Os árbitros Dr. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Prof. Doutora Maria do Rosário Anjos e Dr.ª Maria Forte Vaz, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 05-12-2014, acordam no seguinte:
1. Relatório
A... - ..., Lda., NIPC …, apresentou um pedido de constituição do tribunal arbitral colectivo, artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de Janeiro (doravante RJAT) e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011 de 22 Março, em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira.
A Requerente pretende que sejam anuladas as seguintes liquidações de IVA:
PERÍODO
|
IMPOSTO
|
NÚMERO LIQUIDAÇÃO
|
DEMONSTRAÇÃO/ ACERTO CONTAS
|
VALOR
|
2013.06T
|
IVA
|
2014 008075882
|
2014 00005122012
|
€398.142,65
|
2013.07T
|
IVA
|
2014 008176844
|
2014 00006394921
|
€ 275,414,79
|
2013.10T
|
IVA
|
2014 008893504
|
2014 00007589394
|
€ 50.588,50
|
2013.11T
|
IVA
|
2014008893551
|
2014 00007589395
|
€ 38.870,00
|
A Requerente pretende ainda que seja reconhecido o direito a juros indemnizatórios e a Autoridade Tributária e Aduaneira seja condenada a devolver as quantias que a Requerente pagou relativas àquelas liquidações, acrescidas de juros indemnizatórios.
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 18-09-2014.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
Em 07-11-2014 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 05-12-2014.
A Autoridade Tributária e Aduaneira respondeu, defendendo a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.
Em 10-03-2014 realizou-se a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, em que se procedeu a produção da testemunhal e por depoimento de parte e foram produzidas alegações orais.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamente representadas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de nulidades e não se suscita qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa.
2. Matéria de facto
2.1. Factos provados
Consideram-se provados os seguintes factos com relevância para a decisão:
a) A Requerente é uma sociedade por quotas, que foi constituída em 07-11-2005, que tem como actividade principal o comércio por grosso de telemóveis;
b) A Requerente, no desenvolvimento desta actividade, efectua compras essencialmente a operadores do mercado nacional e ocasionalmente faz algumas aquisições intracomunitárias;
c) Na sequência de a Requerente ter apresentado pedidos de reembolso de IVA à Administração Tributária, foram ordenadas acções de fiscalização externa através da ordem de serviço n.ºs OI…, OI…, OI… e OI…;
d) No âmbito das acções de inspecção, a Autoridade Tributária e Aduaneira elaborou os Relatórios que constam do processo administrativo, cujos teores se dão como reproduzidos;
e) No Relatório da Inspecção Tributária relativo à acção de fiscalização OI… refere-se, além do mais, o seguinte:
I - Conclusões da ação inspetiva
Em resultado da ação inspetiva efetuada ao sujeito passivo A... - ..., Lda, NIPC … (adiante designada por A...), resultaram correções nos montantes seguintes:
1.1 Em sede de IVA
Da análise efetuada aos documentos de suporte aos registos contabilísticos apurou-se:
• Distribuição das compras e vendas por mercados no período de …
A A...em junho de 2013 regista na sua contabilidade os seguintes valores:
Conforme se pode verificar as aquisições efetuadas a fornecedores no mercado nacional representam 100% do total das aquisições. As vendas tiveram como principal destino o mercado intracomunitário (94% do total) e outros mercados (6% do total), o que, conduz ao crédito de IVA, dado que estamos perante operações isentas de IVA que conferem o direito à dedução do IVA suportado na compra.
Assim, importa analisara origem dos bens transacionados pela A….
A análise efetuada aos principais bens comercializados (telemóveis: IPHONES 5 16GB e Samsung Galaxy) no período de …, permitiu concluir que os bens vendidos foram na sua maioria adquiridos aos fornecedores: B..., e C….
Identificados os fornecedores da A..., deste tipo de bens, procedeu-se também à identificação de empresas intermediárias, identificando-se sempre que possível a empresa ou entidade que iniciou em território nacional, os circuitos de facturação correspondentes aos bens em causa. Assim, numa primeira abordagem, vamos expor os circuitos comerciais em fluxogramas, onde são identificados os operadores intervenientes, partindo do fornecedor directo da A...até ao operador que iniciou em território nacional os circuitos de facturação. Posteriormente, passamos a analisar os dados relativos a cada um dos intervenientes.
2. Análise às aquisições dos bens no mercado nacional declaradas pela A...
2.1. Circuitos comerciais
Das diligências efetuadas passamos a expor por fornecedor direto da A...o circuito comercial dos bens através dos seguintes esquemas:
2.1.1.Circuito "B..." e circuito "C…"
2.2. Caracterização das empresas identificadas nos circuitos comerciais
2.2.1. Circuito B… e Circuito C…
2.2.1.1. B..., LDA, NIPC …
A empresa supra identificada, doravante designada por B..., é uma sociedade por quotas, registou-se a 23-10-2008, para a atividade de comércio a retalho de equipamento de telecomunicação, CAE … enquadrada para efeitos de IVA no regime normal de periodicidade trimestral e para efeitos de IRC no regime geral.
Das diligências efetuadas, junto do sujeito passivo B..., foram apurados os seguintes factos:
• Para o desenvolvimento da sua atividade a entidade B..., possui, atualmente, um estabelecimento comercial aberto ao público, sito no Centro Comercial D..., Loja 6 e um armazém, arrendados, com dimensões reduzidas, sitos no Cacem.
• A pequena dimensão das instalações onde a entidade B... exerce efetivamente a sua atividade parece que a mesma não se coaduna com o grande número de telemóveis transacionados.
• As empresas a quem são adquiridos, em grandes quantidades, os IPHONES e os GALAXYS, permanecem pouco tempo como fornecedores, verificando-se, assim, uma alternância frequente nos mesmos.
2.2.1.2. C… SERVIÇOS INFORMÁTICOS E DE TEL. LDA, NIPC …
A empresa supra identificada, doravante designada por C…, é uma sociedade por quotas, registou-se a 01-07-2007, para a atividade de comércio a retalho de equipamento de telecomunicação, CAE …, enquadrada para efeitos de IVA no regime normal de periodicidade trimestral e para efeitos de IRC no regime geral.
Das diligências efetuadas foram apurados os seguintes factos:
• Na morada da sede do sujeito passivo, Rua …, N.º … Loja, Lisboa, …-… Lisboa, existe uma pequena loja que, à data, se encontrava encerrada.
• Contactado o TOC da sociedade, no sentido de consultar e recolher os elementos contabilísticos, verificou-se que os documentos de suporte da contabilidade estavam na sua posse e que a mesma evidenciava registos até à data de 30 de junho de 2013.
• Junto do gabinete de contabilidade foi apurado que a atividade da sociedade não era desenvolvida na loja sita no local da sede do sujeito passivo, na medida em que parte das compras era efetuada na Internet e as mercadorias iam diretamente dos seus fornecedores para os seus clientes.
• O sócio gerente ausentou-se de Portugal entre abril/agosto, sendo que atualmente se encontra no Dubai.
2.2.2. Caraterização das empresas a montante dos fornecedores diretos 2.2.2.1. Fornecedores nacionais Fornecedor Nacional 1
Das diligências efetuadas foram apurados os seguintes factos:
A atividade da empresa consiste na comercialização de cartões telefónicos pré-pagos, telemóveis/Iphones, jornais, revistas e tabaco e é desenvolvida em duas lojas.
Entre janeiro e setembro de 2013, as compras e vendas relacionadas com telemóveis foram todas declaradas como realizadas no mercado nacional e 99% das suas vendas destinaram-se ao cliente B...,
O negócio da revenda de telemóveis/Iphones (mais caros) começou em dezembro de 2012, mas foi em junho de 2013 que sofreu um forte aumento do volume de negócios. Esta atividade é desenvolvida na sua sede, isto é, a mercadoria é entregue na sede da empresa, pelo fornecedor em automóvel próprio e depois o cliente B..., vem buscar a mercadoria, com A mercadoria (telemóveis/Iphones) não é conferida, porque vem dentro de caixas seladas com fita, que o sócio gerente não abre e nunca viu os telemóveis/Iphones.
A atividade de revenda de telemóveis começou porque alguém que se apresentou como dono da empresa B..., e perguntou, ao sócio gerente desta empresa, se ele queria ser intermediário neste negócio, referindo que não tinha boas relações quer com o Fornecedor Nacional 2, quer com o Fornecedor Nacional 3, e foi o referido indivíduo (sócio da B...) que indicou que esses seriam os seus fornecedores.
Este negócio permitia obter uma margem de lucro de 3,00€ ou 4,00€ por telemóvel e os pagamentos aos fornecedores e os pagamentos dos clientes são efetuados através de transferência bancária.
Fornecedor Nacional 2
Das diligências efetuadas foram apurados os seguintes factos:
A sua atividade caracteriza-se pela realização de aquisições no mercado interno, de telemóveis da marca APPLE IPHONE e SAMSUNG e, na consequente, alienação desses bens a clientes nacionais, com uma reduzida margem de lucro.
Não foram disponibilizados quaisquer documentos de transporte comprovativos da expedição das mercadorias do fornecedor e, posteriormente, com destino aos seus clientes, situação que impede a certificação do circuito físico da mercadoria.
Não foi possível estabelecer qualquer contacto com os responsáveis pela empresa, desconhecendo-se outras instalações onde possa estar a exercer atividade e encontra-se em incumprimento declarativo, factos que indiciam o não exercício de qualquer atividade por parte da empresa.
Foi proposta a cessação oficiosa da actividade do sujeito passivo em causa, nos termos do n.º 2 do art. 34.º do Código do IVA e n.º 6 do art. 8.º do Código do IRC.
Fornecedor Nacional 3
Das diligências efetuadas foram apurados os seguintes factos:
A actividade da empresa consistia na compra de cartões telefónicos que eram comercializados de loja em loja e também alguns telemóveis baratos. Em novembro de 2012 iniciou a compra e venda de telemóveis de "gama alta", em grandes quantidades.
Todos os pagamentos e recebimentos foram efetuados por transferência bancária.
Fornecedor Nacional 4
Das diligências efetuadas foram apurados os seguintes factos:
Os elementos contabilísticos evidenciam que a sua atividade se caracteriza pela realização exclusiva de operações no mercado interno, consubstanciadas na aquisição de telemóveis APPLE IPHONE e SAMSUNG GALAXY a um único fornecedor (Fornecedor Nacional 5) e, na consequente, alienação da mercadoria a clientes nacionais pouco diversificados. Inicialmente, apenas teve como cliente a C….
Não obstante o elevado volume de negócios declarado, as declarações periódicas do IVA apresentadas evidenciam o apuramento contínuo de crédito de imposto.
O cruzamento da documentação recolhida evidenciou, por um lado, uma elevada rotação de mercadorias verificando-se o processamento da fatura de venda com a mesma data ou imediatamente a seguir à data da fatura de compra e, por outro, a realização de margens de lucro diferenciadas consoante o destinatário/cliente. As vendas destinadas ao cliente C… evidenciam uma margem de lucro, na maior parte das vezes, de apenas € 1,00.
Fornecedor Nacional 5
Das diligências efetuadas foram apurados os seguintes factos:
Esta empresa, contrariamente ao seu enquadramento fiscal, exerceu a atividade de comércio por grasso de telemóveis de acordo com a faturação recolhida;
O local do seu domicílio fiscal corresponde às instalações de outra empresa - entidade contactada para a contratualização de serviços de escritório virtual/domiciliação fiscal (contrato nunca formalizado).
A morada constante das faturas emitidas pela empresa, corresponde a uma loja que nunca esteve aberta ao público e que, à data da visita da inspeção tributária, se encontrava fechada com indicação na montra de "ALUGA-SE".
A TOC informou ter recebido a documentação contabilística por e-mail, desconhecer se a empresa possui instalações físicas e se está a exercer efetivamente alguma atividade. As tentativas de contacto, pessoal ou por correio, com o sócio gerente da empresa revelaram-se infrutíferas: não se encontrava ninguém no domicílio fiscal e a notificação enviada veio devolvida.
De acordo com a documentação recolhida, a sua atividade caracteriza-se pela realização, a montante, de aquisições de telemóveis, no mercado interno e, na consequente, alienação desses bens ao cliente aqui identificado como Fornecedor Nacional 4 (ano 2013). Verifica-se, através do sistema VIES que, a empresa foi igualmente adquirente intracomunitária de bens, nos anos 2012 e 2013, particularmente no 2.º trimestre de 2013. Tais operações, não foram refletidas nas respetivas declarações periódicas.
Em 03-02-2014, foi cessado oficiosamente nos termos do n.º 2 do art. 34.º do Código do IVA e n.º 6 do art. 8.º do Código do IRC.
Face ao descrito, relativamente aos fornecedores nacionais acima indicados, afigura-se-nos que os mesmos apresentam características de operadores vulgarmente designados por buffer.
2.2.2.2. Fornecedores nacionais com aquisições intracomunitárias de bens (AICBJ/Empresas nacionais
Fornecedor Nacional com AICB 1
Das diligências efetuadas foram apurados os seguintes factos:
A sociedade foi constituída em 11-10-2012, para a atividade de comércio a retalho de equipamento de telecomunicação, CAE …, tendo procedido à liquidação da sociedade e consequente cessação de atividade em 27-09-2013
Indicou como sede social, um escritório virtual, mais concretamente um mail box.
No decorrer do tempo em que a sociedade esteve ativa, não foi declarada à Administração Tributária, qualquer instalação onde pudessem ser armazenados os equipamentos adquiridos para venda no território nacional.
Verificou-se que, no sistema VIÉS, constam transações intracomunitárias envolvendo esta empresa. Tratam-se de transmissões intracomunitárias de bens (TICETs) que lhe foram declaradas por diversos operadores comunitários de diversos países, no entanto, as referidas operações não constam, no todo ou em parte, das respetivas declarações periódicas de IVA.
Com o intuito de "fabricar" IVA dedutível, registou na contabilidade, supostas aquisições no mercado nacional à sociedade aqui identificada como Empresa Nacional 1, tendo registado apenas uma transferência bancária, para a conta do suposto fornecedor, com identificação do NIB, mas sem identificação do beneficiário.
Fornecedor Nacional com AICB 2
Das diligências efetuadas foram apurados os seguintes factos:
A sociedade, detida desde a sua constituição por um cidadão nacional, passou, a partir de 12/04/2013, a ser detida e gerida por um cidadão de nacionalidade paquistanesa, residente em território nacional.
As tentativas de contacto, pessoal ou por correio, com o atual sócio gerente da empresa, revelaram-se infrutíferas: não se encontrava ninguém no domicílio fiscal e a notificação enviada veio devolvida.
A atividade da empresa caracteriza-se essencialmente pela realização, a montante, de aquisições de telemóveis, no mercado interno e no mercado intracomunitário, e na, consequente, alienação desses bens a dois clientes nacionais, sendo um deles o supra identificado Fornecedor Nacional 5.
Verifica-se a existência de diversos pagamentos a favor dos fornecedores intracomunitários e recebimentos do cliente "Fornecedor Nacional 5” efetuados por transferência bancária. Não se verifica a existência de qualquer pagamento a favor de fornecedores nacionais.
Foram detetados diversos levantamentos avultados, em numerário, que inviabilizam a identificação dos respetivos beneficiários.
Não foram disponibilizados quaisquer documentos comprovativos do transporte dos bens quer do fornecedor quer para o cliente.
As declarações periódicas de IVA entregues no ano de 2013, não refletem as operações ativas e passivas documentadas pelas faturas de compra e venda recolhidas.
Em 03-02-2014 foi cessado oficiosamente nos termos do n.º 2 do art. 34.º do Código do IVA e n.º 6 do art. 8.º do Código do IRC.
Empresa Nacional 1
Das diligências efetuadas foram apurados os seguintes factos:
• Registou-se em 30-05-2013 para a atividade de comércio a retalho de equipamentos de telecomunicação;
• A empresa não se encontra no local e morada declarada como sede;
• Não foi possível contactar a empresa nem qualquer representante legal;
• A TOC nunca teve acesso a qualquer documentação da empresa e não consegue contactar o sócio gerente da mesma;
• É manifesto que não está a exercer a actividade para a qual se encontra registada, nem possui uma estrutura empresarial adequada ao exercício dessa mesma actividade e que terá sido constituída com intenção de emitir faturação (de substituição das aquisições intracomunitárias) para o Fornecedor Nacional com AICB 1;
• É uma empresa não declarante.
Em 20-11-2013 foi cessada oficiosamente a actividade nos termos do n.º 2 do art.º 34.º do Código do IVA e n.º 6 do art.º 8.º do Código do IRC.
Empresa Nacional 2
Das diligências efetuadas foram apurados os seguintes factos:
• Registou-se em 16-07-2012 para a atividade de comércio a retalho de equipamentos de telecomunicação. Foi cessado oficiosamente, nos termos do n.º 2 do art. 34.º do Código do IVA e n.º 6 do art. 8.º do Código do IRC, em 29-10-2013, dado que não estava a exercer a atividade, não dispõe de instalações conhecidas nem estrutura adequada susceptível de a exercer;
• Não se encontra no domicílio fiscal constante do cadastro informático;
• Desconhecem-se outras instalações onde possa estar a exercer actividade;
• Encontra-se em falta declarativa de IRC e IVA desde o início da actividade; •
• De acordo com os dados informáticos da AT, relativamente ao ano de 2012, nenhum operador nacional declarou ter sido seu cliente ou fornecedor.
Face ao descrito, relativamente aos operadores neste ponto identificados, afigura-se-nos que os mesmos apresentam características de operadores vulgarmente designados por missing trader.
3. Quebra no preço
Através da análise à documentação enviada pela Administração Fiscal de um dos países, relativamente aos dados recolhidos no operador comunitário X, um dos principais operadores comunitários a declarar vendas para a empresa Fornecedor Nacional com AICB 1, constatou-se que revende os bens no mercado nacional abaixo do preço de custo e que, após terem passado por diversos operadores nacionais, os mesmos bens são novamente revendidos para clientes comunitários e nacionais a um preço inferior ao da sua entrada no mercado nacional, conforme se passa a exemplificar:
Operador comunitário X-----------------------------» Fornecedor Nacional com AICB 1
Fatura de 24-06-2013-… Apple Iphone 5 16 GB ao preço unitário de 510,00€
Fornecedor Nacional com AICB 1-------------------------------» Fornecedor Nacional 2
Factura de 24-06-2013… Apple Iphone 5 16 GB ao preço unitário de 438,00€
Fornecedor Nacional 2-----------------------------------------» Fornecedor Nacional 1
Factura de 24-06-2013 - … Apple Iphone 5 16 GB ao preço unitário de 441,00€
Fornecedor Nacional 1-----------------------------------------------------------» B...
Facturas de 25-06-2013 - … Apple Iphone 5 16 GB ao preço unitário de 445,00€
VD n.º 2013… de 28-06-2013 - 100 Apple Iphone 5 16 GB ao preço unitário de 455,00€
A...------------------------------------------------» E… (operador comunitário)
Fatura n.º …de 01-07-2013 - .. Apple Iphone 5 16 GB ao preço unitário de 485,00€
A...----------------------------------------------» H... (operador nacional)
Fatura n.º … de 01-07-2013 - … Apple Iphone 5 16 GB ao preço unitário de 485,00€
Conforme se pode constatar através do exemplo exposto, o Fornecedor Nacional com AICB'S 1, quebra o preço das mercadorias na entrada das mesmas em território nacional, criando uma margem de comercialização a distribuir pela rede/circuito, à custa do IVA que liquida, mas que não entrega ao Estado, beneficiando os operadores que se encontram a jusante.
4. Conclusão
Face ao exposto constata-se que:
Existe um conjunto de operadores, pessoas coletivas e pessoas singulares, que atuaram em Portugal com o único fim de lesar o Estado em sede de IVA, beneficiando todas as entidades envolvidas com o imposto que não foi entregue nos cofres do Estado;
Os bens transacionados (telemóveis) não são produzidos pelas empresas que os colocaram no mercado nacional, muito menos produzidos em Portugal, não podendo por isso este conjunto de operadores alegar que não existe nada de anormal num negócio, em que as mercadorias são comercializadas abaixo do preço do produtor, A A..., não podia desconhecer esta fraude organizada, pois tira proveito de um negócio que conforme referimos não está a ser efetuado conforme os usos normais do mercado e em conformidade com a lei.
Assim:
Estamos perante um esquema organizado de circuitos comerciais, com intenção de lesar o Estado em sede de IVA;
Os operadores que neles participam conhecem a forma de atuar destas redes, cumprindo com a sua função no circuito, conforme a posição em que participam;
Existe um objetivo comum em todos os operadores obter um benefício "à conta do IVA" lesando o Estado;
Todos os operadores participam num negócio, direta ou indiretamente, que não funciona nas condições normais de mercado, dado existir a quebra de preço à custa do IVA, o que inverte totalmente a substância legal subjacente ao mecanismo do IVA que, como o próprio nome indica, deveria incidir sobre o valor acrescentado e não servir de margem num circuito comercial;
• Existe um esforço concertado por parte dos operadores em cumprir com todas as formalidades inerentes a um negócio, ou seja, documento suporte (fatura), documento de transporte, meio de pagamento, criando assim uma aparente legalidade formal, conseguida apenas com o esforço e perfeito desempenho de cada um dos intervenientes que partilham o benefício em prejuízo do Estado;
Pelo que:
Ainda que a contabilidade da A...evidencie ter sido pago o IVA aos seus fornecedores diretos e se encontre documentado o respectivo montante, a A...não tem direito à dedução do mesmo, já que esse direito surge ou é obtido como consequência do seu envolvimento nestes circuitos fraudulentos. Esta dedução de imposto tem por base operações que foram simuladas e manipuladas, tendo por objetivo lesar o Estado, participando a A... neste mecanismo fraudulento, criando artificialmente os pressupostos exigidos para a dedução do IVA e a obtenção dos reembolsos.
Assim, nos termos do previsto nos nºs 3 do artigo 19º do Código do IVA, a A...não tem direito à dedução do Imposto suportado nas faturas emitidas pelos seus fornecedores diretos.
O imposto não dedutível totaliza o montante de €398.142,65, conforme faturas discriminadas no mapa que constituiu o anexo l, relativamente ao período de …, assim discriminado por fornecedor:
Desta forma, propõe-se o indeferimento parcial do pedido de reembolso do período de …, no montante de 398.142,65€.
f) A Requerente exerceu o direito de audição sobre o projecto de Relatório da Inspecção Tributária atrás referido, juntando documentos, que foram apreciados pela Autoridade Tributária e Aduaneira nestes termos:
Nos pontos 1º a 11º da petição apresentada, afirma que a proposta de indeferimento assenta em pressupostos errados (pontos 3", 9º e 11º), relativamente aos quais o contribuinte não poderá deixar de se pronunciar.
Nos pontos 12º a 27º, aborda as problemáticas da legitimidade dos preços/oscilação dos mesmos.
Para além das generalidades aludidas nestes pontos, a referência concreta a preços de equipamento, versa exclusivamente o Samsung Galaxy S3 Í9300.
A A... na sua petição refere que os Samsung Galaxy podem ser comercializados aos mais variados preços. Para fundamentar a sua afirmação junta:
• Listagens retiradas da plataforma GSM-B2B (doc 1);
• Tabela de preços extraída da página da internet www.Kuantocusta.pt (doc 2).
Da análise ao gráfico da evolução dos preços do telemóvel Samsung Galaxy S3 Í9300, que integra o referido doc 1, verifica-se que para o período em causa, Junho de 2014, o preço médio deste modelo é superior (299,85€/304,13€) ao que foi praticado pelo fornecedor B... neste período, ou seja, 290,00€.
Deste modo, a A... tinha perfeito conhecimento de que estava a adquirir abaixo do preço de mercado, tanto mais que sendo a B..., um fornecedor fora da cadeia normal de distribuição, não podia estar em condições de vender o artigo a um preço inferior ao do revendedor autorizado "F...", como se pode verificar pelo doc 4 anexo à petição.
Quanto à tabela que constituiu o doc 2 refere-se a um período temporal (22-03-2014) que nada tem a ver com o período em análise.
Acresce que na petição apenas faz referência aos preços dos Samsung Galaxy S3 Í9300.
Contudo, as vendas deste modelo no período em análise representam apenas 12% do total dos bens adquiridos aos fornecedores B... e C…, o que corresponde a 18% do total das correções aritméticas propostas.
De salientar que da análise efetuada pela AT foi possível apurar que os bens adquiridos aos fornecedores em causa chegam à A...a preços abaixo do preço a que entram no mercado nacional e que tal só é possível porque na cadeia de transmissões em território nacional foi efetuada quebra de preço, conforme se exemplificou no ponto 3 do item III do projeto de relatório de inspeção tributária. Esta situação foi apurada com base em elementos objetivos, que resultaram de uma investigação aos diversos intervenientes na cadeia, inclusive, com base em informação obtida relativamente aos operadores intracomunitários, ao abrigo da cooperação administrativa.
Nestes termos, mantêm-se as correções propostas inicialmente.
g) Na 1.ª página do Relatório da Inspecção Tributária atrás referido o Senhor Chefe de Divisão da Direcção de Finanças do Porto, proferiu em 04-04-2014 despacho manifestando concordância.
h) No Relatório da Inspecção Tributária relativo à acção de fiscalização OI… refere-se, além do mais, o seguinte:
I - Conclusões da ação inspetiva
Em resultado da ação inspetiva efetuada ao sujeito passivo A... - ..., Lda, NIPC … (adiante designada por A...), resultaram as seguintes correções:
1.1 Em sede de IVA
(...)
• Distribuição das compras e vendas por mercados no período de 201307
A A...em Julho de 2013 regista na sua contabilidade os seguintes valores:
Conforme se pode verificar as aquisições efetuadas a fornecedores no mercado nacional representam 100% do total das aquisições. As vendas tiveram como principal destino o mercado intracomunitário (89% do total) o que, conduz ao crédito de IVA, dado que estamos perante operações isentas de IVA que conferem o direito à dedução do IVA suportado na compra.
Assim, importa analisar a origem dos bens transacionados pela A....
A análise efetuada aos principais bens comercializados (telemóveis: IPHONES 5 16GB e Samsung Galaxy) no período de …, permitiu concluir que os bens vendidos foram na sua maioria adquiridos aos fornecedores: F..., B..., e C….
Identificados os fornecedores da A..., deste tipo de bens, procedeu-se também à identificação de empresas intermediárias, identificando-se sempre que possível a empresa ou entidade que iniciou em território nacional, os circuitos de facturação correspondentes aos bens em causa. Assim, numa primeira abordagem, vamos expor os circuitos comerciais em fluxogramas, onde são identificados os operadores intervenientes, partindo do fornecedor directo da A...até ao operador que iniciou em território nacional os circuitos de facturação. Posteriormente, passamos a analisar os dados relativos a cada um dos intervenientes.
2. Análise às aquisições dos bens no mercado nacional declaradas pela A...
2.1. Circuitos comerciais
Das diligências efetuadas passamos a expor por fornecedor direto da A...o circuito comercial dos bens através dos seguintes esquemas:
2.1.1.Circuito "B..." e circuito "C…"
2.2. Caracterização das empresas identificadas nos circuitos comerciais 2.2.1. Circuito B… e Circuito C…
• Junto do gabinete de contabilidade foi apurado que a atividade da sociedade não era desenvolvida na loja sita no local da sede do sujeito passivo, na medida em que parte das compras era efetuada na Internet e as mercadorias iam diretamente dos seus fornecedores para os seus clientes.
• O sócio gerente ausentou-se de Portugal entre abril/agosto, sendo que atualmente se encontra no Dubai.
2.2.2. Caraterização das empresas a montante dos fornecedores diretos 2.2.2.1. Fornecedores nacionais
Fornecedor Nacional 1
Das diligências efetuadas foram apurados os seguintes factos:
A atividade da empresa consiste na comercialização de cartões telefónicos pré-pagos, telemóveis/Iphones, jornais, revistas e tabaco e é desenvolvida em duas lojas.
Entre janeiro e setembro de 2013, as compras e vendas relacionadas com telemóveis foram todas declaradas como realizadas no mercado nacional e 99% das suas vendas destinaram-se ao cliente B...,
O negócio da revenda de telemóveis/Iphones (mais caros) começou em dezembro de 2012, mas foi em junho de 2013 que sofreu um forte aumento do volume de negócios. Esta atividade é desenvolvida na sua sede, isto é, a mercadoria é entregue na sede da empresa, pelo fornecedor em automóvel próprio e depois o cliente B..., vem buscar a mercadoria, com viatura da empresa, no próprio dia.
A mercadoria (telemóveis/Iphones) não é conferida, porque vem dentro de caixas seladas com fita, que o sócio gerente não abre e nunca viu os telemóveis/Iphones.
A atividade de revenda de telemóveis começou porque alguém que se apresentou como dono da empresa B..., e perguntou, ao sócio gerente desta empresa, se ele queria ser intermediário neste negócio, referindo que não tinha boas relações quer com o Fornecedor Nacional 2, quer com o Fornecedor Nacional 3, e foi o referido indivíduo (sócio da B...) que indicou que esses seriam os seus fornecedores.
Este negócio permitia obter uma margem de lucro de 3,00€ ou 4,00€ por telemóvel e os pagamentos aos fornecedores e os pagamentos dos clientes são efetuados através de transferência bancária.
Fornecedor Nacional 2
Das diligências efetuadas foram apurados os seguintes factos:
A sua atividade caracteriza-se pela realização de aquisições no mercado interno, de telemóveis da marca APPLE IPHONE e SAMSUNG e, na consequente, alienação desses bens a clientes nacionais, com uma reduzida margem de lucro.
Não foram disponibilizados quaisquer documentos de transporte comprovativos da expedição das mercadorias do fornecedor e, posteriormente, com destino aos seus clientes, situação que impede a certificação do circuito físico da mercadoria.
Não foi possível estabelecer qualquer contacto com os responsáveis pela empresa, desconhecendo-se outras instalações onde possa estar a exercer atividade e encontra-se em incumprimento declarativo, factos que indiciam o não exercício de qualquer atividade por parte da empresa.
Foi proposta a cessação oficiosa da actividade do sujeito passivo em causa, nos termos do n.º 2 do art. 34.º do Código do IVA e n.º 6 do art. 8º do Código do IRC.
Fornecedor Nacional 3
Das diligências efetuadas foram apurados os seguintes factos:
Os elementos contabilísticos evidenciam que a sua atividade se caracteriza pela realização exclusiva de operações no mercado interno, consubstanciadas na aquisição de telemóveis APPLE IPHONE e SAMSUNG GALAXY a um único fornecedor (Fornecedor Nacional 4) e, na consequente, alienação da mercadoria a clientes nacionais pouco diversificados.
Não obstante o elevado volume de negócios declarado, as declarações periódicas do IVA apresentadas evidenciam o apuramento contínuo de crédito de imposto.
O cruzamento da documentação recolhida evidenciou, por um lado, uma elevada rotação de mercadorias verificando-se o processamento da fatura de venda com a mesma data ou imediatamente a seguir à data da fatura de compra e, por outro, a realização de margens de lucro diferenciadas e muito reduzidas consoante o destinatário/cliente.
Fornecedor Nacional 4
Das diligências efetuadas foram apurados os seguintes factos:
Esta empresa, contrariamente ao seu enquadramento fiscal, exerceu a atividade de comércio por grosso de telemóveis de acordo com a faturação recolhida;
O local do seu domicílio fiscal corresponde às instalações de outra empresa - entidade contactada para a contratualização de serviços de escritório virtual/domiciliação fiscal (contrato nunca formalizado).
A morada constante das faturas emitidas pela empresa, corresponde a uma loja que nunca esteve aberta ao público e que, à data da visita da inspeção tributária, se encontrava fechada com indicação na montra de "ALUGA-SE".
A TOC informou ter recebido a documentação contabilística por e-mail, desconhecer se a empresa possui instalações físicas e se está a exercer efetivamente alguma atividade. As tentativas de contacto, pessoal ou por correio, com o sócio gerente da empresa revelaram-se infrutíferas: não se encontrava ninguém no domicílio fiscal e a notificação enviada veio devolvida.
De acordo com a documentação recolhida, a sua atividade caracteriza-se pela realização, a montante, de aquisições de telemóveis, no mercado interno e, na consequente, alienação desses bens ao cliente aqui identificado como Fornecedor Nacional 3 (ano 2013). Verifica-se, através do sistema VIÉS que, a empresa foi igualmente adquirente intracomunitária de bens, nos anos 2012 e 2013, particularmente no 2.º trimestre de 2013. Tais operações, não foram refletidas nas respetivas declarações periódicas.
Em 03-02-2014, foi cessado oficiosamente nos termos do n.º 2 do art. 34.º do Código do IVA e n.º 6 do art. 8.º do Código do IRC.
Face ao descrito, relativamente aos fornecedores nacionais acima indicados, afigura-se-nos que os mesmos apresentam características de operadores vulgarmente designados por buffer.
2.2.2.2. Fornecedores nacionais com aquisições intracomunitárias de bens (AICB) Fornecedor Nacional com AICB 1
Das diligências efetuadas foram apurados os seguintes factos:
A sociedade foi constituída em 11-10-2012, para a atividade de comércio a retalho de equipamento de telecomunicação, CAE …, tendo procedido à liquidação da sociedade e consequente cessação de atividade em 27-09-2013
Indicou como sede social, um escritório virtual, mais concretamente um mail box.
No decorrer do tempo em que a sociedade esteve ativa, não foi declarada à Administração Tributária, qualquer instalação onde pudessem ser armazenados os equipamentos adquiridos para venda no território nacional.
Verificou-se que, no sistema VIÉS, constam transações intracomunitárias envolvendo esta empresa. Tratam-se de transmissões intracomunitárias de bens (TICB) que lhe foram declaradas por diversos operadores comunitários de diversos países, no entanto, as referidas operações não constam, no todo ou em parte, das respetivas declarações periódicas de IVA.
Com o intuito de "fabricar" IVA dedutível, registou na contabilidade, supostas aquisições no mercado nacional a uma empresa nacional, tendo registado apenas uma transferência bancária, para a conta da suposta empresa, com identificação do NIB, mas sem identificação do beneficiário.
Fornecedor Nacional com AICB 2
Das diligências efetuadas foram apurados os seguintes factos:
A sociedade, detida desde a sua constituição por um cidadão nacional, passou, a partir de 12/04/2013, a ser detida e gerida por um cidadão de nacionalidade paquistanesa, residente em território nacional.
As tentativas de contacto, pessoal ou por correio, com o atual sócio gerente da empresa, revelaram-se infrutíferas: não se encontrava ninguém no domicílio fiscal e a notificação enviada veio devolvida.
A atividade da empresa caracteriza-se essencialmente pela realização, a montante, de aquisições de telemóveis, no mercado interno e no mercado intracomunitário, e na, consequente, alienação desses bens a dois clientes nacionais, sendo um deles o supra identificado Fornecedor Nacional 4.
Verifica-se a existência de diversos pagamentos a favor dos fornecedores intracomunitários e recebimentos do cliente "Fornecedor Nacional 4" efetuados por transferência bancária. Não se verifica a existência de qualquer pagamento a favor de fornecedores nacionais.
Foram detetados diversos levantamentos avultados, em numerário, que inviabilizam a identificação dos respetivos beneficiários.
Não foram disponibilizados quaisquer documentos comprovativos do transporte dos bens quer do fornecedor quer para o cliente.
As declarações periódicas de IVA entregues no ano de 2013, não refletem as operações ativas e passivas documentadas pelas faturas de compra e venda recolhidas.
Em 03-02-2014 foi cessado oficiosamente nos termos do n.º 2 do art. 34.º do Código do IVA e n.º 6 do art. 8.º do Código do IRC.
Empresa Nacional 1
Das diligências efetuadas foram apurados os seguintes factos:
• Registou-se em 16-07-2012 para o exercício da atividade de comércio a retalho de equipamentos de telecomunicação. Foi cessado oficiosamente, nos termos do n.º 2 do art. 34.º do Código do IVA e n.º 6 do art. 8.º do Código do IRC, em 29-10-2013, dado que não estava a exercer a atividade, não dispor de instalações conhecidas nem estrutura adequada susceptível de a exercer;
• Não se encontra no domicílio fiscal constante do cadastro informático;
• Desconhecem-se outras instalações onde possa estar a exercer actividade;
• Encontra-se em falta declarativa de IRC e IVA desde o início da actividade;
• De acordo com os dados informáticos da AT, relativamente ao ano de 2012, nenhum operador nacional declarou ter sido seu cliente ou fornecedor.
Face ao descrito, relativamente aos operadores neste ponto identificados, afigura-se-nos que os mesmos apresentam características de operadores vulgarmente designados por missing trader.
Através da análise à documentação enviada pela Administração Fiscal de um dos países, relativamente aos dados recolhidos no operador comunitário X, um dos principais operadores comunitários a declarar vendas para a empresa Fornecedor Nacional com AICB 1, constatou-se que revende os bens no mercado nacional abaixo do preço de custo e que, após terem passado por diversos operadores nacionais, os mesmos bens são novamente revendidos para clientes comunitários e nacionais a um preço inferior ao da sua entrada no mercado nacional, conforme se passa a exemplificar:
Operador comunitário X---------------------------» Fornecedor Nacional com AICB 1
Diversas faturas de 11 a 16-07-2013-… Apple Iphone 5 16GB ao preço unitário de 500,00€
Fornecedor Nacional com AICB 1-------------------------» Fornecedor Nacional 2
Diversas facturas de 11 a 16-07-2013 - … Apple Iphone 5 16GB ao preço unitário de 428,00€
Fornecedor Nacional 2------------------------------------------» Fornecedor Nacional 1
Diversas factura de 11 a 16-07-2013-… Apple Iphone 5 16GB ao preço unitário de 431,00€
Fornecedor Nacional 1------------------------------------------------------» B...
Diversas facturas de 15 a 16-07-2013 - …Apple Iphone 5 16GB ao preço unitário de 435,00€
B...------------------------------------------------------------------» A...
VD n.º 2013… de 16-07-2013 - 100 Apple Iphone 5 16GB ao preço unitário de 450,00€ VD n.º 2013… de 16-07-2013- 100 Apple Iphone 5 16GB ao preço unitário de 450,00€
A...----------------------------------------------» E… (operador comunitário)
Fatura n.º … de 17-07-2013 - … Apple Iphone 5 16GB ao preço unitário de 486,00€
Conforme se pode constatar através do exemplo exposto, o Fornecedor Nacional com AICB'S 1, quebra o preço das mercadorias na entrada das mesmas em território nacional, criando uma margem de comercialização a distribuir pela rede/circuito, à custa do IVA que liquida, mas que não entrega ao Estado, beneficiando os operadores que se encontram a jusante.
4. Conclusão
Face ao exposto constata-se que:
Existe um conjunto de operadores, pessoas coletivas e pessoas singulares, que atuaram em Portugal com o único fim de lesar o Estado em sede de IVA, beneficiando todas as entidades envolvidas com o imposto que não foi entregue nos cofres do Estado;
Os bens transacionados (telemóveis) não são produzidos pelas empresas que os colocaram no mercado nacional, muito menos produzidos em Portugal, não podendo por isso este conjunto de operadores alegar que não existe nada de anormal, num negócio, em que as mercadorias são comercializadas abaixo do preço a que entram no mercado nacional, isto porque, os bens transacionados na rede sofrem uma quebra de preço na aquisição intracomunitária, ou seja, aquando da entrada do bem em território nacional. A A..., não podia desconhecer esta fraude organizada, pois tira proveito de um negócio que conforme referimos não está a ser efetuado conforme os usos normais do mercado e em conformidade com a lei.
Assim:
Estamos perante um esquema organizado de circuitos comerciais, com intenção de lesar o Estado em sede de IVA;
Os operadores que neles participam conhecem a forma de atuar destas redes, cumprindo com a sua função no circuito, conforme a posição em que participam;
Existe um objetivo comum em todos os operadores obter um benefício "à conta do IVA" lesando o Estado;
Todos os operadores participam num negócio, direta ou indiretamente, que não funciona nas condições normais de mercado, dado existir a quebra de preço à custa do IVA, o que inverte totalmente a substância legal subjacente ao mecanismo do IVA que, como o próprio nome indica, deveria incidir sobre o valor acrescentado e não servir de margem num circuito comercial;
Existe um esforço concertado por parte dos operadores em cumprir com todas as formalidades inerentes a um negócio, ou seja, documento suporte (fatura), documento de transporte, meio de pagamento, criando assim uma aparente legalidade formal, conseguida apenas com o esforço e perfeito desempenho de cada um dos intervenientes que partilham o benefício em prejuízo do Estado;
Pelo que:
Ainda que a contabilidade da A...evidencie ter sido pago o IVA aos seus fornecedores diretos e se encontre documentado o respectivo montante, a A... não tem direito à dedução do mesmo, já que esse direito surge ou é obtido como consequência do seu envolvimento nestes circuitos fraudulentos. Esta dedução de imposto tem por base operações que foram simuladas e manipuladas, tendo por objetivo lesar o Estado, participando a A... neste mecanismo fraudulento, criando artificialmente os pressupostos exigidos para a dedução do IVA e a obtenção dos reembolsos.
Assim, nos termos do previsto nos nºs 3 do artigo 19º do Código do IVA, a A...não tem direito à dedução do Imposto suportado nas faturas emitidas pelos seus fornecedores diretos.
O imposto não dedutível totaliza o montante de 275.414,79€, conforme faturas discriminadas no mapa que constituiu o anexo l, relativamente ao período de 201307, assim discriminado por fornecedor:
Desta forma, propõe-se o indeferimento parcial do pedido de reembolso do período de …, no montante de 275.414,79€.
i) A Requerente exerceu o direito de audição sobre o projecto de Relatório da Inspecção Tributária atrás referido, juntando documentos, que foram apreciados pela Autoridade Tributária e Aduaneira nestes termos:
Nos pontos 1º a 11" da petição apresentada, afirma que a proposta de indeferimento assenta em pressupostos errados (pontos 3º, 9º e 11º), relativamente aos quais o contribuinte não poderá deixar de se pronunciar.
Nos pontos 12º a 27º, aborda as problemáticas da legitimidade dos preços/oscilação dos mesmos.
Para além das generalidades aludidas nestes pontos, a referência concreta a preços de equipamento, versa os telemóveis Samsung Galaxy S3 I9300 e Iphone 4 8GB.
A A...na sua petição refere que os referidos telemóveis podem ser comercializados aos mais variados preços. Para fundamentar a sua afirmação junta:
• Listagens retiradas da plataforma GSM-B2B (doc 1-A, 1-B e 1-C);
• Tabela de preços extraída da página da internet www.Kuantocusta.pt (doc 2).
Da análise ao gráfico da evolução dos preços dos telemóveis, que integra os referidos doc 1-A, doc1-B e doc 1-C, verifica-se que:
• Para o período em causa, Julho de 2014, o preço médio do telemóvel Samsung Galaxy S3 Í9300 é superior (316,47€) ao que foi praticado pelos fornecedores B... e C… neste período, ou seja, 284,96€ e 288,00€, respetivamente.
• Para o mesmo período, o preço médio do telemóvel Iphone 4 8GB é, também, superior (275,90€) ao que foi praticado pelo fornecedor B... nesse mesmo período, ou seja, 250,00€.
• No gráfico constante do doc 1-B (constituído por 2 folhas), muito embora, na petição, a A...não faça qualquer referência ao preço do telemóvel Iphone 5 16GB, constata-se que o preço médio, no período de Julho de 2013, é de 516,59€, preço superior ao praticado pelos fornecedores, B... e C…, que foi de 440,00€ a 455,00€.
Relativamente ao Iphone 4 8GB, importa referir que, conforme doc 5, a A...comprou, em 08-08-2013, ao fornecedor intracomunitário G... ao preço de 263,50€, também, superior ao que foi praticado pela B....
Deste modo, a A...tinha perfeito conhecimento de que estava a adquirir abaixo do preço de mercado, tanto mais que sendo a B... e C..., fornecedores fora da cadeia normal de distribuição, não podia estar em condições de vender o artigo a um preço inferior ao do revendedor autorizado "F...", como se pode verificar pelo doc 6 anexo à petição.
Quanto à tabela que constituiu o doc 2 refere-se a um período temporal (22-03-2014) que nada tem a ver com o período em análise.
Acresce que, na petição, pontos 1º, 5º, 10º. 12º, 23º, 24º, 29º, a A...refere que a Inspeção Tributária, no projeto de relatório, menciona que: "(,..)abaixo do preço do produtor.º, quando esta expressão não é referido em nenhum dos pontos que constituem o projeto de relatório.
De salientar que da análise efetuada pela AT foi possível apurar que os bens adquiridos aos fornecedores em causa chegam à A...a preços abaixo do preço a que entram no mercado nacional e que tal só é possível porque na cadeia de transmissões em território nacional foi efetuada quebra de preço, conforme se exemplificou no ponto 3 do item III do projeto de relatório de inspeção tributária. Esta situação foi apurada com base em elementos objetivos, que resultaram de uma investigação aos diversos intervenientes na cadeia, inclusive, com base em informação obtida relativamente aos operadores intracomunitários, ao abrigo da cooperação administrativa.
Nestes termos, mantêm-se as correções propostas inicialmente.
j) Na 1.ª página do Relatório da Inspecção Tributária atrás referido o Senhor Chefe de Divisão da Direcção de Finanças do Porto, proferiu em 28-04-2014 despacho manifestando concordância.
k) No Relatório da Inspecção Tributária relativo às acções de fiscalização com os n.ºs OI… e OI… refere-se, além do mais, o seguinte:
I - Conclusões da ação inspetiva
Em resultado da ação inspetiva efetuada ao sujeito passivo A... - ..., Lda, NIPC … (adiante designada por A...), resultaram as seguintes correções:
1.1 Em sede de IVA
(...)
Conforme atrás referimos as ações de inspeção, credenciadas pelas Ordens de Serviço antes identificadas, visam aferir da legitimidade dos pedidos de reembolso solicitados pela A.... Importa assim, verificar a origem do crédito de imposto, analisando para o efeito os valores declarados pela A...nos períodos de … e ….
Da análise efetuada aos documentos de suporte aos registos contabilísticos passa-se a expor o seguinte:
• Distribuição das compras e vendas por mercados
A A...em Outubro e Novembro de 2013 regista na sua contabilidade os seguintes valores:
Conforme se pode verificar as aquisições efetuadas a fornecedores no mercado nacional nos períodos de … e … representam 79% e 76%, respetivamente, do total das aquisições.
As vendas tiveram como principal destino o mercado intracomunitário o que, conduz ao crédito de IVA, dado que estamos perante operações isentas de IVA que conferem o direito à dedução do IVA suportado na compra.
Assim, importa analisar a origem dos bens transacionados pela A....
A análise efetuada, permitiu concluir que, nos períodos em análise, os principais bens comercializados pela A... foram telemóveis (IPHONES 5 16GB e Samsung Galaxy), e que estes telemóveis foram quase todos adquiridos aos fornecedores nacionais: H… e B....
Identificados os fornecedores da A..., deste tipo de bens, procedeu-se também à identificação de empresas intermediárias, identificando-se sempre que possível a empresa ou entidade que iniciou em território nacional, os circuitos de facturação correspondentes aos telemóveis em causa. Assim, numa primeira abordagem, vamos expor os circuitos comerciais em fluxogramas, onde são indicados os operadores intervenientes, partindo do fornecedor directo da A... até ao operador que iniciou em território nacional os circuitos de facturação. Posteriormente, passamos a analisar os dados relativos a cada um dos intervenientes.
2. Análise às aquisições dos bens no mercado nacional declaradas pela A...2.1. Circuitos comerciais
Das diligências efetuadas 'passamos a expor por fornecedor direto da A...o circuito comercial dos telemóveis através do seguinte esquema:
2.1.1.Circuito "B..."
2.2. Caracterização das empresas indicadas no circuito comercial
2.2.1. B..., LDA, NIPC …
A empresa supra identificada, doravante designada por B..., é uma sociedade por quotas, registou-se a 23-10-2008, para o exercício da atividade de comércio a retalho de Das diligências efetuadas junto da B..., foram apurados os seguintes factos:
• Para o desenvolvimento da sua atividade a entidade B..., possui, atualmente, um estabelecimento comercial aberto ao público, sito no Centro Comercial D..., Loja 6 e um armazém, arrendados, com dimensões reduzidas, sitos no Cacem.
• A pequena dimensão das instalações onde a entidade B... exerce efetivamente a sua atividade parece que a mesma não se coaduna com o grande número de telemóveis transacionados.
• As empresas a quem são adquiridos, em grandes quantidades, os IPHONES e os GALAXYS, permanecem pouco tempo como fornecedores, verificando-se, assim, uma alternância frequente nos mesmos.
2.2.2. Caraterização das empresas a montante do fornecedor direto
2.2.2.1. Fornecedores nacionais
Fornecedor Nacional 1
Das diligências efetuadas foram apurados os seguintes factos:
A atividade da empresa consiste na comercialização de cartões telefónicos pré-pagos, telemóveis/Iphones, jornais, revistas e tabaco e é desenvolvida em duas lojas.
Entre janeiro e setembro de 2013, as compras e vendas relacionadas com telemóveis foram todas declaradas como realizadas no mercado nacional e 99% das suas vendas destinaram-se ao cliente B...,
O negócio da revenda de telemóveis/Iphones (mais caros) começou em dezembro de 2012, mas foi em junho de 2013 que sofreu um forte aumento do volume de negócios. Esta atividade é desenvolvida na sua sede, isto é, a mercadoria é entregue na sede da empresa, pelo A mercadoria (telemóveis/Iphones) não é conferida, porque vem dentro de caixas seladas com fita, que o sócio gerente não abre e nunca viu os telemóveis/Iphones.
O sócio gerente desta empresa declarou que a atividade de revenda de telemóveis começou porque o sócio da B..., perguntou-lhe se ele queria ser intermediário no negócio, referindo que não tinha boas relações Fornecedor Nacional 3 e que seria esta empresa um dos seus principais fornecedores.
Este negócio permitia obter uma margem de lucro de 3,00€ ou 4,00€ por telemóvel e os pagamentos aos fornecedores e os pagamentos dos clientes são efetuados através de transferência bancária.
Fornecedor Nacional 2
Das diligências efetuadas foram apurados os seguintes factos:
A actividade da empresa consiste na comercialização de telemóveis, cartões telefónicos e acessórios para telemóvel, nas duas lojas abertas ao público e também comercializa telemóveis para revenda.
As aquisições de telemóveis para revenda, foram todas realizadas no território nacional à empresa Fornecedor Nacional com AICB 2.
As vendas dos telemóveis foram todas efectuadas ao mesmo cliente nacional: B....
Analisadas as facturas de aquisição e de venda de telemóveis para revenda permitiu verificar que obtinha um ganho unitário de cerca de € 3,00/€ 7,00 e, raras exceções, a empresa vendia os telemóveis no mesmo dia em que os adquiria.
Fornecedor Nacional 3
Das diligências efetuadas foram apurados os seguintes factos:
A sua atividade caracteriza-se pela realização de aquisições no mercado interno, de telemóveis da marca APPLE IPHONE e SAMSUNG e, na consequente, alienação desses bens a clientes nacionais, com uma reduzida margem de lucro.
Não foram disponibilizados quaisquer documentos de transporte comprovativos da expedição das mercadorias do fornecedor e, posteriormente, com destino aos seus clientes, situação que impede a certificação do circuito físico da mercadoria.
Não foi possível estabelecer qualquer contacto com os responsáveis pela empresa. Não se encontra no domícilio fiscal constante do cadastro informático da AT e desconhecem-se outras instalações onde possa estar a exercer atividade. Encontra-se em incumprimento declarativo a partir do período de …T. Tais factos indiciam o não exercício de qualquer atividade por parte da empresa.
Em 10-04-2014, a atividade do sujeito passivo foi cessada oficiosamente, nos termos do n.º 2 do art. 34.º do Código do IVA e n.º 6 do art. 8.º do Código do IRC.
Face ao descrito, relativamente aos fornecedores nacionais acima indicados, afigura-se-nos que os mesmos apresentam características de operadores vulgarmente designados por buffer.
2.2.2.2. Fornecedores nacionais com aquisições intracomunitárias de bens (AICB)
Fornecedor nacional c/ AICB 1
Das diligências efetuadas foram apurados os seguintes factos:
Telecomunicações".
Não foi possível estabelecer qualquer contacto com o sócio gerente. Não se encontra no domicílio fiscal constante do cadastro informático da AT e desconhecem-se outras instalações onde possa estar a exercer actividade. Encontra-se em falta declarativa de IVA desde o início da actividade
Verifica-se que operadores intracomunitários declararam ter transmitido bens para a empresa, referentes ao mês de Novembro de 2013, sem que esta tenha declarado qualquer aquisição intracomunitária.
Da análise efetuada é uma empresa intermediária que adquire intracomunitariamente, vende em território nacional e não cumpre obrigações de natureza fiscal.
Foi proposta a cessação oficiosa da actividade do sujeito passivo, nos termos do n.º 2 do art. 34.º do Código do IVA e n.º 6 do art. 8.º do Código do IRC.
Fornecedor nacional c/ AICB 2
Das diligências efetuadas foram apurados os seguintes factos:
Os elementos contabilísticos evidenciam que, a partir de Outubro de 2013, a sua atividade caracteriza-se pela realização exclusiva de operações no mercado intracomunitário, consubstanciadas na aquisição de telemóveis e na consequente venda desses telemóveis a um único cliente nacional Fornecedor Nacional 2.
Não obstante o elevado volume de negócios declarado, as declarações periódicas do IVA apresentadas evidenciam o apuramento contínuo de crédito de imposto.
As operações intracomunitárias declaradas não foram declaradas em sede de IVA.
mercadorias verificando-se o processamento da fatura de venda com a mesma data 01 imediatamente a seguir à data da fatura de compra e, por outro, a realização de margens de lucro diferenciadas e muito reduzidas consoante o destinatário/cliente.
Face ao descrito, relativamente aos operadores neste ponto identificados, afigura-se-nos que os mesmos apresentam características de operadores vulgarmente designados por missing trader.
3. Quebra no preço
Através da análise à documentação enviada pela Administração Fiscal de um dos países, relativamente aos dados recolhidos no operador comunitário X, um dos principais operadores comunitários a declarar vendas para a empresa Fornecedor Nacional com AICB 2, constatou-se que revende os telemóveis no mercado nacional abaixo do preço de custo e que, após terem passado por diversos operadores nacionais, os mesmos telemóveis são novamente revendidos para clientes comunitários e nacionais a um preço inferior ao da sua entrada no mercado nacional, conforme se passa a exemplificar:
Exemplo 1
Operador comunitário X-------------------------------» Fornecedor Nacional com AICB 2
Fatura de 15-10-2013 - … Apple Iphone 5 16GB ao preço unitário de 462,00€
Fornecedor Nacional com AICB 2---------------------------» Fornecedor Nacional 2
Factura de 15-10-2013 - … Apple Iphone 5 16GB ao preço unitário de 402,00€
Fornecedor Nacional 2----------------------------------------------------» B... 1
Factura de 16-10-2013-… Apple Iphone 5 16GB ao preço unitário de 405,00€
B... -------------------------------------------------» A...
FT n.º 2013… de 16-10-2013 - 150 Apple Iphone 5 16GB ao preço unitário de 415,00€
Exemplo 2
Operador comunitário X------------------------------» Fornecedor Nacional com AICB 2
Fatura de 29-10-2013 - … Apple Iphone 5 16GB ao preço unitário de 465,00€
Fornecedor Nacional com AICB 2 --------------------------» Fornecedor Nacional 2
Factura de 04-11 -2013 - 100 Apple Iphone 5 16GB ao preço unitário de 409,00€
Fornecedor Nacional 2-----------------------------------------------------» B...
Factura de 04-11-2013- … Apple Iphone 5 16GB ao preço unitário de412,00€
B... -----------------------------------------------------» A...
Ft n.º 2013… de 04-11 -2013 - 200* Apple Iphone 5 16GB ao preço unitário de 420,00€
A...-------------------------------------------» I…(operador comunitário)
Fatura n.º… de 07-11-2013-…* Apple Iphone 5 16GB ao preço unitário de 460,00€
* Dos quais incluiu os 100 Iphones adquiridos aos sujeitos passivos identificados no exemplo.
Conforme se pode constatar através dos exemplos expostos, o Fornecedor Nacional com AICB'S 2, quebra o preço das mercadorias na entrada das mesmas em território nacional, criando uma margem de comercialização, a distribuir pela rede/circuito, à custa do IVA que liquida, mas que não entrega ao Estado, beneficiando os operadores que se encontram a jusante.
4. Conclusão
Face ao exposto constata-se que:
em sede de IVA, beneficiando todas as entidades envolvidas com o imposto que não foi entregue nos cofres do Estado;
Os bens transacionados (telemóveis) não são produzidos pelas empresas que os colocaram no mercado nacional nem produzidos em Portugal, não podendo por isso este conjunto de operadores alegar que não existe nada de anormal num negócio, em que os telemóveis são comercializadas, no mercado nacional, totalmente à margem do circuito de distribuição das marcas e abaixo do preço porque deram entrada em Portugal. A A..., não podia desconhecer esta fraude organizada, pois tira proveito de um negócio que conforme referimos não está a ser efetuado conforme os usos normais do mercado e em conformidade com a lei.
Assim:
Estamos perante um esquema organizado de circuitos comerciais, com intenção de lesar o Estado em sede de IVA;
Os operadores que neles participam conhecem a forma de atuar destas redes, cumprindo com a sua função no circuito, conforme a posição em que participam; Existe um objetivo comum em todos os operadores obter um benefício "à conta do IVA" lesando o Estado;
Todos os operadores participam num negócio, direta ou indiretamente, que não funciona nas condições normais de mercado, dado existir a quebra de preço à custa do IVA, o que inverte totalmente a substância legal subjacente ao mecanismo do IVA que, como o próprio nome indica, deveria incidir sobre o valor acrescentado e não servir de margem num circuito comercial;
Existe um esforço concertado por parte dos operadores em cumprir com todas as formalidades inerentes a um negócio, ou seja, documento suporte (fatura), documento de transporte, meio de pagamento, criando assim uma aparente legalidade formal, conseguida apenas com o esforço e perfeito desempenho de cada um dos intervenientes que partilham o benefício em prejuízo do Estado;
Pelo que:
Ainda que a contabilidade da A...evidencie ter sido pago o IVA aos seus fornecedores diretos e se encontre documentado o respectivo montante, a A...não tem direito à dedução do mesmo, já que esse direito surge ou é obtido como consequência do seu envolvimento nestes circuitos fraudulentos. Esta dedução de imposto tem por base operações que foram simuladas e manipuladas, tendo por objetivo lesar o Estado, participando a A...neste mecanismo fraudulento, criando artificialmente os pressupostos exigidos para a dedução do IVA e a obtenção dos reembolsos.
Assim, nos termos do previsto nos nºs 3 do artigo 19º do Código do IVA, a A...não tem direito à dedução do Imposto suportado nas faturas emitidas pelo seu fornecedor direto, B..., Lda.
O imposto não dedutível, nos períodos de 201310 e 201311, totaliza o montante de 50.588,50€e 38.870,00€, respetivamente, conforme faturas discriminadas no mapa seguinte:
Desta forma, propõe-se o indeferimento parcial dos pedidos de reembolso dos períodos de … e …, nos montantes de 50.588,50€ e 38.870,00€, respetivamente.
l) A Requerente foi notificada para exercer o direito de audição sobre o projecto de Relatório da Inspecção Tributária atrás referido, mas não o exerceu.
m) Na 1.ª página do Relatório da Inspecção Tributária atrás referido a Senhora Chefe de Divisão da Direcção de Finanças do Porto, proferiu em 03-06-2014 despacho manifestando concordância.
n) Na sequência das correcções efectuadas foram emitidas as seguintes liquidações de IVA:
– n.º 2014 …, de 08-04-2014, relativa ao período …, determinando o valor de reembolso de € 64.667,38 e o valor a pagar de € 398.142,65 79 (demonstração de acerto de contas n.º 2014 …);
– n.º 2014 …, de 29-04-2014, relativa ao período …, determinando o valor de reembolso de € 73.190,91 e o valor a pagar de € 275.414,79 (demonstração de acerto de contas n.º 2014 …);
– n.º 2014 …, de 13-06-2014, relativa ao período …,determinando o valor de reembolso de € 73.194,68 e valor a pagar de € 50.588,50 79 (demonstração de acerto de contas n.º 2014 …);
– n.º 2014 …, de 13-06-2014, relativa ao período …, determinando o valor de reembolso de € 87.542,91 e valor a pagar de € 38.870,00 79 (demonstração de acerto de contas n.º 2014 …); (cópias das liquidações juntas com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
o) O comércio de telemóveis por grosso é realizado à escala mundial, transaccionando-se em todo o mundo os mesmos modelos de equipamento aos mais variados preços expressos em várias moedas, havendo frequentes oscilações de preços, derivadas de variações cambiais e das constantes evoluções dos equipamentos, a nível da sua actualidade e operacionalidade;
p) A Requerente baseia as suas transacções nas ofertas de fornecedores de telemóveis que recebe diariamente/semanalmente por via electrónica (telefone, "Skype", email);
q) A Requerente, depois, aplica uma margem de lucro sobre os preços de compra e remete pela mesma via as suas ofertas de venda a potenciais compradores, ficando as suas vendas dependentes da aceitação pelos clientes destas suas ofertas, umas vezes com sucesso, outras vezes não, dependendo dos preços concorrenciais do mercado no momento;
r) Por vezes, na sequência de solicitação de clientes de determinadas quantidades ou modelos de telemóveis, tenta encontrar no mercado modelos a preços compatíveis com o seu negócio e que lhe permita satisfazer essa procura;
s) Em regra, cada transacção envolve grandes quantidades de equipamentos, da ordem de várias dezenas e mesmo centenas;
t) Trata-se de um negócio que exige grande rapidez, devido às constantes oscilações de preços, para não se frustrarem as expectativas dos clientes da Requerente, que destinam os telemóveis a revenda e as podem ver inviabilizadas pelo aparecimento no mercado de preços mais baixos;
u) Os preços de compra e venda de telemóveis pela Requerente e as respectivas margens de lucro da Requerente relativamente a cada modelo de telemóvel dependem de vários factores, como a quantidade vendida, o destino da mercadoria e custo do transporte, a circunstância de os telemóveis serem bloqueados ou livres, a sua cor, o número de acessórios que trazem, terem ou não logotipos dos operadores móveis, existirem ou não campanhas promocionais, ser ou não fornecido suporte financeiro pelos fabricantes para os distribuidores escoarem stocks;
v) Telemóveis do mesmo modelo podem ter preços significativamente diferentes por serem fabricados em países diferentes;
w) Os telemóveis transaccionados pela Requerente são comprados e vendidos sempre a preços inferiores aos indicados pela plataforma GSM-B2B;
x) Para além de adquirir telemóveis à B... e à C… a Requerente também os adquiria a outros comerciantes por grosso, como a F... e a H…;
y) A Requerente, no ano de 2013, em várias transacções, obteve margens de lucro superiores ao comercializar telemóveis adquiridos à F... e à H… do que as que obteve a comercializar telemóveis adquiridos à B... e à C…»;
z) A Requerente pagou as quantias indicadas como «valor a pagar» nas liquidações atrás referidas (documentos n.ºs 960 a 971 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido).
aa)
Factos não provados
Não se provou que a Requerente obtivesse maiores margens de lucro ao adquirir telemóveis à B... e à C… do que nas transacções com a F... ou a H....
Fundamentação da fixação da matéria de facto
A fixação da matéria de facto baseia-se no processo administrativo, nos documentos juntos com o pedido de pronúncia arbitral, e na prova testemunhal e por depoimento de parte.
Tanto o depoimento de parte como os depoimentos das testemunhas aparentaram serem prestados com isenção, não se tendo detectado razões para duvidar da veracidade dos factos afirmados.
3. Matéria de direito
Nos relatórios das inspecções tributárias referidos na matéria de facto, a Autoridade Tributária e Aduaneira concluiu, em suma, que os telemóveis adquiridos às empresas B... e C… eram comercializados abaixo do preço a que entram no mercado nacional, entendendo que tal só era possível com uma «fraude organizada», «um esquema organizado de circuitos comerciais, com intenção de lesar o Estado em sede de IVA», uma «quebra de preço à custa do IVA», que «os bens adquiridos aos fornecedores em causa chegam à A...a preços abaixo do preço a que entram no mercado nacional e que tal só é possível porque na cadeia de transmissões em território nacional foi efetuada quebra de preço» e que «ainda que a contabilidade da A...evidencie ter sido pago o IVA aos seus fornecedores diretos e se encontre documentado o respectivo montante, a A...não tem direito à dedução do mesmo, já que esse direito surge ou é obtido como consequência do seu envolvimento nestes circuitos fraudulentos. Esta dedução de imposto tem por base operações que foram simuladas e manipuladas, tendo por objetivo lesar o Estado, participando a A...neste mecanismo fraudulento, criando artificialmente os pressupostos exigidos para a dedução do IVA e a obtenção dos reembolsos».
Na sequência desse entendimento, a Autoridade Tributária e Aduaneira concluiu que, por força do preceituado no n.º 3 do artigo 19.º do CIVA, a Requerente não tem direito à dedução do imposto suportado nas facturas emitidas pela B... e pela C…, por considerar que as mesmas titulam operações simuladas e manipuladas, tendo em vista lesar o Estado.
A prova produzida não confirma as conclusões a que chegou a Autoridade Tributária e Aduaneira nos relatórios referidos.
Na verdade, por um lado, provou-se inequivocamente que os preços dos telemóveis transaccionados por grosso sofrem frequentes oscilações de preços, por várias causas, como variações cambiais, desactualização de equipamentos, a quantidade que está em causa em cada transacção, circunstância de os telemóveis serem bloqueados ou livres, a sua cor, o número de acessórios que trazem, terem ou não logotipos dos operadores móveis, existirem ou não campanhas promocionais, ser ou não fornecido suporte financeiro pelos fabricantes para os distribuidores escoarem stocks.
Por isso, não existe no comércio por grosso de telemóveis um «preço a que entram no mercado nacional», uniforme para todas as transacções verificadas em determinado período, que possa servir de padrão para concluir que os preços praticados por aquelas empresas B... e C… eram significativamente mais reduzidos do que os praticados por outras empresas de comércio por grosso.
Na verdade, apontando manifestamente em sentido inverso à conclusão retirada pela Autoridade Tributária e Aduaneira de haver preços especialmente reduzidos praticados por aquelas duas empresas B... e C…, constata-se que a Requerente, nos mesmos períodos, adquiriu telemóveis dos mesmos modelos e a preços idênticos a empresas cuja idoneidade não é questionada pela Autoridade Tributária e Aduaneira ou, pelo menos, a quem esta não imputa conivência em negócios simulados e participação na «fraude organizada» que refere, designadamente a F... e a H….
Para além disso, como demonstra a Requerente através das transacções indicadas nos artigos 98.º a 102.º do pedido de pronúncia arbitral, não é detectável uma regra de que a margem de lucro obtida pela Requerente com a compra e venda de telemóveis nos casos em que os telemóveis foram adquiridos àquelas empresas B... e C… seja superior à margem obtida com a transacção de telemóveis adquiridos à F... e à H…. Pelo contrário, encontram-se casos em que as margens de lucro obtidas pela Requerente com transacções de telemóveis adquiridos à B... e à C… são inferiores às obtidas com telemóveis adquiridos à F... e à H… (como a Requerente refere nos artigos 119.º a 121.º do pedido de pronúncia arbitral) e casos em que as margens obtidas com telemóveis adquiridos a estas empresas são muito superiores à média anual (como sucede nos casos referidos pela Requerente no artigo 125.º do pedido de pronúncia arbitral).
Ainda para além disso, constata-se que relativamente aos telemóveis Samsung Galaxy 4, que a Requerente, nos meses em causa, não adquiriu telemóveis apenas à B... e à C..., tendo-as efectuado também à F... e à H… a preços não significativamente diferentes, tendo em conta os factores que influenciam a formação dos preços do comércio de telemóveis por grosso.
Assim, não se pode considerar demonstrado que as transacções efectuadas pela Requerente com a B... e a C… sejam simuladas, quer na sua totalidade quer quanto ao preço, nem que a Requerente tenha envolvimento na «fraude organizada» em que a Autoridade Tributária e Aduaneira afirma estarem envolvidas a B... e a C… e empresas que não identifica (que denomina nos relatórios das inspecções como «Fornecedores Nacionais com Aquisições Intracomunitárias de Bens – AICB’s) nem que nas transacções com estas empresas a Requerente obtenha uma margem de lucro anormal «à custa do IVA».
Para além disso, sendo reduzidas as diferenças entre os preços praticados pela B... e pela C… e os de aquisições idênticas efectuadas à F... e à H… e havendo grandes variações de preços no comércio por grosso de telemóveis, não se encontram fundamentos objectivos para afirmar que a Requerente deveria aperceber-se da existência de fraude ao efectuar aquisições àquelas primeiras empresas.
No mínimo, face à prova produzida, que aponta em sentido contrário ao afirmado pela Autoridade Tributária e Aduaneira nos relatórios referidos, terá de se ficar numa situação de dúvida sobre a alegada natureza simulada das transacções, dúvida essa que, por força do disposto no artigo 100.º do CPPT, aplicável aos processos arbitrais tributários por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT, tem de ser valorada a favor da Requerente.
Pelo exposto, conclui-se que as liquidações impugnadas, que assentam nas correcções referidas nos relatórios das inspecções tributárias, enfermam de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto, que justifica a sua anulação (artigo 135.º do CPA de 1991, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 2.º, da LGT).
4. Questões de conhecimento prejudicado
Devendo os actos impugnados ser anulados com fundamento em vício de erro sobre os pressupostos de facto, que assegura eficaz tutela dos interesses da Requerente, fica prejudicado, por ser inútil, a apreciação das restantes questões colocadas pela Requerente, relativamente a legalidade daqueles actos.
5. Reembolso das quantias pagas e juros indemnizatórios
A Requerente pagou as quantias liquidadas, como se considerou provado na alínea z) da matéria de facto fixada, e pede a sua devolução acrescida de juros indemnizatórios.
De harmonia com o disposto na alínea b) do art. 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a Administração Tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito», o que está em sintonia com o preceituado no art. 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do art. 29.º do RJAT] que estabelece, que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão».
Embora o art. 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que em processo de impugnação judicial são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira directriz, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».
O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de actos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do art. 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e do art. 61.º, n.º 4 do CPPT (na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redacção inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».
Assim, o n.º 5 do art. 24.º do RJAT, ao dizer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.
Cumpre, assim, apreciar o pedido de reembolso do montante indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios.
No caso em apreço, é manifesto que, na sequência da ilegalidade dos actos de liquidação, há lugar a reembolso do imposto pago, por força dos referidos arts. 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 100.º da LGT, pois tal é essencial para «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado».
No que concerne aos juros indemnizatórios, é também claro que a ilegalidade dos actos de liquidação é imputável à Administração Tributária, que, por sua iniciativa, os praticou sem suporte legal.
Consequentemente, a Requerente tem direito a juros indemnizatórios, nos termos do art. 43.º, n.º 1, da LGT e 61.º do CPPT.
Os juros indemnizatórios serão pagos relativamente a cada uma das liquidações desde a data em que a Requerente efectuou o respectivo pagamento até ao integral reembolso do montante pago, à taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43.º, n.º 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, do artigo 61.º do CPPT, do artigo 559.º do Código Civil e da Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril.
6. Decisão
De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em:
a) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;
b) Anular as seguintes liquidações:
– n.º 2014 …, de 08-04-2014, relativa ao período …, determinando o valor de reembolso de € 64.667,38 e o valor a pagar de € 398.142,65 79 (demonstração de acerto de contas n.º 2014 …);
– n.º 2014 …, de 29-04-2014, relativa ao período …, determinando o valor de reembolso de € 73.190,91 e o valor a pagar de € 275.414,79 (demonstração de acerto de contas n.º 2014 …);
– n.º 2014 …, de 13-06-2014, relativa ao período …,determinando o valor de reembolso de € 73.194,68 e valor a pagar de € 50.588,50 79 (demonstração de acerto de contas n.º 2014 …);
– n.º 2014 …, de 13-06-2014, relativa ao período …, determinando o valor de reembolso de € 87.542,91 e valor a pagar de € 38.870,00 79 (demonstração de acerto de contas n.º 2014 …);
c) Condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a devolver a Requerente as quantias que pagou referidas naquelas liquidações, acrescidas de juros indemnizatórios, à taxa legal supletiva, desde cada uma das datas em que pagas e a data ou datas em que se vier a verificar a devolução.
7. Valor do processo
De harmonia com o disposto no art. 305.º n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 763.015,94.
8. Custas
Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 11.016,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Lisboa, 08-04-2015
Os Árbitros
(Jorge Lopes de Sousa)
(Maria do Rosário Anjos)
(Maria Forte Vaz)