Decisão Arbitral
CAAD: Arbitragem Tributária
Processo nº 525/2014 – T
Tema: Imposto Único de Circulação
Autora / Requerente: A…, S.A.
Requerida: Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante ATA)
1. Relatório
Em 25-07-2014, a sociedade A…, S.A., pessoa coletiva n.º …, com sede em …, Rua …, Edifício …, piso 4, …, …, doravante designada por Requerente, submeteu ao Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) o pedido de constituição de tribunal arbitral com vista à apreciação da legalidade do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa de ato tributário apresentado contra as liquidações de Imposto Único de Circulação, referentes ao ano de 2010.
A Requerente alega que as liquidações em causa padecem de vício de violação da lei e errónea interpretação e aplicação do artigo 3º, n.º 1 do Código do Imposto Único de Circulação (IUC), por não ser proprietária dos veículos em questão, uma vez que já havia alienado as viaturas. A Requerente refere que o disposto no n.º 1 do artigo 3º do Código do IUC[1] é uma presunção legal que terá de ser necessariamente ilidível, mediante apresentação de prova em contrário.
Por fim, a Requerente pede a condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios até ao efetivo reembolso do imposto, nos termos do artigo 43º da Lei Geral Tributária.
A Autoridade Tributária e Aduaneira (ATA) apresentou resposta, em 03-11-2014, defendendo a manutenção dos atos tributários sindicados e pedindo a absolvição do pedido.
A ATA começa por apresentar defesa por exceção, desde logo referindo que a Requerente não foi notificada das liquidações, mas que as emitiu do Portal das Finanças, tratando-se portanto de autoliquidações. A ATA refere que o pedido de pronúncia arbitral carece assim de objeto, atendendo a não se encontrarem a ser sindicados atos de liquidação oficiosa do imposto.
A ATA alega também que o disposto no artigo 131º n.º 1 do Código do Procedimento e do Processo Tributário (CPPT) prescreve que em caso de erro na autoliquidação, a impugnação será obrigatoriamente precedida de reclamação graciosa no prazo de dois anos a contar da apresentação da declaração, o que não se verificou.
A ATA refere ainda que o Tribunal arbitral não tem competência para sindicar os atos em causa, atendendo à inexistência de atos de liquidação oficiosa de IUC emitidos pela ATA, o que consubstancia uma exceção dilatória impeditiva do conhecimento do mérito da causa, nos termos do disposto no artigo 576º n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil, aplicável por força da alínea e) do artigo 2º do CPPT e do artigo 29º n.º 1 alíneas a) e e) do RJAT.
Além disso, nos termos da redação da Portaria n.º 112/2011 de 22 de março, relativa à vinculação da ATA à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD que tenham por objeto a apreciação de pretensões relativas a impostos cuja administração lhes esteja cometida, existirá uma exceção relativa às pretensões relativas à declaração de ilegalidade de atos de autoliquidação, que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos do artigo 131º do CPPT. Pelo que, também por aqui a ATA entende que o tribunal arbitral é incompetente para conhecer o pedido.
Quanto ao pedido de revisão do ato tributário apresentado pela Requerente, a ATA entende ainda que não existe uma fundamentação bastante que permita aplicar os pressupostos de que depende o n.º 4 do artigo 78º da Lei Geral Tributária (LGT). E refere também que o pedido de revisão não é o meio próprio de reação, uma vez que o artigo 131º do CPPT refere que em caso de atos de autoliquidação, o meio graciosa é a reclamação graciosa, e o prazo para a apresentação da mesma é de dois anos a contar das autoliquidações.
A ATA alega ainda que o pedido foi intempestivo, uma vez que o prazo é de 90 dias a contar do termo do prazo para pagamento voluntário das prestações tributárias, nos termos do artigo 10º n.º1 do RJAT e 102º n.º 1 alínea a), prazo esse que se encontrava largamente ultrapassado quando o pedido deu entrada. Assim, entende a ATA que já terá caducado o direito de ação da Requerente, sendo que a caducidade do direito de ação é uma exceção dilatória que obsta ao prosseguimento do processo.
Quanto à defesa por impugnação da ATA, esta começa por referir que o artigo 3º n.º 1 do Código do IUC não consagra qualquer presunção, mas que o legislador estabeleceu expressa e intencionalmente que se consideram como proprietários as pessoas em nome das quais os veículos se encontram registados.
A ATA alega que a argumentação da Requerente representa uma violação do princípio da proporcionalidade, na medida em que desconsidera totalmente no confronto com o princípio da capacidade contributiva, quando na realidade a Requerente dispõe de mecanismos legais necessários e adequados à salvaguarda daquela sua capacidade, como o registo automóvel, e não os exerceu em devido tempo.
Foi designada como árbitro único, em 11-09-2014, Suzana Fernandes da Costa. Em conformidade com o previsto no artigo 11º n.º 1 alínea c) do RJAT, o tribunal arbitral singular foi constituído em 02-09-2014.
Em 10-11-2014, foi agendada a reunião prevista no artigo 18º do RJAT para o dia 05-12-2014 pelas 15:30 horas.
Na reunião, as partes pronunciaram-se oralmente sobre a matéria de exceção e foram as partes notificadas para apresentarem as suas alegações escritas no prazo de 10 dias e de forma sucessiva. Designou-se nessa altura o dia 25-01-2015 para a prolação da decisão arbitral.
O pedido arbitral é tempestivo, nos termos do artigo 10º n.º 1 alínea a) do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de janeiro e do artigo 102º n.º1 alínea a) do CPPT.
O processo não enferma de nulidades.
2. Matéria de facto
2. 1. Factos provados:
Analisada a prova documental produzida, consideram-se provados e com interesse para a decisão da causa os seguintes factos:
1. A Requerente é uma sociedade anónima que se dedica ao comércio e aluguer de veículos ligeiros e pesados e motociclos, sem condutor, prestação de serviços de gestão de frotas de veículos automóveis e motociclos, compra e venda de automóveis e motociclos, novos e usados, e em geral, a prestação de serviços que se encontrem relacionados com a utilização de veículos automóveis e motociclos.
2. A Requerente procedeu ao pagamento do Imposto Único de Circulação, relativo ao ano de 2010, reativo às seguintes viaturas, conforme documentos 107 a 212 juntos ao pedido arbitral:
…………………..
3. A Requerente apresentou, em 31-12-2013, um pedido de revisão de ato tributário das liquidações supra referidas.
4. Até á data de entrada do pedido arbitral, a Requerente não tinha ainda sido notificada da decisão do referido pedido de revisão do ato tributário.
Não se provaram outros factos com relevância para a decisão da causa.
2.2. Fundamentação da matéria de facto provada:
No tocante aos factos provados, a convicção do árbitro fundou-se na prova documental junta aos autos.
2.2.3. Factos não provados
Não ficou provada que a Requerente tenha sido notificada das liquidações de IUC em causa.
3. Matéria de direito:
3.1. Decisão da questão do ato de autoliquidação
O n.º 1 do artigo 17º do Código do IUC refere que o imposto é liquidado pelo sujeito passivo de imposto. Assim, estamos perante autoliquidações de Imposto Único de Circulação, e não liquidações adicionais emitidas pela ATA e notificadas à Requerente.
A ATA alega que tratando-se de autoliquidações, verifica-se a exceção de falta de objeto.
No pedido arbitral são identificadas as liquidações objeto do pedido. Mesmo tratando-se de autoliquidações, o objeto do pedido está identificado, pelo que improcede a exceção de falta de objeto.
3.2. Decisão da questão da incompetência
3.2.1. Alcance da exigência de recurso à via administrativa para formulação de pedidos de pronúncia arbitral relativos a atos de autoliquidação
Tratando-se de atos de autoliquidação, torna-se necessário decidir a questão da incompetência do tribunal para conhecer pretensões relativas à declaração de ilegalidade de atos de autoliquidação.
Sobre o assunto, seguiremos de perto o acórdão do CAAD do processo n.º 117/2013-T, em que são Relatores Dr. Jorge Lopes de Sousa, Dr. Diogo Leite de Campos e Dr. Vitor Simões.
A competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é, em primeiro lugar, limitada às matérias indicadas no art. 2.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT).
Numa segunda linha, a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é também limitada pelos termos em que Administração Tributária foi vinculada àquela jurisdição pela Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, pois o art. 4.º do RJAT estabelece que «a vinculação da administração tributária à jurisdição dos tribunais constituídos nos termos da presente lei depende de portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça, que estabelece, designadamente, o tipo e o valor máximo dos litígios abrangidos».
Em face desta segunda limitação da competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, a resolução da questão da competência depende essencialmente dos termos desta vinculação, pois, mesmo que se esteja perante uma situação enquadrável naquele art. 2.º do RJAT, se ela não estiver abrangida pela vinculação estará afastada a possibilidade de o litígio ser jurisdicionalmente decidido por este Tribunal Arbitral.
Na alínea a) do art. 2.º desta Portaria n.º 112-A/2011, excluem-se expressamente do âmbito da vinculação da Administração Tributária à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD as «pretensões relativas à declaração de ilegalidade de atos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário».
A referência expressa ao precedente «recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser interpretada como reportando-se aos casos em que tal recurso é obrigatório, através da reclamação graciosa, que é o meio administrativo indicado naqueles arts. 131.º a 133.º do CPPT, para que cujos termos se remete. Na verdade, desde logo, não se compreenderia que, não sendo necessária a impugnação administrativa prévia «quando o seu fundamento for exclusivamente matéria de direito e a autoliquidação tiver sido efetuada de acordo com orientações genéricas emitidas pela administração tributária» (art. 131.º, n.º 3, do CPPT, aplicável aos casos de retenção na fonte, por força do disposto no n.º 6 do art. 132.º do mesmo Código), se fosse afastar a jurisdição arbitral por essa impugnação administrativa, que se entende ser desnecessária, não ter sido efetuada.
No caso em apreço, é pedida a declaração de ilegalidade e anulação de atos de autoliquidação, bem como a declaração de ilegalidade e anulação do ato de indeferimento do pedido de revisão oficiosa.
Como resulta da matéria de facto fixada, não se provou que a autoliquidação tivesse «sido efetuada de acordo com orientação genéricas da administração tributária» nem foi apresentada reclamação graciosa nos termos do artigo 131.º do CPPT.
No entanto, foi apresentado pedido de revisão oficiosa dos atos de liquidação referidos.
Assim, importa, antes de mais, esclarecer se a declaração de ilegalidade de atos de indeferimento de pedidos de revisão do ato tributário, previstos no art. 78.º da LGT, se inclui nas competências atribuídas aos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD pelo art. 2.º do RJAT.
Na verdade, neste art. 2.º não se faz qualquer referência expressa a estes atos, ao contrário do que sucede com a autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, que refere os «pedidos de revisão de atos tributários» e «os atos administrativos que comportem a apreciação da legalidade de atos de liquidação».
No entanto, a fórmula «declaração de ilegalidade de atos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta», utilizada na alínea a) do n.º 1 do art. 2.º do RJAT não restringe, numa mera interpretação declarativa, o âmbito da jurisdição arbitral aos casos em que é impugnado diretamente um ato de um daqueles tipos. Na verdade, a ilegalidade de atos de liquidação pode ser declarada jurisdicionalmente como corolário da ilegalidade de um ato de segundo grau, que confirme um ato de liquidação, incorporando a sua ilegalidade.
A inclusão nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD dos casos em que a declaração de ilegalidade dos atos aí indicados é efetuada através da declaração de ilegalidade de atos de segundo grau, que são o objeto imediato da pretensão impugnatória, resulta com segurança da referência que naquela norma é feita aos atos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta, que expressamente se referem como incluídos entre as competências dos tribunais arbitrais. Com efeito, relativamente a estes atos é imposta, como regra, a reclamação graciosa necessária, nos arts. 131.º a 133.º do CPPT, pelo que, nestes casos, o objeto imediato do processo impugnatório é, em regra, o ato de segundo grau que aprecia a legalidade do ato de liquidação, ato aquele que, se o confirma, tem de ser anulado para se obter a declaração de ilegalidade do ato de liquidação. A referência que na alínea a) do n.º 1 do art. 10.º do RJAT se faz ao n.º 2 do art. 102.º do CPPT, em que se prevê a impugnação de atos de indeferimento de reclamações graciosas, desfaz quaisquer dúvidas de que se abrangem nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD os casos em que a declaração de ilegalidade dos actos referidos na alínea a) daquele art. 2.º do RJAT tem de ser obtida na sequência da declaração da ilegalidade de atos de segundo grau.
Aliás, foi precisamente neste sentido que o Governo, na Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, interpretou estas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, ao afastar do âmbito dessas competências as «pretensões relativas à declaração de ilegalidade de atos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário», o que tem como alcance restringir a sua vinculação os casos em que esse recurso à via administrativa foi utilizado.
Obtida a conclusão de que a fórmula utilizada na alínea a) do n.º 1 do art. 2.º do RJAT não exclui os casos em que a declaração de ilegalidade resulta da ilegalidade de um ato de segundo grau, ela abrangerá também os casos em que o ato de segundo grau é o de indeferimento de pedido de revisão do ato tributário, pois não se vê qualquer razão para restringir, tanto mais que, nos casos em que o pedido de revisão é efetuado no prazo da reclamação graciosa, ele deve ser equiparado a uma reclamação graciosa, como se entendeu no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 12-06-2006, no processo n.º 402/06.
A referência expressa ao artigo 131.º do CPPT que se faz no artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011 não pode ter o alcance decisivo de afastar a possibilidade de apreciação de pedidos de ilegalidade de atos de indeferimento de pedidos de revisão oficiosa de atos de autoliquidação.
Na verdade, a interpretação exclusivamente baseada no teor literal que defende a Autoridade Tributária e Aduaneira no presente processo não pode ser aceite, pois na interpretação das normas fiscais são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis (artigo 11.º, n.º 1, da LGT) e o artigo 9.º n.º 1, proíbe expressamente as interpretações exclusivamente baseadas no teor literal das normas ao estatuir que «a interpretação não deve cingir-se à letra da lei», devendo, antes, «reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada».
Quanto a correspondência entre a interpretação e a letra da lei, basta «um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso» (artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil) o que só impedirá que se adotem interpretações que não possam em absoluto compaginar-se com a letra da lei, mesmo reconhecendo nela imperfeição na expressão da intenção legislativa.
Por isso, a letra da lei não é obstáculo a que se faça interpretação declarativa, que explicite o alcance do teor literal, nem mesmo interpretação extensiva, quando se possa concluir que o legislador disse menos do que o que, em coerência, pretenderia dizer, isto é, quando disse imperfeitamente o que pretendia dizer. Na interpretação extensiva «é a própria valoração da norma (o seu “espírito”) que leva a descobrir a necessidade de estender o texto desta à hipótese que ela não abrange», «a força expansiva da própria valoração legal é capaz de levar o dispositivo da norma a cobrir hipóteses do mesmo tipo não cobertas pelo texto».
A interpretação extensiva, assim, é imposta pela coerência valorativa e axiológica do sistema jurídico, erigida pelo artigo 9.º, n.º 1, do Código Civil em critério interpretativo primordial pela via da imposição da observância do princípio da unidade do sistema jurídico.
É manifesto que o alcance da exigência de reclamação graciosa prévia, necessária para abrir a via contenciosa de impugnação de atos de autoliquidação, prevista no n.º 1 do artigo 131.º do CPPT, tem como única justificação o facto de relativamente a esse tipo de atos não existir uma tomada de posição da Administração Tributária sobre a legalidade da situação jurídica criada com o ato, posição essa que até poderá vir a ser favorável ao contribuinte, evitando a necessidade de recurso à via contenciosa.
Na verdade, além de não se vislumbrar qualquer outra justificação para a essa exigência, o facto de estar prevista idêntica reclamação graciosa necessária para impugnação contenciosa de atos de retenção na fonte e de pagamento por conta (nos artigos 132.º, n.º 3, e 133.º, n.º 2, do CPPT), que têm de comum com os atos de autoliquidação a circunstância de também não existir uma tomada de posição da Administração Tributária sobre a legalidade dos atos, confirma que é essa a razão de ser daquela reclamação graciosa necessária.
Uma outra confirmação inequívoca de que é essa a razão de ser da exigência de reclamação graciosa necessária encontra-se no n.º 3, do artigo 131.º do CPPT, ao estabelecer que «sem prejuízo do disposto nos números anteriores, quando o seu fundamento for exclusivamente matéria de direito e a autoliquidação tiver sido efetuada de acordo com orientações genéricas emitidas pela administração tributária, o prazo para a impugnação não depende de reclamação prévia, devendo a impugnação ser apresentada no prazo do n.º 1 do artigo 102.º». Na verdade, em situações deste tipo, houve uma pronúncia prévia genérica da Administração Tributária sobre a legalidade da situação jurídica criada com o ato de autoliquidação e é esse facto que explica que deixe de exigir-se a reclamação graciosa necessária.
Ora, nos casos em que é formulado um pedido de revisão oficiosa de ato de liquidação é proporcionada à Administração Tributária, com este pedido, uma oportunidade de se pronunciar sobre o mérito da pretensão do sujeito passivo antes de este recorrer à via jurisdicional, pelo que, em coerência com as soluções adotadas nos n.ºs 1 e 3 do artigo 131.º do CPPT, não pode ser exigível que, cumulativamente com a possibilidade de apreciação administrativa no âmbito desse procedimento de revisão oficiosa, se exija uma nova apreciação administrativa através de reclamação graciosa.
Por outro lado, é inequívoco que o legislador não pretendeu impedir aos contribuintes a formulação de pedidos de revisão oficiosa nos casos de atos de autoliquidação, pois estes são expressamente referidos no n.º 2 do artigo 78.º da LGT.
Neste contexto, permitindo a lei expressamente que os contribuintes optem pela reclamação graciosa ou pela revisão oficiosa de atos de autoliquidação e sendo o pedido de revisão oficiosa formulado no prazo da reclamação graciosa perfeitamente equiparável a uma reclamação graciosa, como se referiu, não pode haver qualquer razão que possa explicar que não possa aceder à via arbitral um contribuinte que tenha optado pela revisão do ato tributário em vez da reclamação graciosa.
Por isso, é de concluir que os membros do Governo que emitiram a Portaria n.º 112-A/2011, ao fazerem referência ao artigo 131.º do CPPT relativamente a pedidos de declaração de ilegalidade de atos de autoliquidação, disseram imperfeitamente o que pretendiam, pois, pretendendo impor a apreciação administrativa prévia à impugnação contenciosa de atos de autoliquidação, acabaram por incluir referência ao artigo 131.º que não esgota as possibilidades de apreciação administrativa desses atos.
Aliás, é de notar que esta interpretação não se cingindo ao teor literal até se justifica especialmente no caso da alínea a) do artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, por serem evidentes as suas imperfeições: uma, é associar a fórmula abrangente «recurso à via administrativa» (que referencia, além da reclamação graciosa, o recurso hierárquico e a revisão do ato tributário) à «expressão nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário», que tem potencial alcance restritivo à reclamação graciosa; outra é utilizar a fórmula «precedidos» de recurso à via administrativa, reportando-se às «pretensões relativas à declaração de ilegalidade de atos», que, obviamente, se coadunariam muito melhor com a feminina palavra «precedidas».
Por isso, para além da proibição geral de interpretações limitadas à letra da lei que consta do artigo 9.º, n.º 1, do Código Civil, no específico caso da alínea a) do artigo 2.º da Portaria n.º 112-A72011 há uma especial razão para não se justificar grande entusiasmo por uma interpretação literal, que é o facto e a redação daquela norma ser manifestamente defeituosa.
Para além disso, assegurando a revisão do ato tributário a possibilidade de apreciação da pretensão do contribuinte antes do acesso à via contenciosa que se pretende alcançar com a impugnação administrativa necessária, a solução mais acertada, porque é a mais coerente com o desígnio legislativo de «reforçar a tutela eficaz e efetiva dos direitos e interesses legalmente protegidos dos contribuintes» manifestado no n.º 2 do artigo 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, é a admissibilidade da via arbitral para apreciar a legalidade de atos de liquidação previamente apreciada em procedimento de revisão.
E, por ser a solução mais acertada, tem de se presumir ter sido normativamente adotada (artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil).
Por outro lado, contendo aquela alínea a) do artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011 uma fórmula imperfeita, mas que contém uma expressão abrangente «recurso à via administrativa», que potencialmente referencia também a revisão do ato tributário, encontra-se no texto o mínimo de correspondência verbal, embora imperfeitamente expresso, exigido por aquele n.º 3 do artigo 9.º para a viabilidade da adoção da interpretação que consagre a soluça mais acertada.
É de concluir, assim, que o artigo 2.º alínea a) da Portaria n.º 112-A/2011, devidamente interpretado com base nos critérios de interpretação da lei previstos no artigo 9.º do Código Civil e aplicáveis às normas tributárias substantivas a adjetivas, por força do disposto no artigo 11.º, n.º 1, da LGT, viabiliza a apresentação de pedidos de pronúncia arbitral relativamente a atos de autoliquidação que tenham sido precedidos de pedido de revisão oficiosa.
No entanto, e tal como acima se referiu, o pedido de revisão é equiparado a uma reclamação graciosa nos termos do artigo 131º do CPPT, desde que apresentado no prazo de dois anos, tal como exige o referido artigo.
Tendo sido efetuadas as autoliquidações de IUC entre 20-05-2013 e 31-05-2013, e tendo o pedido de revisão do ato tributário sido apresentado em 31-12-2013, considera-se cumprido o prazo de dois anos exigido pelo artigo 131º do CPPT.
Assim, considera-se competente o tribunal arbitral para conhecimento do presente pedido.
3.3. Decisão da questão da intempestividade do pedido
A ATA alega que o pedido foi intempestivo, uma vez que o prazo é de 90 dias a contar do termo do prazo para pagamento voluntário das prestações tributárias, nos termos do artigo 10º n.º1 do RJAT e 102º n.º 1 alínea a), prazo esse que se encontrava largamente ultrapassado quando o pedido deu entrada. Entende a ATA que já terá caducado o direito de ação da Requerente, sendo que a caducidade do direito de ação é uma exceção dilatória que obsta ao prosseguimento do processo.
A Requerente deu entrada ao pedido de revisão do ato tributário em 31-12-2013, e até à entrada do pedido arbitral ainda não tinha sido notificada da decisão do mesmo. Pelo que se verificou a formação de indeferimento tácito do pedido de revisão em 30-04-2014, nos termos do artigo 57º n.º 1 da LGT.
O prazo para a interposição do presente pedido arbitral é de 90 dias a contar da formação do indeferimento tácito do pedido de revisão, nos termos do artigo 10º n.º 1 alínea a) do RJAT e artigo 102º n.º 1 do CPPT.
Tendo o pedido arbitral deu entrada em 25-07-2014, verifica-se que o mesmo foi tempestivamente apresentado.
3.4. Da questão de fundo
Constituem questões centrais saber:
- Se, na data da ocorrência dos factos geradores do imposto (artigo 3º n.º 1 do CIUC) os proprietários dos veículos não forem os que constam do registo, serão apesar disso estes que serão sempre considerados os sujeitos passivos do IUC, não sendo por consequência ilidível a presunção de titularidade revelada pelo registo OU, dito doutro modo, se a norma de incidência subjetiva constante do artigo 3º nº 1 do CIUC, estabelece ou não uma presunção e
– Se, no caso de se concluir pelo estabelecimento duma presunção de titularidade, as faturas são meio idóneo de prova de venda de veículos com vista à ilisão dessa mesma titularidade.
Estas questões foram já decididas em diversas decisões do CAAD, nomeadamente nos processos nºs 14/2013, 26/2013, 27/2013, 73/2013, 170/2013, 294/2013 e 52/2014, que seguiremos de perto.
Dispõe o artigo 3º do CIUC (Código do Imposto único de Circulação):
“ARTIGO 3º
INCIDÊNCIA SUBJETIVA
1 – São sujeitos passivos do imposto os proprietários dos veículos, considerando-se como tais as pessoas singulares ou coletivas, de direito público ou privado, em nome das quais os mesmos se encontrem registados.
2 – São equiparados a proprietários os locatários financeiros, os adquirentes com reserva de propriedade, bem como outros titulares de direitos de opção de compra por força do contrato de locação”.
O artigo 11º da LGT refere que “na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam, são observadas as regras e princípios gerais da interpretação e aplicação das leis”.
Tal como se refere na decisão do CAAD do processo n.º 52/2014-T, “há assim que ponderar qual a melhor interpretação do art. 3º, nº 1 do CIUC, à luz, em primeiro lugar, do elemento literal, ou seja aquele em que se visa detetar o pensamento legislativo que se encontra objetivado na norma, para se verificar se a mesma contempla uma presunção, ou se determina, em definitivo, que o sujeito passivo do imposto é o proprietário que figura no registo”.
Refere também a decisão que a questão que se coloca é, no caso sub juditio, a de saber se a expressão “considerando-se” utilizada pelo legislador no CIUC, em vez da expressão “presumindo-se”, que era a que constava nos diplomas que antecederam o CIUC, terá retirado a natureza de presunção ao dispositivo legal em apreço.
A nosso ver e ao contrário do que defende doutamente a AT, a resposta tem necessariamente de ser negativa, uma vez que da análise do nosso ordenamento jurídico se retira de forma clara que as duas expressões têm sido utilizadas pelo legislador com sentido equivalente, seja ao nível de presunções ilidíveis, seja no quadro das presunções inilidíveis, pelo que nada habilita a extrair a conclusão pretendida pela Autoridade Tributária por uma mera razão semântica.
Na verdade, assim acontece em variadas normas legais que consagram presunções utilizando o verbo “considerar”. E no direito tributário, quando os nºs 3 e 4 do art. 89-A da LGT dispõem que incumbe ao contribuinte o ónus da prova que os rendimentos declarados correspondem à realidade e que, não sendo feita essa prova, presume-se (“considera-se” na letra da Lei) que os rendimentos são os que resultam da tabela que consta no nº 4 do referido artigo.
Esta conclusão de haver total equivalência de significados entre as duas expressões, que o legislador utiliza indiferentemente, satisfaz a condição estabelecida no art. 9º, nº 2 do Código Civil, uma vez que se encontra assegurado o mínimo de correspondência verbal para efeitos da determinação do pensamento legislativo.
Importa, de seguida, submeter a norma em apreço aos demais elementos de interpretação lógica, designadamente, o elemento histórico, o racional ou teleológico e o de ordem sistemática.
Dissertando sobre a atividade interpretativa diz FRANCESCO FERRARA que esta “é a operação mais difícil e delicada a que o jurista pode dedicar-se, e reclama fino trato, senso apurado, intuição feliz, muita experiência e domínio perfeito não só do material positivo, como também do espírito de uma certa legislação. (…) A interpretação deve ser objetiva, equilibrada, sem paixão, arrojada por vezes, mas não revolucionária, aguda, mas sempre respeitadora da lei” (Cfr. Ensaio sobre a Teoria da Interpretação das Leis, tradução de MANUEL DE ANDRADE, (2ª ed.), Arménio Amado, Editor, Coimbra, 1963, p. 129).
Como refere BAPTISTA MACHADO “a disposição legal apresenta-se ao jurista como um enunciado linguístico, como um conjunto de palavras que constituem um texto. Interpretar consiste evidentemente em retirar desse texto um determinado sentido ou conteúdo de pensamento.
O texto comporta múltiplos sentidos (polissemia do texto) e contém com frequência expressões ambíguas ou obscuras. Mesmo quando aparentemente claro à primeira leitura, a sua aplicação aos casos concretos da vida faz muitas vezes surgir dificuldades de interpretação insuspeitadas e imprevisíveis. Além de que, embora aparentemente claro na sua expressão verbal e portador de um só sentido, há ainda que contar com a possibilidade de a expressão verbal ter atraiçoado o pensamento legislativo – fenómeno mais frequente do que parecerá à primeira vista “ (Cfr. Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, pp.175/176).
“A finalidade da interpretação é determinar o sentido objetivo da lei, a vis potestas legis.(…) A lei não é o que o legislador quis ou quis exprimir, mas tão somente aquilo que ele exprimiu em forma de lei. (…) Por outro lado, o comando legal tem um valor autónomo que pode não coincidir com a vontade dos artífices e redatores da lei, e pode levar a consequências inesperadas e imprevistas para os legisladores. (…) O intérprete deve buscar não aquilo que o legislador quis, mas aquilo que na lei aparece objetivamente querido: a mens legis e não a mens legislatoris (Cfr. FRANCESCO FERRARA, Ensaio, pp. 134/135).
Entender uma lei “não é somente aferrar de modo mecânico o sentido aparente e imediato que resulta da conexão verbal; é indagar com profundeza o pensamento legislativo, descer da superfície verbal ao conceito íntimo que o texto encerra e desenvolvê-lo em todas as suas direções possíveis”(loc. cit., p.128).
Com o objetivo de desvendar o verdadeiro sentido e alcance dos textos legais, o intérprete lança mão dos fatores interpretativos que são essencialmente o elemento gramatical (o texto, ou a “letra da lei”) e o elemento lógico, o qual, por sua vez, se subdivide em elemento racional (ou teleológico), elemento sistemático e elemento histórico. (Cfr. BAPTISTA MACHADO, loc. Cit., p. 181; J.OLIVEIRA ASCENSÃO, O Direito – Introdução e Teoria Geral 2ª Ed., Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, p.361).
Entre nós, é o artigo 9º do Código Civil (CC) que fornece as regras e os elementos fundamentais à interpretação correta e adequada das normas.
O texto do nº 1 do artigo 9º do CC começa por dizer que a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dela o “pensamento legislativo”.
Sobre a expressão “pensamento legislativo” diz-nos BAPTISTA MACHADO que o artigo 9º do CC “não tomou posição na controvérsia entre a doutrina subjetivista e a doutrina objetivista. Comprova-o o facto de se não referir, nem à “vontade do legislador” nem à “vontade da lei”, mas apontar antes como escopo da atividade interpretativa a descoberta do “pensamento legislativo” (artº. 9º, 1º). Esta expressão, propositadamente incolor, significa exatamente que o legislador não se quis comprometer” (loc. cit., p. 188).
No mesmo sentido se pronunciam PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA em anotação ao artigo 9º do CC (Cfr. Código Civil Anotado – vol. I, Coimbra ed., 1967, p. 16 ).
Através da análise do elemento histórico, extrai-se a conclusão que, desde a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 59/72, de 30 de Dezembro, o primeiro a regular esta matéria, até ao Decreto-Lei nº 116/94, de 3 de Maio, o último a anteceder o CIUC [cfr Lei nº 22-A/2007, com as alterações da Lei 67-A/2007 e 3-B/2010], foi consagrada a presunção dos sujeitos passivos do IUC serem as pessoas em nome das quais os veículos se encontravam matriculados à data da sua liquidação.
Verifica-se, portanto, que a lei fiscal teve, desde sempre, o objetivo de tributar o verdadeiro e efetivo proprietário e utilizador do veículo, afigurando-se indiferente a utilização de uma ou outra expressão que, como vimos, têm na nossa ordem jurídica um sentido coincidente.
O mesmo se diga quando nos socorremos dos elementos de interpretação de natureza racional ou teleológica.
Com efeito, o atual e novo quadro da tributação automóvel consagra princípios que visam sujeitar os proprietários dos veículos a suportarem os prejuízos por danos viários e ambientais causados por estes, como se alcança do teor do art. 1º do CIUC.
Ora a consideração destes princípios, designadamente, o princípio da equivalência, que merecem tutela constitucional e consagração no direito comunitário, e são também reconhecidos em outros ramos do ordenamento jurídico, determina que os aludidos custos sejam suportados pelos reais proprietários, os causadores dos referidos danos, o que afasta, de todo, uma interpretação que visasse impedir os presumíveis proprietários de fazer prova de que já não o são por a propriedade estar na esfera jurídica de outrem.
Assim, também, da interpretação efetuada à luz dos elementos de natureza racional e teleológica, atento aquilo que a racionalidade do sistema garante e os fins visados pelo novo CIUC, resulta claro que o nº 1 do art. 3º do CIUC consagra uma presunção legal ilidível.
Em face do exposto, importa concluir que a ratio legis do imposto aponta no sentido de serem tributados os efetivos proprietários-utilizadores dos veículos pelo que a expressão “considerando-se” está usada no normativo em apreço num sentido semelhante a “presumindo-se”, razão pela qual dúvidas não há que está consagrada uma presunção legal.
Por outro lado, estabelece o art. 73º da LGT que “(…) as presunções consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário, pelo que são ilidíveis (…)”.
Assim sendo, consagrando o art. 3º, nº 1 do CIUC uma presunção juris tantum [e, portanto, ilidível], a pessoa que está inscrita no registo como proprietária do veículo e que, por essa razão foi considerada pela Autoridade Tributária como sujeito passivo do imposto, pode apresentar elementos de prova visando demonstrar que o titular da propriedade, na data do facto tributário, é outra pessoa, para quem a propriedade foi transferida.
Analisados os elementos carreados para o processo pela Requerente e os factos provados, extrai-se a conclusão que aquela não era a proprietária dos veículos a que respeitam as liquidações em apreço à data dos respetivos factos tributários, por, entretanto, já ter transferido a propriedade dos mesmos, nos termos da lei civil.
Os elementos documentais, constituídos por cópias das respetivas faturas de venda, que não foram impugnados pela AT, gozam da força probatória prevista no artigo 376º, do Código Civil e da presunção de veracidade que é conferida pelo art.º 75º, nº 1 da LGT, tendo, assim, idoneidade e força bastante para ilidir a presunção que suportou as liquidações efetuadas.
Estas operações de transmissão de propriedade são oponíveis à Autoridade Tributária e Aduaneira, porquanto, embora os factos sujeitos a registo só produzam efeitos em relação a terceiros quando registados, face ao disposto no art. 5º, nº 1 do Código do Registo Predial [aplicável por remissão do Código do Registo Automóvel], a Autoridade Tributária não é terceiro para efeitos de registo, uma vez que não se encontra na situação prevista no nº 2 do referido art. 5º do Código do Registo Predial, aplicável por força do Código do Registo Automóvel, ou seja: não adquiriu de um autor comum direitos incompatíveis entre si.
Concluindo, a Autoridade Tributária e Aduaneira só pode prevalecer-se da realidade registral do automóvel se não for comprovada a desatualização da situação jurídica, designadamente quanto à propriedade do veículo.
O registo automóvel, na economia do CIUC, representa mera presunção ilidível dos sujeitos passivos do imposto.
Quanto à questão de saber se, subjacente a todas as questões atrás enunciadas, a norma de incidência subjetiva constante do artigo 3º nº 1 do CIUC, estabelece ou não uma presunção, a resposta fica prejudicada pelas conclusões anteriores.
Nestas circunstâncias, as liquidações de Imposto Único de Circulação em causa devem ser anuladas e, consequentemente restituído à Requerente, pela Autoridade Tributária e Aduaneira, as respetivas importâncias assim indevidamente cobradas e retratadas nos mencionados e documentados atos de liquidação, conforme pedido.
4. Dos juros indemnizatórios
Enfermando de ilegalidade as liquidações de Imposto Único de Circulação, são devidos juros indemnizatórios desde a data do pagamento até ao integral reembolso por parte da ATA, nos termos dos artigos 43º da LGT e 61º n.º 2 do CPPT.
5. Decisão
Em face do exposto, determina-se:
- julgar procedente o pedido formulado pela Requerente no presente processo arbitral tributário, quanto à ilegalidade das liquidações de Imposto Único de Circulação, do ano de 2010, no valor total de 5.226,08 €;
- julgar procedente o pedido de condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira a reembolsar à Requerente, o valor do imposto indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios nos termos legais, desde a data em que tal pagamento foi efetuado até à data do integral reembolso do mesmo.
6. Valor do processo:
De acordo com o disposto no artigo 306º, n.º 2, do CPC e 97º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 3º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se o valor da ação em 5.226,08 €.
7. Custas:
Nos termos do artigo 22º, n.º 4, do RJAT, e da Tabela I anexa ao Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em 612,00 €, devidas pela Autoridade Tributária e Aduaneira.
Notifique.
Lisboa, 23 de janeiro de 2015.
Texto elaborado por computador, nos termos do artigo 138º, n.º 5 do Código do Processo Civil (CPC), aplicável por remissão do artigo 29º, n.º 1, alínea e) do Regime de Arbitragem Tributária, com versos em branco e por mim revisto.
O árbitro singular
Suzana Fernandes da Costa
[1] O artigo 3º n.º 1 do Código do IUC dispõe que “são sujeitos passivos do impostos os proprietários dos veículos, considerando como tais as pessoas singulares ou coletivas, de direito público ou privado, em nome das quais os mesmos se encontrem registados”.