Jurisprudência Arbitral Administrativa


Processo nº 48/2017-A
Data da decisão: 2018-03-01  Relações júrídicas de emprego público 
Valor do pedido: € 4.514,67
Tema: Reconhecimento do direito a compensação pela caducidade de contrato de trabalho a termo resolutivo certo.
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Decisão Arbitral

 

 

 

  1. Relatório

 

A…, identificado nos autos à margem referenciados, doravante designado “Demandante”, propôs no Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”)

Contra

B… (B…), e C… (C…), também identificados nos autos à margem referenciados, doravante designados “Demandados”,

 

Acção para reconhecimento de direito a compensação por caducidade do contrato de trabalho a termo certo resolutivo”, pretendendo:

  1. Ver reconhecido o seu direito à referida compensação pela caducidade de sete contratos celebrados entre as partes, entre 2010 e 2016;
  2. Que, a tal título, sejam os Demandados condenados a pagar ao Demandante a quantia de € 3.223,25;
  3. Que os Demandados sejam condenados a pagar ao Demandante a quantia de € 1.771,47, respeitante a férias vencidas e não gozadas, bem como a proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal;
  4. Acrescendo juros vencidos (€ 186,82, à data da apresentação da p.i.) e vincendos, à taxa legal de 4%, até efetivo pagamento.

 

Contestando, os Demandados, no essencial, aceitam a existência do direito do Demandante à compensação pela caducidade do contrato de trabalho a termo resolutivo certo, mas discordam dos respetivos cálculos, conforme apresentados na p.i., o mesmo se podendo dizer, em geral, em matéria de férias e de subsídio de Natal. Segundo os Demandados, a soma de ambos os valores não ultrapassaria os € 2.646,49.

 

Foi remetido aos autos pelos Demandados o processo administrativo, constituído por 24 documentos.

 

O Demandante respondeu, suscitando uma questão prévia relativa às partes (que não qualificou), aceitando o valor assumido pelos Demandados na contestação, reduzindo o pedido (cfr. infra), e manifestando-se ainda sobre outros aspetos relativos à matéria de facto.

 

Os Demandados responderam, subsequentemente, à questão prévia suscitada pelo Demandante (cfr. infra).

 

Em novo requerimento, de 17/10/2017, veio o Demandante solicitar indicação das razões para o que, em seu entender, haveria constituído desrespeito pelas regras atinentes à constituição do Tribunal, dado que, na petição inicial (“p.i.”) havia sido indicado como “perito”, para efeitos de “prova pericial”, um árbitro da correspondente lista do CAAD, diferente do que viria a ser designado.

 

Notificado para se pronunciar, veio o Demandado dizer que, de acordo com as regras aplicáveis, a indicação de árbitro pelas partes só pode ter lugar através de convenção de arbitragem, ou em acordo posterior, contanto que assinado em momento anterior ao da constituição do tribunal arbitral, o que não teria sucedido no caso vertente, competindo então a designação do árbitro ao CAAD.

 

Em despacho arbitral de 2 de Novembro de 2017, o Tribunal decidiu esta questão nos termos seguintes:

 

“Nos termos do Regulamento de Arbitragem Administrativa (“RAA”) do CAAD em vigor, os árbitros são escolhidos, em regra, de entre a lista aprovada pelo CAAD, que consta do respetivo site, cabendo a sua designação ao Conselho Deontológico (cfr. arts. 15.º, n.º 3; 16.º, n.º 1, do RAA).

As partes podem, alternativamente, assumir a designação do árbitro ou árbitros, na convenção de arbitragem, ou em escrito posterior por elas assinado até à constituição do tribunal.

 

Na sua p.i., o Demandante indicou como “perito a nomear” um Ilustre Membro da lista de árbitros do CAAD.

Na sua contestação, o Demandado nada disse a respeito deste aspeto.

 

Não tendo sido reunidas as condições para a indicação de árbitro por acordo, nos termos das citadas normas regulamentares, o Conselho Deontológico do CAAD designou o árbitro, tendo o Tribunal sido constituído no dia 6/10/2017, nos termos do disposto no art. 17.º do RAA.

 

Na verdade, na sua p.i., o Demandante, na sequência de outros meios de prova, indicou um “perito”, não um árbitro. Aliás, no seu requerimento de 17/10/2017, reitera que indicou tal perito para efeitos de “prova pericial”, o que não se confunde, por qualquer forma, com a indicação de árbitro — que tem de ter lugar nos termos referidos, com vista a colher o acordo da parte demandada. Uma coisa é a constituição do tribunal (ou um árbitro); outra em tudo diferente é a indicação de meios de prova (ou um perito). Uma vez que a prova pericial é também admitida na arbitragem administrativa, só agora, com o requerimento de 17/10/2017, se revelou o alcance da p.i. neste particular.

 

Note-se que, a designação do(s) árbitros(s) pelas partes é matéria plenamente dispositiva, sobre as mesmas recaindo o ónus de serem totalmente claras e inequívocas a esse respeito, na convenção de arbitragem (caso exista), ou em acordo a celebrar em momento anterior ao da constituição do tribunal. No caso vertente, tal não sucedeu.

 

Ao Tribunal, uma vez constituído, só caberia analisar a regularidade da sua constituição (para o que ora importa) caso existisse convenção de arbitragem, ou outra forma de acordo entre as partes quanto à designação do(s) árbitros(s), que não houvessem sido observados.

 

Assim, atendendo às regras de constituição do tribunal referidas supra, conclui-se que o Tribunal está regularmente constituído, desde 6/10/2017, não tendo havido incumprimento de quaisquer regras neste domínio.”

 

Neste mesmo despacho, considerou o Tribunal estar em condições de proceder à condução do processo apenas com base na prova documental oferecida pelas partes (atendendo ao teor da p.i., da contestação, e dos articulados supervenientes, bem como à prova documental com os mesmos fornecida, incluindo a junção do processo administrativo, e considerando os princípios constantes do artigo 5.º, n.º 1, maxime alíneas b) e c) do Regulamento de Arbitragem Administrativa (“RAA”) do CAAD), dispensando-se outras diligências de prova e audiência, e remetendo-se o conhecimento de eventuais outras questões para final, nos termos do disposto no artigo 18.º, n.ºs 1, 3 e 4 do RAA.

 

Notificadas as partes para se pronunciarem quanto a este respeito, a tal não se opuseram, tendo então sido notificadas para alegações sucessivas, que ambas apresentaram.

 

 

 

  1. Saneamento

 

Resolvida que está a questão respeitante à regularidade da constituição do Tribunal (cfr. supra, I), importa, inicialmente atentar na

 

Questão prévia

 

O Demandante intentou a presente ação contra o B… (B…), bem como contra a D… (D…), a qual foi entretanto transformada na C… (C…) (nos termos do Despacho n.º 6/2016, de 20 de julho, do Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, que homologou alterações aos Estatutos do B…, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 147, de 2 de agosto de 2016).

Realmente, conforme resulta do processo administrativo, o contrato de trabalho a termo resolutivo certo sub judice foi celebrado pelo Demandante com a D…, assim como as sucessivas renovações.

Tendo a contestação chegado em nome do B… e da C…, veio o Demandante suscitar a questão de existência de “duas contestações” (posto que aquelas seriam duas pessoas coletivas públicas distintas, e não se verificaria litisconsórcio necessário passivo), o que implicaria o pagamento de duas taxas de justiça autónomas.

Respondendo, e pugnando pela improcedência da questão prévia, afirmaram os Demandados que a (agora) C… é uma mera unidade orgânica do B…, sem personalidade jurídica própria, pelo que não poderia estar em juízo autonomamente: haveria, do ponto de vista dos Demandados, uma situação de litisconsórcio, pois a D… (agora C…), não sendo uma pessoa coletiva pública, celebrara os referidos contratos ao abrigo da sua autonomia administrativa (artigo 41.º, n.º 2, dos Estatutos do B… (Despacho normativo n.º 5/2009, de 26 de janeiro, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 22, de 2 de fevereiro de 2009), tudo com remissão para o artigo 10.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA).

O entendimento do Demandante — que só fica perfeitamente esclarecido com as suas alegações — é o de que a C… é “solidária e subsidiariamente” responsável pelo pagamento dos valores que o mesmo entende serem-lhe devidos.

Já os Demandados entendem que não é assim: pelo pagamento de quaisquer montantes devidos ao Demandante seria apenas responsável o B…, pois a C… “dispõe apenas de autonomia administrativa e financeira” (nos termos, também, das suas alegações finais).

As peças processuais referem-se à parte passiva ora no plural, ora no singular, sem especificação — o que releva para o pedido —, e o quadro normativo surge confuso, pelo que importa deslindar a questão.

 

O B… é uma pessoa coletiva de direito público, enquanto as suas Escolas são meras unidades orgânicas de ensino e investigação, sem personalidade jurídica autónoma (cfr., designadamente, artigos 3.º e 7 dos Estatutos do B…).

Nos termos do disposto no artigo 10.º, n.º 2, do CPTA, “Nos processos intentados contra entidades públicas, a parte demandada é a pessoa coletiva de direito público, salvo nos processos contra o Estado ou as Regiões Autónomas que se reportem à ação ou omissão de órgãos integrados nos respetivos ministérios ou secretarias regionais, em que a parte demandada é o ministério ou ministérios, ou a secretaria ou secretaria regionais, a cujos órgãos sejam imputáveis os atos praticados ou sobre cujos órgãos recaia o dever de praticar os atos jurídicos ou observar os comportamentos pretendidos”. Aliás, também segundo o n.º 3 do mesmo artigo 10.º, “Os processos que tenham por objeto atos ou omissões de entidade administrativa independente, destituída de personalidade jurídica, são intentados contra o Estado ou outra pessoa coletiva de direito público a que essa entidade pertença”.

Todavia, nos termos do n.º 4 ainda do mesmo artigo 10.º, o disposto nos n.ºs 2 e 3 “não obsta a que se considere regularmente proposta a ação quando na petição tenha sido indicado como parte demandada um órgão pertencente à pessoa coletiva de direito público, ao ministério ou à secretaria regional que devem ser demandados”.

Nestes termos, parece de concluir que a presente ação deveria ter sido proposta tão-somente contra o B…, que é a pessoa coletiva pública em questão, sem prejuízo de a mesma se poder considerar regularmente proposta apesar de também ter sido indicada como parte demandada uma sua (mera) unidade orgânica.

 

Os próprios Estatutos do B… atribuem aos presidentes das Escolas a competência para as representar em juízo e fora dele (artigo 54.º, n.º 1, al. a)), o que pode compreender-se dada a autonomia administrativa de que as mesmas gozam, e que lhes permite emitir regulamentos, praticar actos administrativos e celebrar contratos administrativos, nomeadamente (cfr. artigos 41.º e 47.º dos Estatutos do B…). Veja-se, igualmente, o disposto nos artigos 1.º e 10.º, n.º 1, al. a) dos Estatutos da C…, este último a respeito da competência do respetivo presidente para representar a Escola em juízo (Despacho n.º 4065/2017, de 10 de abril de 2017, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 91, de 11 de maio de 2017), bem como o disposto no artigo 13.º, n.º 1, al. a) dos Estatutos Provisórios da C… e da …, a respeito da competência das comissões instaladoras para representação em juízo das Escolas.

Mas tais disposições regulamentares não modificam as regras da legitimidade passiva constantes do CPTA.

Aliás, o disposto no artigo 62.º, n.º 5, dos Estatutos do B… (segundo as correspondentes alterações promovidas através do já mencionado Despacho normativo n.º 6/2016), nos termos do qual “O B… assume a posição da D… em todos os processos judiciais em curso à data de entrada em vigor dos presentes Estatutos” é uma disposição de transição, que tem que ser compreendida no respetivo contexto normativo.

Segundo o n.º 1 deste mesmo artigo 62.º, a D… é “transformada” na C… “no dia 1 de agosto de 2016 e ficará em regime de instalação, com Estatutos provisórios aprovados nos termos do n.º 3 do artigo 38.º do RJIES, até à tomada de posse dos órgãos eleitos”. Os números seguintes dizem respeito, desde logo, à intervenção definidora do Presidente do B… no que toca à transição de situações jurídicas entre a D… e a nova C… . A este competia definir, até 31 de julho de 2016, por despacho, quais os compromissos, encargos, contratos e protocolos da  D… que transitavam para a C… ou para outras Escolas (n.º 3); definir, por despacho, a afetação dos trabalhadores em funções públicas constantes do mapa de pessoal da D… à C… ou outras Escolas (n.º 4); assim como seriam resolvidas por despacho do Presidente do B… todas as outras situações não previstas nos Estatutos referentes à transição entre uma Escola e outra, designadamente, “ações necessárias para a conclusão do ano letivo de 2015-2016”.

Por outras palavras, situações litigiosas pendentes — designadamente, que pudessem gerar encargos — seriam assumidas pelo B…  (daí a transitória assunção da posição da D… pelo B… em todos os processos judiciais em curso naquele momento).

Sucede que, à data da entrada em vigor daquelas alterações estatutárias (3 de agosto de 2016), não se encontrava ainda pendente a presente ação. Mas tão-pouco resulta dos elementos juntos aos autos (designadamente, do processo administrativo) que o contrato do Demandante tenha sido incluído em despacho do Presidente do B… para efeitos da sua transição para a C… . Quid juris, pois?

 

A extinção de uma unidade orgânica de uma certa pessoa coletiva pública não implica a extinção das relações jurídicas que por aquela tenham sido constituídas ao abrigo da autonomia administrativa que lhe tenha sido atribuída. Com efeito, a autonomia administrativa consiste apenas num instrumento de organização administrativa, em razão de valores que o legislador ou certo ente criador consideram justificantes (culturais, académicos, de gestão, etc.). De resto uma unidade orgânica encontra o radical da sua natureza na própria noção de órgão (cujo conceito e explicação das implicações aqui se dispensa). Quando uma certa unidade orgânica é extinta, as relações jurídicas por ela constituídas mantêm-se na esfera jurídica da pessoa coletiva à qual aquela pertencia; sem prejuízo de, caso tal extinção ocorra por transformação, a própria pessoa coletiva poder entregar a vida das relações subsistentes à autonomia administrativa de uma nova unidade orgânica. Mas quando assim não suceda — ou para os casos em que assim não suceda —, as posições jurídicas ativas e passivas emergentes de certa relação jurídica, consoante, manter-se-ão não apenas na esfera jurídica, mas entregues à autonomia administrativa dos órgãos principais da própria pessoa coletiva pública (sobretudo, perante a ausência de uma norma geral de sucessão entre duas unidades orgânicas, quando a opção normativa foi a da identificação específica de situações jurídicas a transitar).

Não pode ser de outro modo, pois mantendo-se a existência da pessoa coletiva pública, mantêm-se também as relações jurídicas constituídas: só nos casos previstos na lei pode uma reorganização de serviços determinar a extinção de relações jurídicas, e ainda assim a coberto de um regime jurídico que tem que ser constitucionalmente aceitável.

Nestes termos, considerar que é o Demandado B… o potencial responsável pelo pagamento de qualquer quantia resultante do eventual reconhecimento dos direitos que o Demandante invoca é, além do mais, uma consequência do próprio princípio da prossecução do interesse público e da proteção dos direitos e interesses dos cidadãos (artigos 266.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa (CRP), e 4.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA)).

 

Do que antecede, resulta que é sobre o Demandado B… que recai a legitimidade passiva para estar na presente ação, tanto em razão do acervo normativo emergente do artigo 10.º do CPTA, como do seu posicionamento substantivo na relação material controvertida.

É certo que a ilegitimidade passiva constitui exceção dilatória, nos termos do disposto no artigo 89.º, n.º 3, al. e) do CPTA; e que a alínea g) do mesmo preceito qualifica como exceção da mesma natureza (com a consequente absolvição da instância, nos termos do n.º 2) a pluralidade subjetiva subsidiária, salvo caso de dúvida fundamentada sobre o sujeito da relação controvertida.

Mas, em bom rigor, não há sequer uma pluralidade subjetiva do lado passivo na presente ação (caso contrário, em tese, poderia multiplicar-se artificialmente o número de partes passivas quando uma ação fosse proposta contra certa pessoa coletiva e vários dos seus órgãos que tivessem tido intervenção no procedimento, apesar do disposto no artigo 10.º do CPTA).

Em todo o caso, resulta do disposto no artigo 8.º, n.º 5, do CPTA, que “A propositura indevida de ação contra um órgão administrativo [ou, mutatis mutandis, contra uma unidade orgânica não personalizada que, nos termos do artigo 10.º, não tenha legitimidade passiva] não tem consequências processuais, nos termos do n.º 4 do artigo 10.º”.

Como tal, determina-se o prosseguimento do processo contra o Demandado B… como parte passiva.

 

Assim, conclui-se que:

  1. O Tribunal é competente.
  2. As partes são legítimas, tendo capacidade e personalidade judiciárias, e estando legalmente representadas.
  3. O processo não padece de vícios invalidantes que impeçam o seu conhecimento.

 

  1. Factos

 

Com interesse para a decisão da causa, resultam provados os seguintes factos:

  1. O Demandante celebrou com a D…, unidade orgânica de ensino e investigação do B…, contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo certo, com sucessivas renovações, para efeitos de exercício de funções docentes na categoria de assistente convidado, abrangendo os seguintes períodos e termos:
    1. 18/10/2010 — 30/09/2011, a tempo parcial (46%); remuneração base mensal = € 501,96 (doc. 1.º do p.a.).
    2. 01/10/2011 — 29/02/2012, a tempo parcial (25%); remuneração base = € 272,81 (doc. 2.º do p.a.).
    3. 01/03/2012 — 30/09/2012, a tempo parcial (42%); remuneração base = € 458,31 (doc. 3.º do p.a.) (este contrato alterou parcialmente o anterior).
    4. 01/10/2012 — 30/09/2013, a tempo parcial (58%); remuneração base = € 632,91 (doc. 4.º do p.a.).
    5. 01/10/2013 — 30/09/2014, a tempo parcial (30%); remuneração base = 327,37 (doc. 5.º do p.a.).
    6. 01/10/2014 — 30/09/2015, a tempo parcial (33%); remuneração base = 360,10 (doc. 6.º do p.a.).
    7. 01/10/2015 — 14/09/2016, a tempo parcial (42%); remuneração base = 458,31 (doc. 7.º do p.a.).
  2. Em 2 de agosto de 2016, foi publicado em Diário da República, 2.ª Série, n.º 147, o Despacho n.º 6/2016, de 20 de julho de 2016, que alterou os Estatutos do B…, transformando a D… em C… (alteração que entrou em vigor em 3 de agosto de 2016).
  3. Em 14/09/2016 caducou a última renovação do contrato do Demandante, não tendo havido da parte da C… ou do B… qualquer manifestação de vontade no sentido de nova renovação, nem do Demandante no sentido da não renovação.
  4. Por carta datada de 16 de novembro de 2016, o Demandante solicitou à C… esclarecimento quanto à sua situação, bem como o pagamento de montantes em dívida (sem especificação).
  5. Em 24/11/2016, o Presidente da Comissão Instaladora da C… exarou despacho nos seguintes termos: “Concordo. Dar conhecimento ao requerente, Eng.º E…”, sobre informação dos serviços que, não sendo inequívoca, parece apontar no sentido de não ser devida qualquer compensação pela caducidade do contrato de trabalho a termo resolutivo certo por “impossibilidade legal expressa” de renovação, “na ausência de distribuição de serviço docente na área, que resultou do processo de reafectação do pessoal (...)”.
  6. Igualmente por provado se tem o pagamento ao Demandante do montante de € 666,97, a título de subsídio de férias e férias não gozadas, conforme resulta do doc. 24.º do p.a., e que as partes admitem por acordo (artigos 12.º e 13.º da contestação, e 5.º do requerimento do Demandante de 10/10/2017), com a consequente redução do pedido.

 

 

  1. Fundamentação

 

Compensação pela caducidade do contrato de trabalho a termo resolutivo certo

 

  1. O que está fundamentalmente em causa na presente ação é saber se o Demandante tem direito a ser compensado pela caducidade do seu contrato de trabalho a termo resolutivo certo, na sequência da respetiva não renovação (após 14/09/2016), e / ou se tem o Demandante direito à perceção de quaisquer montantes respeitante a férias, subsídio de férias e subsídio de Natal na sequência da cessação (não renovação) do contrato.
  2. Ora, o Demandado reconhece ambos os direitos do Demandante referidos supra: cfr. artigos 10.º e 11.º da contestação, assim como a existência de um único contrato (pese embora objeto de renovações: cfr. artigo 17.º da contestação), verificando-se desacordo entre as partes apenas quanto aos critérios de cálculo para quantificação do valor pecuniário desses mesmos direitos.
  3. No momento em que inicialmente foi celebrado o contrato a termo resolutivo certo sub judice (18/10/2010) estava em vigor a Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro (Regime e Regulamento do Contrato de Trabalho em Funções Públicas, ou “RRCTFP”), que, com sucessivas alterações, haveria mais tarde por ser revogada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho (Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, ou “LTFP”), que entrou em vigor no dia 1 de agosto de 2014 (cfr. artigo 44.º, n.º 1).
  4. Ciente da necessidade de o estabelecer de modo a não subsistirem dúvidas quanto à aplicação no tempo, o legislador assentou um regime transitório. Assim, e de acordo com o disposto no artigo 12.º, n.º 2 da LTFP, “No caso de cessação do contrato de trabalho a termo a compensação é calculada do seguinte modo: 
  1. Em relação ao período de duração do contrato até à data da entrada em vigor da presente lei, o montante da compensação é o previsto no Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas aprovado pela Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro, na redação atual;
  2. Em relação ao período de duração do contrato a partir da data referida na alínea anterior, o montante da compensação é o previsto na LTFP
  1. Assim, sendo a facti species determinada pelo “período de duração do contrato até (...)”, torna-se claro que o montante da compensação será calculado ao abrigo da Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro, para os contratos que tenham esgotado os seus efeitos em momento anterior ao da entrada em vigor da LFTP, mas também para o período contratual decorrido deste o respetivo início até ao momento da entrada em vigor da LFTP para aqueles contratos cujos efeitos perdurassem para além de 1 de agosto de 2014 (contratos estes cujo regime compensatório em razão da caducidade seria, então, dual).
  2. Aplicado este critério normativo ao caso dos autos conclui-se que a compensação devida pela não renovação do contrato será calculada nos termos da Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro, quanto aos seguintes períodos contratuais: 18/10/2010 — 30/09/2011; 01/10/2011 — 29/02/2012; 01/03/2012 — 30/09/2012; 01/10/2012 — 30/09/2013; e 01/10/2013 — 31/07/2014 (o período até 30/09/2014 já será regido por critério distinto).
  3. Ao tempo da entrada em vigor da LFTP, dispunha o artigo 252.º (“Caducidade do contrato a termo”) da Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro, como se segue:

 

Artigo 252.º

(Caducidade do contrato a termo)

 

1 - O contrato caduca no termo do prazo estipulado desde que a entidade empregadora pública ou o trabalhador não comuniquem, por escrito, 30 dias antes de o prazo expirar, a vontade de o renovar. 
2 - Na falta da comunicação pelo trabalhador presume-se a vontade deste de renovar o contrato.

 
3 - A caducidade do contrato a termo certo confere ao trabalhador o direito a uma compensação, exceto quando aquela decorra da vontade do trabalhador. 


4 - A compensação a que se refere o número anterior corresponde a 20 dias de remuneração base por cada ano completo de antiguidade, sendo determinada do seguinte modo:


a) O valor da remuneração base mensal do trabalhador a considerar para efeitos de cálculo da compensação não pode ser superior a 20 vezes a retribuição mínima mensal garantida;

 
b) O montante global da compensação não pode ser superior a 12 vezes a remuneração base mensal do trabalhador;

 
c) O valor diário de remuneração base é o resultante da divisão por 30 da remuneração base mensal;

 
d) Em caso de fração de ano, o montante da compensação é calculado proporcionalmente. 


5 - Para efeitos da compensação prevista no número anterior a duração do contrato que corresponda a fracção de mês é calculada proporcionalmente.

 

  1. A remuneração base mensal a ter em conta, para cada período, é a que consta do respetivo contrato ou renovação, aplicando-se então a fórmula de cálculo resultante das alíneas c) e d) do n.º 4 e do n.º 5 do citado artigo 252.º da Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro (e verificando-se o respeito pelos limites decorrentes das alíneas a) e b) do mesmo n.º 4).
  2. Obtêm-se assim os seguintes resultados, por período contratual:
    1. 18/10/2010 — 30/09/2011: remuneração base mensal = € 501,96; remuneração diária (:30) = € 16,73; N.º de dias = 348; Valor da compensação = € 319,05.
    2. 01/10/2011 — 29/02/2012: remuneração base = € 272,81; remuneração diária (:30) = € 9,09; N.º de dias = 152; Valor da compensação = € 75,73.
    3. 01/03/2012 — 30/09/2012: remuneração base = € 458,31; remuneração diária (:30) = € 15,28; N.º de dias = 214; Valor da compensação = € 179,17.
    4. 01/10/2012 — 30/09/2013: remuneração base = € 632,91; remuneração diária (:30) = € 21,09; 1 ano; Valor da compensação = € 421,94.
    5. 01/10/2013 — 31/07/2014: remuneração base = 327,37; remuneração diária (:30) = € 10,91; N.º de dias = 304; Valor da compensação = € 181,78.
  3. Deste modo, o valor da compensação devida ao Demandante pela caducidade do contrato de trabalho a termo resolutivo certo, correspondente ao período ao qual é aplicável o critério da Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro, por determinação do disposto no artigo 12.º, n.º 2, al. a) da LTFP, é de € 1.177,67.
  4. Nos termos do artigo 12.º, n.º 2, al. b), da LFTP, relativamente à restante duração do contrato, o montante da compensação é o previsto na LTFP. Essa duração restante abrange os seguintes períodos: 01/08/2014 — 30/09/2014; 01/10/2014 — 30/09/2015; 01/10/2015 — 14/09/2016.
  5. Nos termos do artigo 293.º, n.º 3, da LTFP, “a caducidade do contrato a termo certo confere ao trabalhador o direito a uma compensação, calculada nos termos previstos no Código do Trabalho para os contratos a termo certo” (exceto quando tal decorra da vontade do trabalhador, o que não é o caso dos autos).
  6. Tal remissão para o Código do Trabalho (“CT”) diz respeito ao modo de calcular a referida compensação, dispondo o artigo 344.º, n.º 2 do CT que “Em caso de caducidade de contrato de trabalho a termo certo decorrente de declaração do empregador nos termos do número anterior, o trabalhador tem direito a compensação correspondente a 18 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade, calculada nos termos do artigo 366.º”.
  7. Esta remissão para o artigo 366.º do CT constitui uma receção do regime material de cálculo da compensação por despedimento coletivo (dispondo, aliás, o respetivo n.º 6 que “Nos casos de contrato de trabalho a termo e de contrato de trabalho temporário, o trabalhador tem direito a compensação prevista no n.º 2 do artigo 344.º e do n.º 4 do artigo 345.º, consoante os casos, aplicando-se, ainda, o disposto nos n.ºs 2 a 5 do presente artigo.”). Relevante é, pois, o regime constante do n.º 2 do artigo 366.º do CT, que encerra as regras de cálculo a aplicar, e que dispõe nos seguintes termos (descontado o introito):
  1. O valor da retribuição base mensal e diuturnidades do trabalhador a considerar para efeitos de cálculo da compensação não pode ser superior a 20 vezes a retribuição mínima mensal garantida;

 b) O montante global da compensação não pode ser superior a 12 vezes a retribuição base mensal e diuturnidades do trabalhador ou, quando seja aplicável o limite previsto na alínea anterior, a 240 vezes a retribuição mínima mensal garantida;

c) O valor diário de retribuição base e diuturnidades é o resultante da divisão por 30 da retribuição base mensal e diuturnidades; 

d) Em caso de fração de ano, o montante da compensação é calculado proporcionalmente.

 

  1. Também aqui é necessário entrar em linha de conta com o valor da remuneração base correspondente a cada período contratual e calcular o valor da remuneração diária (com a diferença de que a cada ano contratual correspondem já não 20 dias de remuneração diária, mas apenas 18).
  2. Considerando os períodos contratuais relevantes, obtêm-se os seguintes resultados:
    1. 01/08/2014 — 30/09/2014: remuneração base = € 327,37; remuneração diária (:30) = € 10,91; N.º de dias = 61; Valor da compensação = € 32,82.
    2. 01/10/2014 — 30/09/2015: remuneração base = € 360,10; remuneração diária = € 12,00; 1 ano; Valor da compensação = € 216,00.
    3. 01/10/2015 — 14/09/2016: remuneração base = € 458,31; remuneração diária (:30) = € 15,28; N.º de dias = 350; Valor da compensação = € 263,73.
  3. Deste modo, o valor da compensação devida ao Demandante pela caducidade do contrato de trabalho a termo resolutivo certo, correspondente ao período ao qual é aplicável o critério do CT, por remissão do artigo 293.º, n.º 3, da LFTP, é de € 512,55.
  4. Em consequência o valor total devido ao Demandante pela caducidade do contrato de trabalho a termo resolutivo certo é de (€ 1.177,67 + € 512,55 =) € 1690,22.

 

 

Férias, subsídio de férias e subsídio de Natal

 

  1. O Demandante peticiona o pagamento de férias não pagas e não gozadas, bem como de proporcionais do subsídio de Natal, com referência, ao ano de 2015 e, no último caso, de 2016, utilizando um critério de ordenado médio mensal (que fixa em € 500,00).
  2. Foi já dado como assente o pagamento ao Demandante do montante de € 666,97, a título de subsídio de férias e férias não gozadas, conforme resulta do doc. 24.º do p.a., e que as partes admitem por acordo (artigos 12.º e 13.º da contestação, e 5.º do requerimento do Demandante de 10/10/2017), com a consequente redução do pedido.
  3. Segundo o quadro legal aplicável, o trabalhador tem direito a um subsídio de Natal igual a um mês de remuneração base mensal, que será proporcional ao tempo de serviço prestado no ano civil, designadamente, no ano da cessação do contrato (artigo 151.º, n.º 1 e n.º 2, al. c), da LTFP).
  4. Idêntica regra de proporcionalidade se verifica em matéria de férias e respetivo subsídio no ano da cessação do contrato, por força das disposições conjugadas do artigo 152.º da LFTP e do artigo 245, n.º 1, (no caso) al. b), do CT (atento o disposto no artigo 4.º, n.º 1, da LTFP).
  5. Atendendo ao que antecede, bem como à retribuição base do Demandante e número de dias do contrato no ano da respetiva cessação, e considerando que o Demandado expressamente o aceita, assenta-se o valor de € 956,95 devido ao Demandante a título de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal.

 

 

 

  1. Decisão

 

Pelo exposto, o Tribunal:

  1. Reconhece o direito do Demandante à compensação pela caducidade do contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo certo sub judice, com os fundamentos que antecedem, e, consequentemente,
  2. Condena o Demandado B… (B…) a pagar ao Demandante a quantia de € 1690,22 (mil seiscentos e noventa euros e vinte e dois cêntimos) a título de compensação por tal caducidade, nos termos legais.
  3. Condena o Demandado B… (B…) a pagar ao Demandante a quantia de € 956,95 (novecentos e cinquenta e seis euros e noventa e cinco cêntimos), a título de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal não pagos, nos termos expostos.
  4. Condena o Demandado B… (B…) a pagar ao Demandante juros à taxa legal em vigor, desde a data do vencimento até integral pagamento.

 

Fixa-se o valor da causa em € 4.514,67 (quatro mil quinhentos e catorze euros e sessenta e sete cêntimos), de acordo com os critérios decorrentes do artigo 32.º do CPTA.

 

Fixa-se o valor dos encargos da arbitragem de acordo com a Tabela do CAAD em vigor.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 1 de março de 2018

 

O Árbitro,

 

 

 

 

(Rui Guerra da Fonseca)