Jurisprudência Arbitral Administrativa


Processo nº 135/2018-A
Data da decisão: 2019-04-03  Relações júrídicas de emprego público 
Valor do pedido: € 30.000,01
Tema: Transição automática para a celebração de contrato de trabalho por tempo indeterminado.
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DECISÃO ARBITRAL

 

 

I.             RELATÓRIO

1.            A..., titular do cartão de cidadão n.º..., com o número de identificação fiscal n.º..., residente na Rua..., n.º..., ...-... ..., veio instaurar neste Tribunal Arbitral do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) a presente ação contra o B..., com o número de identificação de pessoa coletiva ..., com sede no ..., ...-... ..., peticionando a constituição do tribunal arbitral, com a causa de pedir constante do articulado da petição inicial, peticionando, a final, que “deve ser anulado o ato praticado pelo Demandado B... que indeferiu o requerimento da Demandante de transição para um contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado (…)” e “deve o Demandado ser condenado à prática do ato legalmente devido, deferindo o que foi requerido pela Demandante”.

2.            Foi apresentada Contestação pelo Demandado, que alegou, com relevo para o objeto do litígio, que não se encontram verificados os pressupostos legais para a transição automática para um contrato por tempo indeterminado, porquanto, na data com relevância para o efeito, a Autora não exercia funções em regime de tempo integral ou de dedicação exclusiva, concluindo pela improcedência do pedido.

 

II.            PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS

O Tribunal Arbitral é competente e regularmente constituído.

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são partes legítimas e encontram-se regularmente representadas.

A questão a conhecer afigura-se ser apenas de direito, pelo que, e sem necessidade de mais indagações, dispensa-se a apresentação pelas partes de alegações finais, cabendo, de imediato, conhecer o mérito da causa.

 

III.          OBJETO DO LITÍGIO

É objeto do litígio dos presentes autos a apreciação da legalidade do ato administrativo praticado pelo Demandado em 06.04.2018, que determinou o indeferimento da pretensão deduzida pela Autora no sentido de “transição para um contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado”, ao abrigo do disposto no n.º 1, do artigo 5.º, e no n.º 1, do artigo 8.º, do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de Agosto, e no artigo 4.º, da Lei n.º 65/2017, de 9 de Agosto.

 

IV.          QUESTÕES A DECIDIR

A única questão objeto do presente litígio é, pois, a verificação dos pressupostos para a transição automática para a celebração de contrato de trabalho por tempo indeterminado, prevista no Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de Agosto.

 

V.           FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Considerando os meios de prova admissíveis em direito, designadamente, os documentos juntos aos autos pelas partes, o procedimento administrativo instrutor, considerando ainda factos admitidos por acordo, confessados e provados por documentos, resultaram provados os seguintes factos, com relevância para o objeto do litígio:

1.            A Autora exerceu funções de docente na categoria de Equiparada a Assistente, no B..., em regime de exclusividade, em diferentes períodos, compreendidos entre 18.09.2003 e 14.03.2007 – documento n.º 6 junto com a petição inicial.

2.            A Autora exerceu funções de docente na categoria de Equiparada a Assistente, no C..., em regime de tempo integral e em dedicação exclusiva, em dois períodos, a saber: de 19.03.2007 a 31.07.2007 e de 17.09.2007 a 16.03.2008 – documento n.º 7 junto com a petição inicial.

3.            Em 16.09.2009, a Autora foi contratada pela Entidade Demandada para exercer funções de docente em regime de tempo parcial de 50% – vide procedimento administrativo instrutor junto aos autos.

4.            A Autora obteve o grau de Doutor em 06.05.2013 – facto admitido por acordo.

5.            Em 14.08.2017, a Autora requereu à Entidade Demandada a “transição para um contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado na categoria de professor adjunto, com fundamento no disposto no n.º 1 do artigo 5.º e no n.º 1 do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto e no artigo 4.º da Lei n.º 65/2017 de 9 de agosto” – documento n.º 1 junto com a petição inicial.

6.            Em 06.04.2018, foi indeferido o pedido formulado, de acordo com os fundamentos do parecer do Sr. Secretário-geral da Educação e Ciência – vide procedimento administrativo instrutor junto aos autos.

 

VI.          FACTOS NÃO PROVADOS

Não existem outros factos (provados ou não provados) com relevância para a decisão a proferir.

 

VII.         MOTIVAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO

Os factos constantes dos pontos 1. a 6. da matéria de facto foram alegados pela Autora na petição inicial e resultaram provados em face da confissão das partes a este respeito, bem como do teor dos documentos juntos com os articulados, e não impugnados, bem como do teor do procedimento administrativo instrutor.

 

VIII.       FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

A única questão objeto da presente ação é a verificação dos pressupostos para a anulação do ato administrativo que indeferiu a pretensão da Autora, isto é, da verificação dos pressupostos de que depende a transição para um contrato de trabalho por tempo indeterminado.

Atento o invocado e a matéria dada como provada, importa agora fazer a correspondente subsunção dos factos ao direito aplicável, verificando os pressupostos de que depende a pretensão deduzida.

O Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de Agosto, aprovou um conjunto de regras complementares do processo de transição dos docentes do ensino superior politécnico regulado e pelo Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de Agosto, alterado pela Lei n.º 7/2010, de 13 de maio.

Nos termos do artigo 5.º, do aludido diploma legal, “após a obtenção do grau de doutor ou do título de especialista no período de prorrogação ou renovação contratual a que se refere o artigo 2.º, transitam, sem outras formalidades, para o regime de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado (…)” sendo que, o n.º 2 daquele normativo dispõe que “é aplicável aos assistentes, aos equiparados a assistente, a professor adjunto ou a professor coordenador que exerciam funções em regime de tempo integral ou de dedicação exclusiva na data de entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto”.

Assim, a transição para um contrato de trabalho por tempo indeterminado é potencialmente aplicável aos docentes que, eram doutorados ou dispunham do título de especialista, à data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de Agosto, isto é, em 18.08.2016, e para além disso, cumpriam cumulativamente os seguintes requisitos: 1) estavam contratados a termo em 01.09.2009, em regime de tempo integral ou de dedicação exclusiva, e 2) encontravam-se, ainda, contratados a termo, em 30.06.2016 – vide artigo 8.º, do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de Agosto.

Em concreto, importa, pois, verificar se a aqui Autora preenche os pressupostos cumulativos aplicáveis.

Tratando-se de pressupostos cumulativos, basta a não verificação, em concreto, de qualquer um deles, para que a situação em apreço não possa subsumir-se na previsão legal. Assim, para que possa exigir a transição para o contrato de trabalho por tempo indeterminado, necessário seria que a Autora tivesse celebrado contrato a termo, em regime de tempo integral ou de dedicação exclusiva, na data de 01.09.2009, isto é, data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de Agosto.

É, pois, para estas hipóteses, que a lei prevê a integração da carreira, e não outras.

Veja-se que a celebração de contratos de trabalho por pessoas coletivas públicas, como o é a Entidade Demandada, exige, para efeitos do n.º 2, do artigo 47.º, da Constituição da República Portuguesa, o cumprimento de um procedimento concursal, prévio à contratação, ao contrário do que acontece no âmbito do direito privado.

Pelo que, as normas previstas no Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de Agosto, constituem exceção ao regime jurídico regra do acesso à função pública, motivo pelo qual, no caso em apreço, está vedada ao intérprete a aplicação analógica.

Regressando aos factos em apreço, a Autora foi contratada pela Entidade Demandada para exercer funções de docente, em regime de tempo parcial de 50%, em 16.09.2009, sendo certo que, na data relevante para efeitos de aplicação do direito que se arroga, a Autora não era parte de qualquer contrato.

Esta circunstância, per si, obsta à aplicação do disposto no n.º do artigo 5.º, do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de Agosto, na medida em que falta o pressuposto fundamental da vigência de um contrato a termo, mas também das características do mesmo, isto é, alternativamente, tratar-se de um contrato em regime de tempo integral ou de dedicação exclusiva.

Na verdade, a Autora não se encontra em qualquer destas hipóteses, sendo certo que, a situação jurídica da Autora não pode incluir-se na previsão da norma do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de Agosto, nem sequer através de interpretação extensiva.

Por outro lado, a Autora obteve o grau de Doutor em 06.05.2013. Contudo, pese embora tenha obtido aquele grau, não se verificam os pressupostos de que depende a celebração de contrato em funções publicas por tempo indeterminado.

Estando, como estava, a Entidade Demandada sujeita a uma atuação vinculada, sob pena de desobedecer à lei aplicável, violando o princípio da legalidade, outro não poderia ter sido o teor do ato administrativo praticado pelo Demandado, em face do que não merece censura o ato.

 

IX.          V. DECISÃO

Em face do exposto, decide-se julgar totalmente improcedente a presente ação, e em consequência, condenam-se as partes no pagamento das custas da ação, de acordo com o Regulamento de Arbitragem Administrativa, fixando-se o valor dos encargos de arbitragem de acordo com a Tabela do CAAD.

Lisboa, 03.04.2019

O árbitro,

Diogo Pereira da Costa