Jurisprudência Arbitral Administrativa


Processo nº 54/2013-A
Data da decisão: 2014-03-28  Relações júrídicas de emprego público 
Valor do pedido: € 30.000,01
Tema: Pedido de promoção de funcionário. Pagamento da diferença remuneratória mensal correspondente ao reconhecimento do direito de acesso à categoria superior
Versão em PDF

 

CAAD: Arbitragem Administrativa

Processo n.º: 54/2013-A

Tema: Pedido de promoção de funcionário. Pagamento da diferença remuneratória mensal correspondente ao reconhecimento do direito de acesso à categoria superior

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


CAAD

Proc. n.º 54/2013-A

 

 

I – RELATÓRIO

 

O Sindicato dos Trabalhadores … (DEMANDANTE) veio, em representação de um conjunto de associados, pedir a condenação do Instituto …, I. P. (DEMANDADA), a promover a publicação em Diário da República de uma lista dos funcionários promovidos à categoria de … superiores que incluísse os ditos associados.

Pediu ainda a DEMANDANTE:

  1. A condenação da DEMANDADA ao pagamento das diferenças remuneratórias devidas desde a produção de efeitos da promoção, acrescidas dos juros de mora vencidos e vincendos até ao integral pagamento.
  2. A aplicação do art. 19.º da Lei do Orçamento para 2011 apenas às diferenças remuneratórias devidas posteriormente a Dezembro de 2010 e respeitando a natureza mensal dessas diferenças em sede de aplicação das reduções de vencimento; relativas a
  3. A imposição de uma sanção pecuniária compulsória até à publicação oficial da lista de promoções e/ou ao pagamento das diferenças remuneratórias.

 

*

 

Na sua Contestação, a DEMANDADA invocou ter já sido efectuada a publicação em Diário da República das promoções dos associados representados na acção, assim como o pagamento das diferenças remuneratórias, factos que constituiriam excepção peremptória determinante de absolvição do pedido nessa parte. Tal não ocorreu apenas relativamente a uma funcionária (A…), que não reunia o tempo de serviço legalmente exigido para a promoção, pelo que também nesta parte o pedido deve improceder.

Quanto aos pedidos de pagamento de juros de mora e de imposição de sanção pecuniária compulsória, deverão igualmente ser julgados improcedentes, por carência dos necessários pressupostos.

 

*

Em resposta à excepção peremptória invocada quanto ao pedido referente a A…, a DEMANDANTE veio sustentar que o período oficialmente contado de 9 anos, 12 meses e 3 dias de serviço equivale a 10 anos e 3 dias, devendo, pois, julgar-se procedente o pedido formulado relativamente à dita funcionária.

 

 

*

 

Atendendo à publicação oficial das promoções e ao pagamento das correspondentes diferenças remuneratórias, a DEMANDANTE veio modificar a sua petição, ao abrigo do disposto no n.º 3 do art. 15.º do Regulamento de Arbitragem do CAAD, passando a formular os seguintes pedidos:

  1. Condenação da DEMANDADA a publicar em Diário da República, no prazo de 15 dias, a promoção da funcionária A… a … superior;
  2. Condenação da DEMANDADA ao pagamento, no prazo de 15 dias, aos funcionários representados na acção de todas as diferenças remuneratórias devidas em consequência da promoção – a título de vencimento de categoria e exercício, de emolumentos pessoais e de juros de mora – nos seguintes termos:
  1. Aplicação às diferenças remuneratórias relativas a cada um dos meses de 2010, 2011, 2012 e 2013 das taxas de retenção de IRS e das taxas de descontos para a CGA e para a ADSE que se encontrassem em vigor nesses diversos períodos;
  2. Aplicação da sobretaxa de IRS de 3,5% apenas à diferença remuneratória relativa aos meses de 2013;
  1. Imposição aos membros do Conselho Directivo da DEMANDADA de sanções pecuniárias compulsórias de € 48,50/dia, na falta de publicação da promoção da funcionária A… e/ou na falta do pagamento das diferenças remuneratórias devidas a todos os associados representados.

 

*

 

Respondendo aos novos termos da petição, a DEMANDADA vem invocar relativamente à funcionária A… a excepção peremptória de não verificação do pressuposto do tempo de serviço legalmente exigido. Relativamente a todos os funcionários representados pela DEMANDANTE, repete as excepções peremptórias já invocadas na contestação à primeira versão da petição inicial e sustenta a improcedência do pedido de condenação no pagamento de juros de mora e do pedido de imposição de sanções pecuniárias compulsórias.

 

 

 

II – QUESTÕES PRÉVIAS

O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é competente.

 

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas. Não se verificam nulidades, excepções ou questões prévias que impeçam o conhecimento do mérito.

 

*

 

III – QUESTÕES A DECIDIR

 

Atentos os termos definitivos da petição da DEMANDANTE, as questões materiais a decidir são as seguintes:

  1. Existência dos pressupostos para a promoção da funcionária A… à categoria de … superior;
  2. Direito dos funcionários ao pagamento de juros de mora em função das diferenças remuneratórias consequentes à promoção;
  3. Regime de IRS incidente sobre as diferenças remuneratórias a processadas na sequência da promoção dos funcionários a … superiores;
  4. Direito dos funcionários ao pagamento imediato dos emolumentos pessoais;
  5. Existência dos pressupostos para a imposição de sanções pecuniárias compulsórias aos membros do conselho directivo da DEMANDADA.

 

 

 

IV – OS FACTOS

 

Consideram-se provados os seguintes factos:

 

  1. Em 31 de Dezembro de 2010, tinham sido contados à funcionária A… 9 anos, 12 meses e 3 dias de serviço, conforme a lista de antiguidade constante do processo administrativo.
  2. A dita funcionária tinha a classificação de serviço de 3,840, homologada em 14 de Outubro de 2010, conforme comunicação dos serviços daq DEMANDADA.
  3. No Diário da República, 2ª Série, n.º …, de … de Dezembro de 2013, foi publicada a lista de funcionários da DEMANDADA promovidos à categoria de … superior, conforme deliberação do seu Conselho Directivo de 29 de Novembro de 2013.
  4. Dessa lista não fazia parte a funcionária A….
  5. Relativamente a cada um dos funcionários promovidos, a DEMANDADA processou, numa única prestação anexa ao vencimento de dezembro de 2013, as diferenças remuneratórias relativas ao período decorrido desde o momento em que reuniram as condições legalmente previstas para essa promoção, conforme resulta dos respectivos recibos de vencimento.
  6. No cálculo dessa prestação única, foram retirados os descontos para a CGA e a ADSE, segundo as taxas sucessivamente em vigor ao longo do período pelo qual são devidas as diferenças.
  7. Diversamente, quanto à retenção na fonte em sede de IRS foi aplicada uma única taxa, aquela em vigor no momento do pagamento da referida prestação única.
  8. Foi ainda aplicada ao montante processado a sobretaxa de IRS de 3,5%, prevista no art. 187.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro.
  9. Não foram ainda processados os abonos correspondentes aos emolumentos pessoais correspondentes ao período decorrente deste a data a que retroage a promoção, embora a DEMANDADA anuncie que efectuará esse processamento.
  10. A DEMANDADA não processou e não tem intenção de processar quaisquer quantias a título de juros de mora relativamente ao período decorrido entre o momento a que retroage a promoção e a data da publicação oficial da lista de funcionários promovidos.

 

 

V – O DIREITO

 

  1. Promoção da funcionária A…

Segundo a norma do n.º 3 do art. 6.º do Decreto-Lei n.º 131/91, de 2 de Abril, a promoção à categoria de … superior depende de dois requisitos:

  1. Permanência de 10 anos na categoria anterior;
  2. Classificação de serviço não inferior a “Bom”.

Relativamente ao primeiro requisito, a lista de antiguidade revela a contagem de 9 anos, 12 meses e 3 dias de serviço, reportados a 31 de Dezembro de 2010.

Segundo a DEMANDANTE, tal significa que o requisito legal estava preenchido em 29 de Dezembro de 2010.

Segundo a DEMANDADA, a DEMANDANTE ignora os critérios de contagem estabelecidos no art. 94.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º n.º 100/99, de 31 de Março, que manda converter os dias de serviço em anos, meses e dias à razão de 30 dias por cada mês e de 365 dias por cada ano. Assim, o requisito legal dos 10 anos só ficaria preenchido se a funcionária contasse 3650 dias de serviço. Ora, os 9 anos, 12 meses e 3 dias resultam da conversão de apenas 3648 dias de serviço.

Para dilucidar esta questão, deve ter-se presente que a norma do Decreto-Lei n.º 131/91 adopta como base da sua previsão normativa o ano – “pelo menos, 10 anos na categoria anterior” - , enquanto a norma do Decreto-Lei n.º 100/99 adopta como base o dia - “a antiguidade dos funcionários é calculada em dias”. Tudo está, pois, em saber como se opera a conversão de um conjunto de dias num conjunto de anos.

A este respeito, resulta do critério legal de conversão estabelecido pela norma do Decreto-Lei n.º 100/99 que o ano é ficcionado como um período de 365 dias e que o mês é ficcionado como um período de 30 dias. O ano e o mês são, pois, conceitos jurídicos de conteúdo uniforme e não realidades naturalísticas de extensão variável.

O que essa lei não diz é que o ano seja um período de 12 meses – de onde resultaria que uma vez completados 12 meses de um ano se entraria no ano seguinte. Não diz nem poderia logicamente dizer. Seria contraditório imputar ao ano 365 dias e, ao mesmo tempo, imputar-lhe 12 meses, pois a ficção legal conduz a que 12 meses equivalham apenas a 360 dias (12 x 30).

Numa palavra: para o Decreto-Lei n.º 100/99, os anos são múltiplos de dias, não são múltiplos de meses.

Assim, sempre que uma lei – como o Decreto-Lei n.º 131/91 - utilize na previsão normativa o ano (ou um dado número de anos) de serviço, a conversão dos dias segue o critério de a cada conjunto de 365 dias corresponder um ano. E sempre que uma lei utilize o mês (ou um dado número de meses), segue-se o critério de a cada conjunto de 30 dias corresponder um mês. O que não é possível é mesclar os critérios e preencher anos segundo o critério disposto para preencher meses, ou seja, converter doze grupos de 30 dias noutros tantos meses e seguidamente imputar ao ano seguinte os dias em excesso, esquecendo que para a lei o ano são 365 dias, não são doze grupos de 30 dias.

O equívoco da DEMANDANTE é repousar o seu raciocínio na existência de uma sequência dia-mês-ano, organizada segundo um modelo de múltiplos perfeitos (como o sistema métrico, p. ex., em que após cada sequência de dez unidades se passa à unidade superior), de onde resultaria que após uma sequência de 30 dias se passaria ao mês seguinte e que após doze meses se passaria ao ano seguinte. A realidade é que a lei, para efeitos de cômputo do tempo de serviço, constrói duas sequências autónomas, a sequência dia-mês e a sequência dia-ano, em termos tais só que se passa ao ano seguinte após uma sequência de 365 dias, independentemente do que suceda na sequência dia-mês. Assim, os dias que excedam uma sequência de doze meses não pertencem necessariamente ao ano seguinte: apenas pertencem na medida em que excedam 365 dias.

Logo, é irrelevante que a conversão em meses do tempo de serviço da funcionária A… exceda os doze meses. Doze meses, repita-se, não equivale a um ano para estes efeitos: o que equivale a um ano são 365 dias. Se a funcionária não conta 3650 dias, mas apenas 3648, não preenche o requisito dos 10 anos de serviço na categoria anterior.

É verdade que a classificação de serviço da funcionária, devidamente convertida para a escala qualitativa que era utilizada no Decreto-Lei n.º 131/91, satisfaz a exigência mínima de “Bom”: de facto, uma classificação de  3,840 correspondia a “Bom” até 2007 (art. 6.º, n.º 2, do Decreto Regulamentar n.º 19-A/2004, de 14 de Maio) e corresponde hoje à categoria equivalente de “Desempenho Adequado” (art. 50º, n.º 4, da Lei n.º 66-B/2007). Mas falta sempre, como se viu, o requisito cumulativo dos 10 anos de serviço para que se constitua o direito da funcionária a aceder à categoria superior.

Dado o exposto, improcede o pedido da DEMANDANTE na parte relativa à promoção de A….

 

2. Juros de mora relativos às diferenças remuneratórias

A DEMANDANTE sustenta que há lugar ao pagamento de juros de mora calculados em função das diferenças remuneratórias devidas desde o momento em que se verificaram relativamente a cada funcionário os pressupostos do direito de acesso à categoria superior até ao momento em que tais quantias foram efectivamente pagas.

Contesta a DEMANDADA, invocando o regime do art. 6.º do Decreto-Lei n.º 131/91, do qual decorreria, na sua interpretação, que só com a publicação da lista dos promovidos em Diário da República se produzem os efeitos do acesso, incluindo o direito ao pagamento das diferenças remuneratórias. Portanto, a publicação é o momento que marca o nascimento da dívida da DEMANDADA - sem prejuízo de essa dívida ter por conteúdo as diferenças remuneratórias correspondentes ao período que se estende até à reunião dos pressupostos da promoção.

Atentemos no disposto nos n.ºs 3 e 4 do art. 6.º do Decreto-Lei n.º 131/91:

“3 - O acesso a … superior fica condicionado à permanência de, pelo menos, 10 anos na categoria anterior e à classificação de serviço não inferior a Bom, segundo a ordem de graduação estabelecida pelo Conselho Técnico dos ….

“4 - O acesso a que se refere o número anterior produz efeitos independentemente de quaisquer formalidades, excepto publicação no Diário da República, e retroage à data em que o funcionário adquiriu direito à categoria superior.”

Como resulta dos termos expressos da parte final da norma do n.º 4, o direito à categoria superior é adquirido no momento em que o funcionário reúne os pressupostos do tempo de serviço e da classificação. E se pode haver deveres sem direitos, a inversa é impossível: a constituição do direito na esfera jurídica do funcionário tem de ocorrer em simultâneo com o aparecimento do correspondente dever na esfera da Administração.

Em que comportamentos se traduz o dever da Administração?

Uma vez que o acesso está dependente de uma formalidade, que é a publicação oficial, o dever tem por conteúdo a publicação oficial da promoção e, bem entendido, todas as actuações inerentes ao acesso do funcionário à nova categoria, que serão dotadas de efeitos retroactivos.

A solução legal nada tem de extraordinário. Por motivos de certeza jurídica ou outros, é frequente que o acesso a uma categoria ou cargo fique dependente de uma actuação administrativa, que reconhece o direito de acesso. O dever da Administração decompõe-se então em duas prestações (ou dois tipos de prestações) estritamente vinculadas: o acto que reconhece ou certifica o direito de acesso e, por outro lado, o acto ou conjunto de actos, designadamente de conteúdo pecuniário, em que se materializa a investidura no novo cargo.

A circunstância de o acesso não ocorrer automaticamente por força da reunião dos pressupostos do correspondente direito, antes ficar dependente de uma actuação certificativa, em nada afecta ou contraria:

  1. A existência prévia do direito de acesso, plenamente inserido na esfera jurídica do funcionário;
  2. A existência de um dever estrito, correspectivo do direito de acesso, de proceder a essa actuação certificativa;
  3. A existência simultânea de outros deveres adicionais correspectivos do direito de acesso, maxime os de conteúdo pecuniário.

Como bem se percebe, o facto de a posição passiva correspondente ao direito de acesso ter por objecto várias prestações não pode ser invocado pela Administração para se eximir ao cumprimento tempestivo de qualquer uma delas e às consequências associadas a esse cumprimento tardio. Concretizando: é verdade que a DEMANDADA só pode efectuar as prestações remuneratórias inerentes ao novo cargo depois de efectuar a prestação certificativa; mas isso não significa de modo algum que seja lícito o não pagamento das remunerações, já que a prestação certificativa também é efectuada pela própria DEMANDADA.

A defesa da DEMANDADA no caso vertente só faria sentido se a publicação das promoções não fosse uma actuação juridicamente imputável a ela própria: só se a publicação coubesse a uma entidade terceira é que poderia invocar que apenas entra em mora depois de essa entidade cumprir o dever de certificar a passagem à nova categoria. Mas na realidade a actuação certificativa é-lhe tão imputável quanto o pagamento das remunerações do novo cargo, constituindo uma e outra conduta o conteúdo da mesma posição passiva, correlativa do direito de acesso surgido no momento da reunião dos pressupostos do tempo de serviço e da classificação.

Em suma: uma vez constituído o direito de acesso na esfera jurídica de cada funcionário, a DEMANDADA ficou obrigada nos termos do correspondente dever, que tem por conteúdo principal a publicação oficial da promoção e o pagamento das diferenças remuneratórias. O comportamento que tenha adoptado relativamente à prestação certificativa em nada prejudica a circunstância de a prestação pecuniária estar por cumprir – e estar por cumprir não desde o momento em que foi cumprida a prestação certificativa, mas desde o momento em que se tornou exigível. Uma vez constituído o direito de acesso na esfera jurídica de cada funcionário, a DEMANDADA entrou em mora após ter decorrido o tempo estritamente necessário à publicação oficial da promoção e à realização das actuações de processamento das quantias devidas.

Ora, verificando-se o cumprimento tardio de um dever de conteúdo pecuniário, o pagamento de juros de mora é a consequência imposta por lei expressa (Lei n.º 3/2010, de 27 de Abril).

Eventuais dificuldades internas na disponibilização das necessárias verbas são obviamente inoponíveis aos titulares do direito, que em nada podem ser prejudicados pelos atrasos ocorridos e que lhes são de todo alheios.

Pelo exposto, os funcionários representados pela DEMANDANTE têm direito aos juros de mora legalmente estabelecidos, vencidos e vincendos, calculados em função do tempo decorrido desde o momento em que devia ter sido paga cada uma das diferenças remuneratórias mensais correspondentes ao reconhecimento do direito de acesso à categoria superior.

 

3. Regime de IRS aplicável às diferenças remuneratórias

A DEMANDADA concentrou numa única prestação, paga juntamente com o vencimento de Dezembro de 2013, as diferenças remuneratórias que eram devidas a partir do momento em que se reuniram os pressupostos do direito à promoção.  A essa quantia unitária aplicou a taxa de retenção na fonte de IRS em vigor no momento em que o pagamento foi efectivamente realizado (Dezembro de 2013, como se disse), deduzindo ainda a sobretaxa de 3,5% prevista na Lei do Orçamento para 2013.

A DEMANDANTE contesta esta actuação, sustentando que a quantia paga deveria ter sido calculada de forma a reflectir as sucessivas taxas de retenção em vigor, consoante o momento a que deva ser imputada cada uma das parcelas mensais somadas na prestação única paga em Dezembro, e que a sobretaxa apenas poderia ter incidido sobre a parte das diferenças remuneratórias correspondente ao ano de 2013.

Contrapõe a DEMANDADA que a sua actuação não merece reparo porque aplicou as normas em vigor em Dezembro de 2013, sublinhando que é a própria lei a impor expressamente que a retenção seja efectuada de acordo a taxa em vigor no momento do pagamento (cfr. os arts. 98.º, n.º 1, e 99-A, n.º 3, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares).

Como já ficou exposto sub 2., o direito de cada funcionário ao acesso à categoria de … superior ficou constituído na respectiva esfera jurídica no momento em que reuniram os pressupostos do tempo de serviço e classificação. Nesse mesmo momento, ficou a DEMANDADA gravada com o dever correspondente, que tinha como conteúdo a publicação oficial da promoção e as actuações inerentes à colocação na nova categoria, maxime o pagamento das diferenças remuneratórias.

A DEMANDADA só cumpre adequadamente o dever correspondente ao direito de acesso à categoria superior se colocar cada funcionário na situação inerente à nova categoria. E se não cumpriu tempestiva e integralmente esse dever, deve cumpri-lo agora, colocando cada funcionário na situação perfeitamente equivalente à que estaria se ela tivesse actuado pontualmente.

Tal implica, como se viu, o pagamento de juros de mora

Mas implica, por identidade de razão, neutralizar o efeito dos regimes fiscais mais gravosos do que aqueles a que estavam sujeitas as diferenças remuneratórias no momento em que deviam ter sido pagas. Os funcionários não devem suportar nas suas esferas jurídicas consequências desfavoráveis que só existem porque a DEMANDADA não cumpriu pontualmente os deveres a que estava adstrita.

Logo, a quantia paga aos funcionários a título de diferença remuneratória pelo acesso à categoria de … superior deve ser recalculada de forma a equivaler, em termos líquidos de IRS, à soma das quantias que deveriam ter sido sucessivamente pagas em função do direito de acesso ao cargo superior.

Por identidade de razão, deve ser efectuada a neutralização da sobretaxa de 3,5%, prevista no art. 187.º da Lei n.º 66-B/2012, relativamente às quantias que deviam ter sido pagas antes da entrada em vigor da norma correspondente.

 

4. Direito ao pagamento imediato dos emolumentos pessoais

O direito invocado pelos funcionários ao suplemento remuneratório correspondente aos emolumentos pessoais não é negado pela DEMANDADA. O facto de o seu pagamento não ter ainda ocorrido deve-se, nas suas palavras, à “complexidade e morosidade” do processo de apuramento das quantias devidas e à necessidade de promover a reposição das quantias paga em excesso aos restantes funcionários, uma vez que os emolumentos são repartidos, na proporção dos vencimentos, pelos funcionários que tenham intervenção nos actos que originaram a receita (art. 137.º do Decreto Regulamentar n.º 55/80, de 8 de Outubro).

Porém, as dificuldades práticas invocadas em nada afectam o dever jurídico da DEMANDADA de recalcular e pagar os emolumentos devidos a cada funcionário nos termos correspondentes à nova situação. Verifica-se, inquestionavelmente, um persistente incumprimento do dever que lhe incumbe de colocar cada funcionário na situação correspondente à nova categoria.

A DEMANDADA deve, pois, pagar os emolumentos devidos em função do acesso à categoria de … superior, acrescidos dos juros de mora vencidos e vincendos, até ao efectivo pagamento.

 

5. Sanções pecuniárias compulsórias

A DEMANDANTE requer ainda que sejam condenados os membros do Conselho Directivo da DEMANDADA ao pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, no valor diário de 48,50 €, na falta de publicação oficial da promoção de A… e do pagamento das diferenças remunerató  evidas.﷽﷽ remuneratdo a de pagamento das ndada trada em vigor da norma corrspondente. como conterias devidas.

            A sanção pecuniária compulsória consiste num mecanismo de reforço da eficácia das sentenças, coagindo os titulares do órgão a quem incumbe o dever de executar a cumpri-lo efectivamente. Encontra-se primariamente disposto para a utilização na fase executiva, perante situações iminentes ou consumadas de incumprimento do dever de executar, e daí que a sede do seu regime se encontre no art. 169.º do CPTA.

O decretamento de sanções pecuniárias compulsórias logo na sentença condenatória, sendo possível (arts. 44º e 66.º, n.º 3, do  CPTA), não deve em todo o caso constituir a regra, antes limitar-se aos casos em que exista uma justificação adequada para o seu uso a título preventivo, traduzida em factos objectivos que criem dúvidas razoáveis  sobre a execução pontual da decisão (v., nestes termos, o Ac. STA de 28/1/2010, proc. 941-A/05, e o Ac. TCA-Sul de 31/8/2008, proc. 3362/07).

            Ora, não foram trazidas aos autos, nem se descortinam dos elementos disponíveis, quaisquer razões específicas que fundamentem para o caso vertente um receio objectivo de que as decisões proferidas venham a ser ignoradas ou a ser retardada ilegalmente a sua execução pelo órgão a quem cabe esse dever.

Se factos dessa natureza vierem a ocorrer na fase de execução, haverá sempre oportunidade para lançar mão de tal instrumento compulsório, nos termos legalmente previstos.

            Falecem, pois, os pressupostos para a imposição precoce, logo em fase de decisão condenatória, de sanções pecuniárias compulsórias, improcedendo nesta parte o pedido da DEMANDANTE.

 

*

            Peticiona a DEMANDANTE que as diferenças remuneratórias devidas aos funcionários representados sejam pagas no prazo de 15 dias.

            Não foram porém alegados quaisquer factos que justifiquem tal encurtamento do prazo de execução da decisão condenatória, nem eles se encontram patentes no processo administrativo. Ao invés, não pode deixar de ter-se em conta que essa execução, embora apoiada em meios informáticos, envolve cálculos diversos – juros de mora, emolumentos, neutralizações fiscais – que têm de ser repetidos para um número relativamente elevado de funcionários, cada qual com a sua situação específica.

Não se justifica, pois, cominar na decisão um prazo especialmente encurtado para a sua execução.

 

 

            VI – DECISÃO

 

            Em função do exposto, decide-se:

 

  1. Julgar improcedente o pedido de promoção da funcionária A… a … superior;
  2. Condenar a DEMANDADA a pagar aos restantes funcionários representados pela DEMANDANTE os juros de mora, vencidos e vincendos, calculados à taxa legal em função do tempo decorrido desde o momento em que devia ter sido paga cada uma das diferenças remuneratórias mensais correspondentes ao reconhecimento do direito de acesso à categoria superior;
  3. Condenar a DEMANDADA a recalcular a quantia já paga a cada funcionário a título de diferença remuneratória pela promoção a … superior, de forma a equivaler, em termos líquidos de IRS, à soma das quantias que deveriam ter sido sucessivamente pagas em função do direito de acesso ao cargo superior;
  4. Condenar a DEMANDADA a recalcular a quantia paga a cada funcionário a título de diferença remuneratória pela promoção a … superior, de modo a eliminar o efeito da incidência da sobretaxa prevista no art. 187.º da Lei n.º 66-B/2012, relativamente às quantias que deviam ter sido pagas antes da entrada em vigor da norma correspondente;
  5. Condenar a DEMANDADA a pagar os emolumentos calculados em função das remunerações devidas pelo acesso à categoria de … superior, acrescidos dos juros de mora vencidos e vincendos;
  6. Não aplicar a sanção pecuniária compulsória requerida.

 

 

Custas pelas partes, na proporção do decaimento, a fixar nos termos da tabela de encargos processuais anexa ao regulamento do CAAD (art. 32º do referido regulamento).

 

Notifique.

Lisboa, 28 de Março de 2014

 

Luís Fábrica