DECISÃO ARBITRAL
I – RELATÓRIO
1 –A... SA ,NIPC[1] ... ,com sede na Rua ..., em Lisboa, apresentou em 20/10/2014 um pedido de constituição do tribunal arbitral, ao abrigo do disposto na alínea a) do nº1 do artigo 2º, do nº 1 do artigo 3º e da alínea a) do nº 1 do artigo 10º, todos do RJAT[2], sendo requerida a AT[3], com vista à apreciação da legalidade dos actos tributários de liquidação do IS[4], referentes ao ano de 2013 (2ª prestação), com data limite de pagamento em 31/07/2014, incidente sobre um prédio com andares e divisões com utilização independente sito na Rua ... nº..., Lisboa, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ... sob o nº 50 do qual a requerente é proprietária .
2 – O pedido de constituição do tribunal arbitral foi feito sem exercer a opção de designação de árbitro, vindo a ser aceite pelo Exmo Senhor Presidente do CAAD[5] e automaticamente notificado à AT em 21/10/2014.
3 – Nos termos e efeitos do disposto no nº1 do artigo 6º do RJAT, por decisão do Exmº Senhor Presidente do Conselho Deontológico, devidamente comunicada às partes, nos prazos legalmente aplicáveis, foi designado Arlindo José Francisco, na qualidade de árbitro, que comunicou ao Conselho Deontológico e ao Centro de Arbitragem Administrativa a aceitação do encargo no prazo regularmente estipulado.
4 - O tribunal foi constituído em 24/12/2014 de harmonia com as disposições contidas na alínea c) do nº 1 do artigo 11º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228º da Lei nº 66-B/2012 de 31 de Dezembro.
5 – Com o seu pedido visa, a requerente, a declaração de ilegalidade dos actos tributários de liquidação da verba 28 da TGIS[6] que incidiram sobre o VPT[7] das divisões com utilização independente afectas à habitação do imóvel em questão do qual é proprietária.
6- Invoca, em síntese, para o efeito o seguinte:
6.1- O prédio em questão tem afectação habitacional, foi inscrito, na matriz anteriormente a 1951, composto por 4 pisos e divisões susceptíveis de utilização independente, com um VPT global de € 1 051 023,97.
6.2 – Tal valor foi apurado separadamente, conforme dispõe o nº 2 alínea b) do artigo 7º do CIMI[8], e nenhum dos pisos ou divisões com utilização independente e afectação habitacional tem VPT igual ou superior a€ 1000 000,00.
6.3 – O IS contestado foi apurado sobre o VPT de cada um dos pisos ou divisões independentes com afectação habitacional conforme liquidações constantes dos documentos juntos aos autos que, em seu entender, enfermam de ilegalidade na medida em que nenhum dos pisos ou divisões individualmente considerados tem VPT igual ou superior a € 1000 000,00.
6.4 - Um prédio em propriedade vertical ou horizontal não poderá, por si só, ser indiciador de capacidade contributiva, decorrendo da lei uma igualdade de tratamento fiscal e assim, se um prédio em propriedade horizontal só pagaria IS pelas fracções que tivessem valor patrimonial igual ou superior a € 1000 000,00, o mesmo deverá acontecer para os prédios em propriedade vertical com andares ou divisões com utilização independente.
6.5 – É pois evidente a ilegalidade das liquidações por não se verificar o pressuposto legal da incidência do IS previsto na verba 28 da TGIS.
7 – Por sua vez a AT, em síntese, entende:
7.1- Que não assiste razão à requerente uma vez que desde logo o pedido sofre de dupla extemporaneidade, dado que a liquidação do imposto é de 17/03/2014 e, o prazo de pagamento voluntário ocorreu em Abril de 2014,conforme artigo 120º do CIMI, aplicável ex vi artigo 3º da Lei 55-A /2012 de 29 de Outubro.
7.2- Nos termos da alínea a) nº 1 do artigo 10º do RJAT e do da alínea a) nº 1 do artigo 102º do CPPT, o prazo para a apresentação do pedido de constituição do tribunal arbitral é de 90 dias a contar do prazo para o pagamento voluntário do imposto, no caso concreto terminaria em 29/07/2014 e só veio a ser apresentado em 20/10/2014.
7.3 – Mas será ainda extemporâneo na medida em que a requerente não fez prova do pagamento da 1ª prestação cuja data terminou em 30/04/2014, o que implica o vencimento das restantes prestações nos termos do nº 4 do artigo 120º do CIMI já citado, logo a legalidade da prestação aqui em causa também teve o seu prazo de pagamento até 30/04/2014,logo o presente pedido também por esta via será extemporâneo.
7.4 – Mesmo que assim não se venha a entender, na perspectiva da AT, haverá incompetência do tribunal, na medida em que a requerente não impugna um acto tributário, mas o pagamento de uma prestação (2ª) de um acto tributário, matéria afastada em absoluto da competência dos tribunais arbitrais tributários e não tendo a requerente questionado a liquidação do imposto, quando oportunamente foi notificada para o pagamento da 1ª prestação, não pode mais tarde, quando recebe a 2ª nota de cobrança, vir questionar a liquidação que se converteu em definitiva.
7.5 - Refere ainda a AT por impugnação que, um imóvel em propriedade total e um imóvel em propriedade horizontal, têm diferente valoração e tributação donde decorre diferentes efeitos jurídicos; enquanto na propriedade horizontal há uma divisão da propriedade total e autonomia de cada uma das fracções, no prédio em propriedade total há uma única realidade jurídica;
7.6 - Cada parte susceptível de utilização independente não é autónoma, por matriz, possuindo uma descrição do prédio na sua totalidade;
7-7 – Conclui que os actos tributários aqui postos em crise são legais, deverão ser mantidos, absolvendo-se a AT do pedido.
II – SANEAMENTO
O tribunal foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria, de acordo com o artigo 2º do RJAT.
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas de harmonia com os artigos 4º e 10º nº2 do RJAT e artigo 1º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março.
Na sua resposta a AT suscitou excepções de “dupla” extemporaneidade do pedido e de incompetência do tribunal.
Agendada a reunião a que alude o artigo 18º do RJAT para o dia 11 de Março de 2015, veio a requerente exercer o seu direito ao contraditório, relativamente à matéria excepcionada, facto que levou o tribunal em 03/03/2015 a proferir o seguinte despacho:
“Da análise dos autos, entende o tribunal ser dispensável a reunião do artigo 18º do RJAT, bem como a produção de alegações escritas ou orais sobre a matéria controvertida. Deste modo, caso as partes não se oponham ou nada digam sobre este entendimento, até 10 do corrente, ficará sem efeito a realização da aprazada reunião e o tribunal proferirá decisão até 20 de Abril próximo. Notifique.”
Notificadas as partes na mesma data, nada disseram pelo que o tribunal considerou estarem reunidas as condições para a prolação da decisão final.
Como foram suscitadas, pela requerida, excepções que podem obstar ao conhecimento do mérito da causa cumpre decidi-las previamente:
1 - Da “dupla” extemporaneidade do pedido
Alega a requerida, numa primeira linha, que o acto de liquidação ocorreu em 17 de Março de 2014 e o primeiro prazo de pagamento voluntário, ocorreu em Abril de 2014, conforme disposto no artigo 120º do CIMI, aplicável ex vi artigo 3º da Lei 55-A/2012 de 29 de Outubro, para concluir que de acordo com as disposições contidas no artigo 10º, nº1, alínea a) do DL 10/2011 de 20 de Janeiro que aprovou o RJAT e do artigo 102º nº 1 alínea a) do CPPT o prazo para apresentação do pedido de constituição do tribunal arbitral é de 90 dias a contar do termo do prazo para o pagamento voluntário e, na sua perspectiva, terminou em 29/07/2014.
Alega ainda a requerida que, de acordo com o nº 4 do artigo 120º do CIMI, aqui aplicável nos termos já referidos, a requerente, ao não fazer prova do pagamento da 1ª prestação, cuja data terminou em 30/04/2014, equivale ao vencimento das restantes prestações.
Assim a legalidade da nota de cobrança que agora se discute, viu o seu prazo de pagamento voluntário terminar também em 30/04/2014,extraindo, deste modo, a conclusão da “dupla extemporaneidade do pedido.
A requerente, por sua vez vem dizer, que não aceita a argumentação vertida pela AT, dado que o pedido de constituição de tribunal arbitrário ocorreu em 20/10/2014, com referência às liquidações em crise, cujo prazo de pagamento voluntário era 31/07/2014, pelo que foi respeitado os prazos previstos no artigo 10º, nº 1 alínea a) do RJAT e no artigo 102º,nº1 alínea a) do CPPT e que quanto ao segundo argumento de extemporaneidade a 1ª prestação foi paga por compensação da própria AT e que a prova de pagamento em caso algum condiciona a apresentação da impugnação.
Cumpre decidir:
Tendo em vista as disposições contidas no artigo 10º nº1 alínea a) do RJAT e artigo 102º nº1 alínea a) do CPPT, o pedido de pronúncia arbitral deverá ser apresentado no prazo de 90 dias contados a partir do termo do prazo para pagamento voluntário das prestações tributárias legalmente notificadas ao contribuinte. O pagamento voluntário é o que ocorre dentro do prazo estabelecido e regulado nas leis tributárias, conforme artigos 84º e 85º do CPPT.
Determina o artigo 120º do CIMI no seu nº 4 que o não pagamento de uma prestação no prazo estabelecido, leva ao imediato vencimento das restantes
Demonstram os elementos juntos pela requerente, documentos 4 a 8 juntos à petição que os pagamentos via multibanco ocorreram em 15/10/2014 e no âmbito de um PEF. Por outro lado, no requerimento de 17/02/2015, a autora junta um documento que, no seu entender, prova o pagamento da 1ª prestação através de compensação feita pela própria AT.
Da análise do referido documento verifica-se que a compensação ocorreu em 28/08/2014, através de penhora de crédito de IRC, ocorrida no PEF instaurado pela AT para pagamento do imposto do selo em causa.
Desde já podemos concluir dos autos que a 1ª prestação do imposto do selo em causa, não foi paga dentro do período voluntário legalmente concedido (30 de Abril de 2014).Os pagamentos ocorreram já para além deste prazo e já como pagamentos coercivos
Da factualidade exposta verifica-se que a 1ª prestação do Imposto do selo em causa não foi paga dentro do período de pagamento voluntário que decorreu até 30 de Abril de 2014, assim de acordo com as disposições contidas no nº 4 do artigo 120º do CIMI, como já se viu aplicável ao caso concreto, a falta de pagamento determinou o vencimento antecipado das restantes prestações. Dito de outro modo, as restantes prestações viram o seu período de pagamento voluntário antecipado para 30 de Abril de 2014, dada a falta de pagamento atempado da 1ª prestação.
Tendo em conta que o artigo 10º do RJAT dispõe que o pedido de constituição do tribunal é apresentado no prazo de 90 dias, a contar do termo do prazo para pagamento voluntário, conforme prescreve a alínea a) do nº 1 do artigo 102º do CPPT e que o pedido foi apresentado em 20/10/2014, temos que concluir, pela conjugação deste normativos com o nº 4 do artigo 120º do CIMI aqui aplicável, que o pedido é manifestamente extemporâneo.
E nem se diga que o pedido respeita a liquidações cujo prazo de pagamento voluntário terminava em 31/07/2014, só seria assim se o pagamento da 1ª prestação tivesse ocorrido até 30 de Abril de 2014, o que não se verificou.
Assim o tribunal considera procedente a excepção da extemporaneidade do pedido de constituição do tribunal arbitral.
2 – Da incompetência do tribunal arbitral
Verificada a extemporaneidade do pedido que por si determina a absolvição da instância, dispensa-se o tribunal da apreciação desta excepção da incompetência do tribunal.
III – DISPOSITIVO
a) Face ao exposto o tribunal declara procedente a excepção de extemporaneidade do pedido de pronúncia arbitral ficando, deste modo, impedido de conhecer do seu mérito.
b) Por esta via, declara a requerida absolvida da instância.
c) Valor do processo € 3 503,39, tendo em vista as disposições contidas no artigo 299º nº1 do CPC[9], 97-A do CPPT[10] e artigo 3º nº2 do RCPAT[11].
d) Custas a cargo da requerente, ao abrigo do nº4 do artigo 22 do RJAT, fixando-se o seu montante em € 612,00 de harmonia com a tabela I do RCPAT.
Notifique
Lisboa, 20 Abril de 2015
Texto elaborado em computador, nos termos do artigo 131,nº5 do CPC, aplicável por remissão do artigo 29º,nº1,alínea e) do RJAT, com versos em branco e por mim revisto.
A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao acordo ortográfico.
O árbitro singular,
Arlindo José Francisco
[1] Acrónimo de Número de Identificação de Pessoa Colectiva
[2] Acrónimo de Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária
[3] Acrónimo de Autoridade Tributária e Aduaneira
[4] Acrónimo de imposto do Selo
[5] Acrónimo de Centro de Arbitragem Administrativa
[6] Acrónimo de Tabela Geral do Imposto do Selo
[7] Acrónimo de Valor Patrimonial Tributário
[8] Acrónimo de Código do Imposto Municipal sobre Imóveis
[9] Acrónimo de Código de Processo Civil
[10] Acrónimo de Código de Procedimento e de Processo Tributário
[11] Acrónimo de Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária