Jurisprudência Arbitral Administrativa


Processo nº 402/2022-A
Data da decisão: 2023-06-19  Relações júrídicas de emprego público 
Valor do pedido: € 30.000,01
Tema: Contrato de trabalho em funções públicas – Subsídio substitutivo do direito à residência obrigatória
Versão em PDF

 

 

 

DECISÃO ARBITRAL

 

     I.         RELATÓRIO

 

No dia 22.09.2022, A..., B..., C..., D... e E... (“Demandantes”), melhor identificados a fls. 1 da Petição Inicial apresentada nos autos, instauraram, junto deste CAAD, Acção Administrativa, aí identificando como Demandado o Ministério da Justiça.

 

A final, peticionaram os Demandantes que fosse/seja:

 

“a) Reconhecido aos Demandantes o direito a residência obrigatória, com fundamento no art.º 31º, do Decreto-lei n.º 215/2012, de 28 de setembro;

 

b) Condenada a entidade demandada a pagar aos Demandantes o subsídio substitutivo do direito à residência obrigatória no valor idêntico aos valores que são atribuídos aos restantes trabalhadores, com fundamento no n.º 3, do art.º 31º, do Decreto-lei n.º 215/2012, de 28 de setembro e no montante de um “subsídio” de valor idêntico a 15% do valor da retribuição mensal base, nos termos aliás definidos pelo Decreto-lei n.º 140-B/86, de 14 de junho;

 

c) Intimado o Diretor Geral do Reinserção e Serviços Prisionais a emitir despacho de atribuição ao Demandantes do subsídio em causa, com efeitos reportados a setembro 2020, data do primeiro requerimento.”

 

Regularmente citado, veio o Demandado, em 20.10.2022, deduzir Contestação, aí se defendo por Impugnação (cfr. artigos 12.º a 51.º), requerendo, a final:

 

“a) O presente pedido de intervenção do Tribunal Arbitral, no que tange à Direção Geral Reinserção e Serviços Prisionais deve ser julgada totalmente improcedente, uma vez que não assiste aos Demandantes qualquer razão, pois todos os procedimentos legalmente exigíveis à DGRSP, foram legal e corretamente prosseguidos;

 

b) Não existe fundamento fático e legal que sustente o alargamento do direito de residência obrigatória aos Demandantes, ao abrigo do disposto no nº3 do artigo 31º do Decreto-Lei nº 215/2012, de 28 de setembro, conforme resulta do teor das informações nº IDGRSP/2021/... e I-DGRSP/2022/...;

 

c) Não existe no caso em apreço, uma situação geradora de desigualdade, no sentido de discriminatória e arbitrária, tendo presente às diferentes funções e conteúdo funcional dos grupos profissionais em causa, num caso Profissionais de saúde e, noutro caso, dos Demandantes Técnicos Superiores de Reeducação, a natureza da unidade orgânica onde exercem funções (Hospital Prisional), por um lado, e, por outro lado, o normativo legal aqui aplicável (artigo 31º do Decreto Lei n~215/2012, de 28 de setembro);

 

d) O Despacho de aqui em discussão, observa todos os requisitos e fundamentos essenciais e não enferma de qualquer vício formal ou material, pelo que deverá ser mantido nos exatos termos em que foi exarado”

 

Por Despacho datado de 05.12.2022, determinou-se a notificação dos Demandantes nos seguintes termos:

 

“I. Do Valor da Acção

Na sua Petição Inicial, os Autores indicam como valor da Acção o montante de € 30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo), considerando a “acção de valor indeterminável”.

De acordo com o artigo 34.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, “Consideram-se de valor indeterminável os processos respeitantes a bens imateriais e a normas emitidas ou omitidas no exercício da função administrativa, incluindo planos urbanísticos e de ordenamento do território.”

Sucede, porém, que os pedidos formulados pelos Autores têm um conteúdo económico e são susceptíveis de avaliação económica, conforme resulta de forma clara do disposto nos artigos 22.º, 38.º, 39.º, 42.º, 49.º, 62.º e 63.º, da Petição Inicial, bem como dos pedidos constante das alíneas b) e c), pelo menos no que respeita ao período compreendido entre Setembro de 2020 e Setembro de 2022, data da instauração da presente Acção.

Ora,

Nos termos do disposto no artigo 32.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, “Quando pela ação se pretenda obter o pagamento de quantia certa, é esse o valor da causa.”

Em face do exposto, convidam-se os Autores a vir corrigir o Valor atribuído à presente Acção, na medida em que considera este Tribunal Arbitral que os pedidos em causa são susceptíveis de concretização e fixação dos respectivos quantitativos, pelo menos no que respeita ao período compreendido entre Setembro de 2020 e Setembro de 2022, data da instauração da presente Acção.

Prazo: 10 (dez) dias.

 

II. Da Ampliação da Instância

Em face do disposto nos artigos 4.º a 11.º, da Contestação, e, em especial, do Documento n.º 2, junto com a Contestação, convidam-se os Autores a dar cumprimento ao disposto no artigo 63.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, nos termos do qual: “Até ao encerramento da discussão em primeira instância, o objeto do processo pode ser ampliado à impugnação de atos que venham a surgir no âmbito ou na sequência do procedimento em que o ato impugnado se insere, assim como à formulação de novas pretensões que com aquela possam ser cumuladas.”

PRAZO: 10 (dez) dias.”

 

A 16.12.2022, por Requerimento, os Demandantes requereram a correcção do valor da Acção para € 23.581,51 (vinte e três mil, quinhentos e oitenta e um euros e cinquenta e um cêntimos).

 

Mais requereram a Ampliação da Instância relativamente ao Documento n.º 2, junto com a Contestação, consubstanciado no Despacho da Exma. Sra. Subdirectora-Geral, Dra..., datado de 12.10.2022, exarado sobre a Informação n.º I-DGRSP/2022/..., de 07.10.2022.

 

Por Despacho datado de 19.12.2022, determinou-se a notificação do Demandado nos seguintes termos: “Ordene-se a notificação do Demandado para, no prazo de 10 (dez) dias, se pronunciar: i) sobre a rectificação do valor da Acção efectuado pelos Demandantes; e ii) sobre o Pedido de Ampliação da Instância deduzido pelos Demandantes.”

 

Em 09.01.2023, por Requerimento, o Demandado veio opor-se à aplicabilidade do disposto no artigo 63.º, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (“CPTA”) – em termos que configuram uma Questão Prévia/Excepção –, e, bem assim, e por cautela, opor-se à pretensão impugnatória dos Demandantes relativamente ao sobredito Despacho da Exma. Sra. Subdirectora-Geral, Dra..., datado de 12.10.2022, exarado sobre a Informação n.º I-DGRSP/2022/..., de 07.10.2022.

 

Notificados para se pronunciarem por Despacho de 10.01.2023, vieram os Demandantes, alternativamente à posição assumida no Requerimento de 16.12.2022, pugnar pela aplicação, alternativa, do disposto no artigo 70.º, do CPTA, e, subsidiariamente, pela aplicação do disposto no artigo 265.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.

 

Por Despacho de 27.01.2023, remeteu-se “o conhecimento da matéria de Excepção (Questões Prévias) para a Decisão que vier a ser emitida a final, nos termos do disposto no artigo 18.º, n.º 5, do Novo Regulamento de Arbitragem Administrativa”, mais se determinando o seguinte:

 

“2.

Na Petição Inicial apresentada, os Autores requereram a prestação de Declarações de Parte, sem, todavia, darem cumprimento ao disposto nos artigos 466.º, n.º 2, e 452.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, aplicáveis subsidiariamente.

Na Petição Inicial, os Autores também indicaram uma Testemunha, protestanto indicar a morada correcta, o que, até ao momento, não fizeram.

Determina-se, assim, a notificação dos Autores para, no prazo de 10 (dez) dias, requererem o que tiveram por conveniente nesse âmbito.

 

3.

No mesmo prazo de 10 (dez) dias, e uma vez que se encontra finda a fase dos Articulados, vão as Partes notificadas para, ao abrigo do disposto no artigo 18.º, n.º 4, do Novo Regulamento de Arbitragem Administrativa, se pronunciarem sobre a possibilidade de este Tribunal proferir Decisão com base na prova documental e nos restantes elementos juntos ao processo.”

 

O Demandado pronunciou-se, por Requerimento datado de 01.02.2023, no sentido de que “o estado dos autos permite conhecer totalmente do mérito da causa, atenta a matéria de facto alegada e questões de direito a decidir, a entidade demandada não se opõe que o Douto Tribunal possa proferir de imediato decisão com base na prova documental e nos restantes elementos juntos ao processo”.

 

Já os Demandantes pronunciaram-se por Requerimento datado de 06.02.2023, nos termos que, por economia processual, aqui se dão por integralmente reproduzidos e articulados.

 

Por Despacho de 22.04.2023, considerou este Tribunal Arbitral que: “os elementos constantes dos autos, mormente a Prova Documental, é suficiente e bastante para conhecer das Excepções e, eventualmente, do Mérito da Causa. Assim, e nos termos do disposto no artigo 18.º, n.º 4, do Novo Regulamento de Arbitragem Administrativa, este Processo Arbitral será conduzido com base na prova documental e nos restantes elementos juntos ao Processo, de acordo com os princípios da livre apreciação de prova e da autonomia do Tribunal Arbitral na condução do Processo.”

 

Em face do exposto, determinou-se: “a notificação das Partes para, nos termos do disposto no artigo 24.º, do Novo Regulamento de Arbitragem Administrativa, apresentarem, simultâneamente, e pelo prazo de 15 (quinze) dias, Alegações Finais Escritas, das quais conste, designadamente, a Matéria de Facto que consideram Provada e Não Provada, assim como a súmula das respectivas Razões de Direito, com Conclusões.”

 

Demandantes e Demandado apresentaram as suas Alegações Finais Escritas, ambos em 09.05.2023, as quais, por economia processual, aqui se dão por integralmente reproduzidas e articuladas.

 

   II.         SANEAMENTO DO PROCESSO

 

A.   LEGITIMIDADE

 

Nos termos da aplicação conjugada do disposto nos artigos 8.º-A, n.º 1 e n.º 2, e 9.º, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (de ora em diante abreviadamente designado por “CPTA”), os Demandantes são dotados de Personalidade e Capacidade Judiciária, bem como de Legitimidade Activa.

 

O Demandado, o Ministério da Justiça, é dotado de Personalidade e Capacidade Judiciária, bem como de Legitimidade Passiva nos termos do disposto nos artigos 8.º-A, n.º 3, e 10.º, n.º 2 e n.º 4, do CPTA.

 

Este Tribunal Arbitral é competente, nos termos enunciados no intróito da Petição Inicial, competência, essa, reconhecida pelo Demandado na sua Contestação, porquanto a mesma não foi negada.

 

Nos termos da aplicação conjugada do disposto nos artigos 31.º e 34.º, n.º 1 e n.º 2, do CPTA, fixa-se à presente Acção Arbitral o valor de € 23.581,51 (vinte e três mil, quinhentos e oitenta e um euros e cinquenta e um cêntimos).

 

B.    DA PROVA DOCUMENTAL

 

Admitem-se todos os documentos juntos aos autos pelos Demandantes, e, bem assim, pelo Demandado, designadamente o Processo Administrativo Instrutor, junto aos autos por Requerimento de 12.12.2022.

 

C.   DA QUESTÃO PRÉVIA / EXCEPÇÃO

 

Sob a Epígrafe “Alteração da Instância”, estatui o artigo 70.º, do CPTA, que:

 

“1 - Quando a pretensão do interessado seja indeferida na pendência de processo intentado em situação de inércia ou de recusa de apreciação de requerimento, pode o autor alegar novos fundamentos e oferecer diferentes meios de prova em favor da sua pretensão.

2 - A faculdade conferida pelo número anterior é extensiva aos casos em que o indeferimento seja anterior, mas só tenha sido notificado ao autor após a propositura da ação.

3 - Quando, na pendência do processo, seja proferido um ato administrativo que não satisfaça integralmente a pretensão do interessado, o autor pode promover a alteração do objeto do processo, para o efeito de pedir a anulação parcial do novo ato ou a condenação da entidade demandada à prática do ato necessário à satisfação integral da sua pretensão.

4 - Em todas as situações previstas nos números anteriores, o autor deve apresentar articulado próprio no prazo de 30 dias, contado desde a data da notificação do ato, considerando-se como tal, quando não tenha havido notificação, a data do conhecimento do ato obtido no processo.”

 

Como o Demandado reconhece de artigos 4.º a 11.º, da Contestação, em concreto no artigo 11.º,

 

“Em suma, somente neste momento temporal, foi exarado ato final, sobre os pedidos de alargamento do direito de residência obrigatória aos requerentes, ao abrigo do disposto no nº3 do artigo 31º do Decreto-Lei nº 215/ 2012, de 28 de setembro.”

 

Em face do exposto, releva, in casu, o disposto no artigo 70.º, n.º 1 e n.º 2, do CPTA, já que foi só após a instauração da presente Acção – 22.09.2022 – que foi proferido o Despacho da Exma. Sra. Subdirectora-Geral, Dra..., datado de 12.10.2022, exarado sobre a Informação n.º I-DGRSP/2022/..., de 07.10.2022, sobre o qual foram decididos os Requerimentos a que os Demandantes se reportam nos artigos 23.º a 27.º, da Petição Inicial.

 

Considera-se, assim, que a presente Instância Arbitral sofreu uma Alteração, promovida pelos Demandantes em 16.12.2022, a convite deste Tribunal Arbitral, relativamente ao Pedido inicialmente formulado, passando assim a presente instância arbitral a ser uma de Impugnação de Acto Administrativo, consubstanciado no Despacho da Exma. Sra. Subdirectora-Geral, Dra..., datado de 12.10.2022, exarado sobre a Informação n.º I-DGRSP/2022/..., de 07.10.2022,

 

 III.         DECISÃO

 

A.   QUESTÕES A DECIDIR

 

Cabe a este Tribunal Arbitral apreciar e decidir se deve ser anulado o Acto Administrativo consubstanciado no Despacho da Exma. Sra. Subdirectora-Geral, Dra. ..., datado de 12.10.2022, exarado sobre a Informação n.º I-DGRSP/2022/..., de 07.10.2022.

 

E, acto contínuo, se têm os Demandantes direito a que:

 

i)      Seja reconhecido aos Demandantes o Direito a Residência Obrigatória, com fundamento no disposto no artigo 31.º, do Decreto-Lei n.º 215/2012, de 28 de Setembro (na versão conferida pela Rectificação n.º 63/2012, de 6 de Novembro);

 

ii)    Ser o Demandado condenado a pagar aos Demandantes o Subsídio Substitutivo do Direito à Residência Obrigatória, de valor idêntico aos valores que são atribuídos aos restantes Trabalhadores, nos termos e com os fundamentos previstos no artigo 31.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 215/2012, de 28 de Setembro (na versão conferida pela Rectificação n.º 63/2012, de 6 de Novembro) e no montante de um Subsídio de valor idêntico a 15% do Valor da Retribuição Mensal base, nos termos do disposto no Decreto-Lei n.º 140-D/86, de 14 de Junho, com valores reportados a Setembro de 2020.

 

B.    FACTOS PROVADOS

 

Com relevância para a Decisão Arbitral a proferir, consideram-se provados os seguintes factos:

 

1.     Os Demandantes estão vinculados ao mapa de pessoal da DGRSP, na carreira técnica superior de reeducação ao abrigo de Contrato de Trabalho em Funções Públicas, na modalidade de tempo indeterminado, desde: A...- 16 de Novembro de 2020; B...- 16 de Novembro de 2020 C...- 3 de Maio de 2010; D...- 1 de Outubro de 1991; E... - 3 de Maio de 2010;

 

2.     Os Demandantes exercem funções correspondentes à categoria de Técnico Superior de Reeducação (TSR), no Hospital Prisional ...;

 

3.     O vencimento mensal base ilíquido dos Demandantes é de A...- € 1.389,64; B... € 1.389,64; C...- € 1.441,74; D... - € 1.945,49; E...- € 1.441,74, a que acresce o subsídio de refeição e o subsídio de risco (valor fixo de € 142,44);

 

4.     O período normal semanal de trabalho dos Demandantes é de 35 horas semanais;

 

5.     Os Demandantes (TSR) exercem também funções profissionais na Clínica de Psiquiatria e Saúde Mental do Hospital, no âmbito da Lei de Saúde Mental.

 

C.   DA DECISÃO STRICTO SENSU

 

Sob a Epígrafe “Residência Obrigatória”, dispõe o artigo 31.º, do Decreto-Lei n.º 215/2012, de 28 de Setembro (na versão conferida pela Rectificação n.º 63/2012, de 6 de Novembro), que:

 

“1 - Têm residência obrigatória junto dos estabelecimentos prisionais os diretores, os adjuntos, os médicos e enfermeiros, o pessoal do Corpo da Guarda Prisional, os coordenadores técnicos, os assistentes técnicos com funções de tesoureiro e os assistentes operacionais que ocupem postos de trabalho de cozinheiro, de fogueiro, de eletricista e de auxiliar de ação médica.

2 - O pessoal do Grupo de Intervenção e Segurança Prisional e do Grupo Operacional Cinotécnico está também sujeito a residência obrigatória junto das respetivas unidades orgânicas.

3 - A obrigatoriedade de residência junto dos estabelecimentos prisionais pode ser alargada a outros trabalhadores, por despacho do membro do Governo responsável pela área da justiça, sob proposta fundamentada do diretor-geral.” (destacado nosso).

 

Por seu turno, estatui o artigo 2.º, do Regulamento n.º 299/2022, de 25 de Março, publicado no Diário da República n.º 60/2022, Série II, de 25.05.2022, sob a Epígrafe “Casas de Função”, que:

 

“1 - As casas de função pertencentes aos estabelecimentos prisionais destinam-se ao pessoal abrangido pelo disposto no n.º 1 e no n.º 2 do artigo 31.º do Decreto-Lei 215/2012, de 28 de setembro.

 

2 - A obrigatoriedade de residência junto dos estabelecimentos prisionais pode ser alargada a outros trabalhadores, nos termos consagrados no n.º 3 do artigo 31.º do Decreto-Lei 215/2012, de 28 de setembro.

 

3 - As casas de função pertencentes aos centros educativos ou afetas à atividade da reinserção podem ser atribuídas, por interesse do serviço:

 

a) Aos trabalhadores providos em cargos dirigentes dos centros educativos, equipas de reinserção social e equipas de vigilância eletrónica;

 

b) Aos técnicos superiores de reinserção social e técnicos profissionais de reinserção social, que desempenhem funções em regime de laboração contínua ou por turnos.

 

4 - A atribuição de casas de função dos centros educativos e das casas de função afetas à atividade da reinserção social poderá ainda ser alargada a outros trabalhadores da reinserção social abrangidos pelo regime de laboração contínua, que pratiquem horário de trabalho por turnos ou que, pelas funções que desempenham, tenham de ser chamados frequentemente para satisfazer necessidades urgentes e/ou inadiáveis, fora do período normal de laboração.

 

5 - Considera-se ainda existir interesse do serviço, para efeito da atribuição de casa de função da reinserção social, sempre que o trabalhador, no interesse do serviço, for afeto a unidade orgânica distante da sua residência habitual.” (destacado nosso).

 

Os Demandantes fundamentam a sua pretensão com apoio na natureza das funções inerentes ao Técnico Superior de Reeducação, dirigidas ao acompanhamento individual do recluso, durante o cumprimento das penas e medidas privativas da liberdade, em obediência ao disposto no Código de Execução de Penas e Medidas Privativas da Liberdade, aprovado pela Lei n.º 115/2009, de 12 de Outubro (na versão conferida pela Lei n.º 27/2019, de 28 de Março) e no Regulamento Geral dos Estabelecimentos Prisionais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 51/2011, de 11 de Abril (na versão conferida pelo Decreto-Lei n.º 58/2022, de 8 de Setembro).

 

A competência para o Alargamento da Residência Obrigatória, de acordo com o artigo 31.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 215/2012, de 28 de Setembro (na versão conferida pela Rectificação n.º 63/2012, de 6 de Novembro), é do Director-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, de acordo com o Despacho n.º 1996/2020, de 29 de Janeiro, publicado no Diário da República n.º 29/2020, Série II, de 11 de Fevereiro de 2020 – vide n.º 1, alínea k). 

 

As Funções desempenhadas/desenvolvidas pelos Técnicos Superiores de Reeducação encontram-se plasmadas no Decreto-Lei n.º 346/91, de 18 de Setembro, designadamente no MAPA I, onde, sob a Epígrafe “Caracterização genérica do conteúdo funcional dos técnicos superiores de reeducação a que se refere o n.º 2 do artigo 1.º”, se lê:

 

“Propor e desenvolver as actividades necessárias ao acolhimento dos reclusos em colaboração com o Instituto de Reinserção Social e os restantes serviços do estabelecimento.

 

Conceber, adoptar e ou aplicar métodos e processos técnico-científicos considerados mais adequados ao acompanhamento dos reclusos durante a execução das medidas privativas de liberdade, nomeadamente no que respeita à elaboração e actualização do plano individual de readaptação e à emissão de pareceres legalmente exigidos ou superiormente solicitados.

 

Prestar às direcções dos estabelecimentos a assessoria técnica necessária à execução do plano individual de tratamento dos detidos, nomeadamente no que concerne à colocação laboral, à frequência de cursos escolares e de formação profissional, à aplicação de sanções disciplinares e a alterações do regime de cumprimento de pena.

 

Apoio técnico aos tribunais de execução de penas através da elaboração de relatórios, emitindo pareceres sobre a evolução da personalidade dos reclusos, durante a execução da pena, de modo a habilitar os respectivos juízes a avaliar a persistência ou não de perigosidade e a viabilidade da sua reinserção social.

 

Elaboração de programas e execução de estudos psico-sociais e acompanhamento individual dos delinquentes.

 

Concepção e ou desenvolvimento de projectos de actuação a nível de grupos específicos em risco psico-afectivo, designadamente toxicodependentes, portadores de doenças transmissíveis, jovens adultos e doentes mentais.

 

Conceber programas de prevenção primária e secundária, nomeadamente de consultas, tratamento e apoio permanente a reclusos em risco e ou consumidores de drogas.

 

Organizar e dinamizar actividades culturais recreativas, formativas e de educação física, com a participação dos reclusos, com vista à ocupação dos tempos livres e à promoção da vertente psico-social dos mesmos.

 

Organizar o contacto dos reclusos com o meio exterior, incentivando a troca de correspondência e o convívio periódico com familiares e amigos.

 

Organizar cursos escolares de diferentes graus de ensino, estimular os reclusos à sua frequência e estabelecer os contactos necessários com o Ministério da Educação.

 

Fomentar o acesso dos reclusos aos meios de comunicação social por forma a mantê-los informados dos acontecimentos relevantes da vida social.

 

Estimular a participação de grupos de voluntários da comunidade na vida prisional em ordem a viabilizar a ressocialização futura dos reclusos.

 

Organizar estudos estatísticos e elaborar planos e relatórios das actividades.”

 

De acordo com o artigo 22.º, do Decreto-Lei n.º 3/2014, de 9 de Janeiro, na versão conferida pelo Decreto-Lei n.º 118/2021, de 16 de Dezembro, “Os trabalhadores do CGP têm residência obrigatória junto da unidade orgânica onde exercem funções, tendo direito ao abono de suplemento de renda de casa, nos termos e condições a fixar em despacho dos membros do Governo responsáveis pelas áreas da justiça, das finanças e da Administração Pública.”

 

De acordo com o artigo 54.º, desse Diploma Legal, “Os trabalhadores do CGP têm direito a um suplemento de renda de casa, como compensação do dever de residência obrigatória previsto no artigo 22.º, o qual se rege pelo disposto no Decreto-Lei n.º 140-B/86, de 14 de junho, e legislação complementar.”

 

Cumpre então apreciar se se verificam os pressupostos para que haja alargamento, aos Demandantes, do Direito de Residência Obrigatória, previsto no artigo 31.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 215/2012, de 28 de Setembro (na versão conferida pela Rectificação n.º 63/2012, de 6 de Novembro).

 

Os Técnicos Superiores de Reeducação desempenham funções que não implicam a necessidade de residência obrigatória junto do Estabelecimento Prisional, in casu do Hospital Prisional, em termos que se possam considerar abrangidos pelo artigo 31.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 215/2012, de 28 de Setembro (na versão conferida pela Rectificação n.º 63/2012, de 6 de Novembro), pelo que não se vislumbra a existência de fundamentos de interesse público que lhes permitam o alargamento previsto no mencionado artigo, ou seja, o alargamento do Direito de Residência Obrigatória junto a Estabelecimento Prisional dos Demandantes.

 

Os Técnicos Superiores de Reeducação, não integrando nenhum dos Grupos com Residência Obrigatória previstos nos n.ºs 1 e 2, do artigo 31.º, do Decreto-Lei n.º 215/2012, de 28 de Setembro (na versão conferida pela Rectificação n.º 63/2012, de 6 de Novembro), e não exercendo funções que impliquem a necessidade de residência obrigatória junto do Estabelecimento Prisional, in casu do Hospital Prisional, não podem ver alargado o “direito” previsto no n.º 3, desse artigo.

 

Acresce, ademais, e sem prejuízo do exposto, que o n.º 3, do artigo 31.º, do Decreto-Lei n.º 215/2012, de 28 de Setembro (na versão conferida pela Rectificação n.º 63/2012, de 6 de Novembro), é muito claro ao estatuir que o alargamento a outros Trabalhadores para além dos mencionados nos n.ºs 1 e 2, depende de motivos de “interesse do serviço”, nos termos da aplicação conjugada com o n.º 2, do artigo 2.º, do Regulamento n.º 299/2022, de 25 de Março, publicado no Diário da República n.º 60/2022, Série II, de 25.05.2022, e, nessa medida, estamos perante a chamada Reserva de Discricionariedade Administrativa, a qual só é sindicável em caso de erro grosseiro, manifesto, evidente e/ou palmar – erro a incidir nos pressupostos de direito e/ou de facto –, o que não ocorre no caso vertente e nem sequer foi invocado.

 

Nessa medida, falece o primeiro fundamento impugnatório apresentado pelos Demandantes.

 

Relativamente à alegada violação do Princípio da Igualdade, pelo Demandado, por este ter efectuado o Alargamento do Dever de Residência a um conjunto de outros Trabalhadores, não o fazendo para os Demandantes.

 

A Fundamentação para o Alargamento a esses outros Trabalhadores (Profissionais de Saúde) consta das Informações n.º I-DGRSP/2020..., I-DGRSP/2021/...e I-DGRSP/2022/....

 

Compulsado o teor dessas Informações, resulta das mesmas que a natureza das Funções exercidas por esses Profissionais de Saúde é distinta das que são desempenhadas pelos Demandantes.

 

Não existe similitude nas Funções desempenhadas, sendo as mesmas de distinta natureza e conteúdo funcional, pelo que não se pode concluir no sentido pretendido pelas Demandantes, ou seja, o Acto Administrativo Impugnado não efectuou qualquer tratamento diferenciado e injustificado em termos que se possam ter como violadores do Princípio da Igualdade.

 

Compulsado o teor da Fundamentação do Acto Administrativo em Impugnação nestes autos arbitrais e cotejada a mesma com o teor das sobreditas Informações n.º I-DGRSP/2020/..., I-DGRSP/2021/... e I-DGRSP/2022/..., constata-se que do mesmo consta um fundamentação clara, suficiente, congruente e bastante, no sentido quer da demonstração da não verificação dos pressupostos de aplicação do Alargamento previsto no artigo 31.º, n.º 3, do do Decreto-Lei n.º 215/2012, de 28 de Setembro (na versão conferida pela Rectificação n.º 63/2012, de 6 de Novembro), quer da distinta natureza das Funções exercidas pelos Demandantes em cotejo com os demais Profissionais de Saúde que beneficiaram desse Alargamento.

 

Por tudo o exposto,

 

Julga-se a presente Acção como totalmente improcedente, determinando-se a absolvição do Demandado dos pedidos formulados.

 

Em matéria de custas, observe-se o disposto no artigo 29.º, n.º 5, do Novo Regulamento de Arbitragem Administrativa.

 

19 de Junho de 2023

 

O Árbitro,

 

 

 

 

Diogo Pereira da Costa