Jurisprudência Arbitral Administrativa


Processo nº 15/2017-A
Data da decisão: 2018-02-19  Relações júrídicas de emprego público 
Valor do pedido: € 30.000,01
Tema: Reconhecimento do direito a prestar provas públicas para transitar para a categoria de Professor Coordenador Principal.
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DECISÃO ARBITRAL

 

 

I – Do Tribunal Arbitral, das Partes e do pedido

 

I.1 – A presente arbitragem em matéria administrativa relativa a relação jurídica de emprego público decorre junto do CAAD, na Avenida Duque de Loulé, n.º 72 A, 1050-091 Lisboa, por efeito do artigo 3.º do Regulamento de Resolução Alternativa de Litígios do A…, publicado em Anexo ao Despacho n.º 8839/2011, de 21 de junho de 2011 [cf. Diário da República, 2.ª série – N.º 126 – 4 de Julho de 2011, página 27953].

 

O referido artigo 3.º vincula genericamente o A… ao CAAD para (com bem delimitadas exceções) dirimir os litígios – desde que de valor não superior a € 30 000,00 – emergentes de relações reguladas pelo Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 185/81, de 1 de julho, incluindo matérias objeto de regulamentação pelo Instituto e suas Unidades Orgânicas; sendo que uma tal vinculação – desde logo considerada, quanto ao Estado, no artigo 187.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos – está prevista no artigo 44.º-A, n.º 4, do mesmo Estatuto, norma que exige que a regulamentação respetiva estabeleça o tipo e o valor máximo dos litígios para os quais a vinculação genérica é eficaz.

 

Adicionalmente, a Demandante e o A… convencionaram expressamente [cf. documento 1 junto à petição inicial] não renunciarem ao recurso da decisão arbitral que vier a ser proferida na presenta arbitragem, considerando o artigo 27.º, n.º 2, do Regulamento da Arbitragem [cf. “Novo Regulamento de Arbitragem Administrativa”, aplicável à arbitragem em matéria administrativa que decorre no CAAD (disponível em www.caad.org.pt/)] e para efeitos do artigo 39.º, n.º 4, da Lei da Arbitragem Voluntária [cf., ainda, artigo 185.º-A do Código de Processo nos Tribunais Administrativos].

 

Não oferece qualquer dúvida a legitimidade do CAAD, enquanto centro de arbitragem institucionalizada [cf. artigo 3.º, n.º 2, dos Estatutos do CAAD (disponíveis em www.caad.org.pt/) e Despacho n.º 5097/2009, de 27 de janeiro de 2009, no Diário da República, 2.ª série – N.º 30 – 12 de Fevereiro de 2009, página 6113], nem a possibilidade de vinculação prévia à sua jurisdição.

 

Este Tribunal Arbitral, constituído em 20 de junho de 2017, é composto por um Árbitro, conforme estatuição do artigo 15.º, n.º 2, do Regulamento da Arbitragem; e, nos termos dos artigos 15.º, n.º 3, e 16.º, n.º 1, do mesmo Regulamento, o signatário foi o Árbitro designado para apreciar e decidir a presente causa; devendo fazê-lo segundo o Direito constituído [cf. artigos 5.º, n.º 1, alínea f), e 26.º, n.º 1, do Regulamento da Arbitragem; e artigo 185.º, n.º 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos].

 

À luz dos artigos 5.º, n.º 1, alíneas b) e c), e 26.º, n.º 2, do Regulamento da Arbitragem, o Tribunal explicita que poderá recorrer subsidiariamente às normas da Lei da Arbitragem Voluntária e do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

 

Dado que não foi remetido ao Tribunal o processo administrativo e demais documentos pertinentes, conforme estipula o artigo 12.º, n.º 4, do Regulamento da Arbitragem, nem mesmo foi alegada a inexistência deles ou a imputação a terceiros da falta de remessa, regerá, sendo o caso, o disposto no n.º 7 do mesmo artigo.

 

I.2 – A Demandante, B…, casada, docente do ensino superior politécnico, residente na …, n.º…, …, …-… …, interpôs a presente ação contra o A…, pessoa coletiva de direito público, com sede na Rua …, n.º…, …-… …, e contra a C… do A…, referindo esta também como entidade pública personalizada.

 

Acontece que esta C…, designada entre 1993 e 2016 Escola C…, foi formalmente reconhecida como Unidade Orgânica do A… em fevereiro de 2006, o que se mantém desde a revisão estatutária feita em 2009, sendo o Instituto o único a ter a natureza jurídica de pessoa coletiva de direito público, conforme resulta dos artigos 3.º dos Estatutos de cada um [cf. Despacho normativo n.º 5/2009, de 26 de janeiro de 2009, no Diário da República, 2.ª série – N.º 22 – 2 de Fevereiro de 2009, páginas 4786 a 4796, Despacho normativo n.º 6/2016, de 20 de julho de 2016, no Diário da República, 2.ª série – N.º 147 – 2 de agosto de 2016, páginas 24018 a 24019, e Despacho n.º 15836/2009, de 26 de junho de 2009, no Diário da República, 2.ª série – N.º 132 – 10 de Julho de 2009, páginas 27253 a 27260].

 

Por assim ser, decidiu-se no Despacho n.º 1, de 9 de agosto de 2017, que, embora nela não esteja em causa um litígio entre Unidades Orgânicas do A…– situação que convocaria a norma do n.º 8 do artigo 10.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e que justificaria a relevância da competência do Presidente da C… para a representar em juízo [cf. artigo 14.º, n.º 1, alínea a), dos Estatutos desta] –, a presente ação deve considerar-se regularmente proposta.

 

Isto nos termos dos artigos 8.º-A, n.º 5, e 10.º, n.º 4, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, considerando-se exclusivamente demandado o A…, que é quem na ação tem personalidade e capacidade judiciárias e legitimidade passiva, à luz daqueles artigos 8.º-A, n.º 2, e 10.º, n.º 2, sendo que ele foi regularmente citado e contestou tempestivamente [cf., ainda, artigo 78.º, n.º 3, do mesmo Código].

 

Neste ponto, acrescentou-se no mesmo Despacho n.º 1 que, como se disse já, o instrumento jurídico de vinculação à jurisdição arbitral do CAAD que releva in casu respeita ao A…, na universalidade das estruturas que o integram, e a convenção adicionalmente celebrada para acautelar a possibilidade de recurso do que for decidido na presente arbitragem foi-o exclusivamente entre o mesmo Instituto e a Demandante.

 

Acrescente-se que do que no Despacho n.º 1 se promoveu constou, seja a pronúncia escrita da Demandante e do Demandado A… sobre a questão da falta de personalidade judiciária da Escola C… deste Instituto, seja a possibilidade de pronúncia escrita autónoma desta Escola sobre a mesma questão.

 

Cumprido pelas Partes o que nesta matéria se promovera, sem que tivesse advindo qualquer dissonância quanto ao que sobre ela se decidira, no Despacho n.º 2, de 17 de outubro de 2017, considerou-se, em termos definitivos, exclusivamente demandado na presente ação o A… .

 

I.3 – A Demandante termina a petição inicial, que deu entrada no CAAD em 22 de abril de 2017, formulando o pedido que de imediato se transcreve:

“Termos em que com o douto suprimento de V. Ex.ª deve a presente demanda proceder, por provada, e em consequência,

  1. ser reconhecido e considerado como relevante o tempo de serviço docente prestado pela Demandante em regime de tempo integral/exclusividade, nos anos letivos de 1995/96 (pelo menos, desde 17 de agosto de 1996) e 1996/97 (até 2 de dezembro de 1996), ao abrigo de contrato de prestação de serviços, reconhecendo-se assim, à data de 18/8/2016, o exercício de funções docentes em Regime de Tempo Integral ou Exclusividade há mais de 20 anos;
  2. ser reconhecido o direito da Demandante à realização, por via de interpretação extensiva ou integração, ao abrigo do regime fixado no artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17/8, de provas públicas de avaliação de competência pedagógica e técnico científica para transitar para a categoria de Professor Coordenador Principal prevista no Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico (ECPDESP), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 185/81, de 1/7, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31/8, e pela Lei n.º 7/2010, de 13/5;
  3. as entidades demandadas condenadas à prática (i) dos atos jurídicos (máxime o ato de admissão da Demandante às provas) e (ii) das operações materiais, exigidas para a realização e prestação das referidas provas públicas de avaliação de competência pedagógica e técnico científica, para transitar para a categoria de Professor Coordenador Principal;

“bem como,

  1. das custas e encargos da demanda.”

 

 

II – Dos fundamentos, de facto e de Direito, invocados pelas Partes

 

II.1 – Em prol deste seu pedido, a Demandante invoca os seguintes factos que o Tribunal considera relevantes face às soluções plausíveis da presente causa em matéria de Direito:

1.º - Substituindo requerimento de 2 de março de 2016, requereu em 10 de outubro de 2016, ao Presidente da Escola C… do A…, agora com fundamento no Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, a prestação das referidas provas públicas [cf. documento 2 junto à petição inicial], nos termos que de imediato se transcrevem:

“Termos em que vem:

  1. Requerer a contagem de tempo de serviço em exercício de funções docentes em regime de tempo integral desde 17 de Agosto de 1996.

Vem requerer que seja considerado como relevante para efeito da aplicação do disposto no n.º 5 do artigo 8.º-A da Lei n.º 7/2010, de 13 de Maio, com a nova redação dada pelo Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, o tempo de serviço docente prestado pela Demandante em regime de tempo integral/exclusividade, nos anos lectivos de 1995/96 (desde 17 de Agosto de 1996) e 1996/97 (até 2 de Dezembro de 1996), ao abrigo de contrato de prestação de serviços, reconhecendo-se assim à data de 18/8/2016 o exercício de funções docentes em Regime de Tempo Integral ou exclusividade há mais de 20 anos, bem como o seu direito a requerer provas nos termos do referido artigo.

  1. Requerer prestação de provas públicas para a transição para a categoria de Professor Coordenador Principal na área de Ciências Químicas e das Biomoléculas, tendo em conta que a requerente se encontra em condições legais* de aceder a esta Categoria nos termos do n.º 3 do artigo 9.º-A do ECPDESP e que nos termos do 1) possui à data de 18/8/2016 mais de 20 anos de exercício de funções docentes em Regime de tempo integral ou exclusividade.

*Sendo Professora Coordenadora em exclusividade desde 1/2/2004, Doutorada desde 6/7/2000 com Agregação desde 26/5/2009, entende a Requerente que está em condições de transitar para a categoria de Professor Coordenador Principal, por via da aprovação em provas públicas realizadas para avaliação da sua competência pedagógica e técnico-científica na área de Ciências Químicas e das Biomoléculas.”; 

2.º - Não obteve qualquer resposta a este seu requerimento de 10 de outubro de 2016;

3.º - Desempenha funções docentes na atual Escola C… do A…, mediante contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, como professora coordenadora, categoria que detém desde 1 de fevereiro de 2004 – com agregação desde 26 de maio de 2009, segundo a própria, ou desde 1 de junho de 2009, segundo a Escola C… do Instituto A… [cf. documentos 2 e 3 juntos à petição inicial];

4.º - Tendo detido, entre 17 de outubro de 2003 e 31 de janeiro de 2004, a categoria de professora adjunta [cf. documento 3 junto à petição inicial];

5.º - Entre 3 de dezembro de 2001 e 16 de outubro de 2003, desempenhou as suas funções docentes nessa mesma Escola (então Escola C… do …) mediante contrato que a equiparou a professora adjunta [cf. documento 3 junto à petição inicial];

6.º - Entre 14 de julho de 2000 e 2 de dezembro de 2001 [considerando-se um óbvio lapso de escrita, que assim se retifica, a referência “2/12/2011” ínsita em 6 da petição inicial], desempenhou funções docentes na Universidade do … como professora convidada equiparada a professora auxiliar [cf. documento 3 junto à petição inicial e Despachos n.º 20 394/2000, de 19 de setembro de 2000, e n.º 1307/2002, de 2 de janeiro de 2002, ambos fotocopiados do Diário da República no documento 1 junto à contestação];

7.º - Doutorou-se em 6 de julho de 2000;

8.º - Entre 1 de janeiro de 1998 e 13 de julho de 2000, desempenhara já funções docentes na Escola C… mediante contrato que a equiparou a professora adjunta [cf. documento 3 junto à petição inicial];

9.º - E, entre 2 de dezembro de 1996 e 31 de dezembro de 1997, desempenhara também funções docentes na Escola C… mediante contrato que a equiparou a professora adjunta [cf. documento 3 junto à petição inicial];

10.º - Todas as referidas funções docentes foram exercidas em regime de exclusividade, com exceção destas últimas – entre 2 de dezembro de 1996 e 31 de dezembro de 1997 –, que foram exercidas em regime de tempo integral [cf. documento 3 junto à petição inicial];

11.º - Até 2 de dezembro de 1996 [considerando-se um óbvio lapso de escrita, que assim se retifica, a referência “2/12/2016” ínsita em 11 da petição inicial], e desde o ano letivo de 1992-1993, exerceu sempre funções docentes na Escola C… em regime de prestação de serviços, funções que são identificadas em Declaração desta mesma Escola de 31 de janeiro de 2003 [cf. documento 4 junto à petição inicial];

12.º - A atividade académica por si desenvolvida no ano letivo de 1995-1996 e no primeiro semestre do ano letivo de 1996-1997 incluiu – para além do atendimento e apoio aos alunos, dos exames em julho e em setembro, da investigação e da gestão académica – serviço docente distribuído de doze horas semanais de lecionação, referente a aulas teóricas, teórico-práticas e práticas na disciplina de Química Aplicada nos cursos de Anatomia Patológica, Citológica e Tanatológica, de Higiene e Saúde Ambiental e de Radioterapia [cf. relatório anexo ao documento 2, documento 4 e documentos 5 a 11, estes relativos às classificações finais dos alunos, todos juntos à petição inicial];

13.º - A atividade académica por si desenvolvida, como prestação de serviços, no ano letivo de 1995-1996 e no primeiro semestre do ano letivo de 1996-1997 teve continuidade no referido contrato (administrativo de provimento) que – ainda neste primeiro semestre, a partir de 2 de dezembro de 1996, e em regime de tempo integral – a equiparou a professora adjunta;

14.º - Possui as condições para aceder à categoria de professor coordenador principal à luz do regime normal do respetivo recrutamento, constante do artigo 9.º-A, n.ºs 2 e 3, do Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico: concurso documental de doutorados há mais de cinco anos e detentores do título de agregado ou de título legalmente equivalente;

15.º - Sendo que até à data da propositura da presente ação não fora aberto na Escola C… do A… nenhum concurso para provimento de vaga na categoria de professor coordenador principal, prevista desde 2009, havendo docentes com os requisitos habilitacionais exigidos.

 

II.2 – Na contestação aceita-se expressamente como verdadeira a matéria de facto alegada pela Demandante tendo-se, para além da afirmação genérica de não aceitação do que esteja em “manifesta contradição” com a defesa:

1.º - Impugnado definidamente aquela referência “2/12/2011” que surge em 6 da petição inicial como correspondendo à data final do desempenho de funções docentes na Universidade do … [sendo que resulta inequívoco do próprio documento 3 junto à petição inicial que tal data foi sim 2 de dezembro de 2001, razão por que, tratando-se de óbvio lapso de escrita, se assumiu esta data e não aquela na descrição feita do facto que no ponto anterior se especificou em sexto lugar];

2.º - Não concedido que a atividade académica desenvolvida pela Demandante, como prestação de serviços, no ano letivo de 1995-1996 e até 2 de dezembro de 1996, já no ano letivo de 1996-1997, o tenha sido em regime de tempo integral.

 

E, adicionalmente, constata o Demandado na contestação o facto de a Demandante não ter requerido, no tempo legalmente disponibilizado para tal, a realização das provas públicas previstas no n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto [que alterou o Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico], na redação da Lei n.º 7/2010, de 13 de maio; mais emitindo a opinião de que ela não o fez porque saberia não preencher a condição então exigida de mais de 15 anos de exercício de funções docentes em regime de tempo integral ou exclusividade, já que teria consciência da irrelevância para este fim das funções docentes na Universidade do … como professora convidada equiparada a professora auxiliar, exercidas entre 14 de julho de 2000 e 2 de dezembro de 2001.

 

II.3 – A Demandante fundamenta a sua pretensão nos seguintes argumentos de Direito, que, no que releva, assim se enunciam:

1.º - A norma constante do n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto [que alterou o Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico], na redação da Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, previu um regime transitório excecional mediante o qual os assistentes, os professores-adjuntos e os professores-coordenadores, que então exercessem funções docentes em tempo integral ou exclusividade há mais de 15 anos, podiam requerer, até 13 de maio de 2011, a prestação de provas públicas de avaliação da competência pedagógica e técnico-científica para que, em caso de aprovação, transitassem sem mais para o regime de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado na respetiva categoria; e a norma constante do n.º 9 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, também na redação da Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, previu um regime de transição idêntico para os docentes equiparados àquelas categorias;

2.º - Conforme já foi decidido judicialmente [e a Demandante refere-se, seja ao Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 17-01-2014, no Processo n.º 00677/11.1BECBR, que cita extensivamente, seja à Sentença, que junta, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja de 15-06-2016, no Processo n.º 187/15.8BEBJA, a qual, por sua vez, se suporta naquele Acórdão], tais normas devem interpretar-se no sentido de, não apenas permitirem uma transição para um novo regime contratual, mas de permitirem também a transição para categoria superior à detida ou a que o docente está equiparado, devendo entender-se a expressão “respetiva categoria”, ínsita em ambas as normas, como referindo-se à categoria à qual se pretende aceder com as provas requeridas;

3.º - E, na lógica do que já foi decidido pelo CAAD [cf. Processo n.º 9/2015-A], deve relevar, para efeitos de contagem daqueles 15 anos de exercício de funções docentes em tempo integral, o desempenho dessas funções em regime de prestação de serviços em tempo integral;

4.º - O Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, aprovou regras complementares do processo de transição dos docentes do ensino superior politécnico regulado pelo Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, com as alterações da Lei n.º 7/2010, de 13 de maio; e no parágrafo décimo primeiro do seu preâmbulo escreveu-se que se faculta a “possibilidade de a realização das provas públicas para a transição para a carreira”, introduzida pelas referidas normas de 2010, “aos docentes que contem, desde 1 de setembro de 2009, 20 anos de serviço em regime de tempo integral ou de dedicação exclusiva”;

5.º - “A vontade do legislador expressa neste segmento do relatório preambular seria renovar a possibilidade” de os docentes enquadrados pelas mesmas normas de 2010 realizarem as provas públicas a que elas se referem, “desde que até à entrada em vigor do diploma de 2016 tivessem mais de 20 anos de serviço docente em regime de exclusividade/tempo integral”;  

6.º - Sendo que a concretização normativa daquela afirmação preambular consta do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, nos moldes seguintes: possibilidade de os assistentes e os equiparados a assistente, a professor adjunto ou a professor coordenador que, à data da entrada em vigor deste diploma, exercessem funções em regime de tempo integral ou de dedicação exclusiva há mais de 20 anos requererem, até 31 de dezembro de 2016, a prestação das referidas provas, transitando sem mais, em caso de aprovação, para o regime de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado na mesma categoria em que exerciam funções;

7.º - Porque este artigo 6.º teria ficado aquém dos propósitos anunciados naquele inciso preambular, haveria de, mediante interpretação jurídica (extensiva e corretiva) do mesmo ou integração de lacuna, ler e aplicar esse preceito com o seguinte sentido: os docentes abrangidos pelo n.º 9 do artigo 6.º e pelo n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação da Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, “podem, até 31 de dezembro de 2016, requerer a prestação das provas a que se referem estas normas, com as consequências nelas estabelecidas em caso de aprovação”;

8.º - Devendo considerar-se relevar para tal o seu exercício de funções docentes em regime de prestação de serviços no ano letivo de 1995-1996 e, até 2 de dezembro de 1996, no primeiro semestre do ano letivo de 1996-1997, possuindo assim mais de 20 anos de desempenho de docência em tempo integral ou exclusividade à data de 18 de agosto de 2016, o dia da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto;

9.º - Pois deve considerar-se, na qualificação do Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico, que essa atividade académica por si desenvolvida como prestação de serviços no ano letivo de 1995-1996 e, até 2 de dezembro de 1996, no primeiro semestre do ano letivo de 1996-1997 ocorreu em regime de tempo integral.

 

II.4 – Concluindo por que deve a presente ação ser considerada totalmente improcedente, a contestação contradiz este entendimento da Demandante, suportando-se nos seguintes argumentos de Direito, que, também no que releva, assim se enunciam:

1.º - O tempo de serviço correspondente às funções docentes da Demandante na Universidade do … como professora convidada equiparada a professora auxiliar, entre 14 de julho de 2000 e 2 de dezembro de 2001, não pode relevar para efeitos do regime transitório excecional que ela invoca por se tratar de serviço docente desempenhado fora do ensino superior politécnico, em conformidade com a argumentação jurídica constante, seja do ponto 2 do ofício …, dirigido em 31 de julho de 2015 pela Secretaria de Estado do Ensino Superior ao Presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos [cf. documento 2 junto à contestação], seja da Informação n.º INF-G/…/2015/DSERT, de 17 de agosto de 2015, da Secretaria-Geral do Ministério da Educação e Ciência, que obteve a concordância do Secretário de Estado do Ensino Superior em 1 de outubro de 2015 e que, em 5 de outubro de 2015, foi comunicada à Presidente do A… por ofício …/…/2015/DSERT pela mesma Secretaria-Geral [cf. documento 3 junto à contestação], seja do ponto 14 da Nota Interpretativa do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos, já elaborada após a publicação do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto [cf. documento 4 junto à contestação];

2.º - Razão por que se não pode considerar verificada aquela condição invocada pela Demandante de possuir, à data de 18 de agosto de 2016, mais de 20 anos de exercício de funções docentes em regime de tempo integral ou exclusividade;

3.º - O Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, maxime o seu artigo 6.º, não prevê a possibilidade pretendida pela Demandante, pois que abrange, expressa e taxativamente, apenas os assistentes, os equiparados a assistente, os equiparados a professor adjunto e os equiparados a professor coordenador e prevê, no caso de aprovação nas provas requeridas, a transição para o regime de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado mas na mesma categoria em que exercem já funções;

4.º - “Se o legislador quisesse também abranger os professores adjuntos e os professores coordenadores em tal norma, tê-lo-ia feito expressamente, aliás como fez na Lei n.º 7/2010. Mas não o fez!”;

5.º - As provas públicas previstas neste artigo 6.º servem agora “para consolidação em termos de carreira e não como forma de promoção/transição”; “servem para acabar com a precariedade: tanto do ponto de vista dos assistentes mas também dos equiparados”; “não visam resolver problemas distintos, a saber, o da progressão na carreira ou o da promoção para categoria superior (sendo este último aquilo que a Demandante procura)”;

6.º - A passagem do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, identificada pela Demandante refere-se a provas públicas “para a transição para a carreira”;

7.º - E a segurança no trabalho em funções públicas da Demandante está já devidamente salvaguardada, à luz do artigo 10.º-A, n.º 1, do Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico;

8.º - A progressão da categoria de professor coordenador para a categoria de professor coordenador principal pode, pois, ocorrer agora exclusivamente através do concurso documental exigido pelo artigo 9.º-A, n.º 2, do Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico;

9.º - “Isto sem prejuízo de ter sido concedido em devido tempo e ao caso dos presentes autos, aos professores coordenadores a possibilidade de obterem/progredirem para coordenadores principais através de prova pública, através do mecanismo excecional/especial contido na Lei n.º 7/2010”; “Já no atual Decreto-Lei (n.º 45/2016) tal não sucede!”;

10.º - Assim, o artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, é muito diferente daquela outra norma do n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação da Lei n.º 7/2010, de 13 de maio;

11.º - O que inviabiliza a interpretação extensiva do primeiro pretendida pela Demandante, “tendo por base um regime passado e uma sentença que estão diametralmente opostos ao que o atual Decreto-Lei n.º 45/2016 dispõe e acima de tudo em relação ao objetivo que motivou este novo regime excecional de transição”; que “é taxativo relativamente aos docentes que poderão beneficiar da realização de provas públicas”.

 

II.5 – Face a esta argumentação do Demandado, veio a Demandante, em 29 de maio de 2017, reiterar “a alegação que no cômputo do tempo de serviço docente (...) para efeito do peticionado, deve valer o tempo de serviço docente prestado no subsector universitário”, reproduzindo, em abono de tal reiteração, o decidido pelo CAAD no Processo n.º 50/2013-A.

 

Reagiu o Demandado, requerendo, em 31 de maio de 2017, o desentranhamento dos autos de tal nova alegação da Demandante, por a considerarem manifestamente inadmissível.

 

Decidiu-se no Despacho n.º 2 este incidente emergente daquela resposta da Demandante à contestação, objeto desta reclamação do Demandado: tendo presente que tal resposta corresponde claramente à prática de um ato que as normas processuais não admitem [cf., maxime, artigo 12.º do Regulamento da Arbitragem e artigo 85.º-A do Código de Processo nos Tribunais Administrativos], produzindo nulidade, dado tratar-se de irregularidade que pode influir no exame ou na decisão da causa, e mais tendo presente aquela reclamação do Demandado, considerou-se não escrita a referida resposta apresentada pela Demandante à contestação [cf. artigos 195.º e 197.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi artigo 1.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos].

 

 

III – Do objeto da ação e das questões sub judice

 

III.1 – A Demandante encima a sua petição inicial com a afirmação de que pretende com a presente ação o “reconhecimento de situação jurídica subjetiva e condenação na prática de atos devidos”. E termina-a com o pedido que já se transcreveu.

 

Logo no Despacho n.º 1 foram equacionadas as questões emergentes deste objeto da presente ação; e isso foi feito considerando já a publicação, na precisa data desse mesmo Despacho, da Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto, que altera o Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, com relevância na situação sub judice, na medida em que a norma do n.º 1 do artigo 6.º deste diploma passa a estatuir, produzindo a alteração efeitos desde 18 de agosto de 2016, o seguinte: “Os assistentes e os equiparados a assistente, a professor adjunto ou a professor coordenador que, à data da entrada em vigor do presente decreto-lei, exerçam funções em regime de tempo integral ou de dedicação exclusiva há mais de 15 anos podem, até 31 de dezembro de 2017, requerer a prestação das provas a que se referem os n.ºs 9, 10 e 11 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, alterado pela Lei n.º 7/2010, de 13 de maio.”

 

Como se escreveu no Despacho n.º 1, embora não tenha sido totalmente clara no modo como se expressou, é muito óbvio que a Demandante pretende o “reconhecimento de situação jurídica subjetiva” com relevância, não na data da propositura da presenta ação – 22 de abril de 2017 –, mas sim na data – 10 de outubro de 2016 – em que requereu com fundamento no Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, a prestação das provas públicas que antes haviam sido previstas no n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação da Lei n.º 7/2010, de 13 de maio.

 

É que – não fora a citada alteração agora feita pela Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto – o “reconhecimento de situação jurídica subjetiva” com relevância a 22 de abril de 2017 seria imediatamente improcedente por causa da extinção, em 31 de dezembro de 2016, do direito de requerer tais provas, conforme a anterior previsão do n.º 1 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto.

 

E, para mais, seria incompatível com o que a Demandante afirma em 3, 4 e 5 da petição inicial, ao fundamentar a presente ação com a ausência de resposta àquele seu requerimento de 10 de outubro de 2016, e mesmo com o seu pedido de condenação à sua admissão àquelas provas públicas.

 

Por outro lado, é notório que foi por referência a este requerimento de 10 de outubro de 2016 que o Demandado entendeu o peticionado pela Demandante e dele se defendeu na contestação, tendo assim interpretado convenientemente a petição inicial, o que permite dispensar qualquer iniciativa tendente à clarificação da mesma [cf. artigo 186.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 1.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos].

 

III.2 – Assim sendo – continuou a escrever-se no Despacho n.º 1 –, e existindo um dever de decisão do requerimento da Demandante de 10 de outubro de 2016 [cf. artigo 13.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo], o objeto da presente ação, conforme formatado por ela, é a condenação do A… à decisão, no âmbito da sua Unidade Orgânica Escola C…, desse mesmo requerimento, e a condenação a uma decisão favorável, com a prática dos atos necessários à admissão às provas públicas requeridas e à realização das mesmas, pressupondo esta condenação a uma tal decisão favorável a resposta, sucessiva, às seguintes duas questões, as questões sub judice:

1.ª - Permite a argumentação própria da metodologia do Direito concluir, como preconiza a Demandante, que o artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, confere aos docentes do ensino superior politécnico com a categoria de professor coordenador o direito de, querendo, requererem, agora até 31 de dezembro de 2017, a prestação de provas públicas de avaliação da sua competência pedagógica e técnico-científica para, em caso de aprovação, acederem, sem outras formalidades, mantendo o regime de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado, à categoria de professor coordenador principal?

2.ª - Em caso afirmativo, preenche concretamente a Demandante as condições, quanto ao regime de exercício de funções e à duração deste, exigidas pelo mesmo artigo, considerando já a redação da Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto, para gozo da faculdade de requerer a prestação de tais provas, maxime considerando as funções docentes por si exercidas em regime de prestação de serviços e as funções docentes por si exercidas no ensino universitário?

 

III.3 – Em suma – concluiu neste ponto o Despacho n.º 1 –, está em causa o objeto previsto nas alíneas b), f) e g) do n.º 1 do artigo 37.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, numa cumulação perfeitamente legítima e numa ação que foi interposta tempestivamente [cf. artigos 4.º e 69.º, n.º 1.º, do mesmo Código e artigos 128.º, n.º 1, e 129.º do Código do Procedimento Administrativo; e cf. artigo 11.º do Regulamento da Arbitragem].

 

 

IV – Do valor da causa e da competência do Tribunal Arbitral

 

IV.1 – A Demandante – sem que a contestação se pronunciasse sobre o tema – indicou na petição inicial para a presente causa o valor de € 5237,92, esclarecendo que este valor assenta na multiplicação por oito (o número de remunerações mensais, incluindo subsídio de Natal, entre outubro de 2016, data do referido requerimento para realização de provas, e abril de 2017, data da propositura desta ação) do diferencial pecuniário ilíquido entre o vencimento base por si recebido, correspondente à categoria de professor coordenador com agregação, e o vencimento base correspondente ao primeiro escalão da categoria de professor coordenador principal, a que pretende aceder.

 

No Despacho n.º 1 questionou-se este valor da causa indicado pela Demandante.

 

É inequívoco que tem de ser atribuído um valor pecuniário certo à causa, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido, com efeitos em termos de recorribilidade da sentença do tribunal e de custas processuais, e que, sem prejuízo dos poderes das partes relativamente à indicação desse valor, compete ao juiz fixá-lo [cf. artigo 31.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e, ex vi n.º 4 deste artigo, artigos 305.º e 306.º do Código de Processo Civil; cf., ainda, Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 16-09-2011, no Processo n.º 00638/11.0BEPRT].

 

E, precisamente como acontece na presenta arbitragem, o valor da causa pode também condicionar a suficiência do instrumento de vinculação à jurisdição do CAAD.

 

Razão por que importou analisar, logo nesse Despacho n.º 1, qual deva ser o valor a fixar para a presente causa.

 

Embora não o tenha dito expressamente, terá a Demandante indicado aquele valor de € 5237,92 à luz do critério geral previsto no n.º 2 do artigo 32.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos: “Quando pela ação se pretenda obter um benefício diverso do pagamento de uma quantia, o valor da causa é a quantia equivalente e esse benefício.”

 

Acontece que esta opção da Demandante apresenta dois senãos, ambos da maior relevância: (i) estando em causa um direito a prestação de provas e não à aprovação nas mesmas, nada permite dar por assente que obteria um vencimento base superior logo em outubro de 2016, ainda que tais provas fossem imediatamente realizadas; (ii) o pedido deduzido, como se verificou, não tem por objeto quaisquer quantias que tenham ficado por pagar por efeito da omissão de decisão do requerimento para a prestação dessas provas: pois, na verdade, a diferença de vencimentos base é utilizada exclusivamente como critério para indicação do valor da causa.

 

O que não permite – não permite de todo – considerar a questão da determinação da categoria profissional da Demandante como uma questão que constitui um mero pressuposto lógico da decisão sobre o pagamento de tais quantias, assim erigidas a pedido principal. E nem mesmo é possível dizer-se na situação sub judice que o que é pedido pela Demandante se inscreve num contexto patrimonial, na lógica do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25-09-2014, no Processo n.º 3648/09.4TTLSB.L1.S1.

 

O pedido sub judice respeita, imediata e inequivocamente, à possibilidade de a Demandante aceder à categoria profissional de professor coordenador principal prevista no Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico, estando-se, pois, perante uma ação para conhecimento de uma categoria profissional, sobre a qual diz solidamente o Supremo Tribunal de Justiça [cf., entre outros, Acórdãos de 14-11-2001, no Processo n.º 01S1821 e no Processo n.º 01S1959, com antecedentes no Acórdão de 19-03-1992, no Processo n.º 003369, e com reflexo no Acórdão de 27-10-2010, no Processo n.º 4483/07.0TTLSB.L1.S1]: “o pedido de reconhecimento de uma categoria profissional (...) não comporta quantificação exata e representa valores e interesses que vão para além do salário, penetrando a própria carreira do trabalhador, o seu estatuto profissional e a sua colocação na hierarquia (...)”.

 

É certo que uma tal pronúncia do Supremo Tribunal de Justiça, dizendo respeito a relações jurídico-laborais privadas, foi determinada pela norma do atual artigo 79.º do Código de Processo de Trabalho (artigo 47.º, n.º 3, à altura), que não tem paralelo fora desse âmbito.

 

Mas fora de tal âmbito prevalece, muito naturalmente, a substância da argumentação sobre a “imaterialidade” dos bens, interesses, utilidades ou posições jurídicas em causa quando se aprecia o direito de aceder a uma categoria profissional ou de aceder a procedimentos determinantes desse acesso, pois nestes casos estar-se-á perante ações em que o objeto não tem, em si, expressão pecuniária, isto é, estar-se-á perante ações que se destinam “à declaração ou à efetivação de direito extrapatrimonial”, na expressão de Aroso de Almeida e Fernandes Padilha [cf. Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 2005, página 160].

 

Haverá, pois, de concluir-se que o presente processo respeita a bens imateriais, considerando-se assim de valor indeterminável e, portanto, de valor superior ao da alçada do Tribunal Central Administrativo: € 30 000,01, conforme o artigo 34.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, conjugado com o artigo 6.º, n.º 4, do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais e o artigo 44.º, n.º 1, da Lei da Organização do Sistema Judiciário.

 

Diga-se, aliás, que, apesar da epígrafe (“Critério supletivo”) daquele artigo 34.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, de supletivo ou subsidiário nos seus n.ºs 1 e 2 há apenas a consideração do valor indeterminável como sendo superior ao da alçada do Tribunal Central Administrativo, mas não já a própria estatuição especial dos processos considerados de valor indeterminável, na qual se incluem os respeitantes a bens imateriais [cf. Aroso de Almeida e Fernandes Padilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 2005, página 160; cf., ainda, Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 18-11-2010, no Processo n.º 06614/10].

 

Veja-se também como no Processo cuja sentença foi pela Demandante junta aos presentes autos [Processo n.º 187/15.8BEBJA] o valor da respetiva causa foi fixado precisamente em € 30 000,01. E, no mesmo sentido, veja-se, entre outros, os seguintes Processos decididos pelo CAAD: n.º 30/2013-AA; n.º 46/2013-A; n.º 47/2013-A; n.º 1/2014-A; n.º 10/2014-A; n.º 31/2014-A; n.º 15/2015-A a n.º 22/2015-A; n.º 33/2015-A; n.º 64/2015-A; n.º 65/2015-A; n.º 86/2015-A [cf., ainda, entre outros, Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 01-03-2012, no Processo n.º 0832/07, e de 19-03-2013, no Processo n.º 012/13; Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 16-12-2015, no Processo n.º 08889/15; Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte de 16-09-2011, no Processo n.º 00638/11.0BEPRT, e de 23-03-2012, no Processo n.º 03124/11.5BEPRT].

 

Dito isto, o Despacho n.º 1 acrescentou importar ainda sublinhar que, pelas razões que de imediato ficariam claras, não pode considerar-se a ausência de pronúncia na contestação relativamente ao valor da causa indicado na petição inicial como um acordo tácito das Partes quanto ao mesmo, acordo este que, face à prevalência da autonomia da vontade das partes própria da jurisdição arbitral, faria com que fosse esse mesmo o valor a fixar.

 

E, com isto, entrou o Despacho n.º 1 na questão da competência do Tribunal Arbitral.

 

IV.2 – Não se desconhecendo o debate doutrinal sobre a possibilidade de o tribunal arbitral decidir ex officio sobre a sua competência, à luz da norma do n.º 1 do artigo 18.º da Lei da Arbitragem Voluntária – que prevê que o mesmo possa decidir sobre a sua própria competência, ainda que seja necessário apreciar a existência, validade, eficácia ou aplicabilidade da convenção de arbitragem –, a verdade é que na presente causa, segundo se crê – disse-se no Despacho n.º 1 –, isso revelava-se legalmente imprescindível.

 

É que se colocava in casu um problema relativamente à suficiência do instrumento de vinculação genérica do A… à jurisdição arbitral do CAAD, face ao referido valor de € 30 000,01 a fixar para a presente causa, na medida em que esse instrumento de vinculação, como se viu, impõe o limite máximo de € 30 000,00 para o valor dos litígios a dirimir no CAAD.

 

Ora, a imposição de um tal limite máximo (no caso, de € 30 000,00) – que, como também se viu, assenta numa exigência legal estatuída no artigo 44.º-A, n.º 4, do Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico, aliás em coerência com o artigo 1.º, n.º 5, da Lei da Arbitragem Voluntária – não pode entender-se, muito obviamente, senão por referência ao valor das causas como o mesmo deve ser fixado nos termos da lei e, em concreto, nos termos do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

 

É a um tal valor que se refere o artigo 10.º, n.º 1, alínea d), do Regulamento da Arbitragem; e é só um tal valor que é conforme ao próprio funcionamento do centro de arbitragem voluntária institucionalizada que é o CAAD.

 

Razão por que, como se disse: “não pode considerar-se a ausência de pronúncia na contestação relativamente ao valor da causa indicado na petição inicial como um acordo tácito das Partes quanto ao mesmo, acordo este que, face à prevalência da autonomia da vontade das partes própria da jurisdição arbitral, faria com que fosse esse mesmo o valor a fixar”.

 

No Despacho n.º 1 acrescentou-se ainda que as Partes não podiam deixar de estar conscientes da importância do valor legal da causa ao terem, adicionalmente, convencionado expressamente não renunciarem à faculdade de recorrerem da decisão arbitral a proferir.

 

Não houve, pois, como não enfrentar no âmbito da presente arbitragem o problema da insuficiência do instrumento de vinculação genérica do A… à jurisdição arbitral do CAAD e, assim mesmo, da ineficácia/inaplicabilidade in casu do mesmo.

 

E nem a assunção da existência, validade, eficácia e aplicabilidade de uma convenção de arbitragem por efeito do silêncio ou inércia do demandado [cf. artigos 2.º, n.º 5, e 18.º, n.º 4, da Lei da Arbitragem Voluntária] é coerente com o modelo de vinculação genérica a um centro de arbitragem voluntária institucionalizada.

 

Não houve, pois, dito de outro modo – sublinhou-se no Despacho n.º 1 –, como não enfrentar, mesmo que por iniciativa do próprio Tribunal, o problema da competência deste para proferir uma decisão de mérito no litígio sub judice.

 

Até porque não pode esquecer-se que uma tal insuficiência do instrumento de vinculação genérica do A… à jurisdição arbitral do CAAD constituiria causa de anulação da sentença arbitral, à luz da subalínea iii) da alínea a) do n.º 3 do artigo 46.º da Lei da Arbitragem Voluntária [cf. artigo 27.º, n.º 1, do Regulamento da Arbitragem]; mesmo considerando a preclusão do direito de impugnar ínsita no n.º 4 deste mesmo artigo 46.º.

 

Preclusão esta que constitui para este Tribunal, face ao princípio favor arbitrationis e à relevância da autonomia da vontade na determinação da jurisdição arbitral, um argumento adicional no sentido de não deixar de alertar as Partes para os efeitos na sua própria competência decorrentes da referida insuficiência do instrumento de vinculação genérica do A… à jurisdição arbitral do CAAD.

 

Tudo isto mesmo sem apelar à “ordem pública”, que caracteriza o âmbito da jurisdição e da competência em matéria administrativa, conforme o artigo 13.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

 

Em suma – concluiu-se no Despacho n.º 1 –, não pode deixar de colocar-se a questão da incompetência deste Tribunal Arbitral para decidir o litígio da presente causa, face ao valor de € 30 000,01 que lhe deverá ser fixado e ao limite de € 30 000,00 previsto como valor máximo dos litígios objeto da vinculação genérica do A… à jurisdição arbitral do CAAD; questão cujo conhecimento precede logicamente tudo o mais [cf. artigo 13.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos].

 

No Despacho n.º 1 logo se assumiu ser uma tal incompetência passível de sanação ou, dito de outro modo, poderem as Partes acautelar a competência deste Tribunal; assim o entendessem a Demandante e o A…– este na pessoa do seu Presidente [cf. n.º 3 do artigo 44.º-A do Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico, artigo 184.º, n.º 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e alínea y) do n.º 1 do artigo 27.º dos Estatutos do Instituto, em anexo ao Despacho normativo n.º 5/2009, de 26 de janeiro de 2009, no Diário da República, 2.ª série – N.º 22 – 2 de Fevereiro de 2009, páginas 4786 a 4796] – subscrever conjuntamente compromisso arbitral, declarando, de modo expresso e inequívoco e reportando efeitos a 22 de abril de 2017, as suas vontades comuns de que seja decidido pelo CAAD o objeto do litígio nele pendente com o número de processo 15/2017-A, com o valor de € 30 000,01, submetendo um tal compromisso à apreciação deste Tribunal.

 

Esta possibilidade então concedida é, aliás, o caminho que se afigura mais coerente com os seguintes momentos normativos:

  1. Com o princípio favor arbitrationis e com a relevância da autonomia da vontade das partes na determinação da jurisdição arbitral (assim se esteja perante uma “vontade expressa e inequívoca”, no dizer do artigo 150.º, n.º 1, da Lei da Organização do Sistema Judiciário);
  2. Com o disposto no artigo 44.º-A, n.º 1, do Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico e com o artigo 180.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo nos Tribunais Administrativos;
  3. Com o regime dos artigos 8.º, n.º 1, 9.º e 10.º, n.º 1, alínea c), do Regulamento da Arbitragem;
  4. Com as possibilidades de modificação da convenção de arbitragem previstas no artigo 4.º, n.ºs 1 e 3, da Lei da Arbitragem Voluntária;
  5. Com a lógica de aproveitamento do processado inerente ao regime da incompetência [cf. artigo 14.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos].   

 

IV.3 – Face ao que, promoveu-se no Despacho n.º 1 a pronúncia escrita das Partes sobre estas questões do valor da causa e da competência do Tribunal Arbitral e, querendo estas, a apresentação, conjuntamente pela Demandante e pelo Demandado A…, daquele compromisso arbitral capaz de acautelar a competência do Tribunal.

 

Face à pronúncia das Partes sobre o valor da causa e tendo elas apresentado o equacionado compromisso arbitral, no Despacho n.º 2 decidiu-se:

  1. A fixação definitiva do valor da presente causa, que respeita a bens imateriais, considerando-se assim de valor indeterminável e, portanto, de valor superior ao da alçada do Tribunal Central Administrativo, em € 30 000,01 (trinta mil euros e um cêntimo), conforme o artigo 34.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, conjugado com o artigo 6.º, n.º 4, do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais e o artigo 44.º, n.º 1, da Lei da Organização do Sistema Judiciário;
  2. Considerar acautelada a competência do Tribunal, face à suficiência do compromisso arbitral subscrito conjuntamente pelas Partes e por estas junto aos autos, que se aceitou por ser válido e eficaz, no qual declararam, de modo expresso e inequívoco e reportando efeitos a 22 de abril de 2017, as suas vontades comuns de que seja decidido pelo CAAD o objeto do presente litígio, com o referido valor fixado.

 

 

V – Da decisão sobre a condução posterior do processo arbitral

 

No Despacho n.º 1 logo se declarou, para além das questões referidas, não se verificarem nulidades processuais, exceções dilatórias ou questões prévias – e nem as Partes as suscitaram –, e haver regularidade nas constituições de advogado; e mais se promoveu a pronúncia escrita das Partes, havendo que decidir-se o mérito da causa, seja sobre a possibilidade de condução do processo arbitral com base na prova documental e nos restantes elementos juntos ao processo, seja sobre a produção de alegações finais, escritas ou orais, sucessivas ou simultâneas [cf. artigos 18.º, n.º 3, e 24.º do Regulamento da Arbitragem].

 

E, face às posições manifestadas pelas Partes, decidiu-se no Despacho n.º 2, pelo qual se saneou definitivamente o processo, para além do já referido:

  1. À luz do artigo 18.º, n.º 3, do Regulamento da Arbitragem, indeferir o requerimento inicial da Demandante para produção de prova testemunhal, determinando, por considerar-se suficiente para a apreciação e decisão do mérito da causa, a condução do presente processo arbitral exclusivamente com base na prova documental e nos restantes elementos juntos ao mesmo;
  2. Admitir a junção aos autos de cinco documentos apresentados pela Demandante [pautas de avaliação relativas aos anos letivos de 1993-1994 e de 1994-1995, visando demonstrar que nesses anos a Demandante “lecionou e avaliou unidades curriculares anuais (...), para reforço da prova dos factos alegados nos artigos 9.º e seguintes da petição inicial”];
  3. Deferir a retificação da petição inicial requerida pela Demandante [no sentido de se considerar a data ínsita em 11 da mesma como sendo “2/12/1996” e não “2/12/2016”]; conforme o próprio Tribunal já aliás havia considerado no Despacho n.º 1 [cf. 11.º facto enunciado em II.1];
  4. Determinar, considerando o artigo 24.º do Regulamento da Arbitragem, a notificação das Partes para apresentarem, no prazo simultâneo de 20 dias – que ambas viriam a respeitar –, alegações finais escritas.

 

 

VI – Das alegações finais escritas apresentadas pelas Partes  

 

VI.1 – Do que a Demandante alegou – e tem-se presente nesta Decisão a integralidade do que escreveu –, importa reter o seguinte:

1.º - Apoiando-se na Decisão proferida no Processo n.º 50/2013-A do CAAD, que cita extensivamente, argumenta que, para efeito do seu pedido, releva o tempo de serviço docente por si prestado no subsector universitário, em concreto na Universidade do …, entre 14 de julho de 2000 e 2 de dezembro de 2001, em regime de exclusividade; procurando reforçar este argumento, por referência ao Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico, seja com uma referência a momentos de abertura da “porta à mobilidade do exercício de funções docentes entre ensino universitário/ensino politécnico” [cf. artigo 8.º, n.º 5, artigo 9.º-A, n.º 6, e artigo 10.º, n.º 2], seja com o facto de a composição dos júris dos concursos para professor coordenador principal poder contar com professores catedráticos [cf. artigo 9.º-A, n.º 4, alínea a)]; e acrescentando, ainda na mesma lógica de reforço da sua posição, agora por referência à alínea a) do artigo 9.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, aditado pelo artigo 4.º da Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, que o legislador não quis “excluir do conceito de ‘anos de serviço continuado’, para efeitos de aplicação do regime transitório, o serviço prestado no ensino universitário, restringindo o tempo de serviço relevante exclusivamente ao prestado no ensino superior politécnico”; 

2.º - Acrescentou agora o argumento de que, a não se considerar para efeito do seu pedido aquele serviço docente por si prestado na Universidade do …, haveria então de considerar o tempo de serviço prestado, em regime de prestação de serviços, desde o ano letivo de 1993-1994 até 2 de dezembro de 1996, pois tal prestação de serviços “corresponde a tempo integral”;

3.º - Referindo que não foram impugnados os artigos 11.º a 18.º da petição inicial [nos quais, por referência à atividade docente da Demandante desenvolvida como prestação de serviços no ano letivo de 1995-1996 e no ano letivo seguinte até 2 de dezembro de 1996, que se descreve, se alega ter a mesma sido “sempre equivalente ao exercício de funções docentes em regime de tempo integral”, tendo sempre “12 horas semanais de lecionação”, conforme o artigo 34.º, n.º 5, do Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico], aduz que “a natureza de ‘prestação de serviços’ não pode inviabilizar o cômputo do tempo de serviço, porquanto a prestação de serviço foi efetuada em igualdade de circunstância do que seria prestado ao abrigo de uma relação contratual laboral, ao tempo subordinado a contrato administrativo de provimento”, tendo de aplicar-se a jurisprudência, que a Demandante cita extensivamente, constante das Decisões proferidas nos Processos n.º 52/2013-A e n.º 9/2015-A (esta citando aquela) do CAAD [acrescentando ainda uma referência ao Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 06-03-2008, no Processo n.º 01100/05.1BECBR], sendo que as funções docentes em causa, “de 1993 a 1996”, por integrarem uma relação com subordinação jurídica, devem considerar-se reconduzidas, embora formalmente tituladas como prestação de serviços, “aos tipos contratuais previstos nos regimes de vinculação do pessoal docente previstos nos estatutos de carreira docente politécnica” e devem relevar “para validação do requisito temporal exigido para aplicação do regime transitório” em causa na presente ação;

4.º - É falsa a alegação do Demandado de que a Demandante não requereu a realização das provas públicas previstas no n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação da Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, porque saberia não preencher a condição então exigida de mais de 15 anos de exercício de funções docentes em regime de tempo integral ou exclusividade, pois – diz a Demandante – “só não requereu as provas antes devido às dúvidas na interpretação e aplicação da norma (...) aos docentes já enquadrados em categoria de carreira”, tendo feito o primeiro requerimento (em 2 de março de 2016) “depois de ter tomado conhecimento” daqueles referidos Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 17-01-2014, no Processo n.º 00677/11.1BECBR, e Sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja de 15-06-2016, no Processo n.º 187/15.8BEBJA;

5.º - Resta apreciar – evolui então a Demandante, como já se havia expressado em 33 da petição inicial – se o Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, “em especial o seu preâmbulo, renovou essa possibilidade transitória de, por via de prestação de provas públicas, docente de carreira, que preencha os requisitos exigidos, possa aceder a categoria superior”;

6.º - E nesta questão a Demandante retoma/reproduz os argumentos de Direito que expressou na petição inicial, aos quais, pontualmente, aduz o seguinte:

  • Conforme o seu artigo 1.º, o Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, aprova um conjunto de regras, ditas complementares das anteriores, do processo de transição dos docentes do ensino superior politécnico, sendo que não foi revogado o artigo 8.º-A, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação da Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, e sendo que, estando em vigor este regime (não revogado), “importa assegurar o princípio da igualdade”, não se tratando diferentemente docentes em igualdade de condições “só porque uns exerceram o seu direito em 2010 (...) e outros vieram a exercê-lo só em 2016, em benefício do novo requisito temporal (o mesmo se diga dos docentes que vierem a exercer idêntico direito, agora ao abrigo da complementar Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto, por força do novo prazo estipulado – agora, outra vez, 15 anos)”;
  • É iníquo “muitos docentes (...) providos na categoria de equiparado a professor coordenador, sem doutoramento ou título de especialista, mas por razões meramente estratégicas e de imagem das instituições, sendo esta a de ter em determinados cargos, como a coordenação de cursos, pessoas com aquela categoria (equiparado a professor coordenador), poderem agora saltar para categoria de carreira de professor coordenador, como a detida pela Demandante, numa igualdade de categoria que nada tem a ver com as habilitações académicas decorrentes do grau de doutor ou do título de agregação”, sendo que “docentes, com mais habilitações, doutorados e agregados como a Demandante, com o mesmo ou mais tempo de serviço, continuarão em categoria similar e terão de se manter na mesma categoria, em caso de impedimento da prestação de provas públicas para categoria superior”;
  • Olhando para as regras de elaboração de atos normativos aprovadas pelo Governo, que preconizam a coerência entre os preâmbulos e os articulados e que aqueles se não pronunciem sobre matéria omissa nestes, constata-se no Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, que o seu preâmbulo diz mais do que o seu artigo 6.º, “cuja incompletude deveria ser suprida ou pela via da interpretação extensiva (...) ou pela via da integração por analogia”;
  • Retomando posição já manifestada na pronúncia suscitada pelo Despacho n.º 1 [dizendo que deste “parece decorrer que o direito peticionado (...) só se mantém vivo, por via da publicação da Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto”], refere a Demandante que a Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto, “em nada altera a ordem jurídica, o regime jurídico estabelecido desde 2010, mantendo em aberto no campo da interpretação/integração tudo o que acima se enunciou e alegou decorrente da publicação do Decreto-Lei n.º 45/2016”, daqui resultando “que a apreciação do pedido do reconhecimento do direito à realização das provas requeridas (...) deve ser feita, como se destaca do teor da alegação de direito do articulado da petição inicial, ao abrigo de uma interpretação normativa ou de integração por norma resultante do disposto no n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, na redação da Lei n.º 7/2010, no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 45/2016 e do artigo 6.º deste diploma, sendo assim irrelevante direta ou indiretamente para o caso dos autos a entrada em vigor e o articulado da Lei n.º 65/2017”.

 

VI.2 – Por seu turno, do que, na lógica do que na contestação havia expressado, o Demandado alegou – e, uma vez mais, tem-se presente nesta Decisão a integralidade do que escreveu –, importa reter o seguinte:

1.º - Depois de se identificar o objeto da presente ação e os pedidos nela formulados pela Demandante, esclarece-se que “o Demandado não contesta a factualidade aduzida pela Demandante, pois, em boa verdade, não existe qualquer matéria factual controvertida”;

2.º - Continua a entender, pelas razões expressas na contestação, que na situação sub judice só deve relevar o tempo de serviço prestado no ensino superior politécnico;

3.º - E, para efeitos do requisito do tempo de serviço de 15 anos previsto no artigo 8.º-A, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação da Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, a Demandante sempre teria apenas 14 anos, caso fosse admitido o exercício a tempo integral desde 1995, “o que não se concede”, ou mesmo apenas só 13 anos, caso só se reconheça o tempo integral desde 1996 (conforme documento junto pela própria Demandante);

4.º - A redação do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, é “diametralmente oposta” à daquele artigo 8.º-A, n.º 5, de 2010;

5.º - Quanto à “ligação” entre o referido parágrafo décimo primeiro do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, e o seu artigo 6.º, aquele apenas “traça, em linhas gerais, quais foram as disposições legais alteradas e/ou aditadas pela Lei n.º 7/2010, ressuscitando tal regime excecional que já não estava em vigor”, vindo a sua concretização plasmada no artigo 6.º, que estabelece taxativamente “quais as categorias de docentes que aproveitam o regime de prestação de provas públicas, estabelecendo ainda, em caso de aprovação, de que modo se processa a transição”, remetendo coerentemente apenas para os n.ºs 9, 10 e 11 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação da Lei n.º 7/2010, de 13 de maio;

6.º - “Dito de outro modo e para que dúvidas não restem, apenas os assistentes e os equiparados a assistente, a professor adjunto e a professor coordenador poderão ter acesso ao regime de prestação de provas públicas, às restantes categorias, i.e., professor adjunto e professor coordenador, não se aplica (...) tal regime.”; “E não se aplica tal regime aos professores adjuntos e professores coordenadores, já que este artigo serve essencialmente para acabar com a precariedade de quem ainda tem um vínculo precário com a função pública e para transitar para as categorias que atualmente estão em vigor no ensino politécnico aqueles docentes que por alguma razão são ainda assistentes.”;

7.º - “Ora, se é verdade que a Lei n.º 7/2010 concedeu expressamente a possibilidade aos professores adjuntos e professores coordenadores de requererem a prestação de provas públicas e tal entendimento ficou firmado nos doutos tribunais, não menos verdade é que o Decreto-Lei n.º 45/2016 deixou ‘cair’ essa possibilidade àqueles docentes.”; e “se o legislador no Decreto-Lei n.º 45/2016 quisesse incluir as categorias de professor adjunto e de professor coordenador no rol de categorias abrangidas pelo atual artigo 6.º tê-lo-ia feito expressamente, mas não o fez!”;

8.º - A possibilidade de os professores coordenadores “transitarem para a categoria de professor coordenador principal através do regime de provas públicas está prejudicada pela atual redação do artigo 6.º dada pelo Decreto-Lei n.º 45/2016”; a obtenção desta categoria é exclusivamente por meio do concurso documental previsto no artigo 9.º-A, n.º 2, do Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico;

9.º - “Assim, não se compreende (nunca se compreendeu) como é que a Demandante pretende estar abrangida pelo regime de provas públicas para transição para a categoria de Professor Coordenador Principal, previsto no Decreto-Lei n.º 45/2016, quando da leitura do mesmo é evidente que não o está.”; e “também ainda não se alcançou a pretensão da Demandante (...) em querer fazer interpretações extensivas e/ou corretivas à atual redação do artigo 6.º” do mesmo diploma; algo que seria um “claro desvio do espírito da referida norma” e “esvaziaria o conteúdo útil de outras”, nomeadamente daquele artigo 9.º-A, n.º 2, do Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico;

10.º - A Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto, apenas alterou o requisito do tempo de serviço exigido naquele artigo 6.º, mantendo-o em tudo o mais, incluindo as categorias abrangidas, o que reforça o entendimento do legislador “na desconsideração das restantes categorias do ensino superior politécnico para efeitos do regime de prestação de provas públicas”.

 

 

Cumpre, pois, apreciar e decidir a presente ação.

 

 

VII – Da fundamentação de facto

 

VII.1 – Face à sua relevância quanto às várias soluções plausíveis das questões de Direito suscitadas na presente ação, o Tribunal considera provados todos os factos, devidamente alegados pela Demandante, especificados supra II.1.

 

A convicção do Tribunal quanto à verdade destes factos assenta, seja na natureza documental da prova produzida sobre os mesmos, seja na sua não impugnação pelo Demandado, traduzindo-se na respetiva admissão por acordo. Deve, aliás, relembrar-se que o Demandado declarou nas suas alegações finais não contestar “a factualidade aduzida pela Demandante, pois, em boa verdade, não existe qualquer matéria factual controvertida”.

 

VII.2 – Menção particular, pela sua relevância no contexto de Direito suscitado pelo dissídio sub judice, tem contudo de fazer-se ao facto enunciado em 12.º lugar: a atividade académica desenvolvida pela Demandante no ano letivo de 1995-1996 e no primeiro semestre do ano letivo de 1996-1997 (maxime até 2 de dezembro de 1996) incluiu – para além do atendimento e apoio aos alunos, dos exames em julho e em setembro, da investigação e da gestão académica – serviço docente distribuído de doze horas semanais de lecionação, referente a aulas teóricas, teórico-práticas e práticas na disciplina de Química Aplicada nos cursos de Anatomia Patológica, Citológica e Tanatológica, de Higiene e Saúde Ambiental e de Radioterapia, conforme o relatório anexo ao documento 2, o documento 4 e os documentos 5 a 11, estes relativos às classificações finais dos alunos, todos juntos à petição inicial.

 

E tal relevância tem obviamente a ver com a eventual pertinência – eventualidade esta que em momento posterior desta Decisão se descortinará – de se constatar se a docência nesse período ocorreu ou não em regime de tempo integral.

 

Anote-se, por questão de mero rigor, que o facto considerado provado é de que a docência em análise implicou doze horas semanais de lecionação; saber se uma tal dedicação temporal traduz um regime de tempo integral é já conclusão jurídica, a responder afirmativamente à luz do artigo 34.º, n.º 5, do Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico.

 

Dito isto, importa sublinhar que se não esqueceu que o Demandado disse, seja em sede de contestação, seja em sede de alegações finais, não conceder que a docência da Demandante, como prestação de serviços, no ano letivo de 1995-1996 e até 2 de dezembro de 1996, já no ano letivo de 1996-1997, o tenha sido em regime de tempo integral.

 

Só que, mesmo que se entendesse uma tal afirmação como uma impugnação regularmente alegada desse facto, a verdade é que a convicção formada pelo Tribunal é em sentido diferente, porque:

  1. Tal referência a doze horas semanais alegada na petição inicial surge, documentalmente traduzida em regime de tempo integral, no relatório anexo ao documento 2 junto a tal petição; e embora se trate de um relatório elaborado pela Demandante, não é, de todo, verosímil que não corresponda à verdade, face à relevância, seja dos interesses em causa, seja das consequências da constatação de falsidade; acrescendo o facto de o Demandado não ter contraposto qualquer carga horária diferente, como lhe seria muito fácil, caso a carga horária apresentada pela Demandante não correspondesse à verdade;
  2. Resulta notório que o descritivo das funções desempenhadas não parece compatível com uma carga horária de lecionação inferior a doze horas semanais, acrescendo o facto de esta constituir uma carga horária máxima, conforme aquele mesmo artigo 34.º, n.º 5, do Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico;
  3. Pelo menos quanto à atividade académica desenvolvida pela Demandante no primeiro semestre do ano letivo de 1996-1997, é seguro que a mesma teve continuidade num contrato administrativo de provimento que, ainda neste primeiro semestre, a partir de 2 de dezembro de 1996, se traduziu num regime de tempo integral, conforme resulta do documento 3 junto à petição inicial.

 

Foi neste contexto que no Despacho n.º 2 o Tribunal dispensou a produção de prova testemunhal; e fora já também, muito obviamente, no mesmo contexto que, na pronúncia suscitada pelo Despacho n.º 1, a Demandante considerou a desnecessidade dessa mesma prova testemunhal em função da suficiência da prova documental sobre a sua alegação de que, à data em que requereu a prestação de provas públicas de avaliação, “detinha vinte anos de serviço no ensino superior em regime de tempo integral”.

 

Já em sede de alegações finais, veio a Demandante afirmar, como se disse, que desde o ano letivo de 1993-1994 e até 2 de dezembro de 1996 a sua prestação de serviços ocorreu sempre em regime de tempo integral. Simplesmente não pode considerar-se esta alegação factual, pois ela corresponde a matéria não alegada na petição inicial ou em qualquer outro momento processualmente tempestivo.

 

Na verdade, é seguro que na petição inicial a Demandante alega – como, aliás, se fixou no facto enunciado em 11.º lugar como provado – que até 2 de dezembro de 1996 e desde o ano letivo de 1992-1993 exerceu sempre funções docentes na Escola C… em regime de prestação de serviços; mas só alega tê-lo feito em regime de tempo integral quanto ao ano letivo de 1995-1996 e até 2 de dezembro de 1996, já no ano letivo de 1996-1997, como se constata, sem margem para qualquer dúvida, do que escreve de 10 a 18 da petição inicial, particularmente em 10, 14, 15 e 17; razão por que o Demandado só quanto a este hiato sentiu necessidade de dizer, como vimos, não conceder que a docência da Demandante o tenha sido em regime de tempo integral.

 

VII.3 – Resta anotar – numa anotação porventura óbvia – que a relevância para a apreciação e decisão da presente ação do período, anterior a 2 de dezembro de 1996, durante o qual a Demandante exerceu a sua docência no ensino superior politécnico através de prestação de serviços em regime de tempo integral dependerá da precedência lógica das questões de Direito a apreciar e decidir – incluindo, como melhor se verá, quanto ao número de anos de exercício de funções docentes em regime de tempo integral ou de dedicação exclusiva que deva, in casu, considerar-se exigido pelo artigo 6.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto –, algo que nos remete, de imediato, para o momento seguinte da presente Decisão.

 

 

VIII – Da fundamentação de Direito

 

VIII.1 – Como se disse [cf. supra III.2], existindo um dever de decisão do requerimento da Demandante de 10 de outubro de 2016 [cf. artigo 13.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo], o objeto da presente ação, conforme formatado por ela, é a condenação do A… à decisão, no âmbito da sua Unidade Orgânica C…, desse mesmo requerimento, e a condenação a uma decisão favorável, com a prática dos atos necessários à admissão às provas públicas requeridas e à realização das mesmas, pressupondo esta condenação a uma tal decisão favorável a resposta, sucessiva, às seguintes duas questões, as questões sub judice:

1.ª - Permite a argumentação própria da metodologia do Direito concluir, como preconiza a Demandante, que o artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, confere aos docentes do ensino superior politécnico com a categoria de professor coordenador o direito de, querendo, requererem, agora até 31 de dezembro de 2017, a prestação de provas públicas de avaliação da sua competência pedagógica e técnico-científica para, em caso de aprovação, acederem, sem outras formalidades, mantendo o regime de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado, à categoria de professor coordenador principal?

2.ª - Em caso afirmativo, preenche concretamente a Demandante as condições, quanto ao regime de exercício de funções e à duração deste, exigidas pelo mesmo artigo, considerando já a redação da Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto, para gozo da faculdade de requerer a prestação de tais provas, maxime considerando as funções docentes por si exercidas em regime de prestação de serviços e as funções docentes por si exercidas no ensino universitário?

 

VIII.2 – Esta referência à Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto, reclama, desde já, um esclarecimento, pois, como se disse, a Demandante referiu que do Despacho n.º 1 “parece decorrer que o direito peticionado (...) só se mantém vivo, por via da publicação da Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto”.

 

Não é assim. E vejamos porquê.

 

VIII.2.1 – Como resulta à saciedade do que se disse antes, em III.1, o que se fez no Despacho n.º 1 foi clarificar temporalmente [clarificação que o Tribunal considerou necessária] o pedido da Demandante, no sentido de que o que ela pretende é o reconhecimento de situação jurídica subjetiva com relevância, não na data da propositura da presenta ação – 22 de abril de 2017 –, mas sim na data – 10 de outubro de 2016 – em que requereu com fundamento no Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, a prestação das provas públicas que antes haviam sido previstas no n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação da Lei n.º 7/2010, de 13 de maio.

 

E fundamentou-se essa necessária clarificação do momento relevante pretendido pela Demandante à luz das seguintes três razões: (i) em 22 de abril já se extinguira o direito de requerer tais provas, conforme a anterior previsão do n.º 1 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto [sendo a referência feita à Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto, meramente para identificar uma nova disponibilidade desse direito]; (ii) só aquela data de 10 de outubro de 2016 é compatível com o que a Demandante afirma em 3, 4 e 5 da petição inicial; (iii) foi por referência àquela mesma data de 10 de outubro de 2016 que o Demandado entendeu o peticionado pela Demandante e dele se defendeu na contestação.

 

Não se tratou, portanto, de todo, de afirmar que o direito peticionado pela Demandante só se mantém vivo por via da publicação da Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto.

 

VIII.2.2 – Sem prejuízo do que vem de afirmar-se, aspeto obviamente diferente é a da relevância desta Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto, na apreciação e decisão da questão sub judice na presente ação.

 

Neste ponto, diferentemente da posição aparentemente manifestada pelas Partes, o Tribunal não pode deixar de ponderar uma tal relevância, pois não pode olvidar que a Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto, não só alterou o n.º 1 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, diminuindo para quinze (em vez dos anteriores vinte) o número de anos de exercício de funções docentes em regime de tempo integral ou de dedicação exclusiva exigido para se poder requer a prestação de provas públicas de avaliação da competência pedagógica e técnico-científica, como fez ainda reportar a produção de efeitos desta alteração a 18 de agosto de 2016, precisamente a data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto [cf. artigo 4.º da Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto].

 

Atente-se que a Demandante não pede a produção de efeitos do eventual resultado favorável das provas públicas de avaliação que requereu à data em que as requereu; nem faria sentido que o tivesse pedido, pois o que a lei prevê é um direito, verificadas concretamente as respetivas condições, à prestação dessas provas e não, obviamente, à aprovação nas mesmas.

 

Atente-se ainda que nada impediu/impedia que indeferimentos de prestação de tais provas por inexistência, à data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, de vinte anos de exercício de funções docentes em regime de tempo integral ou de dedicação exclusiva pudessem ser invertidos, após a entrada em vigor da Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto, nos casos em que naquela data existissem quinze anos de exercício de funções docentes nas referidas condições, mediante requerimento apresentado até 31 de dezembro de 2017.

 

Assim sendo, e não tendo o requerido pela Demandante sido ainda administrativamente decidido, não pode obviamente o Tribunal deixar de ponderar, face a tal reporte pretérito de efeitos determinado por lei, em termos aliás favoráveis à Demandante, se o número de anos de exercício de funções docentes em regime de tempo integral ou de dedicação exclusiva que deve agora considerar-se exigido para a prestação das provas públicas de avaliação requeridas e ambicionadas pela Demandante não deve ser quinze em vez de vinte.

 

Daí ter-se enunciado aquela segunda questão de Direito sub judice (relevante no caso de decisão afirmativa da primeira) nos termos seguintes: Preenche concretamente a Demandante as condições, quanto ao regime de exercício de funções e à duração deste, exigidas pelo artigo 6.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, já na redação da Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto, para gozo da faculdade de requerer a prestação de tais provas?

 

Em suma, havendo de decidir-se esta segunda questão de Direito sub judice, ela necessariamente subdividir-se-á nas seguintes duas perguntas, que aqui se enunciam de acordo com a precedência lógico-jurídica das mesmas:

1.ª - Considerando o regime da produção de efeitos da alteração do n.º 1 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, pela Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto, na situação sub judice é quinze ou é vinte o número de anos de exercício de funções docentes em regime de tempo integral ou de dedicação exclusiva que deve agora considerar-se exigido, à data do requerimento da Demandante – 10 de outubro de 2016 –, para poder aceder-se à prestação das provas públicas de avaliação pretendidas pela Demandante?

2.ª - Concluindo-se por que prevalece a exigência de vinte anos, relevam nesse cômputo, seja as funções docentes exercidas pela Demandante no ensino universitário, seja as funções docentes por si exercidas em regime de prestação de serviços, antes de 2 de dezembro de 1996, e, neste caso, face à matéria de facto dada como provada, quais?

 

Sendo que esta segunda questão de Direito sub judice, nas duas sub-questões acabadas de enunciar, só relevará na presente Decisão caso aquela outra primeira questão de Direito sub judice tenha uma resposta afirmativa.

 

É precisamente o que passará a analisar-se e decidir-se.

 

VIII.3 – Permite a argumentação própria da metodologia do Direito concluir, como preconiza a Demandante com a contestação do Demandado, que o artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, confere aos docentes do ensino superior politécnico com a categoria de professor coordenador o direito de, querendo, requererem a prestação de provas públicas de avaliação da sua competência pedagógica e técnico-científica para, em caso de aprovação, acederem, sem outras formalidades, mantendo o regime de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado, à categoria de professor coordenador principal?

 

Como antes se disse, a Demandante, invocando que o artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, teria ficado aquém dos propósitos anunciados naquele décimo primeiro parágrafo do respetivo preâmbulo, sugere uma interpretação jurídica, “extensiva e corretiva”, daquele artigo ou integração de lacuna, propondo que o mesmo fosse lido e aplicado com o seguinte sentido: “Os docentes abrangidos pelo n.º 9 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, bem como pelo n.º 5 do artigo 8.º-A, do mesmo diploma legal podem, até 31 de dezembro de 2016, requerer a prestação das provas a que se referem estas normas, com as consequências nelas estabelecidas em caso de aprovação.”

 

Sendo-se muito claro, importa frisar que, nestes termos, a Demandante não é – como lhe teria competido ser – nada concreta e rigorosa na identificação dos incisos textuais a aditar ao atual texto do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, para concretizar a interpretação extensiva que preconiza; e também não identifica com suficiente rigor a norma a aplicar por analogia visando sanar a lacuna que alega existir.

 

A Demandante limita-se, isso sim, a propor um texto inovatório, com o qual pretende descrever e enquadrar o sentido de um resultado normativo conforme à sua pretensão.

 

Dito isto, importa começar por analisar se estão verificados os pressupostos metodológico-jurídicos justificativos de uma interpretação extensiva do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto. Ficou o elemento literal da norma aquém do seu espírito, aferido este pelos elementos histórico, sistemático e teleológico da interpretação jurídica, incluindo nesta análise o teor do décimo primeiro parágrafo do preâmbulo deste diploma?

 

É o seguinte o teor do décimo primeiro parágrafo do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto:

Faculta-se igualmente possibilidade de a realização das provas públicas para a transição para a carreira, introduzida pela Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, através do aditamento dos n.ºs 9,10 e 11 ao artigo 6.º e do n.º 5 do artigo 8.º-A ao Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, aos docentes que contem, desde 1 de setembro de 2009, 20 anos de serviço em regime de tempo integral ou de dedicação exclusiva.

 

Por seu turno, diz, sob a epígrafe “Provas públicas de avaliação de competência”, o artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto [na sua redação anterior à referida alteração feita pelo artigo 2.º da Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto]:

1 – Os assistentes e os equiparados a assistente, a professor adjunto ou a professor coordenador que, à data da entrada em vigor do presente decreto-lei, exerçam funções em regime de tempo integral ou de dedicação exclusiva há mais de 20 anos podem, até 31 de dezembro de 2016, requerer a prestação das provas a que se referem os n.ºs 9, 10 e 11 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, alterado pela Lei n.º 7/2010, de 13 de maio.    

2 – Os docentes referidos no número anterior transitam, em caso de aprovação nas referidas provas, sem outras formalidades, para o regime de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado, na mesma categoria em que exercem funções.

 

E dizem, sob a epígrafe “Regime de transição dos atuais equiparados a professor e assistente”, os n.ºs 9, 10 e 11 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação da Lei n.º 7/2010, de 13 de maio:

9 – Os atuais equiparados a professor-coordenador, a professor-adjunto ou a assistente e que exerçam funções docentes em regime de tempo integral ou dedicação exclusiva há mais de 15 anos podem requerer a prestação de provas públicas de avaliação da sua competência pedagógica e técnico-científica, no prazo de um ano a partir da publicação da presente lei, transitando, em caso de aprovação nas referidas provas, sem outras formalidades, para o regime de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado na respetiva categoria.

10 – As provas referidas no número anterior, definidas pelo órgão técnico-científico da instituição, são constituídas por:

  1. Apreciação e discussão do currículo do candidato;
  2. Apresentação de uma lição de 60 minutos, sobre tema escolhido pelo requerente no âmbito da área ou áreas disciplinares em que desempenha funções.

11 – A apreciação das provas realizadas (...) é efetuada por um júri, cuja constituição e funcionamento decorrem de acordo com o estabelecido nos artigos 21.º a 24.º-A do Estatuto, com as devidas adaptações.

 

Por fim, diz, sob a epígrafe “Regime transitório excecional”, o n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação da Lei n.º 7/2010, de 13 de maio:

5 – Os atuais assistentes, professores-adjuntos e professores-coordenadores que exerçam funções docentes em regime de tempo integral ou dedicação exclusiva há mais de 15 anos podem requerer a prestação de provas públicas de avaliação da sua competência pedagógica e técnico-científica, no prazo de um ano a partir da publicação da presente lei, nos termos do estabelecido nos n.ºs 9 a 11 do artigo 6.º, com as devidas adaptações, transitando, em caso de aprovação nas referidas provas, sem outras formalidades, para o regime de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado na respetiva categoria.

 

O sentido normativo destas disposições do n.º 9.º do artigo 6.º e do n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação da Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, pôde – apesar da menor felicidade de algumas redações [maxime da última norma citada] – estabilizar-se com o tempo e com a intervenção judicial de que foram objeto [cf., maxime, o já referido Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 17-01-2014, no Processo n.º 00677/11.1BECBR, incluindo o parecer jurídico de Vieira de Andrade e Veiga Moura nele extensivamente citado], nos termos seguintes, coerentes aliás com as epígrafes dos respetivos dois artigos:

  1. No caso dos assistentes com doutoramento, dos professores adjuntos e dos professores coordenadores, dado já terem transitado para a carreira, o regime do n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação da Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, tem utilidade apenas para acederem à categoria seguinte à que detêm, tendo esta constatação constituído aliás argumento decisivo para interpretação da expressão normativa “respetiva categoria” [presente em ambas as normas] no sentido da categoria a que o interessado se candidata, podendo esta ser categoria superior à detida;
  2. No caso dos equiparados a assistente, a professor adjunto e a professor coordenador [n.º 9 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto] e no caso dos assistentes sem doutoramento [n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto], pretende-se permitir a transição para a carreira, superando a precariedade do vínculo, podendo, do mesmo modo, tal transição consolidar-se na categoria superior à detida por equiparação.

 

É face a este enquadramento do sentido normativo consolidado sobre estas disposições introduzidas pela Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, que melhor pode compreender-se aquele momento preambular do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto. Ele refere-se, tão só, aos momentos, contidos como se viu em ambas essas disposições, de transição para a carreira [relativamente aos assistentes e aos equiparados a assistente, a professor adjunto e a professor coordenador], visando a ultrapassagem da precariedade dos vínculos. E, assim sendo, o preâmbulo anuncia que com esse fim o Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, retoma – sem especificar os moldes concretos dessa retoma para além da exigência de 20 anos de serviço em regime de tempo integral ou de dedicação exclusiva – a anterior possibilidade de realização de provas públicas de avaliação da competência pedagógica e técnico-científica.

 

Ora, não vemos qualquer incoerência entre esta óbvia leitura do décimo primeiro parágrafo do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, e a sua concretização através do artigo 6.º do mesmo diploma legal, que na sua hipótese/previsão [tatbestand, facti species] se refere precisamente aos assistentes e aos equiparados a assistente, a professor adjunto e a professor coordenador e que na sua estatuição/provisão, por um lado remete para aquelas provas públicas dos n.ºs 9, 10 e 11 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto [concebidas, como se extrai da epígrafe do artigo, predominantemente para transição para a carreira] e, por outro lado, face àquela intervenção judicial interpretativa sobre o regime de 2010 quanto à expressão “na respetiva categoria”, clarifica, agora que estão apenas em causa situações em que é inequívoca a utilidade em si mesma da transição para a carreira, que esta transição ocorre “na mesma categoria em que (os docentes) exercem funções” e não já “na respetiva categoria”.

 

Inexiste, pois, qualquer “legística” menos apurada; sendo que, mesmo que assim não fosse, nunca esse eventual menor apuro poderia resolver-se mediante uma opção pelo preâmbulo, forçando leituras da norma incomportáveis para os cânones da metodologia jurídica.

 

E tão pouco se deteta qualquer incongruência entre o elemento literal da norma – em si mesma coerente com aquele momento preambular – e o seu espírito, pois, por um lado, a sua teleologia aponta decisivamente para a estabilidade dos vínculos laborais dos docentes do ensino superior politécnico e não para o acesso a novas categorias e, por outro lado, agora em termos histórico-sistemáticos, ciente das razões que deram origem àquela interpretação da expressão “na respetiva categoria”, entendeu o legislador tomar legitimamente em mãos a clarificação de que, agora que não restam dúvidas de que apenas estão em causa situações de transição para a carreira, esta transição opera “na mesma categoria” em que os docentes exercem as suas funções docentes. Visão que sai reforçada pelo facto de a Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto, ter, neste ponto, confirmado plenamente a redação do artigo 6.º que vinha do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto.

 

De forma muito clara, há de pois concluir-se pela inexistência de quaisquer pressupostos metodológico-jurídicos justificativos da interpretação extensiva (ou corretiva, como também alegado) do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, preconizada pela Demandante.

 

Daqui intui-se já que tão pouco se verifica existir qualquer lacuna a suscitar integração por analogia, pois, muito obviamente, o legislador pretendeu, tanto assumir o regime descrito do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, quanto não retomar o regime constante do n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação da Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, relativamente aos docentes aí referidos já titulares de vínculo laboral não precário; regime este que, de acordo com a sua própria previsão [numa técnica legislativa muito deficiente mas que não deixa dúvidas], caducara entretanto [não fazendo por isso sentido a conclusão que a Demandante pretende extrair quando aduz que o Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, complementou o processo de transição que vinha de 2010 sem revogar este].

 

Tem pois razão o Demandado quando sublinha que o artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, não prevê a possibilidade pretendida pela Demandante, pois que abrange, expressa e taxativamente, apenas os assistentes, os equiparados a assistente, os equiparados a professor adjunto e os equiparados a professor coordenador e prevê, no caso de aprovação nas provas requeridas, a transição para o regime de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado mas na mesma categoria em que eles exercem já funções.

 

Inexiste, portanto, qualquer frustração das intenções ordenadoras do sistema jurídico, razão por que, muito obviamente, não estamos perante qualquer lacuna a carecer de integração, porque, pura e simplesmente, não temos caso omisso algum, situação alguma desprovida de regulação jurídica em termos que contrariem o plano ordenador do sistema jurídico.

 

O atual silêncio do legislador quanto àquele caducado regime do n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação da Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, relativamente aos docentes aí referidos já titulares de vínculo laboral não precário, traduz-se num silêncio eloquente da lei, resultado de uma abstenção deliberada do legislador, pois verdadeiramente não há ausência de regulação e a opção legislada é explícita e perfeitamente coerente [cf. Mário Bigotte Chorão, “Integração de Lacunas”, in Polis – Enciclopédia Verbo da Sociedade e do Estado – Antropologia, Direito, Economia, Ciência Política, 3, 1985, págs. 591-618, maxime págs. 592-593].

 

Relembre-se, aliás, o que antes se disse sobre a Demandante não ter sequer identificado com o rigor que se exigiria a norma a aplicar por analogia visando sanar a lacuna que considera existir. Embora não o tenha feito, resulta do que pretende que tal norma objeto da analogia pretendida é precisamente aquela norma constante do n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação da Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, relativamente aos docentes aí referidos já titulares de vínculo laboral não precário.

 

Só que estando tal norma caducada não se vê como pudesse aplicar-se por analogia, para já não referir – conforme se extrai claramente da epígrafe do artigo “Regime transitório excecional” – tratar-se ela de uma norma excecional e, como tal, conforme o artigo 11.º do Código Civil, não comportar aplicação analógica.

 

Complementarmente, dir-se-á, ainda, que, enquanto não caducou, esta norma do n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação da Lei n.º 7/2010, de 13 de maio [e, mutatis mutandis, o mesmo pode dizer-se do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto], ter-se-á traduzido numa implicação intensiva, no sentido de que a sua hipótese/previsão subjetiva constituía pressuposto delimitado taxativamente (numa lógica de numerus clausus); e, assim, tal pressuposto era, não apenas suficiente, mas ainda necessário para a verificação da consequência/estatuição/provisão, em termos tais que esta segue-se se aquele pressuposto se verificar mas só se segue quando ele se verificar. Ora, nestes casos, impõe-se uma decisão, em termos imediatamente lógicos, pelo argumentum a contrario em detrimento da analogia, como nos ensina lapidarmente Castanheira Neves [cf. Questão-de-facto – Questão-de-Direito ou o Problema Metodológico da Juridicidade (Ensaio de uma Reposição Crítica), I, A Crise, 1967, Coimbra, Livraria Almedina, páginas 263 a 265].

 

Deve, aliás, ir-se ainda um pouco mais além, para anotar que, verdadeiramente, a Demandante não preconiza apenas a aplicação analógica da estatuição/provisão da norma do n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação da Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, na interpretação entretanto feita do seu inciso final “na respetiva categoria”; ela preconiza abranger também nessa analogia a própria hipótese/previsão subjetiva da norma quanto aos docentes aí referidos já titulares de vínculo laboral não precário.

 

No que lhe interessa, é precisamente esse o objetivo daquela proposta que faz de consideração do seguinte sentido normativo, já antes citado: “Os docentes abrangidos pelo n.º 9 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, bem como pelo n.º 5 do artigo 8.º-A, do mesmo diploma legal podem, até 31 de dezembro de 2016, requerer a prestação das provas a que se referem estas normas, com as consequências nelas estabelecidas em caso de aprovação.”

 

Ou seja, verdadeiramente, o que a Demandante preconiza – ainda que disso não se tenha dado conta – não é nenhuma intervenção da metodologia própria do Direito de cariz interpretativo ou integrador; o que ela realmente preconiza é – isso sim – uma verdadeira correção do sistema jurídico, em termos de se retomar por inteiro uma norma que entretanto caducara e que, como nenhuma outra, serviria os seus interesses.

 

Só que uma tal correção está para além da metodologia jurídica própria do Direito constituído [de jure constituto], traduzindo-se antes numa ambição de jure constituendo, a ser reportada ao legislador e não a ser pedida, ainda que sob a aparência de tarefa interpretativa ou integradora, às instâncias incumbidas de dirimir os dissídios jurídicos segundo o Direito constituído.

 

E, considerem-se elas mais ou menos válidas, nem as referidas ponderações de justiça apresentadas pela Demandante – quanto à alegada desigualdade entre a sua concreta situação e a dos docentes em situação similar que usufruíram do regime transitório de 2010 e quanto à iniquidade de alguns docentes menos habilitados poderem “saltar” para categoria idêntica à sua sem que ela possa pela mesma via subir de categoria – evidenciam, nem isso se alega, problemas de constitucionalidade contendentes com o regime jurídico em análise nesta Decisão, conforme este Tribunal o entendeu.

 

Haverá, pois, de concluir-se que, ao contrário do que a Demandante preconiza, a argumentação própria da metodologia do Direito constituído, seja pela via interpretativa seja pela via integradora, não permite, face à norma do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, reconhecer aos docentes do ensino superior politécnico com a categoria de professor coordenador – e, assim, à Demandante – o direito de requererem, fosse até 31 de dezembro de 2016 fosse até 31 de dezembro de 2017, a prestação de provas públicas de avaliação de competência pedagógica e técnico-científica para, em caso de aprovação, acederem, sem outras formalidades, mantendo o regime de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado, à categoria de professor coordenador principal.

 

Conclusão esta que, naturalmente, torna desnecessária a apreciação e decisão das, antes discriminadas, demais questões de Direito sub judice.

 

 

IX – Da Decisão Arbitral

 

À luz dos fundamentos expostos, julgo totalmente improcedente a presente ação – que tem o valor de € 30 000,01 (trinta mil euros e um cêntimo) – interposta pela Demandante, B…, e, consequentemente, absolvo o Demandado, A…, dos pedidos nela formulados.

 

 

Notifique.

 

 

19 de fevereiro de 2018.

 

 

O Árbitro,

 

 

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Abílio de Almeida Morgado