Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 371/2014-T
Data da decisão: 2015-07-15  IRC  
Valor do pedido: € 4.466,89
Tema: IRC - declaração de substituição e a anulação do direito aos juros indemnizatórios
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Processo n.º 371/2014-T

 

DECISÃO ARBITRAL

 

O árbitro Guilherme W. d’Oliveira Martins, designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formar o presente Tribunal Arbitral, constituído em 15 de julho de 2014, decide nos termos que se seguem:

 

I. Relatório

1. A sociedade Grupo A…, SGPS, SA., NIPC …, apresentou um pedido de constituição de tribunal arbitral singular, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), com vista a:

(a) anulação das notas de liquidação n.º 2013…, da nota de compensação n.º 2013…, e do documento de cobrança n.º 2013... e com fundamento em erro no apuramento do montante a repor pela ora Requerente;

(b) seja efetuada nova liquidação e correspondente nota de compensação, incorporando-se nas mesmas o montante de € 4.466,89 (quatro mil, quatrocentos e sessenta e seis euros e oitenta e nove cêntimos), referente a juros indemnizatórios devidos à ora Requerente, contados à taxa de 4%, desde 01/09/2012 até 17/09/2012, sobre o valor do reembolso a que tem efetivamente direito, no montante de € 2.397.668,68 (dois milhões, trezentos e noventa e sete mil, seiscentos e sessenta e oito euros e sessenta e oito cêntimos) e

(c) em consequência, Seja emitido novo documento de cobrança pelo valor correto a repor pela ora Requerente, no montante de € 40.468,23 (quarenta mil, quatrocentos e sessenta e oito euros e vinte e três cêntimos).

2. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD em 13-05-2014 e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 14-05-2014.

3. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitro do tribunal arbitral singular o ora signatário, que comunicou a aceitação do correspondente encargo no prazo aplicável.

4. Em 30.06.2014 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.ºe 7.º do Código Deontológico.

5. Assim, nos termos do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, na redação introduzida pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Tribunal Arbitral foi constituído em 15.07.2014.

6. No dia 29.10.2014 teve lugar a primeira reunião do Tribunal, nos termos e para os efeitos do artigo 18.º do RJAT, tendo sido lavrada ata da mesma, que igualmente se encontra junta aos autos.

7. Iniciada a reunião, foi dada a palavra à Representante da Requerida para se pronunciar sobre a manutenção do ato, que a mesma declarou manter.

8. De seguida o representante da requerente declarou pretender pronunciar-se  sobre a exceção invocada pela Requerida na sua resposta, o que fez.

 

9. No uso da palavra, os representantes da Requerente e da Requerida declararam prescindir das alegações orais.

10. O Tribunal designou o dia 15.01.2015 para a prolação da decisão arbitral.

11. Foram proferidos despachos de prorrogação de decisão em 20/01/2015, 30/03/2015, 11/04/2015, 20/04/2015, 28/04/2015, 12/05/2015, 21/05/2015 e 16/06/2015.

 

12. Os fundamentos do pedido da Requerente são os seguintes:

-       Em 31/05/2012, a ora Requerente procedeu à apresentação da declaração de rendimentos e à autoliquidação de IRC, com referência ao exercício do ano de 2011.

-       Na referida declaração contabilizou deduções de benefícios fiscais no montante global de € 135.551,83 (cento e trinta e cinco mil, quinhentos e cinquenta e um euros e oitenta e três cêntimos).

-       E apurou um valor de IRC a recuperar, no montante de € 2.436.969,43 (dois milhões, quatrocentos e trinta e seis mil, novecentos e sessenta e nove euros e quarenta e três cêntimos).

-       Em 17/09/2012, a Autoridade Tributária (AT) emitiu a nota de crédito para reembolso n.º 2012..., pelo montante de € 2.441.509,54 (dois milhões, quatrocentos e quarenta e um mil, quinhentos e nove euros e cinquenta e quatro cêntimos) que compreende o montante de € 2.436.969,43 (dois milhões, quatrocentos e trinta e seis mil, novecentos e sessenta e nove euros e quarenta e três cêntimos), referente ao IRC a recuperar, e o valor de € 4.540,11 (quatro mil, quinhentos e quarenta euros e onze cêntimos), referente a juros indemnizatórios, contados à taxa de 4% desde 01/09/2012 até 17/09/2012 – Cfr doc. nº 2 que ora se junta e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos.

-       Porém, em 20/09/2012, a ora Requerente apresentou uma declaração de substituição, com vista à correção das deduções de benefícios fiscais, declarados inicialmente pelo montante global de € 135.551,83 (cento e trinta e cinco mil, quinhentos e cinquenta e um euros e oitenta e três cêntimos), quando deviam ter sido pelo montante de € 96.250,78 (noventa e seis mil, duzentos e cinquenta euros e setenta e oito cêntimos).

-       Ou seja, porque verificou ter sido efetuada a dedução de benefícios fiscais em excesso, no montante de € 39.301,05 (trinta e nove mil, trezentos e um euros e cinco cêntimos).

-       Nessa medida, o valor de IRC a recuperar confinava-se ao montante de € 2.397.668,38 (dois milhões, trezentos e noventa e sete mil, seiscentos e sessenta e oito euros e trinta oito cêntimos), ou seja, o valor inicial de € 2.436.969,43, menos a quantia de € 39.301,05.

-       Por sua vez, em termos dos juros indemnizatórios, deverá ser deduzido o montante de € 1.093,96 (mil e noventa e três euros e noventa e seis cêntimos), correspondente a juros compensatórios calculados à taxa de 4%, desde 20/09/2012 até 31/05/2013, sobre o montante de € 39.301,05 (trinta e nove mil, trezentos e um euros e cinco cêntimos), o qual correspondia à única parcela do reembolso que se mostrava efetivamente indevida.

-       Ou seja, o montante correto de IRC a reembolsar deveria, ao invés do que sucedeu, cingir-se ao montante de € 2.401.041,31 (dois milhões, quatrocentos e um mil e quarenta e um euros e quarenta e um cêntimos), ou seja, € 2 402.135,27 - € 1.093,96.

-       Acontece que em 4 de outubro de 2013, a ora Requerente foi notificada para proceder ao pagamento da quantia de € 44.935,12, conforme demonstração de acerto de contas com o nº 2013..., para os devidos e legais efeitos

-       Valor esse que compreendia a diferença entre o valor € 2.441.509,54 (constante da nota de crédito para reembolso n.º 2012...) e a quantia de € 2.397.668,68 (valor resultante do apuramento da declaração de substituição apresentada em 20/09/2012), acrescido de juros compensatórios por recebimento indevido de reembolso, no valor de € 1.093,96.

-       Sendo que estas duas últimas rubricas haviam sido apuradas em sede, respetivamente, da nota de demonstração de liquidação de IRC nº 2013 ... e da nota de demonstração de liquidação de juros nº 2013 ....

-       Contudo, conforme supra referido e salvo melhor entendimento em contrário, o montante da liquidação adicional, referente ao valor a repor pela ora Requerente, será apenas de € 40.468,23 (€ 2.441.509,54 - € 2.401.041,31) e não € 44.935,12, conforme reclama a AT.

-       Neste contexto, há que reconhecer que a AT procedeu, e bem, à liquidação e pagamento de juros indemnizatórios a favor da ora Requerente, com referência ao montante do IRC a recuperar, apurado na liquidação inicial.

-       Invoca todavia a AT, em sede de decisão da reclamação graciosa, que “emendando os valores inicialmente declarados relativamente aos benefícios fiscais - que tiveram implicações no cálculo do imposto a liquidar, deixou de preencher a alínea a) do nº 3 do art. 43.º da LGT, uma vez que a Autoridade Tributária deixou de estar em falta quanto à restituição oficiosa do imposto, já que só com a entrega da declaração de substituição é que a situação fiscal da requerente ficou efetivamente consolidada relativamente ao exercício em apreço. Nessa medida, consideramos que, in casu, não são devidos juros indemnizatórios.”

-       Com o devido respeito, a ora Requerente entende que a apresentação de declaração corretiva não anula por completo o direito à indemnização pelo atraso da AT na efetivação do reembolso do IRC a que a ora Requerente sempre tem direito, mas apenas confere à AT o direito a receber a diferença entre o valor que a Requerente deveria ter recebido (€ 4.466,89) e aquele que efetivamente recebeu (€ 4.540,11).

-       Ou seja, a reposição, ora em apreço, apenas atinge o montante das deduções indevidamente efetuadas (€ 39.301,05) e o valor dos juros indemnizatórios a estas exclusivamente correspondentes (€ 73,22).

-       Pelo que, em conformidade com o supra alegado, deve ser efetuada a correção do cálculo do montante recebido em excesso e a repor pela ora Requerente, acrescido dos juros compensatórios devidos pelo montante das deduções indevidamente efetuadas.

-       A substituição realizada pela Requerente apenas teve efeitos sobre parte do valor que havia sido reembolsado e não sobre a totalidade.

-       Por conseguinte e salvo melhor opinião em contrário, é manifesto que a Administração Tributária teria, em qualquer caso, de liquidar juros indemnizatórios ao Sujeito Passivo e ora requerente, respeitantes ao valor a recuperar de € 2.436.969,43 (dois milhões, quatrocentos e trinta e seis mil, novecentos e sessenta e nove euros e quarenta e três cêntimos).

 

13. Em resposta ao pedido da Requerente, a AT:

13.A. Da incompetência material do Tribunal Arbitral

-       Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT determina-se que a competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação da declaração de ilegalidade de atos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta.

-       Por força da remissão do n.º 1 do artigo 4.º do RJAT, a vinculação da AT à jurisdição dos tribunais arbitrais constituídos nos termos desse diploma fica na dependência do disposto na  Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, designadamente quanto ao tipo e o valor máximo dos litígios abrangidos.

-       O pedido formulado pela Requerente encontra-se fora do âmbito material da arbitragem tributária nos termos moldados pelo legislador do RJAT.

-       É que, note-se, o pedido formulado pela Requerente dirige-se à condenação da Administração Tributária ao reconhecimento e ao pagamento do direito a juros indemnizatórios.

-       Ora, este pedido, salvo o devido respeito, não tem cabimento na presente instância arbitral.

-       Efetivamente, o âmbito de competência dos tribunais arbitrais constituídos ao abrigo do disposto no RJAT, não contempla a possibilidade de apreciação de pedidos tendentes ao reconhecimento de direitos em matéria tributária.

-       Circunstância que decorre do disposto no n.o 1 do artigo 2.º do RJAT que, como é sabido, define os tipos de pretensões que podem ser apreciadas por tribunais arbitrais em matéria tributária.

-       E, também, do confronto entre a lei de autorização legislativa ao abrigo do qual foi instituída a arbitragem em matéria tributária – nomeadamente quando aí se referiu que «O processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária» (cf. n.ºs 2 e 4, alínea b) do artigo 124.º da Lei n.o 3-B/2010, de 28 de abril) – e aquilo que, de facto, veio a ser consagrado no RJAT.

-       Daí resultando, de forma inequívoca, ter o legislador optado por não contemplar (no RJAT) a possibilidade de apreciação de pedidos tendentes ao reconhecimento de direitos em matéria tributária, e a apreciação de questões tributárias que não impliquem a apreciação da legalidade de um ato de liquidação.

 

13.B. Por impugnação

-       Para sustentar a procedência da presente ação, alega a Requerente, em síntese, que a apresentação da declaração de substituição não anula por completo o direito aos juros indemnizatórios que havia recebido em resultado do atraso da AT na efetivação do reembolso do IRC.

-       Todavia, com base na factualidade acima descrita e pelas razões de seguida aduzidas, constata-se que os argumentos apresentados pela Requerente são manifestamente improcedentes, os quais desde já se impugnam na íntegra.

-       Nos termos do disposto no artigo 104.º n.º 3 do Código do Imposto sobre o Rendimentos das Pessoas Coletivas (CIRC), o reembolso é efetuado quando a declaração periódica de rendimentos for enviada no prazo legal e desde que a mesma não contenha erros de preenchimento, até ao fim do 3.º mês seguinte ao do seu envio.

-       Por sua vez, o n.º 6 do artigo 104.º do CIRC prevê a consequência do incumprimento do prazo previsto no n.º 3 da mesma norma, ao estabelecer que: “Não sendo efetuado o reembolso no prazo referido no n.º 3, acrescem à quantia a restituir juros indemnizatórios a taxa idêntica à aplicável aos juros compensatórios a favor do Estado.”

-       Também o artigo 43.º no 3 a) da Lei Geral Tributária (LGT) estabelece que: “São também devidos juros indemnizatórios nas seguintes circunstâncias:
a) Quando não seja cumprido o prazo legal de restituição oficiosa dos tributos;”

-       O artigo 104.º n.º 3 do CIRC estipula um prazo certo para que o reembolso seja efetuado: “Fim do 3.º mês seguinte ao do envio da declaração periódica de rendimentos”.

-       Para além de fixar esse prazo, aquela disposição legal prevê as condições que têm de se verificar para que nasça a obrigação de efetuar o reembolso nesse mesmo prazo:

a)     A declaração periódica de rendimentos deve ser enviada no prazo legal; e 


b)     Essa declaração não pode conter erros de preenchimento. 


-       A Requerente entregou a declaração periódica de rendimentos dentro do prazo legal (estando, assim, preenchida a primeira condição prevista no no 3 do artigo 104.º do CIRC),

-       Contudo, a mesma foi entregue com erros de preenchimento,

-       Pois a Requerente não declarou o valor correto do total das deduções a efetuar em sede de benefícios fiscais (não se verificando, portanto, a segunda condição estabelecida no no 3 do artigo 104.º do CIRC).

-       A Requerente corrigiu aquele valor através da entrega da declaração de substituição, considerando que a alteração do valor supra referido teve implicações no cálculo do imposto a liquidar, só com a entrega da Declaração de Substituição é que a situação fiscal da Requerente ficou efetivamente consolidada relativamente ao exercício em apreço.

-       Deste modo, não se verificando uma das condições cumulativas previstas no n.º 3 do artigo 104.º do CIRC, não existia a obrigação de proceder ao reembolso de IRC no prazo aí determinado.

-       Inexistindo essa obrigação, não tem a Requerente direito a receber juros indemnizatórios.

 

II. SANEAMENTO

 

1. O Tribunal é competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º e 6.º, todos do RJAT.

 

2. As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e do artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.

 

3. O processo não enferma de nulidades e não foram suscitadas questões prévias que importe analisar.

 

4. Quanto à exceção de incompetência material do Tribunal Arbitral invocada pela Requerida, o que está em causa unicamente nesta decisão é o direito do Requerente a receber juros indemnizatórios.

 

Ora, o art. 2.º do RJAT fixa quais as matérias sobre as quais se pode pronunciar o tribunal arbitral, encontrando-se abrangidas pela sua competência a declaração de ilegalidade de atos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta (alínea a) do n.º 1), bem como a declaração de ilegalidade de atos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de atos de determinação da matéria coletável e de atos de fixação de valores patrimoniais (alínea b) do n.º 1).

De igual modo, se deverá entender que os pedidos de juros indemnizatórios (bem como de indemnização por garantia indevida) são pretensões relativas a atos tributários (v.g. de liquidação ou de autoliquidação), que visam explicitar/concretizar o conteúdo do dever de “restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito”, consagrado no art. 24.º, n.º 1, al. b) do RJAT.

Pelo que, concluindo como Jorge Lopes de Sousa: “insere[-se] nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD a fixação dos efeitos da decisão arbitral que podem ser definidos em processo de impugnação judicial, designadamente, a anulação dos atos cuja declaração de ilegalidade é pedida, a condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento de juros indemnizatórios e a fixação de indemnização por garantia indevida” (cfr. ob. cit., p. 116; sobre os juros indemnizatórios pode ver-se do mesmo Autor, Juros nas relações tributárias, in Problemas fundamentais do Direito tributário, Lisboa, 1999, p. 155 e s.).

Pelo que, mesmo estando em causa nesta decisão arbitral apenas pagamento de juros indemnizatórios, com referência ao montante do IRC a recuperar pela Requerente apurado na liquidação inicial, no leque de competências do tribunal arbitral, quanto a esta parte, estão, pois, reunidas as condições para se apreciar o mérito do pedido.

 

 

III. FUNDAMENTAÇÃO

III. A. FACTOS PROVADOS

Antes de entrar na apreciação das questões de mérito, cumpre apresentar a matéria factual relevante para a respetiva compreensão e decisão, a qual, examinada a prova documental e o processo administrativo tributário junto aos autos e tendo ainda em conta os factos alegados, se fixa como segue:

-       Em 31/05/2012, a ora Requerente procedeu à apresentação da declaração de rendimentos e à autoliquidação de IRC, com referência ao exercício do ano de 2011.

-       Na referida declaração contabilizou deduções de benefícios fiscais no montante global de € 135.551,83 (cento e trinta e cinco mil, quinhentos e cinquenta e um euros e oitenta e três cêntimos).

-       E apurou um valor de IRC a recuperar, no montante de € 2.436.969,43 (dois milhões, quatrocentos e trinta e seis mil, novecentos e sessenta e nove euros e quarenta e três cêntimos).

-       Em 17/09/2012, a Autoridade Tributária (AT) emitiu a nota de crédito para reembolso n.º 2012..., pelo montante de € 2.441.509,54 (dois milhões, quatrocentos e quarenta e um mil, quinhentos e nove euros e cinquenta e quatro cêntimos) que compreende o montante de € 2.436.969,43 (dois milhões, quatrocentos e trinta e seis mil, novecentos e sessenta e nove euros e quarenta e três cêntimos), referente ao IRC a recuperar, e o valor de € 4.540,11 (quatro mil, quinhentos e quarenta euros e onze cêntimos), referente a juros indemnizatórios, contados à taxa de 4% desde 01/09/2012 até 17/09/2012 – Cfr doc. nº 2 que ora se junta e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos.

-       Porém, em 20/09/2012, a ora Requerente apresentou uma declaração de substituição, com vista à correção das deduções de benefícios fiscais, declarados inicialmente pelo montante global de € 135.551,83 (cento e trinta e cinco mil, quinhentos e cinquenta e um euros e oitenta e três cêntimos), quando deviam ter sido pelo montante de € 96.250,78 (noventa e seis mil, duzentos e cinquenta euros e setenta e oito cêntimos).

-       Ou seja, porque verificou ter sido efetuada a dedução de benefícios fiscais em excesso, no montante de € 39.301,05 (trinta e nove mil, trezentos e um euros e cinco cêntimos).

-       Nessa medida, o valor de IRC a recuperar confinava-se ao montante de € 2.397.668,38 (dois milhões, trezentos e noventa e sete mil, seiscentos e sessenta e oito euros e trinta oito cêntimos), ou seja, o valor inicial de € 2.436.969,43, menos a quantia de € 39.301,05.

-       Por sua vez, em termos dos juros indemnizatórios, deverá ser deduzido o montante de € 1.093,96 (mil e noventa e três euros e noventa e seis cêntimos), correspondente a juros compensatórios calculados à taxa de 4%, desde 20/09/2012 até 31/05/2013, sobre o montante de € 39.301,05 (trinta e nove mil, trezentos e um euros e cinco cêntimos), o qual correspondia à única parcela do reembolso que se mostrava efetivamente indevida.

-       Ou seja, o montante correto de IRC a reembolsar deveria, ao invés do que sucedeu, cingir-se ao montante de € 2.401.041,31 (dois milhões, quatrocentos e um mil e quarenta e um euros e quarenta e um cêntimos), ou seja, € 2 402.135,27 - € 1.093,96.

-       Acontece que em 4 de outubro de 2013, a ora Requerente foi notificada para proceder ao pagamento da quantia de € 44.935,12, conforme demonstração de acerto de contas com o nº 2013..., para os devidos e legas efeitos

-       Valor esse que compreendia a diferença entre o valor € 2.441.509,54 (constante da nota de crédito para reembolso n.º 2012...) e a quantia de € 2.397.668,68 (valor resultante do apuramento da declaração de substituição apresentada em 20/09/2012), acrescido de juros compensatórios por recebimento indevido de reembolso, no valor de € 1.093,96.

-       Sendo que estas duas últimas rubricas haviam sido apuradas em sede, respetivamente, da nota de demonstração de liquidação de IRC nº 2013 ... e da nota de demonstração de liquidação de juros nº 2013 ....

 

III.B FACTOS NÃO PROVADOS

Não há, alegados ou de conhecimento oficioso, factos relevantes para a decisão que não tenham sido dados como provados.

 

III. C MOTIVAÇÃO

A fixação da matéria de facto baseou-se no processo administrativo, nos documentos juntos à petição inicial ou no decurso do presente processo.

 

 

IV. DO DIREITO

 

Para sustentar a procedência da presente ação, alega a Requerente, em síntese, que a apresentação da declaração de substituição não anula por completo o direito aos juros indemnizatórios que havia recebido em resultado do atraso da AT na efetivação do reembolso do IRC.

E tal pretensão invocada é perfeitamente clara quando a Requerente invoca e reconhece no pedido inicial o seguinte:

 

-       Neste contexto, há que reconhecer que a AT procedeu, e bem, à liquidação e pagamento de juros indemnizatórios a favor da ora Requerente, com referência ao montante do IRC a recuperar, apurado na liquidação inicial.

-       Invoca todavia a AT, em sede de decisão da reclamação graciosa, que “emendando os valores inicialmente declarados relativamente aos benefícios fiscais - que tiveram implicações no cálculo do imposto a liquidar, deixou de preencher a alínea a) do nº 3 do art. 43.º da LGT, uma vez que a Autoridade Tributária deixou de estar em falta quanto à restituição oficiosa do imposto, já que só com a entrega da declaração de substituição é que a situação fiscal da requerente ficou efetivamente consolidada relativamente ao exercício em apreço. Nessa medida, consideramos que, in casu, não são devidos juros indemnizatórios.”

-       Com o devido respeito, a ora Requerente entende que a apresentação de declaração corretiva não anula por completo o direito à indemnização pelo atraso da AT na efetivação do reembolso do IRC a que a ora Requerente sempre tem direito, mas apenas confere à AT o direito a receber a diferença entre o valor que a Requerente deveria ter recebido (€ 4.466,89) e aquele que efetivamente recebeu (€ 4.540,11).

-       Ou seja, a reposição, ora em apreço, apenas atinge o montante das deduções indevidamente efetuadas (€ 39.301,05) e o valor dos juros indemnizatórios a estas exclusivamente correspondentes (€ 73,22).

Nos processos arbitrais tributários apenas há lugar ao pagamento de juros indemnizatórios nos termos dos artigos 43.º, n.ºs 1 e 2, e 100.º da LGT, quando se determine que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

Ora, está amplamente provado que pela consulta do processo administrativo e pelo conteúdo das alegações da Requerente e da impugnação da Requerida, que:

-       A Requerente entregou a declaração periódica de rendimentos dentro do prazo legal (estando, assim, preenchida a primeira condição prevista no no 3 do artigo 104.º do CIRC);

-       A referida declaração foi entregue com erros de preenchimento, pois a Requerente não declarou o valor correto do total das deduções a efetuar em sede de benefícios fiscais (não se verificando, portanto, a segunda condição estabelecida no n.º 3 do artigo 104.º do CIRC).

-       A Requerente corrigiu aquele valor através da entrega da declaração de substituição, considerando que a alteração do valor supra referido teve implicações no cálculo do imposto a liquidar;

-       Só com a entrega da Declaração de Substituição é que a situação fiscal da Requerente ficou efetivamente consolidada relativamente ao exercício em apreço;

Deste modo, não se verificando uma das condições cumulativas previstas no n.º 3 do artigo 104.º do CIRC, não existia a obrigação de proceder ao reembolso de IRC por parte da Autoridade Tributária no prazo aí determinado.

Inexistindo essa obrigação, não tem a Requerente qualquer direito a receber juros indemnizatórios, porquanto ficou provado que, nos termos dos artigos 43.º, n.ºs 1 e 2, e 100.º da LGT,

a)     Não houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido (43.º, n.º 1 da LGT);

b)     Não está em causa o cumprimento de qualquer orientação genérica emitida pela Autoridade Tributária (43.º, n.º 2 da LGT);

c)     Não está em causa na presente decisão qualquer anulação do ato tributário que deu lugar à presente pretensão de juros indemnizatórios (100.º da LGT).

 

 

V. Decisão

 

Em face de tudo quanto se deixa exposto, e com os fundamentos expostos, o Tribunal Arbitral decide julgar totalmente improcedente o pedido de pronúncia arbitral, e absolver a Requerida do pedido.

 

Fixa-se o valor do processo em € 4.466,89, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 97.º-A do CPPT, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 612,00, nos termos da Tabela I do Regulamento de Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar totalmente pela Requerente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.

 

Lisboa, 15 de julho de 2015

 

O árbitro,

Guilherme W. d’Oliveira Martins