Decisão Arbitral
Processo n.º 605/2014-T
Autor/Requerente: Fundo Especial de Investimento Imobiliário Fechado A...
Requerido: Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante AT)
1. Relatório
B… - Sociedade Gestora de Fundos de Investimento Imobiliário, S.A., NIPC …, com sede na Avenida … Lisboa, na qualidade de sociedade gestora do Fundo Especial de Investimento Imobiliário Fechado A..., contribuinte fiscal n.º …, com sede no mesmo local, doravante designada por requerente, submeteu, em 04-08-2014, ao Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) o pedido de constituição de tribunal arbitral, com vista à declaração de ilegalidade de atos tributários de liquidação de imposto de selo da verba n.º 28 da Tabela Geral do Imposto de Selo, relativos aos andares e divisões com utilização independente do prédio urbano em propriedade total sito na Avenida …, na freguesia de ..., em Lisboa, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... da referida freguesia, a saber,
i. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 551,00, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 1.º dto., cujo VPT é de € 165.296,12, referente à primeira prestação;
ii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 273,78, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 1.º ft., cujo VPT é de € 82.129,94, referente à primeira prestação;
iii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 551,00, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 2.º dto., cujo VPT é de € 165.296,12, referente à primeira prestação;
iv. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 520,54, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 2.º esq., cujo VPT é de € 156.162,27, referente à primeira prestação;
v. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 551,00, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 3.º dto., cujo VPT é de € 165.296,12, referente à primeira prestação;
vi. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 520,54, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 3.º esq., cujo VPT é de € 156.162,27, referente à primeira prestação;
vii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 561,67, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 4.º dto., cujo VPT é de € 168.500,99, referente à primeira prestação;
viii. Liquidação n.º 2014 ..., no valor de € 520,54, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 4.º esq., cujo VPT é de € 156.162,27, referente à primeira prestação;
ix. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 555,18, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 5.º dto., cujo VPT é de € 166.552,34, referente à primeira prestação;
x. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 520,54, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 5.º esq., cujo VPT é de € 156.162,27, referente à primeira prestação;
xi. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 532,84, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 6.º dto., cujo VPT é de € 159.847,86, referente à primeira prestação;
xii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 501,42, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 6.º esq., cujo VPT é de € 150.424,56, referente à primeira prestação;
xiii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 550,98, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 1.º dto., cujo VPT é de € 165.296,12, referente à segunda prestação;
xiv. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 273,76, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 1.º ft., cujo VPT é de € 82.129,94, referente à segunda prestação;
xv. Liquidação n.º 2014..., no valor de €550,98, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 2.º dto., cujo VPT é de € 165.296,12, referente à segunda prestação;
xvi. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 520,54, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 2.º esq., cujo VPT é de € 156.162,27, referente à segunda prestação;
xvii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 550,98, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 3.ºdto., cujo VPT é de € 165.296,12, referente à segunda prestação;
xviii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 520,54, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 3.º esq., cujo VPT é de € 156.162,27, referente à segunda prestação;
xix. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 561,67, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 4.º dto., cujo VPT é de € 168.500,99, referente à segunda prestação;
xx. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 520,54, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 4.ºesq., cujo VPT é de € 156.162,27, referente à segunda prestação;
xxi. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 555,17, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 5.º dto., cujo VPT é de € 166.552,34, referente à segunda prestação;
xxii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 520,54, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 5.º esq., cujo VPT é de € 156.162,27, referente à segunda prestação;
xxiii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 532,82, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 6.ºdto., cujo VPT é de € 159.847,86, referente à segunda prestação;
xxiv. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 501,42, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 6.º esq., cujo VPT é de € 150.424,56, referente à segunda prestação;
xxv. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 550,98, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... – 1º dto., cujo VPT é de € 165.296,12, referente à terceira prestação;
xxvi. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 273,76, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 1.º ft., cujo VPT é de € 82.129,94, referente à terceira prestação;
xxvii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 550,98, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 2.º dto., cujo VPT é de € 165.296,12, referente à terceira prestação;
xxviii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 520,54, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 2.º esq., cujo VPT é de € 156.162,27, referente à terceira prestação;
xxix. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 550,98, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 3.º dto., cujo VPT é de € 165.296,12, referente à terceira prestação;
xxx. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 520,54, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 3.º esq., cujo VPT é de € 156.162,27, referente à terceira prestação;
xxxi. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 561,67, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 4.º dto., cujo VPT é de € 168.500,99, referente à terceira prestação;
xxxii. Liquidação n.º 2014 ..., no valor de € 520,54, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 4.º esq., cujo VPT é de € 156.162,27, referente à terceira prestação;
xxxiii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 555,17, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 5.º dto., cujo VPT é de € 166.552,34, referente à terceira prestação;
xxxiv. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 520,54, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 5.º esq., cujo VPT é de € 156.162,27, referente à terceira prestação;
xxxv. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 532,82, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 6.º dto., cujo VPT é de € 159.847,86, referente à terceira prestação;
xxxvi. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 501,42, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 6.º esq., cujo VPT é de € 150.424,56, referente à terceira prestação;
Todas as referidas liquidações têm data de 17-03-2014.
A requerente peticiona a anulação dos supra referidos atos de liquidação do Imposto de Selo bem como a devolução das quantias liquidadas, acrescidas de juros indemnizatórios.
A requerente alega, para tanto, que o imóvel a que se referem as liquidações de Imposto de Selo, cuja legalidade se discute, é um prédio em propriedade total, composto por 13 andares e divisões susceptíveis de utilização independente, dos quais 12 estão afetos a habitação, sendo que nenhum dos andares e divisões tem um VPT igual ou superior a € 1.000.000, não se verificando, na sua perspetiva, o pressuposto legal de incidência da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto de Selo.
Foi designado como árbitro único, em 19-09-2014, Ricardo Marques Candeias. Em conformidade com o previsto no art. 11.º, 1, c), RJAT, o tribunal arbitral singular foi constituído em 06-10-2014.
A requerida juntou no dia 14-11-2014 o PA referente às liquidações em causa nos autos.
Notificada para o efeito, a AT apresentou resposta a 18-11-2014. Esgrima que o valor patrimonial relevante para efeitos de incidência de imposto é o valor patrimonial total do prédio urbano e não o valor patrimonial de cada uma das partes que o componham, ainda que sejam suscetíveis de utilização independente, por não se encontrar o prédio constituído em propriedade horizontal.
Notificadas para se pronunciarem a respeito da proposta de dispensa da realização da reunião a que alude o art. 18.º do RJAT e dispensa de alegações orais, a AT e a requerente nada disseram ou requereram.
O tribunal arbitral entendeu, face aos elementos carreados para os autos, e inexistindo exceções a dirimir, não ser necessária a realização da reunião prevista bem como a produção de alegações. Consequentemente, em 02-04-2015 foi fixado para prolação da decisão o dia 06-04-2015.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (arts. 4.º e 10.º, n.º 1 e 2, do RJAT, e art. 1.º, da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março). O processo não enferma de nulidades e não foram suscitadas questões prévias que cumpra apreciar.
2. Dos factos
Analisada a prova documental produzida pela requerente, consideram-se provados e com interesse para a decisão da causa os seguintes factos:
a) O prédio urbano sito na Avenida ..., na freguesia de ..., em Lisboa, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ..., é propriedade da ora requerente;
b) O prédio encontra-se em propriedade total;
c) É constituído por 13 andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, 12 deles com afetação habitacional, sem se encontrarem em regime de propriedade horizontal;
d) A AT liquidou a 17-03-2013 o Imposto de Selo relativo ao ano de 2013, referente a parte dos andares ou divisões com utilização independente existentes no prédio supra identificado, no valor correspondente a 1% do seu valor patrimonial tributário, da seguinte forma:
i. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 551,00, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 1.º dto., cujo VPT é de € 165.296,12, referente à primeira prestação;
ii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 273,78, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 1.º ft., cujo VPT é de € 82.129,94, referente à primeira prestação;
iii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 551,00, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 2.º dto., cujo VPT é de € 165.296,12, referente à primeira prestação;
iv. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 520,54, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 2.º esq., cujo VPT é de € 156.162,27, referente à primeira prestação;
v. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 551,00, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 3.º dto., cujo VPT é de € 165.296,12, referente à primeira prestação;
vi. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 520,54, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 3.º esq., cujo VPT é de € 156.162,27, referente à primeira prestação;
vii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 561,67, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 4.º dto., cujo VPT é de € 168.500,99, referente à primeira prestação;
viii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 520,54, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 4.º esq., cujo VPT é de € 156.162,27, referente à primeira prestação;
ix. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 555,18, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 5.º dto., cujo VPT é de € 166.552,34, referente à primeira prestação;
x. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 520,54, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 5.º esq., cujo VPT é de € 156.162,27, referente à primeira prestação;
xi. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 532,84, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 6.º dto., cujo VPT é de € 159.847,86, referente à primeira prestação;
xii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 501,42, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 6.º esq., cujo VPT é de € 150.424,56, referente à primeira prestação;
xiii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 550,98, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 1.º dto., cujo VPT é de € 165.296,12, referente à segunda prestação;
xiv. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 273,76, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 1.º ft., cujo VPT é de € 82.129,94, referente à segunda prestação;
xv. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 550,98, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 2.º dto., cujo VPT é de € 165.296,12, referente à segunda prestação;
xvi. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 520,54, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 2.º esq., cujo VPT é de € 156.162,27, referente à segunda prestação;
xvii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 550,98, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 3.ºdto., cujo VPT é de € 165.296,12, referente à segunda prestação;
xviii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 520,54, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 3.º esq., cujo VPT é de € 156.162,27, referente à segunda prestação;
xix. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 561,67, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 4.º dto., cujo VPT é de € 168.500,99, referente à segunda prestação;
xx. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 520,54, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 4.ºesq., cujo VPT é de € 156.162,27, referente à segunda prestação;
xxi. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 555,17, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 5.º dto., cujo VPT é de € 166.552,34, referente à segunda prestação;
xxii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 520,54, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 5.º esq., cujo VPT é de € 156.162,27, referente à segunda prestação;
xxiii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 532,82, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 6.ºdto., cujo VPT é de € 159.847,86, referente à segunda prestação;
xxiv. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 501,42, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 6.º esq., cujo VPT é de € 150.424,56, referente à segunda prestação;
xxv. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 550,98, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... – 1º dto., cujo VPT é de € 165.296,12, referente à terceira prestação;
xxvi. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 273,76, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 1.º ft., cujo VPT é de € 82.129,94, referente à terceira prestação;
xxvii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 550,98, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 2.º dto., cujo VPT é de € 165.296,12, referente à terceira prestação;
xxviii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 520,54, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 2.º esq., cujo VPT é de € 156.162,27, referente à terceira prestação;
xxix. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 550,98, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 3.º dto., cujo VPT é de € 165.296,12, referente à terceira prestação;
xxx. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 520,54, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 3.º esq., cujo VPT é de € 156.162,27, referente à terceira prestação;
xxxi. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 561,67, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 4.º dto., cujo VPT é de € 168.500,99, referente à terceira prestação;
xxxii. Liquidação n.º 2014 ..., no valor de € 520,54, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 4.º esq., cujo VPT é de € 156.162,27, referente à terceira prestação;
xxxiii. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 555,17, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 5.º dto., cujo VPT é de € 166.552,34, referente à terceira prestação;
xxxiv. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 520,54, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 5.º esq., cujo VPT é de € 156.162,27, referente à terceira prestação;
xxxv. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 532,82, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 6.º dto., cujo VPT é de € 159.847,86, referente à terceira prestação;
xxxvi. Liquidação n.º 2014..., no valor de € 501,42, relativa ao prédio descrito no artigo matricial com o n.º ... - 6.º esq., cujo VPT é de € 150.424,56, referente à terceira prestação;
e) O valor patrimonial total do prédio é de € 1.847.994,13.
f) A requerente foi notificada para proceder ao pagamento das referidas notas de liquidação, no valor total de € 18.479,93.
g) A requerente procedeu no dia 30-04-2014 ao pagamento das liquidações n.ºs 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014 ...; 2014...; 2014...; 2014..., 2014... e 2014..., referentes à primeira prestação; no dia 31-07-2014 ao pagamento das liquidações n.ºs 2014 ...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014... e 2014... referentes à segunda prestação e no dia 29-11-2014 ao pagamento das liquidações n.ºs 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014 ...; 2014...; 2014...; 2014... e 2014..., referentes à terceira prestação, tudo no valor total de € 18.479,93.
A convicção do árbitro fundou-se na prova documental junta aos autos, concretamente os pontos a), b), c), e e) resultam do teor da caderneta predial junta aos autos e os pontos d), f), e g) resultam das notas de liquidação e respetivos comprovativos de pagamento, referentes à primeira prestação, juntos com a petição inicial como documentos 1 e 3 a 14; notas de liquidação, e respetivos comprovativos de pagamento, referentes à segunda prestação, juntos através de requerimento da requerente de 03-09-2014, como documento 1; notas de liquidação, e respetivos comprovativos de pagamento, referentes à terceira prestação, juntos através de requerimento da requerente de 4-12-2014, como documento 1.
Para a decisão da causa não se provaram outros factos com relevância.
3. Do Direito
São estes os factos que importa apreciar. Vejamos então.
A requerente vem alegar na sua petição inicial que “ (…) a sujeição das várias divisões de um prédio com as características daquele que está em questão no presente procedimento, deve ser determinado pelo VPT atribuído a cada uma das divisões do prédio, e não pelo VPT total do mesmo. Isto porque, o Código do IMI – para o qual o art.º 67º, n.º2 do Código do Imposto de Selo remete expressamente no que concerne às matérias relativas à verba 28 da TGIS não reguladas -, estipula que cada andar u parte de prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial que discrimina o respectivo VPT – principio da autonomização das partes independentes de um prédio urbano, mesmo quando não esteja constituído em propriedade horizontal – (vd. art.º 12º do Código de IMI).”
Defende a requerente que “Assim, (…), conclui-se que o Código do IMI prevê expressamente a regra de que o imposto é liquidado por referencia ao VPT de cada divisão (…).”
Continua a requerente, argumentando que ”(…) A verba 28 da TGIS só pode, legitimamente, incidir sobre divisões que integram prédios construídos em propriedade vertical quando esta parte/divisão apresente um VPT igual ou superior a € 1.000.000,00”
A requerente continua a sua argumentação referindo que “(…) nenhum dos VPT das divisões que foram sujeitas a Imposto de Selo é igual ou superior a € 1.000.000,00(…). Devem as liquidações de Imposto de Selo sub judice ser anuladas por ilegais, para todos os efeitos legais”.
Mais argumenta a requerente, que a interpretação da AT viola o princípio constitucional da igualdade, pois “a AT distingue duas realidades fácticas, que devem ser tratadas do mesmo modo, sob pena de violação do princípio da igualdade, um dos princípios basilares do ordenamento jurídico-fiscal, previsto no art.º 13º da Constituição da República Portuguesa. (…) A interpretação da AT não é conforme à Lei e à Constituição, por violação do princípio da igualdade (art.13º da CRP) bem como do que dispõe o art. 104º, n.º 3, da CRP.”.
A este respeito, conclui a requerente referindo que “(…)a tributação sub judice não pode ter-se por legal quando fundamentada na realidade jurídica de um prédio, e não na realidade económica e material daqueles que suportam o imposto. Termos em que, para efeito de incidência da verba 28.1 da TGIS deve revelar como critério determinante da capacidade contributiva a verdade material de cada prédio/fracção/divisão. E não a mera realidade jurídico-formal do prédio como “prédio em propriedade vertical/em propriedade horizontal”, sob pena de violação flagrante do princípio da igualdade, constitucionalmente consagrado.”.
A requerente esgrima ainda, numa outra linha de argumentação, que “a ilegalidade das liquidações de Imposto de selo sub judice se impõe ainda atenta a própria ratio legis subjacente à verba 28.1. da TGIS.(…) O legislador pretendeu impor um esforço acrescido aos contribuintes proprietários (e outros) de prédios com afectação habitacional cujo VPT seja superior a 1 milhão de euros, ou seja, sobre o património imobiliário habitacional de “luxo”.”
Continua a requerente, a este respeito, referindo que “Ora, tendo em mente a ratio legis desta verba, e analisando o VPT das diversas divisões que fazem parte do prédio urbano que corresponde ao art.º..., resulta de forma flagrante que o sujeito passivo do imposto – os proprietários, usufrutuários ou superficiários – não poderá se considerados como proprietários de imóvel de “luxo”.”
Conclui reforçando a tese da “ilegalidade da sujeição da verba 28.1 da TGIS aos prédios constituídos em propriedade vertical, quando nenhum dos seus andares ou divisões tenham um VPT igual ou superior a € 1.000.000,00.”
Termina a requerente, propugnando que ”devem as liquidações de Imposto do selo sub judice ser anuladas, por ilegais para todos os devidos efeitos legais, atento a ratio legis da verba 28 da TGIS, e à luz dos princípios da legalidade e da igualdade fiscal, bem como da prevalência da verdade material sobre a realidade jurídico-formal”, peticionando o reembolso dos montantes pagos acrescidos de juros indemnizatórios.
Por seu lado a AT vem contrapor a posição da requerente, fundamentando a sua pretensão no facto de o prédio desta se encontrar em regime de propriedade total e a concentração em cada prédio de habitações independentes não ser susceptível de desencadear a incidência do imposto de selo sobre cada uma delas.
No entendimento da AT “À data a Requerente detinha a propriedade plena do prédio urbano em análise, avaliado nos termos do CIMI, no âmbito da avaliação geral aos prédios urbanos, constante do artigo ... da matriz predial urbana da freguesia de ..., concelho e distrito de Lisboa, descrito como «prédio em propriedade total com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente», com 8 pisos e 13 divisões susceptíveis de utilização independente e afectos a habitação, com valor patrimonial tributário (VP) superior a € 1.000.000,00.
(…)
Dispõe o artigo 44º, n.º 5 do CIS, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 55-A/2012, de 29/10 que, havendo lugar a liquidação, o imposto a que se refere a verba 28 da TGIS é pago, nos prazos, termos e condições definidos no artigo 120º do CIMI, em três prestações nos meses de Abril, Julho e Novembro, conforme n.º 1, alínea c) do referido artigo 120º.
(…)
Ora, o que está aqui em causa é uma liquidação que resulta da aplicação directa da norma legal, que se traduz em elementos objectivos, sem qualquer apreciação subjectiva ou discricionária.”
Argumenta a AT no sentido de que “O conceito de prédio encontra-se definido no artigo 2º, n.º 1 do CIMI, estando estatuído no seu n.º 4 que no regime de propriedade horizontal, cada fracção autónoma é havida como constituindo um prédio. Decorre da análise do preceito normativo que um «prédio em propriedade total com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente» é, inequivocamente, diverso de um imóvel em regime de propriedade horizontal, constituído por fracções autónomas, ou seja, vários prédios. O artigo 12º do CIMI estatui o conceito de matriz predial, sendo que o seu n.º 3 respeita, exclusivamente, à forma de registar os dados matriciais.”
Refere a AT que “Em cumprimento do disposto no artigo 119º, n.º 1 do CIMI, o documento de cobrança é enviado ao sujeito passivo com discriminação das partes susceptíveis de utilização independente, respectivo valor patrimonial tributário e da colecta imputada a cada município da localização dos prédios.”
Concluindo, nessa parte, que “estando correcta a liquidação e sendo devido o imposto apurado, não são devidos juros indemnizatórios.”
Quanto à alegada violação do princípio da legalidade, argumenta a requerida no seguinte sentido: “muito embora a liquidação do IS, nas situações previstas na verba nº 28.1 da TGIS, se processe de acordo com as regras do CIMI, a verdade é que o legislador ressalva os aspectos que careçam das devidas adaptações, a saber aqueles em que, como é o caso dos prédios em propriedade total, ainda que com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente (muito embora o IMI seja liquidado relativamente a cada parte susceptível de utilização independente) para efeitos de IS releva o prédio na sua totalidade pois que, as divisões susceptíveis de utilização independente não são havidas como prédio, mas apenas as fracções autónomas no regime de propriedade horizontal, conforme nº 4 do art. 2º do CIMI. O que, expressamente, resulta da letra da lei é que o legislador quis tributar com a verba 28.1 em discussão os prédios enquanto uma única realidade jurídico-tributária (…).A sujeição ao imposto de selo da verba 28.1. da Tabela Geral anexa ao CIS resulta da conjugação de dois factos: a afectação habitacional e o valor patrimonial do prédio urbano inscrito na matriz ser igual ou superior a € 1.000.000,00.”
Pugna a AT pela improcedência do alegado vício de violação de lei por erro quanto aos pressupostos de direito, porquanto “Encontrando-se o prédio em regime de propriedade total, não possuindo fracções autónomas, às quais a lei fiscal atribua a qualificação de prédio, porque da noção de prédio do artigo 2º do CIMI, só as fracções autónomas de prédio em regime de propriedade horizontal são tidas como prédios – n.º 4 do citado artigo 2º do CIMI.”
Sobre a violação do princípio da igualdade tributária e da capacidade contributiva, argumenta a AT o seguinte: “Sobre a violação deste princípio, a AT entende que a previsão da verba 28.1 da TGIS não consubstancia qualquer violação ao princípio da igualdade, inexistindo qualquer discriminação na tributação de prédios constituídos em propriedade horizontal e prédios em propriedade total com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, ou entre prédios com afectação habitacional e prédios com outras afectações.
Esgrima a AT que “A propriedade horizontal e a propriedade vertical são institutos jurídicos diferenciados. A constituição da propriedade horizontal implica, é um facto, uma mera alteração jurídica do prédio, não havendo uma avaliação (ofício – circulado n.º 40.025, de 11.08.200, da DSCA), mas o legislador pode, no entanto, submeter a um enquadramento jurídico tributário distinto, logo, discriminatório, os prédios em regime de propriedade horizontal e vertical, em especial, beneficiando o instituto juridicamente mais evoluído da propriedade horizontal, sem que essa discriminação deva ser considerada necessariamente arbitrária. Esta discriminação pode também ser imposta pela necessidade de impor coerência ao sistema fiscal.”
Na perspectiva da AT, importa dar ênfase ao diferente regime jurídico-civilístico atribuído à propriedade horizontal face à propriedade total, os quais consistirão, mesmo para efeitos fiscais, institutos jurídicos diferentes. Daí o diferente tratamento em termos de incidência da verba 28.1 da TGIS: “O que se pretende concluir é que estas normas procedimentos de avaliação, as normas sobre a inscrição matricial, e ainda as normas sobre a liquidação das partes susceptíveis de utilização independente, não permitem afirmar que deva existir uma equiparação do prédio em regime de propriedade total ao regime da propriedade vertical, isto porque, e como já se referiu, seria ilegal e inconstitucional. Estes regimes jurídico-civilísticos são diferentes, e a lei fiscal respeita-os!”
Conclui a sua linha de argumentação referindo que “É assim consequência, de o facto tributário do imposto de selo da verba 28.1. consistir na propriedade, de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do CIMI, seja igual ou superior a € 1.000.000,00, o valor patrimonial relevante para efeitos da incidência do imposto ser, assim, o valor patrimonial total do prédio urbano e não o valor patrimonial de cada uma das partes que o componham, ainda quando susceptíveis de utilização independente. A verba 28.1 incide pois sobre a propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos com afectação habitacional, cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do CIMI, seja igual ou superior a € 1.000.000,00.
Conclui a AT que “Deste modo, não se pode concluir por uma alegada discriminação em violação do princípio da igualdade quando, na verdade, estamos perante realidades distintas, valoradas pelo legislador de forma diferente. Importa ainda salientar que a tributação em sede de IS obedece ao critério de adequação, na exacta medida em que visa a tributação da riqueza consubstanciada na propriedade de imóveis de elevado valor, surgindo num contexto de crise económica que não pode de todo ser ignorado.(…) Assim, encontra-se legitimada a opção por este mecanismo de obtenção da receita, o qual apenas seria censurável, face ao princípio da proporcionalidade, se resultasse manifestamente indefensável. (…) Pelo que, temos, necessariamente concluir que os actos tributários em causa não violaram qualquer princípio legal ou constitucional, devendo, assim ser mantidos.”
Posta uma breve descrição da palete argumentativa tecida pelas partes, vejamos então.
A questão decidenda prende-se com a de saber se a regra de incidência da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto de Selo (TGIS) é aplicável a prédios que não se encontram constituídos em propriedade horizontal. Com efeito, nesses casos questiona-se se a referida verba deverá incidir sobre o somatório do VPT atribuído aos diferentes andares, isto é, sobre o VPT total do prédio, ou, antes, sobre o VPT de cada andar com utilização económica independente do prédio.
Esta questão já foi objecto de vários acórdãos do CAAD, nomeadamente, os proferidos nos processos 132/2013-T, 14/2014-T, 30/2014-T e 88/2014-T, que seguiremos de perto.
A verba 28 da Tabela Geral de Imposto de Selo (TGIS) foi aditada pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro. Ela estabelece o seguinte:
“28 – Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1.000.000 – sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:
28.1 – Por prédio com afetação habitacional – 1 % (…);”
Com o aditamento do n.º 2 do artigo 67.º do Código do Imposto do Selo (CIS), operado também pela referida Lei, estabeleceu-se que quanto “às matérias não reguladas no presente código respeitantes à verba 28 da Tabela Geral aplica-se subsidiariamente o CIMI.”.
Por força desta remissão, reportando-se a norma de incidência da verba 28.1 TGIS a prédios urbanos, o conceito de prédio urbano será o resultante do CIMI.
O CIMI estabelece no art. 2.º, 1, o conceito de prédio. Define-o como “toda a fração de território, abrangendo as águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com caráter de permanência, desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou coletiva e, em circunstâncias normais, tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontrem implantados, embora situados numa fração de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial”.
Já o art. 4.º do CIMI estabelece que são prédios urbanos “todos aqueles que não devam ser classificados como rústicos, sem prejuízo do disposto no artigo seguinte”.
Por sua vez, o art. 6.º, ibidem, procede à classificação das diversas espécies de prédios urbanos, distinguindo-os, no n.º 1 do referido artigo, em quatro subcategorias: “a) Habitacionais; b) Comerciais, industriais ou para serviços; c) Terrenos para construção; d) Outros”.
No n.º 2 do mesmo artigo encontramos o critério utilizado para essa distinção, considerando que os “Habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços são os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins”.
Ora, verificamos que não decorre dos normativos legais do citado diploma qualquer classificação dos prédios urbanos que os distinga entre prédios em propriedade horizontal versus prédios em propriedade vertical.
Se o legislador os qualifica como uma mesma realidade jurídico-fiscal, claudicará sustentação legal à aplicação de diferentes regimes fiscais por força da natureza jurídico-civilística que um prédio urbano com afectação habitacional detenha.
É verdade que o art. 2.º, 4, do CIMI, determina que, "para efeitos deste imposto, cada fracção autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio". Porém, é também verdade que o mesmo não estabelece qualquer diferenciação entre as fracções autónomas dos prédios em propriedade horizontal estas e as partes do prédio com utilização independentemente da classificação enquanto prédios urbanos habitacionais.
Daqui resulta que o legislador pretendeu apenas, como fez, diferenciar os prédios urbanos considerando o seu destino normal, isto é, considerando o destino a que cada um deles está adstrito. Deste modo, obsta assim, do ponto de vista fiscal, a uma distinção que a lei civil prevê, entre prédios em propriedade horizontal e prédios em propriedade vertical, não permitindo, contudo, que essa caracterização jurídica releve para aquilo que nos interessa, que é o âmbito de incidência do imposto, tanto do IMI como da verba 28.1 da TGIS, decorrente da mencionada remissão.
Sendo assim, concluímos ser irrelevante, para efeitos de tributação, que o prédio esteja em propriedade vertical ou horizontal. É antes relevante a verdade material subjacente à sua existência enquanto prédio urbano e à sua utilização habitacional.
Aliás, atenta a intenção do legislador ao criar a verba 28 da TGIS e à aplicação que a AT lhe vem dando, considera-se que o critério por esta adotado quanto aos prédios em propriedade vertical não se adequa aos princípios da legalidade, igualdade e proporcionalidade fiscal, consagrados constitucionalmente no nosso ordenamento jurídico.
O princípio da igualdade fiscal deverá ser entendido no seu sentido material. Pelo que, a tónica deste princípio assentará sempre na capacidade contributiva de cada contribuinte. O mesmo é dizer que teremos um imposto igual para os que tiverem igual capacidade contributiva, e um imposto diferente para os que dispuserem de diferente capacidade contributiva. Certo é que, a diferença no imposto será proporcional à diferente capacidade contributiva.
Este princípio é-nos imposto pela articulação do art. 13.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) com os arts. 103.º e 104.º do mesmo diploma.
Ora, o imposto estabelecido pela verba 28 da TGIS pretende harmonizar a repartição do esforço fiscal dos contribuintes, fazendo incidir este imposto sobre os titulares de propriedades de elevado valor destinadas a habitação, que excedam € 1.000.000,00, por cada andar com utilização independente.
Com efeito, determinando o princípio da igualdade fiscal que se deve tratar fiscalmente de forma igual o que é igual e de forma diferente o que é diferente, não se justifica o tratamento diferenciado, para efeitos de tributação, dos andares de um prédio só pelo facto de o mesmo já se encontrar em propriedade horizontal, conquanto que esses andares tenham utilização independente.
E remetendo o CIS para o CIMI, consideramos que a inscrição na matriz de imóveis em propriedade vertical, constituídos por diferentes andares com utilização independente, deverá obedecer às mesmas regras de inscrição dos imóveis constituídos em propriedade horizontal.
Atente-se, desde logo, no disposto no n.º 3, do art. 12.º do CIMI, segundo o qual "cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina também o respectivo valor patrimonial tributário".
Fixar como valor de referência para a incidência do novo imposto o VPT global do prédio em causa, como pretende a AT, não encontra qualquer base na legislação aplicável e supra referida.
Aliás, a própria requerida emitiu as notas de Liquidação que constam dos autos, sendo cada uma delas referente a cada uma das frações com utilização independente e afectação habitacional. Consta, inclusive, de cada delas particular referência ao VPT de cada fração, para efeitos de aplicação da verba 28.1 da TGIS. Decorre daqui ter sido o imposto liquidado individualmente em relação a cada uma das partes com utilização independente e não considerando a soma dos VPT dos andares do prédio em propriedade total.
Face a todo o exposto, o critério legal a utilizar para definição da incidência do imposto estabelecido na verba 28.1 da TGIS terá de ser idêntico ao estabelecido para efeitos do IMI.
Como se pode ler na Decisão Arbitral proferida no processo 132/2013-T “não se vislumbra, nos trabalhos relativos à discussão da proposta de lei n.º 96/XII na Assembleia da República, a invocação de uma ratio interpretativa distinta da aqui apresentada. Com efeito, justificou-se tal medida, apelidada de "taxa especial sobre os prédios urbanos habitacionais de mais elevado valor", com a necessidade de cumprir com os princípios da equidade social e da justiça fiscal, onerando mais significativamente os titulares de propriedades com elevado valor destinadas a habitação, e, nessa medida, fazendo incidir a nova "taxa especial" sobre as "casas de valor igual ou superior a 1 milhão de euros".
Prossegue ainda a referida decisão afirmando que “se tal lógica parece fazer sentido quando aplicada a «habitação» - seja ela «casa», «fracção autónoma» ou «parte de prédio com utilização independente» / «unidade autónoma» -, porque se supõe uma capacidade contributiva acima da média e, nessa medida, se justifica a necessidade de realização de um esforço contributivo adicional, pouco sentido faria passar a desconsiderar os apuramentos "unidade a unidade" quando só através do somatório dos VPTs das mesmas (porque detidas pelo mesmo indivíduo) é que se superaria o milhão de euros”.
Posto que, só assistiria razão à AT e, consequentemente, direito à liquidação do imposto em causa, se a algum dos andares com utilização independente correspondesse um VPT superior a € 1.000.000,00, o que não se verifica, pois o valor mais elevado corresponde apenas a € 168.500,99.
Depreende-se do que até aqui foi dito que a posição da AT é contrária à Lei e à Constituição, violando os princípios da legalidade e igualdade fiscal.
O prédio em causa encontra-se em propriedade total e contém 13 frações com utilização independente, sendo que 12 têm afectação habitacional. Como se mostra provado, nenhum deles tem um VPT igual ou superior a € 1.000.000,00. Observamos assim a não verificação do pressuposto legal de incidência do Imposto de Selo previsto na verba 28 da TGIS.
Em consequência do exposto, concluímos pela ilegalidade das liquidações de imposto de selo impugnadas pela Requerente. Deverá por isso a matéria colectável, que serve de base à norma de incidência da verba 28.1 da TGIS, ser o VPT determinado nos termos do CIMI, para cada um dos andares do prédio que sejam suscetíveis de utilização independente.
Deu-se como provado que a ora requerente pagou nos dias 30-04-2014, 31-07-2014 e 29-11-2014 a primeira, segunda e terceira prestações relativas ao imposto resultante das liquidações em discussão, tendo peticionado o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios.
Dispõem os arts. 24.º, 1, b), RJAT, e 100.º, LGT, que, tendo sido pago o imposto e posteriormente, sendo anulada a liquidação que suportava esse imposto, tem o contribuinte direito ao reembolso dos montantes indevidamente pagos.
O art. 43.º, LGT, prevê que “são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”.
Quanto à existência, no caso, de erro imputável aos serviços, este erro considera-se verificado, segundo jurisprudência uniforme do STA (vejam-se, neste sentido, os Acórdãos do STA de 22-05-2002, Proc. n.º 457/02; de 31.10.2001, Proc. n.º 26167; de 2.12.2009, Proc. n.º 0892/09) sempre que procederem a reclamação graciosa ou impugnação da liquidação (no mesmo sentido, a decisão no processo arbitral 218/2013-T).
Por conseguinte, tem a requerente direito a juros indemnizatórios, nos termos dos arts. 43.º, 1, LGT, e 61.º, 2 , 5, CPPT.
Sendo assim, deve a AT restituir o valor de € 18.479,93 acrescido de juros à taxa legal de 4%, desde a data dos referidos pagamentos (30-04-2014, 31-07-2014 e 29-11-2014) até à restituição integral dos valores por parte da AT.
De acordo com o disposto nos arts. 12.º, 2, e 22.º, 4, ambos do RJAT, e art. 4.º 3, da Tabela I anexa ao Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, as custas do presente processo ficam a cargo da requerida.
4. Decisão
Perante o supra descrito, decide-se julgar totalmente procedente o pedido formulado pela Requerente no presente processo arbitral tributário, quanto à ilegalidade das liquidações de Imposto de Selo n.ºs 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014..., 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014...; 2014 ...; 2014...; 2014...; 2014... e 2014... devendo as mesmas considerar-se nulas, com as necessárias consequências legais.
Ainda se condena a ora requerida a devolver à requerente o total de € 18.479,93 a título de capital, que esta indevidamente pagou, acrescido de juros à taxa legal de 4%, desde os dias 30-04-2014, 31-07-2014 e 29-11-2014 respetivamente, relativos à primeira, segunda e terceira prestações, até à restituição integral do valor em causa.
A requerida ainda é condenada no pagamento das custas nos termos supra e infra referidos.
Valor do processo:
De acordo com o disposto nos arts. 306.º, 2, CPC, e 97.º-A, 1, a), CPPT, e 3.º, 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor da ação em € 18.479,93.
Custas:
Nos termos do artigo 22.º, 4, do RJAT, e da Tabela I anexa ao Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em € 1.224,00 devidas pela Autoridade Tributária.
Notifique.
Lisboa, 6 de abril de 2015.
Texto elaborado por computador, nos termos do art. 131.º, 5, CPC, aplicável por remissão do art. 29.º, 1, e), RJAT, com versos em branco e por mim revisto.
O árbitro singular
Ricardo Marques Candeias