Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 298/2025-T
Data da decisão: 2025-11-11  IRS  
Valor do pedido: € 9.253,44
Tema: IRS - rendimentos prediais de 2023- aplicação no tempo do art. 28º da Lei n.º 56/2023, de 16/10
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SUMÁRIO: 

Ocorre inutilidade superveniente da lide e consequente extinção da instância se a Requerente obteve a plena satisfação do pedido em virtude da revogação pela AT, após a constituição do Tribunal Arbitral, do ato de liquidação contestado, cabendo nesse caso à Requerida suportar as custas processuais devidas.

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DECISÃO ARBITRAL

 

Relatório

1-Requerentes

A..., NIF..., titular do cartão n.º..., válido até 02/10/2027, e mulher B..., NIF..., titular do cartão do cidadão n.º..., válido até 03/08/2031, residentes na Rua ..., n.º..., ...-... Póvoa de Varzim.

2. Requerida

Autoridade Tributária e Aduaneira(AT)

3. Tramitação do processo

 

3.1 O pedido de pronúncia arbitral (PPA) deu entrada  e foi aceite a 27/3/2025, tendo sido nessa data encaminha automaticamente para Requerente e Requerida.

.3.2  A 31/3/2025, o PPA  seria notificado á Requerida. 

3.3  A 21/4/2025, por delegação da diretora- geral da AT, o diretor de  serviços da Direção de  Serviços de Consultadoria  Jurídica e do Contencioso designaria representante processuais da Requerida  as juristas ... e ... .

3.4.A 16/5/2025, o CAAD nomearia para árbitro singular  António  Lima Guerreiro, que a 4/4/ 2025 aceitara  o encargo.

 

3.5   A 3/6/2025, despacho do presidente do Conselho Deontológico do CAAD procederia à constituição do Tribunal Arbitral 

 

3.6. Na mesma data, o Tribunal Arbitral notificaria  a Requerida para, no prazo de 30 dias apresentar Resposta, se entender necessário, requerer prova  adicional e remeter o Processo Administrativo(PA).

 

3.7 A 7/7/2025, a Requerida informaria  que ,por despacho da Subdiretora-geral da AT de 2/6/2025 e remetido às juristas signatárias, a 4/6/2025.foi determinada a inutilidade superveniente do pedido, nos termos e com os fundamentos aí invocados, conforme documentação  anexa, que aponta para a revogação do ato impugnado.

 

3.8 A 14/7/2025, vieram os Requerentes informar que a Requerida procedeu à anulação da liquidação de IRS n.º 2024..., no valor de 9.253,44 €, . em substituição desta,  emitiu a liquidação n.º 2025..., no valor de 1.657,98 € (que incluiu o pagamento de juros indemnizatórios no valor de 178,02 €). 

 

3.9  Assim, tendo a Requerida satisfeito a pretensão dos Requerentes, procedendo â anulação parcial do ato tributário como era sua pretensão, não se justifica o prosseguimento dos presentes autos, devendo, no entanto, a Requerida ser condenada no pagamento das custas do processo, uma vez que foi esta que deu causa ao presente processo., nos termos da alínea e) do  277.º, alínea e) e do nº 3 do 536., ambos do CPC, aplicável ex vi da alínea e) do nº 1 do art.  29.ºdo RJAT-

 

4PRESSUPOSTOS RELATIVOS AO TRIBUNAL E ÀS PARTES

4.1. O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído.

 

4.2. As Partes gozam de personalidade e de capacidade judiciárias e encontram-se regularmente representadas.

5. OBJETO DO PROCESSO

Dada a revogação pela Requerida do ato impugnado, deixou de estar em causa a legalidade da liquidação de IRS n.º 2024..., respeitante os rendimentos prediais  do ano de 2023, auferidos pelos Requerentes no valor de 9.253,44 €, cuja anulação havia sido rejeitada pela decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º ...2024..., proferida pelo Serviço de Finanças da Póvoa de Varzim, colocando-se apenas a questão da responsabilidade pelas custas processuais.

6- Posição da Requerente

 

Conforme resulta da demonstração da liquidação substituída , aos rendimentos prediais auferidos pelos Requerentes em 2023  teria sido indevidamente  aplicada pela AT a taxa de tributação autónoma de 28%., quando , de acordo com a alínea e) do nº 7 do art. 71º do EBF, em vigor no momento dos factos,  por serem decorrentes  de imóveis situados em 'área de reabilitação urbana', recuperados nos termos das respetivas estratégias de reabilitação, deveriam ter sido tributados â taxa autónoma de 5%, sem prejuízo da opção pelo englobamento.

 

Por outro lado, sendo o IRS um imposto periódico de formação sucessiva é aplicável o disposto no n.º 2 do art. 12.º da LGT, ou seja, a lei nova só se aplica ao período decorrido a partir da sua entrada em vigor e não a factos anteriores-

 

É verdade que o n.º 7 do art.. 71.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais foi revogado pelo art. 28º º da Lei n.º 56/2023. Porém, ,nos termos do art. 55º dessa Lei, tal revogação só entrou em vigor em 7 de outubro de 2023, dia seguinte ao da publicação dessa Lei.

 

Assim sendo, a revogação do benefício fiscal apenas teria  efeitos para o futuro  abrangendo apenas os rendimentos prediais obtidos a partir de 7 de Outubro de 2023( Decisão Arbitral n.º 618/2023-T). 

 

7 Posição da Requerida  

 

A Requerida, por seu turno, defenderia inicialmente que o n.º 7 do artigo 71.º do EBF  apenas  foi revogado pela alínea a) do art 53.º da Lei n.º 56/2023, de 6/10, pelo que, como a revogação não foi acompanhada de norma transitória e sendo o IRS um imposto anual, cujo facto tributário ocorre a 31 de dezembro de cada ano, deve considerar-se a redação que estiver em vigor nessa data e não na data em que os rendimentos foram auferidos.

Essa posição seria alterada   pelo referido despacho da diretora- geral da AT de 2/6/2025, que procederia à anulação da liquidação de IRS n.º 2024..., no valor de 9.253,44 €, . em substituição desta,  emitiria  a liquidação n.º 2025..., no valor de 1.657,98 € (que incluiu o pagamento de juros indemnizatórios no valor de 178,02 €). 

 

8- Fundamentação

8.1. Factos Provados

 

8.1.1.Os Requerentes são usufrutuários do prédio urbano sito na ..., ..., da União de Freguesias ... e ..., inscrito na matriz urbana com o artigo ..., da União de Freguesias de ... e ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos sob o n.º... .

8.1.2 Por carta datada de 11/02/2019, a Câmara Municipal de Matosinhos notificou o Serviço da ... Repartição de Finanças de Matosinhos, de documento com o seguinte teor : “Para efeitos do disposto no n.º 4 do art. 45.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, anexo informação e relatório relativos à determinação do nível de conservação do imóvel sito na Av.ª ..., ..., da União de Freguesias de ... e ..., com o artigo matricial..., inicialmente fixado em 2,07 – nível 2 – mau e posteriormente, após execução das obras de reabilitação em se de comunicação prévia apresentada, fixado em 5,00 – nível 5 – excelente.” 

8.1.3 Em 18/06/2024, os Requerentes apresentaram a declaração modelo 3 de IRS via internet, respeitante aos rendimentos obtidos no ano de 2023. tendo incluído no anexo F (rendimento prediais), o valor auferido a título de rendas referente ao contrato de arrendamento n.º ..., do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ..., da União de Freguesia ... e ... (código...), no valor global de 36.720,00 €.

8.1.4 Nessa declaração, os Requerentes identificaram no quadro 6A desse   anexo F o imóvel objeto de reabilitação com comprovação emitida pela entidade competente, nos termos do n.º 6 e 23 do artigo 71.º do EBF, e assinalaram  no quadro 6G que não optavam pelo englobamento.

8.1.5 Em 24/07/2024 foi emitida a nota de liquidação de IRS n.º 2024..., respeitante aos rendimentos do ano de 2023, no valor de 9.253,44 €-

8.1.6 Em 01/08/2024, o Requerente marido apresentou reclamação graciosa da liquidação de IRS do ano de 2023, via e-balcão, e juntou documento comprovativo do benefício atribuído ao imóvel. 

8.1.7. Em 28/08/2024 os Requerentes efetuaram o pagamento da liquidação, montante de 9.2253,44 €-

8.1.8 Por carta datada de 27/11/2024, a Requerida notificou o Requerente marido da proposta de indeferimento e para exercer, querendo, o direito de audição prévia.

8.1.9 Em 10/12/2024, o Requerente marido exerceu o direito de audição prévia, nos termos do artigo 60.º da LGT.

 8.1.10 Por notificação datada de 06/01/2025, expedida a 27/01/2025 e rececionada a 28/01/2025, o Reclamante marido foi notificado da decisão de indeferimento da 7.1.2 8.2.Factos não Provados

 

Não se consideram não  provados  quaisquer outros factos relevantes para o 

conhecimento da causa,.

 

 8.3 -Fundamentação da Fixação da Matéria de Facto

 

O Tribunal Arbitral tem o dever de selecionar os factos pertinentes para a decisão da causa, com base na sua relevância jurídica e tendo em consideração as várias soluções plausíveis das questões de Direito suscitadas pelas partes, bem como o dever de discriminar os factos provados e não provados. Porém, o Tribunal Arbitral não tem um dever de pronúncia quanto a toda a matéria de facto alegada pelas partes, em conformidade com o disposto no nº 2 do 123.º do CPPT e  no nº 1 do  596.º, vem como no nº 3 do art. 607º, ambos do CPC, aplicáveis ex  alíneas a) e e) do nº 1 do art. 29º   do RJAT.~

 

O Tribunal formou a sua íntima e prudente convicção quanto aos factos provados , considerando como provados  os factos em que se demonstrou acordo das partes nesse sentido, e também quanto aos não provados .

 

Essa convicção foi extraída do   exame de todos os elementos probatórios carreados aos autos, que foram apreciados e avaliados com base no princípio da livre apreciação dos factos e nas regras da experiência, normalidade e racionalidade, em conformidade com os ditames fixados na alínea e) do art.  16.º, do RJAT e  nos nºs 4e 5 do 607.ºdo CPC aplicáveis ex vi alínea e) do nº 1 do art. 9º  do RJAT.

9. Direito aplicável 

Nos pedidos de pronúncia arbitral que tenham por objeto a apreciação da legalidade dos atos tributários previstos no artigo 2.º, o dirigente máximo do serviço da administração tributária pode, no prazo de 30 dias a contar do conhecimento do pedido de constituição do tribunal arbitral, proceder à revogação, ratificação, reforma ou conversão do ato tributário cuja ilegalidade foi suscitada, praticando, quando necessário, ato tributário substitutivo, devendo notificar o presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) da sua decisão, iniciando-se então a contagem do prazo referido na alínea c) do n.º 1 do art. 1º. 

Não ,tendo a Requerida revogado o ato impugnado dentro desse prazo mas posteriormente, após a constituição do Tribunal Arbitral, é responsável pelo pagamento da totalidade das custas processuais.

 

10. Valor do processo 

Fixa-se o valor do processo em €   9.253,44 €,  nos termos do disposto no artigo 32.º , do CPTA artigo 97.º-A do CPPT, aplicáveis por força do disposto nas alíneas a) e b) do  nº 1 do  art. 29.º,  do RJAT e no  n.º 2 do art. 3º , do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).

 

8. Custas 

Nos termos da Tabela I anexa ao RCPAT, as custas são no valor de €918,00 (novecentos e dezoito euros) a suportar pela Requerida, conformemente ao disposto no nº 2 do art-12.º, n.º 2, e nº 4 do art. 22º do RJAT, e n.º 5  do art – 24º  do RCPAT.

Notifique-se

 

Lisboa,   11 de novembro  de 2025

 

 

O árbitro singular 

 

(António Lima Guerreiro)