Decisão arbitral
Processo n.º 768/2014-T
I – Relatório
1.1. A…, residente na …, Condomínio …, Lote …, 1.º dto., …, …, contribuinte fiscal n.º …, e B…, residente na mesma morada, contribuinte fiscal n.º …, casados entre si (doravante apenas designados por «requerentes»), apresentaram, em 14/11/2014, um pedido de constituição de tribunal arbitral e de pronúncia arbitral, nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, al. a), 5.º, n.º 2, e 10.º, n.º 1, al. a), do Dec.-Lei n.º 10/2011, de 20/1 (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante somente designado por «RJAT»), relativo à apreciação da legalidade da liquidação de IRS n.º 2014 …e da liquidação de juros n.º 2014 …, ambas respeitantes a IRS de 2011.
1.2. Em 30/1/2015 foi constituído o presente Tribunal Arbitral Singular.
1.3. Nos termos do art. 17.º, n.º 1, do RJAT, foi a AT citada, enquanto parte requerida, para apresentar resposta, nos termos do referido artigo. A AT apresentou a sua resposta em 4/3/2015 (e PA a 2/3/2015), tendo argumentado no sentido da total improcedência do pedido dos requerentes.
1.4. Por despacho de 23/3/2015, o Tribunal considerou, nos termos do art. 16.º, al. c) e e), do RJAT, ser dispensável a reunião do art. 18.º do RJAT e que o processo estava pronto para decisão. Foi, ainda, fixada a data de 6/4/2015 para a prolação da decisão arbitral.
1.5. O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído, é materialmente competente, o processo não enferma de vícios que o invalidem e as Partes têm personalidade e capacidade judiciárias, configurando-se legítimas.
II – Fundamentação: A Matéria de Facto
2.1. Vêm os ora requerentes alegar, na sua petição, que: a) “encontram-se cabalmente justificados – sem margem para dúvidas – todos os valores apresentados pela AT como base para correcção da declaração de rendimentos apresentada”, “não existindo, como tal, qualquer fundamento para a correcção operada”; b) “a AT tinha em sua posse todos os elementos necessários para compreender a questão”, mas desta forma se evidencia e esclarece, ponto por ponto, valor a valor, que não é devido qualquer imposto”; c) detalhadamente, quanto aos valores do requerente A…: c.1) “[quanto aos valores €4,99; €1,05; €327,50; €268,52 e €1.689,12, num total de €2.291,18] nos termos do [doc. 10] se retira que o saldo da mais-valia sujeita a tributação é de €807,52 [...] e não €2.291,18”; c.2) “[quanto aos valores €15.000,00; €15.000,00 e €10.000,00, num total de €40.000,00] [o doc. 11] demonstr[a] que os valores de aquisição são, também, os valores de alienação, não tendo decorrido, assim, desta operação, qualquer mais-valia para o Requerente, ou seja, o valor daí resultante é zero e não €40.000,00”; c.3) “[quanto aos valores €140,60; €187,00 e €62,25, num total de €389,85], [da análise do doc. 10, na parte correspondente a obrigações denominadas “C SAD-6%-2010-2013”, “D… – 1.ª Emissão/…” e “D… – 2.ª Emissão/…”, verifica-se que] o saldo da mais-valia é zero, e não €389,85, como resulta da liquidação em crise”; c.4) “[quanto aos demais valores em questão, discriminados nos pontos 71.º a 105.º da p.i., relativos a resgate de unidades de participação de fundos de investimento, os sujeitos passivos nas condições dos ora requerentes] são isentos de IRS relativamente aos rendimentos respeitantes a unidades de participação [em fundos de investimento mobiliário], nos termos do disposto no artigo 22.º, n.º 2, do Estatuto dos Benefícios Fiscais”; c.5) “[quanto, especificamente, ao valor de €13.605,19, tratado nos pontos 106.º a 111.º da p.i.,] o requerente desconhece totalmente a sua origem”; d) também detalhadamente, agora quanto aos valores da requerente B…: d.1) “[quanto aos valores €4,99; €1,05; €327,50; €268,52 e €1.689,12, num total de €2.291,18] nos termos do [doc. 23] se retira que o saldo da mais-valia sujeita a tributação é de €807,52 [...] e não €2.291,18”; d.2) “[quanto ao valor de €1.995,00, que se reporta a obrigações subscritas em 25/5/1998] [da análise do doc. 22 verifica-se que] não existe qualquer saldo de mais-valia a apurar, o qual é igual a zero”; d.3) “[quanto aos valores €187,00, €62,25 e €140,60, num total de €389,85], [da análise do doc. 23, na parte correspondente a obrigações denominadas “C… SAD-6%-2010-2013”, “D… – 1.ª Emissão/…” e “D… – 2.ª Emissão/…”, verifica-se que] o saldo da mais-valia é zero, e não €389,85, como resulta da liquidação em crise”; d.4) “[quanto aos demais valores em questão, discriminados nos pontos 128.º a 151.º da p.i., relativos a resgate de unidades de participação de fundos de investimento, entende-se, em termos idênticos ao acima descritos (vd. ponto 129.º da p.i.), que os sujeitos passivos nas condições dos ora requerentes são isentos de IRS relativamente aos rendimentos respeitantes a unidades de participação em fundos de investimento mobiliário, nos termos do disposto no artigo 22.º, n.º 2, do Estatuto dos Benefícios Fiscais”]; e) “não sendo devida a quantia de imposto liquidado aos Requerentes, como cabalmente comprovado, também não poderá subsistir, atenta a sua natureza acessória, a liquidação de juros compensatórios [não se verificando, por outro lado] qualquer comportamento culposo por parte dos Requerentes”; f) “em face do exposto, não estando, in casu, verificados os pressupostos de que a lei (cfr. Artigo 35.º da LGT) faz depender o direito do Estado a liquidar juros compensatórios, devem os mesmos ser anulados em conformidade”; g) “procedendo o presente pedido, deverá ainda ser reconhecido o direito à indemnização pelo valor correspondente aos encargos com a garantia [bancária]”; h) “demonstrado, como ficou, que o ato de liquidação se encontra afetado por erro imputável à AT, de que resulta pagamento de montante superior ao legalmente devido, mais se requer o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do disposto no artigo 43.º da LGT”.
2.2. Concluem os requerentes que “seja julgado integralmente procedente o presente pedido de pronúncia arbitral, por provado, com fundamento nas razões de facto e de direito apresentadas e, em consequência, seja determinada a anulação do ato de liquidação de IRS de 2011, bem como do ato de liquidação de juros compensatórios [...], com todas as consequências legais”. Os ora requerentes requerem, ainda, que a AT “seja condenada [...] no pagamento de indemnização por prestação de garantia bancária indevida, por um lado, e de juros indemnizatórios, por outro.”
2.3. Por seu lado, a AT vem alegar, na sua contestação: a) que “os requerentes deduziram pedido de pronúncia arbitral contra o acto de indeferimento tácito da reclamação graciosa que haviam deduzido da liquidação oficiosa de IRS, referente ao exercício de 2011”; b) que, “em tempo, e no âmbito do disposto no n.º 1 do art. 13.º do RJAT, veio a requerida a revogar parcialmente o acto impugnado, praticando, em 12/01/2015, o acto de deferimento parcial da predita reclamação graciosa”; c) que “de tudo, e para os efeitos do n.º 2 da referida disposição normativa, [deu] conhecimento quer ao Centro de Arbitragem Administrativa, quer aos requerentes (o que fez em 12/01/2015, cfr. Documentos já juntos aos autos)”; d) que, “em conformidade, e nos precisos termos da última parte do n.º 2 do art. 13.º do RJAT, o procedimento apenas poderia prosseguir contra o novo acto, ou seja, contra o indeferimento parcial da reclamação graciosa” [mas,] “ao contrário do que lhes é permitido por lei, que estipula expressamente «prosseguindo o procedimento relativamente a esse último acto» - n.º 2 do art. 13.º do RJAT -, os requerentes vêm ao procedimento declarar que «prosseguirão, custe o que custar e até às últimas consequências, com processo judicial que agora se encontra em curso»”; e) que, “até à constituição do tribunal arbitral não existe processo” e que, “in casu, o tribunal foi constituído a 30/01/2015”; f) que, “revogado o acto, na parte em que o foi, nunca o processo poderia ser constituído contra um objecto inexistente na ordem jurídica”; g) que “em 30/01/2015 [...] o processo arbitral teve início tendo por objecto a parte do acto impugnada e não revogada. Ou seja [...], a parte não revogada e que constitui objecto dos presentes autos cinge-se à matéria sindicada no requerimento de petição inicial em 106.º a 111.º e que se refere à mais valia proveniente da venda das acções da entidade com o NIF …, inscritas com o valor de realização de €13.605,19 e de aquisição de €13.500,88 (vd. fls. 70 do PA)”; h) que, quanto a essa específica mais-valia, “os requerentes [sustentam], tão só e apenas, que desconhecem a origem de tal valor, socorrendo-se, para o efeito, de um escrito que juntam como documento 21”; i) que “a Administração Fiscal, atuando no âmbito do princípio da legalidade, a que se mostra vinculada, não poderia ignorar a declaração que lhe foi prestada pela referida instituição [pelo que,] o que os recorrentes pretendem implicaria que a requerida desconsiderasse o declarado no modelo 13 junto ao PA a fls. 29”; j) que “a [referida] declaração é de entrega obrigatória [...] nos termos do art. 124.º do CIRS [e que,] a ocorrer um suposto lapso por parte daquela instituição [a Fundação E…] no preenchimento da declaração mod. 13, este poderia ter sido corrigido pela própria instituição [e, mesmo que não tivesse sido detectado por esta,] sempre os recorrentes se deveriam ter dirigido à entidade declarante, confrontando-a e requerendo formalmente que procedesse, junto da AT, à correcção que alegam ser devida. O que não fizeram [apesar do] ónus da prova que sobre eles impende”; l) que, “no mais, vêm os recorrentes, em sede de pedido de pronúncia arbitral, suscitar questões que não foram objecto de reclamação graciosa, pelo que se mostra, nesta parte, caducado o direito de acção”, e que, “sem conceder, [...] não assiste razão aos requerentes [porque, quanto aos juros compensatórios,] se mostram cumpridos todos os requisitos de que a lei faz depender a liquidação dos juros compensatórios; [porque, quanto à garantia bancária, os requerentes] não [solicitaram a indemnização] em sede de reclamação graciosa. Não o tendo sido, nem nos 30 dias posteriores à sua constituição (14/06/2014), não podem agora, e em violação do art. 171.º do CPPT, vir os requerentes reclamar o que em tempo não fizeram; [e porque, quanto aos juros indemnizatórios], nenhum erro pode ser assacado [à AT e] qualquer erro, a existir, não seria imputável à AT, porquanto só em sede de procedimento de divergências e, posteriormente, em sede de reclamação graciosa, é que os recorrentes vêm junto da AT explicar que, por lapso, não declararam os valores sindicados (vide o pedido de reclamação graciosa junto ao PA a fls. 4 a 23).”
2.4. A AT conclui, em síntese, que “falecem, em toda a linha, os argumentos dos requerentes”, e que “deve o pedido de pronúncia arbitral ser julgado totalmente improcedente, por não provado e, consequentemente, absolvida a Requerida de todos os pedidos, tudo com as devidas e legais consequências.”
2.5. Consideram-se provados os seguintes factos:
i) A 16/4/2014 (fl. 2 do PA apenso), os requerentes apresentaram reclamação graciosa da liquidação de IRS n.º 2014 … e da liquidação de juros n.º 2014 …, relativas a IRS de 2011. Na referida reclamação não foi solicitada a indemnização a que se refere o art. 171.º do CPPT (nem tal sucedeu nos 30 dias subsequentes).
ii) Nos termos do art. 13.º, n.º 1, do RJAT, a Requerida revogou parcialmente o acto impugnado, ao deferir parcialmente, por Despacho de 12/1/2015, a supra referida reclamação graciosa (vd. Despacho final apenso aos autos). Este despacho foi notificado aos requerentes no mesmo dia e de acordo com o disposto no art. 13.º, n.º 2, do RJAT.
iii) Em 12/1/2015, atendendo à decisão da AT, nos termos do art. 13.º, n.º 1, do RJAT, e ao circunstancialismo previsto no art. 13.º, n.º 2, do RJAT, o Exmo. Senhor Presidente do CAAD proferiu despacho solicitando aos requerentes que se dignassem informar o CAAD, querendo, sobre o prosseguimento do procedimento. Estes informaram, por requerimento de 22/1/2015, que pretendiam prosseguir com o procedimento.
iv) Em 30/1/2015, foi constituído o presente Tribunal Arbitral Singular, o qual tem por objecto a parte do acto que não foi revogada, nos termos da parte final do n.º 2 do art. 13.º do RJAT. A referida parte não revogada, aqui em análise, diz apenas respeito à matéria sindicada nos pontos 106.º a 111.º da p.i. dos ora requerentes, a qual é relativa à mais-valia proveniente da venda das acções da entidade com o NIF …, inscritas com o valor de realização de €13.605,19 e com o valor de aquisição de €13.500,88 (vd. fl. 70 do PA apenso aos autos).
v) Em face dos Docs. 2, 3 e 5, apensos ao requerimento dos requerentes de 22/1/2015, (Doc. 2 também constante do anexo 2 ao requerimento dos requerentes de 1/4/2015), verifica-se que fizeram prova bastante de que “não receberam qualquer importância [da Fundação E…] durante o ano de 2011 ou a este ano relativa” (requerimento de 22/1, §31.º).
2.6. Não há factos não provados relevantes para a decisão da causa.
III – Fundamentação: A Matéria de Direito
No presente caso, são três as questões de direito controvertidas: A) saber se, como conclui a AT, nos “termos da última parte do n.º 2 do art. 13.º do RJAT, o procedimento apenas pod[e] prosseguir contra o novo acto, ou seja, contra o indeferimento parcial da reclamação graciosa”; B) saber se, como alegam os ora requerentes, “nada receberam d[a] Fundação E…”; C) saber se deve ser reconhecido o direito a indemnização pelo valor correspondente aos encargos com a garantia bancária prestada pelos requerentes, assim como o (também peticionado) direito ao pagamento de juros indemnizatórios.
Vejamos, então.
A) Quanto à primeira questão, conclui-se que assiste razão à AT, uma vez que, como acima se referiu, na matéria de facto provada:
- Nos termos do art. 13.º, n.º 1, do RJAT, a Requerida revogou parcialmente o acto impugnado, ao deferir parcialmente, por Despacho de 12/1/2015, a supra referida reclamação graciosa (vd. Despacho final apenso aos presentes autos), tendo este despacho sido notificado aos requerentes no mesmo dia e de acordo com o disposto no art. 13.º, n.º 2, do RJAT.
- Em 12/1/2015, atendendo à decisão da AT, nos termos do art. 13.º, n.º 1, do RJAT, e ao circunstancialismo previsto no art. 13.º, n.º 2, do RJAT, o Exmo. Senhor Presidente do CAAD proferiu despacho solicitando aos requerentes que se dignassem informar o CAAD, querendo, sobre o prosseguimento do procedimento. Estes informaram, por requerimento de 22/1/2015, que pretendiam prosseguir com o procedimento.
Assim sendo:
- Em 30/1/2015, foi constituído o presente Tribunal Arbitral Singular, o qual tem por objecto a parte do acto que não foi revogada, nos termos da parte final do n.º 2 do art. 13.º do RJAT. A referida parte não revogada, aqui em análise, diz apenas respeito à matéria sindicada nos pontos 106.º a 111.º da p.i. dos ora requerentes, a qual é relativa à mais-valia proveniente da venda das acções da entidade com o NIF …, inscritas com o valor de realização de €13.605,19 e com o valor de aquisição de €13.500,88 (vd. fl. 70 do PA apenso aos presentes autos).
No mesmo sentido, e em concordância com o que dispõe o citado texto legal, veja-se o que refere, por exemplo, Jorge Lopes de Sousa, no seu “Comentário ao Regime Jurídico da Arbitragem Tributária”, que está inserido no Guia da Arbitragem Tributária, coordenado por Nuno Villa-Lobos e Mónica Brito Vieira (Almedina, 2013, p. 177): “No n.º 2 do artigo 13.º do RJAT, prevê-se apenas o prosseguimento do procedimento relativamente ao novo ato que substitua, total ou parcialmente, o que é objecto do pedido de pronúncia arbitral. [...]. Se for praticado um novo ato em substituição, total ou parcial, do ato que é objecto do pedido de pronúncia arbitral, o dirigente máximo do serviço da Administração Tributária procede à notificação do sujeito passivo para, no prazo de 10 dias, se pronunciar, prosseguindo o procedimento relativamente a esse último ato se o sujeito passivo nada disser ou declarar que mantém o seu interesse (artigo 13.º, n.º 2, do RJAT).”
Tendo os ora requerentes declarado, no requerimento de 22/1/2015, que mantém o seu interesse, conclui-se, pelo supra exposto, que o presente processo tem por objecto a parte do acto impugnado não revogada pela AT através do seu Despacho de 12/1/2015.
B) Quanto à matéria aqui em causa, sindicada nos pontos 106.º a 111.º da p.i. dos ora requerentes, estes alegam, no requerimento de 22/1/2015, que “nada receberam d[a] Fundação E…”, e que, para o demonstrar, “obtiveram um novo documento – desta feita, cumprindo todas as exigências impostas pela AT na sua apreciação – emitido pela Fundação E…, que juntam como Documento 2 ao presente e que apresentaram com o seu exercício de audição prévia”, sendo que, no entender dos requerentes, “daquele documento resulta claro que os Requerentes não receberam qualquer importância daquela entidade durante o ano de 2011 ou a este ano relativa.”
Por seu lado, a AT refere que, “nos registos informáticos vigentes na Autoridade Tributária e Aduaneira, designadamente, na declaração mod. 13, que é o meio próprio e legal, sendo utilizada pelas entidades para declararem ao Estado os valores mobiliários e outros, pagos ao contribuinte, aquela entidade, ou seja, a Fundação E…, declarou uma transacção de venda do sujeito passivo A-Nif …, no valor de €13.605,19. [E] como tal, não [se pode] ignorar [esta] situação.” Acrescenta a AT que, “se tal transacção foi declarada por erro da Fundação, compete à mesma, bem como ao reclamante fazer prova disso”, nos termos do disposto no n.º 1 do art. 74.º da LGT.
Sucede, contudo, que se verifica que os requerentes fizeram prova bastante do referido erro, por via da apresentação do Documento 2, apenso ao requerimento de 22/1/2015 (também constante do anexo 2 ao requerimento de 1/4/2015) – documento este que não foi contestado pela AT –, pelo que se conclui que lhes assiste, nesta parte, razão.
Acresce que, considerando a natureza da Fundação, os seus Estatutos e as respectivas demonstrações financeiras (cf. Documentos 3 e 5, apensos ao requerimento de 22/1/2015), ficou igualmente demonstrado que esta não é entidade com capacidade ou legitimidade para emitir acções, pelo que – sendo certo que a AT confiou e agiu com base nos elementos que lhe foram facultados – se conclui que, também por esta via, os requerentes conseguiram fazer prova bastante de que não receberam o valor em causa.
Nestes termos, conclui-se que a liquidação em causa, na parte não revogada pela AT, não pode subsistir – o mesmo sucedendo com a liquidação de juros compensatórios, dado que, em face do exposto, inexiste dívida de imposto (imposto ao qual esta última liquidação estava inextricavelmente ligada).
C) Quanto aos demais pedidos (de “indemnização pela prestação de garantia indevida” e o relativo ao alegado “direito a juros indemnizatórios”), verifica-se que não assiste razão aos ora requerentes.
No que se refere ao pedido de indemnização pela prestação de garantia indevida, não assiste razão aos requerentes porque, como bem refere a AT, “dispõe o artigo 171.º do CPPT que a indemnização «será requerida no processo em que seja controvertida a legalidade da dívida exequenda» - n.º 1 - e «deve ser solicitada na reclamação, impugnação ou recurso ou em caso de o seu fundamento ser superveniente no prazo de 30 dias após a sua ocorrência» - n.º 2 [...]. Não [...] tendo [solicitado a indemnização na mencionada reclamação], nem nos 30 dias posteriores à sua constituição [...], não podem agora [...] reclamar o que em tempo não fizeram.”
Com efeito, como assinala, e.g., o seguinte aresto, “do regime que resulta dos arts. 53.º da LGT e 171.º do CPPT ressalta que, em princípio, o pedido de indemnização pela prestação indevida de garantia deve ser apresentado no processo em que se impugna a legalidade da dívida garantida e aquando da apresentação da petição (impugnação, recurso ou oposição). Mas, caso nessa altura (da apresentação da petição) ainda não tenha sido prestada a garantia, o pedido deve ser formulado no prazo de 30 dias” (vd. Acórdão do STA de 8/10/2014, proc. 1016/14).
No que diz respeito ao pedido de juros indemnizatórios, cabe referir que o direito aos mesmos pressupõe que haja sido pago imposto por montante superior ao devido e que tal derive de erro, de facto ou de direito, imputável aos serviços da AT. E, de facto, em face do que se disse acima, conclui-se que foi pago imposto superior ao devido; contudo, ainda que se reconheça não ser devido (na parte não revogada pela AT) o imposto pago pelos requerentes, não se descortina que, na sua origem, se encontre o invocado erro imputável aos serviços, o qual determinaria o direito aos peticionados juros indemnizatórios. Com efeito, a AT limitou-se a dar cumprimento ao normativo legal em face dos documentos que lhe foram entregues e, em particular, em face do que a Fundação E… declarou no modelo 13 (vd. fl. 29 do PA). Importa ainda notar, por último, que a referida entidade declarante não procedeu a qualquer rectificação da mencionada declaração, em devido tempo ou de motu proprio.
Nestes termos, conclui-se que o erro não é imputável à AT, razão pela qual improcede o pedido de pagamento de juros indemnizatórios a favor dos requerentes.
***
IV – Decisão
Em face do supra exposto, decide-se:
- Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral, com a consequente revogação, com todos os efeitos legais, dos actos de liquidação impugnados, na parte não revogada pela AT.
- Julgar improcedente o pedido na parte respeitante ao peticionado pagamento, aos ora requerentes, de indemnização pela prestação de garantia bancária.
- Julgar improcedente o pedido na parte relativa aos juros indemnizatórios.
Fixa-se o valor do processo em €13.500,88 (treze mil e quinhentos euros e oitenta e oito cêntimos), nos termos do art. 32.º do CPTA e do art. 97.º-A do CPPT, aplicáveis por força do disposto no art. 29.º, n.º 1, als. a) e b), do RJAT, e do art. 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).
Custas a cargo da requerida, no montante de €918,00 (novecentos e dezoito euros), nos termos da Tabela I do RCPAT, e em cumprimento do disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e do disposto no art. 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.
Notifique.
Lisboa, 6 de Abril de 2015.
O Árbitro
(Miguel Patrício)
***
Texto elaborado em computador, nos termos do disposto
no art. 131.º, n.º 5, do CPC, aplicável por remissão do art. 29.º, n.º 1, al. e), do RJAT.
A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.