Jurisprudência Arbitral Administrativa


Processo nº 44/2018-A
Data da decisão: 2018-12-03  Relações júrídicas de emprego público 
Valor do pedido: € 30.000,01
Tema: Avaliação de desempenho do pessoal docente do Ensino Superior Politécnico.
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Sentença

 

I – Relatório

A..., casada, residente na Rua ..., n.º..., ... (...-...), portadora do NIF..., veio intentar a presente ação administrativa contra o B..., pessoa coletiva de direito público com o n.º..., com sede na Rua ..., n.º..., no ..., formulando o seguinte pedido:

«a)       Declarar nulos ou anulados os actos impugnados praticados pelo Réu, melhor identificados nos artigos 3.º e 5.º desta petição;

b)         Condenar o Réu a reconhecer que o tempo na direcção do Laboratório de E… do ... do C... deve ser contabilizado no item 3.1.10., “Responsabilidade por laboratórios, serviços e gabinetes previstos no organigrama” das grelhas de pontuação, e a rever e/ou alterar a avaliação de desempenho da Autora relativa ao quadriénio 2008-2011, atribuindo-lhe nova classificação para esse período com as legais consequências em termos de progressão na carreira e vencimento;

c)         Ser o Réu condenado a pagar custas, procuradoria e demais encargos devidos pela presente acção.»

 

Para assim concluir, a Autora alega, em suma e em síntese, o seguinte:

- Que exerce funções de Diretora do Laboratório de E…;

- Que as funções de Diretora do Laboratório deveriam ter sido consideradas no parâmetro 3.10 da grelha de avaliação com a denominação: «3.1.10 Responsabilidade por laboratórios, serviços e gabinetes previstos no organigrama» e não, como se veio a verificar nos atos impugnados, no parâmetro 3.1.12 com a denominação: «3.1.12 Outros cargos organizacionais reconhecidos pela .../B... »;

- Que os fundamentos apresentados pelo Réu para tal enquadramento não devem proceder considerando o enquadramento legal e estatutário do Laboratório, que se deve reconhecer como inserido no organigrama do Réu;

- Que os atos impugnados – o despacho que homologou a lista de classificação e avaliação, bem como a decisão que indeferiu a reclamação apresentada pela Autora – padecem de erro nos pressupostos de facto e vício de violação de lei;

- Que os atos impugnados violam o Princípio da Igualdade uma vez que, no caso do docente D..., que exerce funções de direção em laboratório, foi contabilizado tal tempo de funções no parâmetro 3.1.10.

  

Juntou documentos e requereu a produção de prova testemunhal.

 

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O Réu contestou, alegando, em suma e em síntese, o seguinte:

- Que o Laboratório em que a Autora exerce funções de Diretora não se enquadra na estrutura organizacional do Réu uma vez que o mesmo não consta expressamente reconhecido nos Estatutos ou no Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior, tratando-se, antes, de “meros espaços ad hoc, não assumidos como estruturas orgânicas”;

- Que atenta tal configuração, não poderia a Autora ser enquadrado no parâmetro 3.1.10 uma vez que este parâmetro estará reservado às estruturas expressamente reconhecidas e enquadradas na estrutura orgânica do Réu;

- Que não ocorreu qualquer violação do Princípio da Igualdade uma vez que o docente D... foi avaliado no ponto 3.1.12.

 

Juntou documentos e o processo administrativo, requereu a produção de prova testemunhal e a prova por confissão.

 

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Finda a fase dos articulados foi proferido despacho pré-saneador que, entre o mais, apreciou os requerimentos probatórios apresentados pelas partes, identificou o objeto do litígio e os temas da prova, designando-se ainda, em tal despacho, data para a inquirição das testemunhas.

 

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Com vista à realização das diligências instrutórias, no dia 10 de julho de 2018 teve lugar a audiência na qual foi tomado o depoimento de parte da Autora e inquirida a testemunha arrolada pelo Réu.

 

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As partes apresentaram alegações simultâneas. Em tais alegações, no essencial, as partes reiteraram, respetivamente, a procedência e improcedência da ação.

 

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Questões a decidir:

Se o ato impugnado – despacho que homologa a avaliação da Autora e o despacho que indeferiu a reclamação apresentada pela Autora – padece de vícios de erro nos pressupostos de facto e violação de lei, porquanto, as funções exercidas pela Autora enquanto Diretora do Laboratório de E… do ... deveriam ter sido enquadradas no parâmetro 3.1.10 da grelha de avaliação da docente.

 

 

II – Saneamento

O tribunal é competente, as partes são legítimas e a instância mantém-se válida e regular, nada obstando ao conhecimento do mérito.

 

III – Fundamentação

 

III.I – De Facto

Com interesse para a boa decisão da causa mostram-se provados os seguintes factos:

1 - A Autora é Professora Adjunta no C... (C...), em regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado.

2 - Nos termos do artigo 7.º, n.º 1 e n.º 2, alínea a), dos Estatutos do B..., publicados no DR n.º 22, 2.ª série, em 2 de Fevereiro de 2009, o C... está integrado no B... (B...).

3 - O Réu integra unidades orgânicas de ensino e investigação, designadas Escolas, entre as quais o C... – Cfr. artigo 7.º, n.º 1 e n.º 2, alínea a), dos Estatutos do B... .

4 - As Escolas gozam, nas suas áreas específicas de intervenção e no âmbito dos cursos instituídos, de autonomia estatutária, pedagógica, científica, cultural e administrativa, sendo que os Estatutos das Escolas regulam a sua missão específica no âmbito da missão do B..., os objectivos pedagógicos e científicos, bem como a estrutura orgânica e a concretização das autonomias que lhes são reconhecidas pela lei e pelos Estatutos do B... . – Cfr. artigos 47.º, n.º 1 e 48.º, n.º 1 dos Estatutos do B...

5 - Nos termos dos seus Estatutos, o C... organiza-se internamente em departamentos correspondentes a grandes áreas de conhecimento, que dispõem de um regulamento próprio, elaborado por todos os seus docentes e investigadores e homologado pelo Presidente do C... . – cfr. artigo 24.º e ss. dos Estatutos do C..., publicados no DR n.º 132, 2.ª série, em 10 de Julho de 2009.

6 - O Regulamento do ..., no seu Capítulo II, sob a epígrafe “Organização e funcionamento”, prevê a existência de laboratórios afectos ao ..., como espaços dedicados a actividades lectivas com necessidades específicas de equipamentos e software, geridos por directores nomeados pelo director do ..., com determinadas funções, aí definidas. – Cfr. Artigo 9.º do Regulamento do ... publicado no DR n.º 214, 2.ª série, em 4 de Novembro de 2010.

7 – Desde o dia 7 de Fevereiro de 2008, a Autora é directora responsável pelo Laboratório de E… do ... .

8 - No dia 15 Outubro de 2017, a Autora requereu a avaliação por ponderação curricular sumária para os quadriénios 2008-2011 e 2012-2015, nos termos do artigo 10.º do Regulamento de Avaliação de Desempenho dos Docentes do B... (Despacho do B.../... /2011).

9 - Na grelha de pontuação disponibilizada para o efeito, a Autora contabilizou no item 3.1.10., “Responsabilidade por laboratórios, serviços e gabinetes previstos no organigrama”, a direcção do Laboratório de Electromagnetismo do ... .

10 – No dia 10 de novembro de 2017, a Autora foi notificada do parecer formulado pelo avaliador nomeado pela Comissão de Avaliação de Desempenho Docente (CADD) do C..., Dr. E..., que propôs alterar a avaliação da Autora, contabilizando a direcção do Laboratório de E… do ... no item 3.1.12., “Outros cargos organizacionais reconhecidos pela .../B...”, com o fundamento de que “(..) é um laboratório não reconhecido pela ..., pelo que o tempo inserido no ponto 3.1.10 tem que ser enquadrado no ponto 3.1.12.”.

11 - No dia 6 de Dezembro de 2017, a Autora exerceu pronúncia em sede de audiência de interessados sobre o referido parecer, alegando, em síntese, que o laboratório pertence à organização do ..., como resulta do Regulamento do ..., pelo que a função de directora de laboratório deve ser enquadrada no ponto 3.1.10 e não no ponto 3.1.12, como sugerido pelo avaliador.

12 – Por despacho datado de 28 de Dezembro de 2017, a Senhora Presidente do B..., através do Despacho B.../... /2017, homologou a lista de classificação de avaliação de desempenho do pessoal do C... (C...), para o período de 2004-2015, que inclui a avaliação da Autora.

13 - Em 12 de Janeiro de 2018 a Autora apresentou uma reclamação do referido acto de homologação, dirigida à Presidente do B... .

14 – No dia 1 de Fevereiro de 2018, a Presidente do B... proferiu despacho de concordância com a proposta de decisão final que negou provimento à reclamação apresentada pela Autora.

15 – No dia 3 de janeiro de 2018, foi efetuada a notificação para o Portal C...– com o link ...- do despacho do Presidente do B... que homologou a lista de classificação de avaliação de desempenho do pessoal docente do C... .

16 - No dia 12 de Janeiro de 2018, a Autora apresentou reclamação do acto de homologação da avaliação, nos termos do n.º 4 do artigo 17.º do Regulamento de Avaliação de Desempenho dos Docentes do B... .

17 - No dia 01 de Fevereiro de 2018, a Autora foi notificada do despacho que negou provimento à sua reclamação.

18 – O Laboratório de E… do ... não se encontra expressamente previsto nos Estatutos do C... .

19 – Na avaliação do docente D... foi proposto: (i) para o ano de 2007 - 12 meses no ponto 3.1.10 e 12 meses no ponto 3.1.12; (ii) para o período 2008 a 2011: 52 meses no ponto 3.1.10 e 48 meses no ponto 3.1.12.

20 – Pela Ata n.º..., de 15-12-2017, a CADD deliberou que a atividade exercida por D... enquanto Diretor dos Laboratórios de instrumentação e medidas elétricas do ... não poderia ser contabilizada no parâmetro 3.1.10, sendo apenas passível de enquadramento no parâmetro 3.1.12.

21 -  A CADD entendeu que as funções exercidas por D... enquanto Diretor do Centro ... deveriam ser incluídas no parâmetro 3.1.10. por se tratar de um “grupo de investigação” reconhecido no Organigrama do Réu.

 

A restante factualidade constante nos articulados não consta da decisão da matéria de facto supra por se tratar de matéria genérica, conclusiva, de direito ou sem interesse para a boa decisão da causa, tendo ainda sido considerados factos instrumentais, complementares e concretizadores que resultaram da instrução da causa e sobre os quais as partes tiveram oportunidade de se pronunciar

 

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Meios de prova e motivação

Finda a audiência de discussão e julgamento, cumpre ao Tribunal proferir decisão arbitral nos termos do disposto no artigo 25.º do Regulamento de Arbitragem Administrativa do CAAD. Tal decisão, deve seguir, tanto quanto possível, as exigências da sentença com uma decisão sobre a matéria de facto controvertida – art. 607.º do CPC. Com efeito, estatui o disposto no n.º 4 da norma citada que o julgador analisa criticamente as provas, indica as ilações tiradas dos factos instrumentais e especifica os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras da experiência. A prova é apreciada livremente pelo juiz segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, excepcionando-se os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, aqueles que só possam ser provados por documentos e os que estejam plenamente provados – por documentos, por acordo ou confissão das partes (n.º5).

Na decisão “deve ser vertido resultado da ponderação serena de todos os meios de prova produzidos, seja qual for o efeito que derive de tal decisão. A resposta dada quanto à matéria de facto controvertida, normalmente apoiada no princípio da liberdade de julgamento consagrado no art. 655º, deve reflectir o resultado da conjugação dos vários elementos de prova que na audiência ou em momento anterior foram sujeitos às regras da contraditoriedade, da imediação ou da oralidade.” – Abrantes Geraldes, in “Temas da Reforma do Processo Civil”, II volume, 4a edição, Almedina, 2004, pág. 216.

No entanto, não se exige do julgador uma decisão assente na certeza absoluta. Em sede de livre apreciação da prova é suficiente um juízo de probabilidade ou verosimilhança. - FREITAS, Lebre de - “Introdução ao Processo Civil”, 2009, Coimbra Editora, pp. 160, 161.

É sobretudo no domínio da prova testemunhal que se colocam os maiores desafios ao julgador. É que não pode ver-se o depoimento apenas na sua expressão mais visível de oralidade, mas antes apreendê-lo como um todo. Pois se há informação que resulta do que as pessoas verbalizam, outra resulta das suas expressões faciais, do tom de voz, da fluidez ou hesitação do discurso, da postura em audiência, das suas reacções. Não há quaisquer fórmulas para apreciação dos depoimentos. Eles são apreciados, caso a caso, pessoa a pessoa, considerando, além o referido, a razão de ciência invocada pela testemunha, a sua ligação às partes, o seu (des)interesse na lide, a sua razoabilidade face à lógica da realidade e ainda as máximas da experiência do julgador e os conhecimentos científicos.

Essencial será, que o julgador, na apreciação livre da prova, mesmo a pericial, obedeça aos princípios da sensatez e sentido de responsabilidade, motivando a apreciação que faz de todos os elementos probatórios em respeito pelos comandos legais.

No caso concreto, no que se refere à factualidade respeitante aos factos n.º 1 a 6, 8 a 14, 16 e 17 encontram-se provados por terem sido alegados pela Autora e expressamente aceites pelo Réu.

O facto 7) resultou do depoimento de parte e do processo administrativo junto aos autos.

O facto 15) resultou provado pelo depoimento da testemunha F... .

O facto 18) resulta diretamente dos Estatutos do Réu.

O facto 19) resulta da documentação junta pelo Réu a estes autos respeitante ao processo de avaliação de D... .

O facto 20) encontra-se provado por constar expressamente de fls. 9 do processo administrativo junto aos autos.

O facto 21) resultou do depoimento da testemunha F..., que corroborou igualmente os factos 18), 19) e 20).

A respeito do depoimento da testemunha F..., professora coordenadora com vínculo ao Réu, o mesmo mereceu credibilidade pela forma espontânea e livre como a testemunha prestou o seu depoimento, mostrando um conhecimento profundo de todo o processo de avaliação. Esta testemunha declarou que integra a Comissão de Avaliação de Desempenho do pessoal Docente (CADD), tendo participado no processo de avaliação dos docentes do Réu. A testemunha explicou o processo de avaliação e a respetiva divisão entre avaliadores. Clarificou também que a CADD teve uma reunião prévia com os avaliadores na qual se procedeu a uma clarificação dos critérios de avaliação, para que as avaliações fossem o mais harmonizadas possível. Clarificou também a forma de notificação dos docentes da avaliação através do portal. Quanto aos parâmetros 3.1.10 e 3.1.12 da grelha de avaliação dos docentes, esclareceu a diferença entre os critérios e o que englobava cada parâmetro. Segundo esta testemunha, no parâmetro 3.1.12 constavam as atividades de gestão que não estavam diretamente abrangidas pelos restantes parâmetros do ponto 3. Já quanto ao ponto 3.1.10 explicou que aqui se deveriam incluir as atividades de gestão dos serviços que constavam do organigrama da Escola, tendo por referência os que constam reconhecidos nos respetivos Estatutos. Explicou ainda a depoente, que as formas de organização dos departamentos e estruturas por estes criadas, como os laboratórios, extravasam o âmbito estatutário e por isso estavam excluídos do ponto 3.1.12. Questionada a testemunha se houve algum avaliador que tivesse incluído a direção de laboratórios no ponto 3.1.10 explicou que, tanto quanto é do seu conhecimento, isso não ocorreu; mais referindo que a CADD “esteve atenta” e sempre que detetou um erro neste enquadramento acabou por agir, procurando salvaguardar o Princípio da Igualdade na avaliação de todos os docentes. Questionada diretamente sobre a avaliação do Professor D... descreveu o grupo de investigação “...”, explicando que o mesmo, enquanto “grupo de investigação” está previsto nos Estatutos do C..., situação que levou à pontuação deste docente no parâmetro 3.1.10.  Clarificou também que a atividade de um “grupo de investigação” como o ..., em termos de complexidade e densidade, é muito mais exigente do que a direção de um simples laboratório de departamento.

Mais esclareceu esta testemunha, a respeito da avaliação de D..., para 2007, que este docente incluiu, no parâmetro 3.1.10 da sua proposta duas funções: (i) 12 meses de direção do laboratório de instrumentação e medidas elétricas do ...; (ii) 12 meses de direção do “...”, ressalvando o docente, quanto a esta direção do ..., que, como já havia atingido o limite máximo da pontuação com os 12 meses de direção do laboratório, não seria necessária a consideração da direção do ... . A respeito deste ponto a testemunha explicou que a CADD observou que os 12 meses de direção do ... são válidos no parâmetro 3.1.10 e por isso validou esta pontuação, irrelevando as funções de direção no laboratório de departamento. 

Ainda quanto à avaliação do docente D... a testemunha esclareceu o seguinte: entre 2008 e 2011 o docente D... tinha 4 meses como Diretor do laboratório de instrumentação e medidas elétricas do Departamento de ... e tinha 48 meses como diretor do ..., tendo proposto uma avaliação de 52 meses no item 3.1.10. O avaliador terá considerado apenas os 4 meses do laboratório. A CADD apreciou a questão e terá sinalizado que o correto neste parâmetro seriam os 48 meses como diretor do ... e não os 4 meses do laboratório. Todavia, como a pontuação erradamente atribuída não teria reflexos na avaliação final do docente, a CADD acabou por decidir não alterar esta pontuação por “inutilidade superveniente”.

O tribunal considerou ainda o depoimento de parte prestado pela Autora, que valorou de forma livre e na medida do conhecimento direto apresentado sobre a factualidade relevante.

 

III.II – De Direito

A avaliação de desempenho do pessoal docente do Ensino Superior Politécnico rege-se pelo disposto no Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, alterado pela Lei n.º 7/2010, de 13 de maio. Nos termos do n.º 1 do artigo 35.º - A do aludido Estatuto, a avaliação está sujeita a um regime constante de regulamento a aprovar por cada instituição de ensino. Assim, em concretização de tal normativo, pelo Despacho n.º 6414/2011 (publicado no Diário da República, 2.ª série — N.º 74 — 14 de Abril de 2011) a Presidente do B... aprovou o Regulamento de Avaliação de Desempenho dos Docentes do B... . De acordo com este Regulamento, sobressaem, com relevância para os presentes autos, as seguintes notas: (i) o processo de avaliação é regulado e supervisionado pela Comissão de Avaliação de Desempenho Docente da Unidade Orgânica (CADD); (ii) a avaliação de desempenho de cada docente contempla três dimensões – a pedagógica; a técnica científica e artística; a organizacional; (iii) na dimensão organizacional «inclui-se, entre outros parâmetros: exercício de funções de gestão nos órgão do B... e das suas unidades orgânicas, electivas ou por designação e ainda a participação em tarefas distribuídas pelos órgãos de gestão que se incluam no âmbito da actividade e categoria profissional do docente do ensino superior politécnico» (art. 11.º, n.º 1, alínea c)).

Revertendo agora ao caso em discussão nos presentes autos, discute-se aqui o enquadramento de funções exercidas pela Autora em um dos parâmetros constantes da dimensão organizacional.

Caberá referir que esta dimensão organizacional, de acordo com a grelha aprovada, encontra-se subdividida em diversos parâmetros, respeitantes às funções exercidas pelos avaliandos e que aqui se elencam:

«3.1.1 Vice-Presidente do B...;

3.1.2 Vice-presidente ...ou pró-presidente do B...

3.1.3 Direção de departamento ou unidades técnico-científica

3.1.4 Direção de curso

3.1.5 Vice-presidente do..., ...

3.1.6 Direção de unidade de I&D reconhecida pela F… ou com captação de orçamento anual > 50.000 euros, incluindo centros artísticos ou de prestação de serviço

3.1.7 Sub-direção de departamento ou unidades técnico-científico

3.1.8 Sub-direção de unidade de I&D reconhecida pela F… ou com captação de orçamento anual > 50.000 euros, incluindo centros artísticos ou de prestação de serviço

3.1.9 Sub-direção de curso

3.1.10 Responsabilidade por laboratórios, serviços e gabinetes previstos no organigrama

3.1.11 Membro C.., C.., C…

3.1.12 Outros cargos organizacionais reconhecidos pela .../ B...»   

Nestes parâmetros será particularmente relevante o 3.1.10, no qual a Autora considera que se deve enquadrar a atividade desenvolvida enquanto Diretora do Laboratório de E.do ... .

A primeira nota que sobressai deste parâmetro é a necessidade de enquadramento das funções respetivas no organigrama; qualificação que, de resto, pela sua indeterminação, se prestará aos equívocos de interpretação que terão motivado o presente litígio.

A Autora entende que a ação deve ser julgada procedente, por um lado, porque o Laboratório de E… do ... que dirigiu se deve subsumir diretamente ao parâmetro 3.1.10 e, por outro, porque em casos análogos ao seu (de direção de laboratórios), o Réu reconheceu o enquadramento de tais funções no parâmetro 3.1.10. 

 

Vejamos, então, cada um destes ângulos.

Para afastar o enquadramento da Autora neste parâmetro o Réu invoca que, nem no Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior (aprovado pela Lei n.º 62/2007, de 10 de setembro) nem nos Estatutos do C... (publicados no Diário da República, 2.ª série — N.º 132 — 10 de julho de 2009) existe qualquer previsão orgânica expressa dos laboratórios ou do cargo de diretor. Assim, não constando tais laboratórios expressamente nos diplomas que definem a orgânica do C..., entende o Réu que a Autora não poderia ser enquadrada no parâmetro 3.1.10. A conclusão do Réu a este respeito é absolutamente clara e inequívoca, sendo apodíctico que em ambos os diplomas inexiste qualquer referência aos laboratórios enquanto estruturas organicamente integradas no C... .

Por outro lado, o que se pode constatar é que o laboratório dirigido pela Autora é uma estrutura criada por via do Regulamento do Departamento ... aprovado por despacho do Presidente do ..., de 18 de outubro de 2010 (publicado no Diário da República, 2.ª série — N.º 214 — 4 de Novembro de 2010) sendo que, nos termos do artigo 9.º, tais laboratórios se definem como: «espaços dedicados a actividades lectivas com necessidades específicas de equipamentos e software» e a nomeação do diretor compete ao Diretor do Departamento ... .

Assim sendo, não se revelará inexata a tese sustentada pelo Réu, segundo a qual tais laboratórios estarão afastados do organigrama, na aceção e interpretação promovida pela CADD que, segundo também sustenta o Réu, terá apenas considerado como integrados no parâmetro 3.1.10 as estruturas que tivessem na sua génese e origem um reconhecimento estatutário.

Por outro lado, na análise deste ponto importará ainda tomar em consideração o disposto no artigo 1.º do Regulamento do Departamento de ..., e que ressalva expressamente o seguinte:

«As estruturas, cargos e funções previstas no presente Regulamento são válidas apenas para o Departamento ... (...) não interagindo com as estruturas, cargos e funções do C..., excepto quando estejam igualmente previstos nos Estatutos do C....»

Resulta assim reconhecido neste preceito que os laboratórios terão uma validade (ou, se preferirmos, uma “existência orgânica”) circunscrita ao Departamento ... com uma expressa exclusão da orgânica do C... e que se acha reconhecida nos respetivos Estatutos.

Aqui chegados, parece-nos ser de concluir que os vícios apontados pela Autora aos actos impugnados não se podem reconhecer como verificados. Se é certo que o parâmetro 3.1.10 tem uma redação equívoca subordinada a um conceito impreciso com a expressão “organigrama” e, igualmente, que o laboratório dirigido pela Autora tem um contexto departamental reconhecido por via de um Regulamento, não será menos certo reconhecer que a alegação do Réu, suportada por abundante prova documental, permite concluir que na definição deste parâmetro, a CADD terá considerado, para a generalidade dos docentes avaliados, unicamente, estruturas que tinham uma origem estatutária expressamente reconhecida.

Ora, este último ponto vem precisamente ao encontro do ponto de comparação feito pela Autora com a avaliação do docente D..., enquanto diretor do laboratório... . No que respeita ao ..., como resultou provado pelo depoimento da testemunha F..., o mesmo enquadra-se e descreve-se como “grupo de investigação”, expressamente reconhecido nos Estatutos do C... . Com efeito, nos termos do artigo 33.º dos Estatutos do C...

«1 — São reconhecidos como grupos de investigação do C... os que se enquadram em, pelo menos, um dos seguintes critérios:

a) Unidades de investigação do C... reconhecidas e avaliadas, com classificação igual ou superior a Bom, pelo organismo do ministério da tutela a quem estiverem atribuídas essas competências;

b) Grupos do C... reconhecidos pelo Conselho Técnico -Científico, nos termos de regulamento por si aprovado e homologado pelo Presidente do C...;

c) Grupos de docentes e investigadores que realizem investigação em espaço de investigação próprio nas instalações do C... e estejam associados a unidades de investigação externas reconhecidas e avaliadas, com classificação igual ou superior a Bom, pelo organismo do ministério da tutela a quem estiverem atribuídas essas competências.

(…)»

Ora, como resultou provado nestes autos, apesar dos equívocos gerados durante o processo de avaliação do docente D..., a CADD firmou posição expressa (constante de Ata) reconhecendo que a direção deste grupo de investigação (denominado ...) deveria ser enquadrada no parâmetro 3.1.10, do mesmo modo que afastou, também de forma expressa, que a direção de laboratórios de departamento pudessem ter semelhante enquadramento. Assim, uma vez que o grupo de investigação (...) está efetivamente enquadrado nos Estatutos, ao contrário dos laboratórios dos departamentos, não nos poderá merecer qualquer censura esta avaliação, à luz do Princípio da Igualdade invocado pela Autora. De resto, sublinhe-se que a CADD salientou precisamente este ponto na apreciação que fez a uma reclamação deste docente, sendo certo que de tal afirmação, conjugada com o depoimento da testemunha F..., se pode concluir que não se provou que a avaliação deste docente tenha sido beneficiada pela direção de um laboratório idêntico ao que a Autora dirige.

Em síntese e para finalizar, o tribunal não ficou convencido das ilegalidades invocadas pela Autora. Num extenso processo de avaliação, que abrange uma multiplicidade de docentes, impõe-se sempre assegurar que as avaliações sigam critérios uniformes para que não existam tratamentos desiguais. Neste contexto, importará salientar que a prova produzida criou a convicção no decisor que o critério seguido pela CADD terá sido o de não incluir os laboratórios (como aquele que foi dirigido pela Autora) no parâmetro 3.1.10, razão pela qual, a decisão a proferir nestes autos, só poderia ser a de improcedência do pedido deduzido, sob pena de a presente decisão promover um tratamento diferenciado em face dos restantes docentes devidamente avaliados à luz do critério estabelecido pela CADD.

 

IV - Decisão

 

Em face do exposto, julgo a presente ação improcedente, absolvendo o Réu –B...- dos pedidos formulados pela Autora.

 

Fixa-se o valor da acção nos € 30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo) - (cf. n.º 2 do artigo 34.º do CPTA), sendo a taxa de arbitragem a calcular nos termos legais.

 

Custas pela Autora.

Registe e notifique-se.

 

Lisboa, 3 de Dezembro de 2018

 

O Árbitro,

 

Tiago Leote Cravo