Jurisprudência Arbitral Administrativa


Processo nº 97/2018-A
Data da decisão: 2018-06-24  Contratos 
Valor do pedido: € 419.400,00
Tema: Processo pré-contratual urgente – Procedimento de concurso público com publicidade internacional.
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SENTENÇA

 

 

Demandante: A... SA

Demandados: E..., F... e G...

Contrainteressados: D... SA, H... SA, I... e C... LDA.

 

 

 

Este Tribunal Arbitral, após requerimento inicial de 17.5.2018, foi constituído a 21.5.2018, com a aceitação do Árbitro signatário, nos termos do nº 5 do artigo 19º - A do RCAAD, devidamente notificado às partes que o aceitaram. Nestes autos de Arbitragem Pré-Contratual Urgente demandou a concorrente A... SA, após apresentar proposta, a declaração de ilegalidade de disposições do Programa do Concurso Público Internacional Nº 1/2018, destinado à aquisição de serviços de Vigilância e Segurança para as Instalações do B... .

 

Atento o carácter urgente dos autos, não sendo, no entanto, aplicável o disposto no artigo 19º A nº 12 do RCAAD, bem como a falta de elementos essenciais (processo administrativo), entendeu o Tribunal, nos termos permitidos pelo nº 5 do artigo 18º do RCAAD, desde logo, ordenar a citação da Demandada e de todos os Contrainteressados indicados para contestarem, nos termos dos artigos 19º - A nº 8 al. a), 12º nºs 2, 3 e 4) e 20º nº2 do RCAAD, bem como para se pronunciarem sobre a convenção de arbitragem (26º do Programa do Procedimento e Anexo III - Modelo da Proposta, 2º da LAV, 8º, 9º e 19-A do RCAAD e 476º do CCP), a competência deste Tribunal e o valor do processo indicado pelo Demandante (artigo 26º nº 3 al. c) do Programa do Procedimento e os artigos 19º-A nº 5 e 15º do RCAAD).

 

No âmbito de um pedido de medidas provisórias, apresentado pela Demandante A... SA., a 24.5.2018, foi junto o Relatório Preliminar e pedida a suspensão imediata do procedimento, tendo o Tribunal, atenta a urgência, ordenado a abertura de Apenso B e notificado as partes para se pronunciarem, em especial, atento o disposto no artigo 95º nº 3 do CPTA, sobre o critério de adjudicação e modelo de avaliação previsto no programa do procedimento e legalidade da definição da escala de pontuação, com intervalos como os que ali vêm definidos (19º do Programa do Procedimento), ordenando ainda, pelo seu relevo para apreciação da causa no quadro da Directiva 2014/24/EU e Código dos Contratos Públicos, a imediata junção da decisão de contratar e de aprovação das peças do procedimento e critério de adjudicação (seus pressupostos, fundamentos e justificação).

 

Corridos os prazos, vieram as Demandadas, por via de requerimento simples de 14.6.2018,      requerer a extinção da instância, por inutilidade superveniente, juntando deliberação unânime de anulação da decisão de contratar e escolha do procedimento, da autorização de abertura de um procedimento de concurso público com publicidade internacional e aprovação das peças do procedimento e da designação do júri tomada no dia 09/04/2018, nos termos conjugados dos artigos 163.º/1 e 4, 165.º/2, 168.º/1 e 3, 169.º/1 do CPA., com fundamento na ilegalidade da inclusão de Certificados, atribuídos aos Concorrentes, como factor do critério de adjudicação, quanto a tal não configurar avaliação da proposta, nos termos e limites do objecto do contrato.

 

Antes de decidir, notificaram-se as partes para, querendo, em 5 dias, se pronunciarem sobre a Requerida extinção da Instância (5º nº 1, al. d) e 19-A nº 8 al. d) do RCAAD, considerando ainda o disposto nos artigos 64º e 123º nº 1 al. d) e nº 3 do CPTA). Foi pelas Demandadas junto o Processo Administrativo e veio a Demandante declarar não se opor à extinção da instância, requerendo ainda a condenação das Demandadas em custas.

 

Aqui chegados, antes de proferir sentença, cumpre primeiro conhecer das questões iniciais.

Por se considerar ser instrumental e considerando quanto disposto no artigo 5º nº 1 al. b) do RCAAD e no artigo 30º nº 3 da Lei da Arbitragem Voluntária (LAV), determina-se que, quando o Regulamento do CAAD e a LAV não definirem as regras processuais aplicáveis à presente arbitragem, supletivamente, serão aplicadas os conceitos e as regras decorrentes, primeiro, do CPTA e depois do CPC.

Demandante e Demandados estão representados, cumprindo averiguar se o Tribunal é competente nos termos das disposições conjugadas dos artigos 1º e 8º do RCAAD, 18º da LAV, Convenção de Arbitragem, 180º do CPTA e 476º do CCP. Na apreciação da competência do Tribunal, cabe apreciar a arbitrabilidade do litígio, na sua vertente objectiva, face ao objecto do litígio, e subjectiva face à posição das partes e do específico Tribunal Arbitral. Esta disposição legal consagra no domínio da arbitragem voluntária o princípio da Competência-Competência. A competência do tribunal arbitral pressupõe assim a arbitrabilidade do litígio (cujo objecto deve ser abrangido pela convenção de arbitragem), a existência de uma convenção de arbitragem válida e eficaz e a regular constituição do Tribunal Arbitral.

 

Defina-se então o objecto do litígio, desde já se admitindo como sujeito a prova todos os factos que de forma, directa ou indirecta, possam contribuir para o correcto apuramento da verdade e melhor apreciação e aplicação de direito: A Demandante A..., tendo apresentado proposta no procedimento de contratação de aquisição de serviços de segurança, lançado pela Demandada B..., veio impugnar as disposições contidas nas peças do procedimento, especificamente a disposição do programa do procedimento que prevê, entre os factores do critério de adjudicação, a apresentação pelos concorrentes de Certificados, determinando o nº de Certificados apresentados maior ou menor pontuação e ponderando este factor uma percentagem no critério de adjudicação – proposta economicamente mais vantajosa, na sua versão de melhor relação qualidade-preço (74º nº 1 al. a) e 75º do CCP). Assim, o objecto do litígio é a validade das referidas disposições do critério de adjudicação que integram o programa do procedimento.

 

Definido o objecto do litígio, vejamos se o litígio é arbitrável e se existe convenção de arbitragem válida e eficaz. O litígio é arbitrável nos termos dos artigos 1º nº 1 e nº 5 da LAV, 180º nº 3 e 185º do CPTA e 209º nº 2 da CRP, o que veio a ser admitido e confirmado pela disposição específica do artigo 476º do CCP. A competência material do Centro de Arbitragem Administrativa do CAAD afere-se em função da lei geral, dos seus Estatutos e do seu Regulamento de Arbitragem. O CAAD tem por objeto, a resolução de litígios respeitantes a contratos nos termos do Despacho do Secretário de Estado da Justiça nº 5097/2009, DR II Série – nº 30, de 12 de Fevereiro e Despacho n.º 5880/2018, de 15 de Junho (e demais legislação citada nestes Despachos), n.º 2 do artigo 3.º dos Estatutos do CAAD e 19º A do RCAAD. Verifica-se assim que o litígio em questão é arbitrável pelo CAAD, devendo verificar-se então se, em concreto, a convenção de arbitragem é válida e eficaz e se abrange o objecto deste litígio.

A Demandada B..., atento tal lhe ser permitido pelo artigo 180º nº 3 do CPTA (Lei nº 15/2002, de 22 de Fevereiro), que veio depois a merecer concretização legislativa do Governo no artigo 476º do CCP (nos termos das suas competências, entre outros o Ac. TC nº 270/95), optou pela arbitragem, caso em que, obrigatoriamente, tinha que incluir no artigo 26º do programa do procedimento e Modelo de Proposta/Anexo III e 26º do caderno de encargos a adesão ao CAAD e seu Regulamento de Arbitragem, para dirimir os litígios inerentes ao procedimento de formação do contrato (fazendo constar da minuta da proposta a aceitação da convenção pelos concorrentes) bem como aos litígios inerentes à execução (fazendo constar a aceitação do caderno de encargos), o que fez nos termos permitidos pelo artigo 132º nº 4 do CCP, considerando-se respeitados os precisos termos e limites desta disposição. Parece assim claro a este Tribunal que foram respeitados os requisitos de validade da convenção de arbitragem, na modalidade de cláusula compromissória, em conformidade com os artigos 1º e 2º da LAV e as já referidas disposições do CPTA, tudo ainda em conformidade com o pretendido pela Directiva Recursos, quanto a uma forma célere de resolução de conflitos (Considerando 17, artigos 1º e 2º e Ac. Ascendi quanto à natureza do CAAD), e confirmado pela Directiva 2014/24/EU, alteração ao Regulamento do CAAD e Protocolo celebrado entre o CAAD e a PGR em 1 de Março de 2018.

 

Importa agora verificar se foi respeitado também o artigo 476º do CCP, em especial a remissão por aquela norma feita para o Anexo XII. Sendo o contrato em causa um contrato do catálogo (19º -A nº 1 do RCAAD) e atenta a já citada Lei nº 15/2002, de 22 de Fevereiro, que, in casu, permite a arbitragem, mostra-se respeitado este artigo. Vejamos a remissão por ele feita para o Anexo XII. Deixando de parte as críticas que têm vindo a ser feitas a este Anexo e ao pouco acerto legislativo inerente à redacção, parece claro ao Tribunal, da análise do Programa e Caderno de Encargos juntos, que não foi integralmente respeitada no Programa do Concurso e Caderno de encargos (contrato a celebrar) a redacção daquele anexo, quanto aos Modelos para aceitação da jurisdição do Centro de Arbitragem. Ora é sabido que as disposições do CCP são imperativas, no entanto trata-se aqui de uma questão essencialmente formal pois, o que se verifica é que, apesar da distinta redacção, mostram-se assegurados, com a redacção escolhida para a convenção em apreciação, todos os propósitos do Legislador que, em suma, resultam de todas as já citadas disposições 1º e 2º da LAV, 180º nº 3 do CPTA, 19º -A do RCAAD, 209º nº 2 da CRP, 20º nº 1 e nº 4 da CRP e, no essencial, respeitada a vontade das partes que, voluntariamente, aderiram a convenção de arbitragem (aqui se voltará), nos termos do artigo 180º nº 2 do CPTA, respeitando na íntegra o limite da concorrência constante do artigo 132º nº 4 do CCP e seus princípios densificadores plasmados e garantidos na Constituição da República Portuguesa. Por tudo isto, não obstante o vício do procedimento, potencialmente invalidante (do procedimento), que resulta de não ter sido adoptado o exacto Modelo XII do CCP, entende-se, em abono do aproveitamento dos Actos, do favor do Procedimento, 283º nº 4 do CCP, do favor arbitralis e da Teoria das Formalidades não essenciais que utile per inutile non vitiatur, ou seja, uma vez alcançado o fim pretendido, não se justifica a declaração de invalidade, mantendo-se válida a convenção e o procedimento (Neste sentido Concursos e Outros Procedimentos de Contratação Pública – Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, Almedina pag. 245 e Ac. STA de 20.2.1986,STA de 4.11.2003 e 7.6.2006).

 

Tudo verificado, importa analisar ainda o último limite à regularidade da constituição deste Tribunal, aferindo a sua regularidade ao abrigo do 180º nº 2 do CPTA (e 9º nº 6 do RCAAD), sem o respeito do qual não pode este Tribunal julgar-se competente. Exige esta disposição, alterada em 2015 com a introdução do nº 3, que quando existam contrainteressados a regularidade da constituição do Tribunal Arbitral depende da sua aceitação do compromisso arbitral. Ora esta disposição do nº 2 tem de ser interpretada atendendo a sua razão temporal, anterior ao nº 3 do mesmo artigo, previsto expressamente para os procedimentos arbitrais destinados à impugnação de actos proferidos em procedimento de formação de contratos, em que se exige a previsão no programa do procedimento, não de um compromisso arbitral, mas sim de uma cláusula compromissória. O que, por sua vez, resulta claro do artigo 476º do CCP, tendo o legislador, conhecedor do regime, optado por, uma vez escolhendo a entidade adjudicante submeter os litígios a arbitragem, tem de prever, obrigatoriamente, a aceitação dos concorrentes, via declaração, no programa do procedimento. Ora, o legislador, não formulou o artigo 476º do CCP em termos de convite a celebração de convenção, não funcionando esta caso algum dos concorrentes a ela não aderisse (e retomando assim a competência judicial). Antes o Legislador a formulou como uma Declaração Obrigatória dos concorrentes. Logo, não pretendia o legislador que a arbitragem fosse impossibilitada por qualquer recusa de qualquer concorrente, antes a mesma se mantendo, excluindo-se do procedimento aqueles que a não aceitem e que sempre poderão recorrer aos Tribunais Judiciais para impugnar o procedimento (sendo o legislador conhecedor, naturalmente, entre outras, das questões de conflitos de julgados ou litispendência que daí decorrem e das soluções do próprio sistema para os resolver, entre eles, o disposto no artigo 581º, 582º, 114º, 109º do CPC e 178º do CPTA). 

Por outro lado, a expressão contrainteressados ali prevista tem de ser interpretada à luz do artigo 103º nº 2, conjugado com o art.º 57.º do CPTA: “Para além da entidade autora do acto impugnado, são obrigatoriamente demandados os contrainteressados a quem o provimento do processo impugnatório possa directamente prejudicar ou que tenham legítimo interesse na manutenção do acto impugnado e que possam ser identificados em função da relação material em causa ou dos documentos contidos no processo administrativo.” A noção de contrainteressado terá, pois, de ser construída não a partir do eventual interesse que alguém pudesse ter em ser parte na acção mas a partir do prejuízo que ele terá se não for chamado a juízo, o qual estará sempre relacionado com a manutenção ou anulação do acto impugnado, quer esse prejuízo resulte directamente da anulação do acto quer o mesmo advenha da afectação do interesse legítimo em que o mesmo seja mantido na ordem jurídica. Logo, será em função da análise da concreta relação material controvertida e do prejuízo que poderá advir do desfecho do processo impugnatório que se poderão identificar os contra interessados, só eles podendo beneficiar das garantias de defesa concedidas por lei, neste sentido o AC. STA de 12.11.2015, disponível em www.dgsi.pt: “Deste modo, e sendo que a anulação o acto de adjudicação só acarretará prejuízo para a entidade que o praticou e para o adjudicatário, todos os outros oponentes ao concurso – do segundo ao último classificado – irão beneficiar do acto anulatório na medida em que, por força dessa anulação, será refeito o processo administrativo e praticado um novo acto classificatório que, colocando um deles na primeira posição, o fará beneficiário do contrato…Daí que só o adjudicatário seja contra interessado uma vez que só ele tem um interesse convergente com o interesse da entidade demandada.”

Esclarecido o entendimento que este tribunal faz das referidas normas, vejamos o caso dos autos. Não obstante não resultar do Relatório Preliminar qualquer exclusão nos termos do artigo 146º nº 2 al. n), certo é que, analisadas as propostas, verifica-se que os Concorrentes Grupo I... (excluído por outro motivo) e C... não declararam na proposta a sua aceitação da competência arbitral para o procedimento de formação do contrato, tendo os restantes concorrentes aderido nos exactos termos previstos no Programa. Ora, entre os concorrentes celebrantes da convenção de arbitragem, por esta via, encontram-se a Demandante (2ª classificada), as Demandadas e a primeira classificada D..., motivo pelo qual, nos termos da adesão por este Tribunal ao entendimento resumido no Ac. STA de 12.11.2015, supra transcrito, à luz do qual se deve interpretar também o artigo 9º nº 6 do RCAAD, se mostra verificada a regularidade da constituição deste Tribunal.

 

Uma questão permanece que é a opção das partes subscritoras da Convenção por indicar um árbitro único para dirimir o litígio, o que é permitido pelo artigo 15º nº 1 do RCAAD. Termos em que, resta concluir ser este Tribunal competente.

 

Vejamos agora o valor dos autos, sabendo-se que tal reveste importância essencial em matéria de recurso, importando considerar o regime específico do artigo 476º nº 5 do CCP para o qual as partes remeteram. Diga-se ainda, que é também o próprio Regulamento do CAAD que exige que as partes indiquem o valor (artigo 10º nº 1 al. d)). Ora a Demandante indicou como valor do presente processo o de 30.000€, o que não mereceu oposição. Cumpre tomar posição sobre o valor da causa. Para a determinação do valor do processo sub judice, cumpre então atender ao disposto nos artigos 31.º a 34.º do CPTA (regime supletivo supra determinado), que fixam as regras relativas à determinação do valor da causa no âmbito do processo administrativo. Ora o n.º 1 do artigo 31.º do CPTA dispõe que “a toda a causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido”. Não crê o Tribunal que não seja possível atribuir valor ou conteúdo económico ao acto impugnado. Com efeito o critério supletivo fixado no artigo 34.º nº 2 do CPTA para valores indetermináveis diz respeito àquelas situações em que estejam em causa ou se discutam bens, utilidades, posições jurídicas ou interesses insusceptíveis de avaliação económica ou pecuniária directa ou imediata i.e., interesses imateriais, cf. acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 11 de abril de 2013, processo n.º 09667/13, CA – 2.º Juízo). Pelo contrário, como resulta do Ac. STA de 27-10-2011 “O valor das acções relativas a actos administrativos é regulado pelo artigo 33.º do CPTA, que estabelece como critério geral, o conteúdo económico do acto. Este conceito deve ser concretizado de acordo com as regras especiais enunciadas nas suas diversas alíneas e, no caso de não ser subsumível a nenhuma delas, o que é o caso dos autos, de acordo com as regras gerais estabelecidas no artigo 32.º. De entre estas, todas são claramente afastadas pelo teor literal dos vários preceitos, com excepção da regra contida no n.º 2, que se assume, “na prática como um critério subsidiário, visto que é aplicável aos demais casos em que o pedido se não traduza uma quantia em dinheiro e em que, por outro lado, não seja atendível qualquer outro dos critérios gerais ou especiais enumerados nos restantes números do artigo 32.º ou nos artigos 33.º e 34.º” (Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, obra citada, pág.149). Estabelece este preceito: Quando pela acção se pretenda obter um benefício diverso do pagamento de uma quantia, o valor da causa é o valor equivalente a esse benefício”. O valor da acção deve, assim, ser apurado em função do conteúdo económico do acto, conteúdo esse que consiste no benefício que o autor retirar da pretensão formulada na acção. No caso sub judice, esse benefício consiste na anulação do concurso em causa. É apenas essa anulação que releva, contendendo as consequências legais da mesma já com a execução da respectiva sentença anulatória. Esse concurso tem um preço-base, sendo ele que há-de determinar o valor da acção, como decidiu o acórdão recorrido….Tal qual como no caso da impugnação de um contrato, em que o valor da acção é o valor desse contrato (artigo 32.º, n.º 3) e não o valor do lucro a obter com a sua execução, o valor de uma acção em que se impugna a adjudicação e o próprio concurso no seu todo (normas procedimentais) e se pede a anulação desse concurso, o valor é o do preço-base do concurso e não o lucro a obter com o contrato.

 

Ora, atendendo aos pedidos formulados pela Demandante, há que reconhecer que o presente processo tem um valor igual ao valor do contrato a celebrar. Nestes termos, admite-se o valor da ação como de 419.400,00€ (Artigo 18º do Programa), porquanto se trata de uma causa com valor determinável, registando-se este novo valor nos autos (e incidente).

 

Inexistindo outras questões prévias a decidir, verificando-se a legitimidade das partes e o cumprimento dos prazos de impugnação, exercido o contraditório, importa proferir sentença, dispensando-se a fixação da matéria de facto, uma vez que a mesma resulta das peças do procedimento juntas, do Relatório Preliminar e da Declaração de Revogação da Decisão de contratar, nos termos do artigo 165º e seguintes do CPA, junta pela Demandada (não cabendo a este Tribunal a apreciação da validade deste acto revogatório, nem se verificando os pressupostos do artigo 64º do CPTA). Com a referida anulação a pretensão da Demandante (de declaração de ilegalidade das peças do procedimento e de anulação do procedimento) ficou sem objecto uma vez que a decisão de contratar e todos os actos subsequentes do procedimento (onde se incluem as peças) foram removidos da ordem jurídica, tendo as Demandadas reconhecido a ilegalidade que fundamentou a Revogação, tudo em conformidade com o artigo 277º al. e) do CPC, considerando ainda o disposto no artigo 123º nº 1 al d) CPTA, termos em que se impõe declarar extinta a instância por inutilidade superveniente destes autos a tanto destinados.

 

As custas, nestes autos principais serão, nos termos do artigo 29º nº 6 do RCAAD, suportadas em partes iguais por Demandadas e Demandante pois, não obstante aquelas terem dado, aparentemente, razão à causa (o que não se conheceu), certo é que não deduziram contestação, revogando o acto de imediato, não tendo proferido Relatório Final, não tendo exigido a aplicação de medidas provisórias, pelo que se entende adequada a divisão das custas nos autos.

 

Por motivos de simplificação processual se declara aqui, e com os mesmos fundamentos, a extinção da Instância do Apenso de Medidas Provisórias. Não obstante a alteração do valor da causa produzir efeitos também no apenso, atento o valor bastante (face à complexidade do litígio e seu desfecho) da taxa a pagar nos autos principais, entende-se ser de fixar a taxa de justiça no apenso de medidas provisórias no exacto valor já liquidado pela Demandante, e por ela devido nos termos do artigo 29º nº 6 do RCAAD, não sendo devida mais taxa de justiça, no incidente, que assim se reduz a esse valor naquele apenso. 

 

Assim, considerando quanto decorre da fundamentação:

 

  1. Importa julgar extinta a Instância Arbitral Pré-Contratual Urgente, por inutilidade superveniente decorrente da deliberação unânime de anulação da decisão de contratar e escolha do procedimento, da autorização de abertura de um procedimento de concurso público com publicidade internacional e aprovação das peças do procedimento e a designação do júri tomada no dia 09/04/2018, nos termos conjugados dos artigos 163.º/1 e 4, 165.º/2, 168.º/1 e 3, 169.º/1 do CPA.
  2. Declara-se ainda, com os mesmos fundamentos, a Extinção da Instância no Apenso de medidas provisórias, sem mais custas, devendo ser extraída cópia desta sentença e arquivada naquele apenso.
  3. Fixa-se à causa o valor de 419.400,00€ (Artigo 18º do Programa), devendo as custas ser suportadas por Demandante (notificando-se esta para liquidar taxa nos termos da Tabela, deduzida do montante que já liquidou) e Demandadas (notificando-se estas para liquidar taxa nos termos da Tabela), em partes iguais para Demandante e Demandadas, atenta a não apresentação de contestação e considerando o disposto no Artigo 29º nº 6 do RCAAD.
  4. Deposite-se, registe-se e notifique-se, também a PGR nos termos e para os efeitos do Protocolo celebrado a 1.3.2018.

 

 

O ÁRBITRO

Nuno Pereira André

 

Lisboa, 24 de Junho de 2018