova (no caso a Lei n.º 15/2010, de 2 de Julho) não lhes será aplicável.

            Cita o Requerente, em abono da sua tese, jurisprudência arbitral (acórdãos proferidos nos processos 25/2011T e 135/2013T do CAAD[2]) e dos tribunais tributários (acórdão do STA de 03/12/2013, proferido no processo 1582/13[3]).

 

*

            Já a AT, contraditando os Requerentes, aponta que a Lei n.º 15/2010, de 26 de Julho, revogou o regime anteriormente vigente, sem criar nenhuma norma de direito transitório que salvaguardasse eventuais factos tributários ainda em formação.

            Refere também a AT que os rendimentos em questão nos autos, constituem uma das categorias de rendimentos que integram a incidência real ou objectiva do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS), pelo que o facto gerador do imposto verifica-se em 31 de Dezembro de cada ano, só assim se compreendendo o carácter unitário e global da tributação do rendimento, muito embora haja um recorte analítico das várias categorias de rendimentos de acordo com a sua fonte.

            Conclui, a mesma Autoridade, que o facto gerador não é sequer o ganho resultante da alienação mas o saldo positivo apurado em determinado período de tributação entre as mais e as menos-valias realizadas.

            Louva-se a AT nas decisões proferidas nos processos 340/2014T e 107/2014T do CAAD.

 

*

            Se a questão a resolver nos autos é de simples formulação, menos simples não é a enunciação dos dois caminhos a percorrer para a respetiva resolução.

            Efectivamente, no fundo, haverá desde logo que apurar se o facto tributário subjacente à tributação de mais-valias resultantes da alienação onerosa de partes sociais é um facto instantâneo ou, antes, se trata de um facto continuado.

            O STA, no aresto citado pelos Requerentes[4], conclui que o facto tributário em questão se reveste de natureza instantânea, pelo que o regime decorrente da Lei n.º 15/2010, de 26 de Julho, apenas seria aplicável às mais-valias ocorridas após a sua entrada em vigor.

            É esta – de facto – a pedra de toque da solução a dar à questão em causa, sendo aquele o entendimento do(s) aresto(s) referido(s).

            Ressalvado o (muito) respeito devido, entende-se, todavia, que o facto tributário sub iudice, não será de natureza instantânea, ao contrário do que a jurisprudência em questão entende, mas um facto complexo de formação sucessiva, pelo que, dada a essencialidade desta questão, mais não nos restará do que divergir daquela jurisprudência.

            Com efeito, entende-se que a situação que nos ocupa (tributação de mais valias), é semelhante à julgada pelo Tribunal Constitucional no Ac. 399/10 (alteração da taxa de IRS no decurso do próprio ano a que a alteração respeita) e distinta da julgada pelo mesmo Tribunal nos acórdãos relativos às tributações autónomas.

Cada mais-valia realizada será, assim, análoga, por exemplo, a um salário, e não a uma despesa sujeita a tributação autónoma, o que resulta, por exemplo, da circunstância de ser tributado o saldo das mais e menos-valias, e não cada uma das mais-valias individualmente realizadas e desligadas das restantes variações patrimoniais do mesmo género.

Veja-se, por exemplo, que nas tributações autónomas não é tributado qualquer saldo para o qual concorram as despesas a ela sujeitas, mas antes cada uma das despesas individuais, em si, desligadamente das demais. Caso o regime das mais e menos valias se revestisse da mesma natureza, cada uma das mais valias deveria ser tributada de per si, independentemente das restantes mais e, sobretudo, menos valias registadas no mesmo período.

Ou seja, e em suma, se a situação fosse de facto análoga às tributações autónomas, desde logo, cada mais valia seria sempre tributada, independentemente de eventuais menos-valias que houvesse, o que não é o caso.

O que vem de se dizer será ainda mais evidenciado pela possibilidade de englobamento. De facto, nessa circunstância (de o sujeito passivo optar por englobar o rendimento das mais valias com o seu restante rendimento sujeito a IRS) não se perceberia como é que - por exemplo - o rendimento dos salários auferidos no início do ano estaria sujeito à taxa agravada a meio do mesmo, enquanto que as mais-valias englobadas com aqueles escapariam à "retrospectividade" daquela taxa e da delimitação da base tributável.

E, note-se, não se vislumbra motivo para distinguir as mais-valias objecto de englobamento das que não o sejam, uma vez que, para além do mais, a opção de englobamento só ocorre no final do ano/período, pelo que se estaria a "condicionar" a natureza (instantânea ou continuada) do facto tributário a uma opção posterior à sua ocorrência.

Conclui-se, assim, também e na mesma linha de raciocínio, que a opção do legislador de tributar as mais-valias do ano de 2010, realizadas antes da entrada em vigor da alteração do respectivo regime, atenta a natureza não instantânea do respectivo facto tributário, não será inconstitucional, no fundo pelas mesmas razões que a aplicação das taxas agravadas aos restantes rendimentos sujeitos a IRS, nos mesmos termos, não o foi.

 

*

O raciocínio que se vem de expor, restringe-se, todavia, ao plano constitucional, que é aquele que, naturalmente, foi objecto de pronúncia pelo Tribunal Constitucional. Ou seja, conclui-se, em suma, pelos mesmos fundamentos que sustentaram o Acórdão do Tribunal Constitucional 399/10, que não será contrária à CRP[5] a aplicação do regime resultante da revogação do n.º 2 do artigo 10.º do CIRS, no decurso do ano de 2010, às mais valias auferidas no decurso desse mesmo ano[6].

            Não sendo inconstitucional, resta, então, apurar se será legal tal aplicação.

A primeira dúvida que se poderá colocar, agora, decorrerá do disposto no artigo 10.º do CIRS, que refere que: “Os ganhos consideram-se obtidos no momento da prática dos atos previstos no nº 1”.

 Esta norma, contudo, deverá ser compreendida como tendo unicamente o fito de fixar o período de tributação a que deverá ser imputado o ganho, e não de tomar posição quanto à natureza do facto tributário sujeito, sendo, por exemplo, análoga ao art.º 24.º/4 do CIRS, que tem uma redação semelhante àquele artigo 10.º/3[7], mas em relação ao qual não se questionará, seguramente, que se reporta a factos tributários da mesma natureza dos restantes sujeitos a IRS, e não a factos instantâneos.

            Uma outra dúvida, mais consistente, poderá emergir do artigo 12.º/2 da LGT que diz que "Se o facto tributário for de formação sucessiva, a lei nova só se aplica ao período decorrido a partir da sua entrada em vigor".

            Efectivamente, a alternativa a considerar que o rendimento em causa no presente processo é um facto tributário instantâneo (como considerou o STA nos termos acima abordados), será considerá-lo, então, um facto tributário análogo ao restante rendimento sujeito a IRS, ou seja, um facto tributário de formação sucessiva.

Sendo esse o caso, como não parece haver dúvidas razoáveis que seja, estará preenchida a previsão normativa do artigo 12.º/2 da LGT.

Contudo, devidamente interpretado o regime legal da tributação das mais-valias resultante da entrada em vigor das alterações ao CIRS introduzidas pela Lei n.º 15/2010, de 2 de Julho, tal como explanado no voto de vencido proferido no processo 135/2013T do CAAD[8], conclui-se pela intencionalidade deste tributar o saldo resultante da totalidade das mais e menos-valias realizadas no período de tributação em curso na data da entrada em vigor daquela lei.

Como se escreveu, para além do mais, na referida declaração de voto, “O texto da proposta de lei corresponde, nesta parte, inteiramente ao texto aprovado que ficou a constar da Lei n.º 15/2010. Impõe-se, pois, concluir que o objectivo do legislador foi o de subordinar todas as mais-valias auferidas com a alienação de participações no ano de 2010 ao novo regime (tributário e de isenção)”. Aliás, reforçando-se tudo o mais laboriosamente expendido naquela mesma declaração, diga-se que não faria sentido, nem seria coerente, que o legislador pretendesse, como foi pacificamente aceite desde a publicação do Acórdão 399/10 do Tribunal Constitucional, que a taxa de IRS introduzida no decurso do exercício de 2010 tivesse uma eficácia “retrospectiva”, e não tratasse da mesma maneira a matéria que nos ocupa, produzida, precisamente, no mesmo contexto e com as mesmas finalidades.

Conclui-se assim, aqui como ali, que “aquela disposição do n.º 2 do art. 12.º entra em contradição com a determinação resultante do artigo 43.º, n.º 1 do CIRS”, no sentido emergente do quadro normativo resultante da entrada em vigor das alterações introduzidas no CIRS pela Lei n.º 15/2010, de 2 de Julho, “, bem como com o princípio geral do próprio n.º 1 do art. 1.º do CIRS.”, ou seja, que tais normas “colidem no seu sentido prescritivo ou nas consequências jurídicas que produzem”, detectando-se, portanto, uma antinomia normativa.

Reconhecido isto, e tendo em conta os doutrinalmente sedimentados critérios da hierarquia, especialidade e cronologia, concluir-se-á, como, uma vez mais, detalhadamente se demonstra na declaração de voto citada, que apenas o critério da especialidade poderá resolver a antinomia surpreendida, dado que nem se verifica qualquer relação de hierarquia entre a LGT e o CIRS, nem o artigo 12.º/2 daquela Lei Geral é posterior ao regime legal de tributação das mais valias em IRS, decorrente da entrada em vigor da Lei n.º 15/2010, de 2 de Julho.

Ora, face àquele referido critério - da especialidade – não restarão dúvidas que o regime do CIRS é especial em relação ao regime da LGT, pelo que haverá de afastar a aplicação da norma desta lei, ao caso convocada. 

Deste modo – em conclusão – entendendo-se que o regime legal da tributação em IRS das mais-valias resultante das alterações àquele Código introduzidas pela da Lei n.º 15/2010, de 2 de Julho, teve em vista a sujeição ao novo regime das totalidade das mais valias auferidas no exercício de 2010, e que tal comando legislativo não enferma de qualquer inconstitucionalidade, nem é afastado por qualquer outra norma legal que com ela se encontre numa relação de antinomia, haverá que confirmar o acto tributário objecto dos presentes autos, improcedendo – na íntegra – os pedidos arbitrais.

 

*

C. DECISÃO

Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral:

a)    Julgar totalmente improcedentes os pedidos arbitrais formulados;

b)    Condenar o Requerente nas custas do processo, no montante de €2.448,00, tendo-se em conta o já pago.

 

D. Valor do processo

Fixa-se o valor do processo em €69.130,26, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

E. Custas

Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em €2.448,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pelo Requerente, uma vez que o pedido foi integralmente improcedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.

 

Notifique-se.

 

Lisboa

30 de Abril de 2015

 

 

 

 

 

O Árbitro Presidente

(José Pedro Carvalho  - Relator)

 

O Árbitro  Vogal

(Carlos Baptista Lobo - vencido)

 

O Árbitro  Vogal

(Manuela Roseiro)

 

 

DECLARAÇÃO DE VOTO

 

 

Não concordo com a decisão do presente acórdão pelas seguintes razões:

- Independentemente da questão de se saber se, no caso das mais-valias nos encontramos perante factos tributários de natureza instantânea ou de formação sucessiva, o facto é que a operação em causa foi realizada em momento anterior ao da publicação da norma de incidência;

- Independentemente do caso de se entender que o IRS incide sobre o valor anual dos rendimentos das várias categorias legalmente previstas (art. 1º do CIRS) incluindo as mais-valias na categoria dos incrementos patrimoniais (arts. 9º e 10º do CIRS), o facto tributário da realização destas últimas ocorre no momento da sua alienação, e não no dia 31 de Dezembro de cada ano, como é o caso do IRC;

- A intensidade da retroactividade da aplicação da nova norma de incidência ao caso concreto é mais grave do que no caso das decisões do STA e do TC referentes às tributações autónomas sobre encargos com viaturas ligeiras de passageiros e despesas de representação, onde o facto tributário se gera, por determinação legal, no dia 31 de Dezembro. Quanto a estas o facto de se entender que a tributação em causa incide sobre despesa e não propriamente sobre o rendimento tributável em IRC é uma mera construção jurisprudencial que serve unicamente para clarificar o efeito da retroactividade;

- A comparação com a situação das alterações dos escalões e taxas no IRS, também analisadas pelo TC e pelo Provedor de Justiça não é relevante, uma vez que, no caso das taxas, estamos a falar de uma norma geral, que opera sobre a generalidade das realidades de incidência e que, em concreto, não é concretizável numa categoria de incidência concreta; e, neste caso, por razões de simplicidade e eficiência no cálculo do imposto a pagar seria irrazoável a aplicação de uma regra pro rata à generalidade dos rendimentos. No caso concreto, todos os elementos de incidência que desencadearam o facto tributário ocorreram em momento anterior ao da publicação da norma inovadora;

- Os argumentos de que não foram violados os princípios da segurança e confiança jurídicas, de urgência de situação de emergência financeira existente, injustiça relativa e outros claudicam perante a proibição expressa do princípio da não retroactividade da norma fiscal previsto no n.º 3 do artigo 103.º da CRP. Assim, se essas questões poderiam ser ponderadas antes da revisão constitucional que introduziu expressamente essa norma, em momento posterior tal já não se torna possível.

- A situação é ainda mais pertinente quando estamos a tratar de uma alteração legislativa que significou uma alteração radical no paradigma de tributação em IRS, dado que a situação anterior de não tributação das mais-valias mobiliárias se constituía como elemento estrutural do imposto.

Neste quadro, a minha posição identifica-se com a adoptada pelo STA, nos acórdãos referentes aos processos nºs 1582/13 e 1078/12[9], e pelo CAAD, no acórdão referente ao processo 135/2013-T onde se conclui que o facto tributário em questão se reveste de natureza instantânea, pelo que o regime decorrente da Lei n.º 15/2010, de 26 de Julho, apenas seria aplicável às mais valias ocorridas após a sua entrada em vigor.

 

 

 

Carlos Baptista Lobo

 

 

 



[1] “Se o facto tributário for de formação sucessiva, a lei nova só se aplica ao período decorrido a partir da sua entrada em vigor.”

[2] Disponíveis em www.caad.org.pt.

[3] Disponível em www.dgsi.pt.

[4] Reafirmado pelo Ac. do mesmo Tribunal de 08/01/2014, proferido no processo 01078/12, também disponível em www.dgsi.pt.

[5] Incluindo o princípio constitucional da proteção da confiança, decorrente do princípio do Estado de Direito Democrático, contido no artigo 2.º da CRP.

[6] Idêntica conclusão havia formulado o Provedor de Justiça, na sua súmula R-3736/10, disponível para consulta em http://www.provedor-jus.pt/archive/doc/sumula__maisvalias_15122010.pdf.

[7] “Os ganhos referidos no n.º 7) da alínea b) do n.º 3 do artigo 2º consideram-se obtidos, respetivamente:...”

[8] Disponível para consulta em www.caad.org.pt. No sentido dessa mesma declaração de voto, para além dos arestos citados pela AT, decidiu-se no processo 453/2014T do CAAD.            

[9] Disponíveis em www.dgsi.pt.