Jurisprudência Arbitral Administrativa


Processo nº 82/2016-A
Data da decisão: 2017-07-12  Relações júrídicas de emprego público 
Valor do pedido: € 30.000,01
Tema: Alteração do posicionamento remuneratório
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DECISÃO ARBITRAL

 

I.                   RELATÓRIO

 

  1. Partes e objeto do litígio

 

A…, com o NIF…, residente na …, …, …, …-… …, Torres Novas, Especialista Auxiliar da B…, demandou o C…, com sede na …, …-… Lisboa, junto do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”).

 

Alega, em suma, o Demandante que, estando provido no mapa de pessoal da D… com nomeação definitiva na categoria de Escrivão Auxiliar e auferindo o vencimento base mensal de 1.067,60€, ingressou, na sequência de procedimento concursal interno de ingresso, na carreira de Especialista Auxiliar do mapa de pessoal da B…, tendo auferido durante o período de estágio e, findo este, até junho de 2016 o vencimento base mensal que auferia na categoria de origem. Contudo, a partir de julho de 2016, o Demandante passou a auferir o vencimento base mensal de 935,12€, correspondente ao escalão 1 da carreira de Especialista Auxiliar e, nesse mês de julho de 2016, foram-lhe descontadas as quantias alegadamente abonadas em excesso entre dezembro de 2015 e junho de 2016, pelo que, nesse mês, apenas lhe foi paga a remuneração de 224,87€. O Demandante defende que a alteração do seu posicionamento remuneratório de 1.067,60€ para 935,12€ viola o disposto no artigo 132.º, n.º 5, da Lei Orgânica da B… (LO…), aprovada pelo Decreto-Lei n.º 275-A/2000, de 09.11, Mais alega que, mesmo que assim não fosse, sempre a reposição determinada seria ilegal, por violação do disposto no artigo 174.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LGTFP), aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20.06, e por, ao não salvaguardar o montante correspondente ao salário mínimo, ofender o princípio da dignidade humana, decorrente do princípio do Estado de Direito, constante das disposições conjugadas dos artigos 1.º, 59.º, n.º 2, al. a) e 63.º, n.ºs 1 e 3, da Constituição.

 

Peticiona, por isso, que seja declarado o direito a ser retribuído pelo montante que auferia enquanto Escrivão Auxiliar da D… (1067,60€) até ao momento em que, por força da Tabela correspondente a Especialista Auxiliar da B…, possa progredir para a posição remuneratória seguinte. Mais requer que seja o Demandando condenando a devolver-lhe as quantias que deduziu indevidamente do seu vencimento, acrescidas de juros de mora à taxa legal, contados desde a data das deduções até integral pagamento. Subsidiariamente, a entender-se que o Demandante podia efetuar as deduções, peticiona que seja declarada a ilegalidade dos descontos que afetem o valor correspondente ao salário mínimo e condenado o Demandado a devolvê-los acrescidos de juros de mora à taxa legal contados desde a data dos descontos até integral pagamento.

 

O Demandado apresentou contestação propugnando pela improcedência da ação. Defende, em síntese, que, nos termos do artigo 132.º, n.º 1, da LO… o ingresso do pessoal de apoio à investigação criminal faz-se, imperativamente, no escalão 1, precedido de um período de estágio, e que apenas os estagiários, caso sejam já funcionários, beneficiam da faculdade de optar pela remuneração de origem, como dispõe o artigo 138.º, n.º 3, da LO… . Mais sustenta que o artigo 132.º, n.º 5, da LO… não se aplica em situações de “ingresso”, após concurso, de trabalhadores nas carreiras da B…, mas apenas em situações de “integração” de trabalhadores na B…, por exemplo em situações de mobilidade na categoria previstas no artigo 99.º, n.º 5, da LGTFP. 

 

  1. Processo administrativo

 

Com a Contestação, o Demandado enviou processo administrativo composto por 15 páginas, numeradas e rubricadas.

 

  1. Tribunal Arbitral

 

A B…, serviço central do C…, encontra-se vinculada à jurisdição do CAAD no que respeita à composição de litígios de valor igual ou inferior a 150 milhões de euros que tenham por objeto questões emergentes de relações jurídicas de emprego público, quando não estejam em causa direitos indisponíveis e quando não resultem de acidente de trabalho ou de doença profissional (cfr. artigo 1.º, n.º 1, al. d) e n.º 2, al. a), da Portaria n.º 1120/2009, de 30 de setembro).

 

Por correio eletrónico de 04.01.2017, o Presidente do Conselho Deontológico do CAAD comunicou à signatária a designação como árbitro do tribunal arbitral singular, a qual foi aceite pela signatária por correio eletrónico de 11.01.2017.

 

O Tribunal Arbitral foi constituído a 12.01.2017.

 

  1. Tramitação e despachos

 

Por despacho de 24.02.2017, proferido ao abrigo do artigo 18.º do Regulamento Arbitragem Administrativa do CAAD, o Tribunal determinou que: i) o Demandante juntasse, no prazo de 10 dias, documento para prova da retribuição mensal auferida quando se encontrava provido no mapa de pessoal da D…, ii) as partes se pronunciassem, no prazo de 10 dias, sobre a intenção de o Tribunal conduzir o processo apenas com base na prova documental junta com os articulados e processo administrativo e iii) as partes informassem, no prazo de 10 dias, se pretendiam apresentar alegações finais.

 

Na sequência desse despacho, o Demandante juntou aos autos, por requerimento de 15.03.2017, nota de abonos e descontos referente ao mês de fevereiro de 2014. Quanto ao mais, as partes nada disseram.

 

Por despacho de 12.05.2017, o Tribunal i) admitiu a junção aos autos do documento junto pelo Demandante por requerimento de 15.03.201 ii) determinou que o processo seria decidido apenas com base na prova documental junta e iii) notificou as partes para produzirem alegações finais escritas simultâneas, fixando-se o prazo de 15 dias para o efeito.

 

As partes não apresentaram alegações escritas.

 

  1. Saneamento

 

O Tribunal é competente. As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se regularmente representadas. Não se verificam nulidades ou questões prévias que cumpra apreciar.

 

  1. Questões decidendas

 

Cabe a este Tribunal resolver duas questões de Direito:

1)      Questão de saber se o ingresso na carreira de especialista auxiliar, na sequência de procedimento concursal interno de ingresso, se faz no escalão 1 quando o funcionário detinha posição remuneratória superior à correspondente ao escalão 1 da nova carreira;

2)      Caso se conclua afirmativamente quanto à questão 1), questão de saber se, em caso de ter sido abonado ao funcionário vencimento superior ao devido, poderá deduzir-se o montante pago em excesso no vencimento subsequente e, em caso afirmativo, se essa dedução pode atingir o montante correspondente à retribuição mensal mínima garantida.

 

II.                FUNDAMENTAÇÃO

 

  1. Factos

 

Os factos relevantes para a decisão da causa afiguram-se não controvertidos, não existindo factos não provados relevantes para a decisão. Assim, com relevância para a decisão a proferir, consideram-se provados, face à prova documental produzida e à posição concordante das partes manifestada nos respetivos articulados, os seguintes factos:

1)      O Demandante, em 30.09.2013, encontrava-se provido no mapa de pessoal da D… (D…) com nomeação definitiva na categoria de Escrivão Auxiliar (cfr. Nota Biográfica do Demandante datada de 30.09.2013 e junta como Doc. n.º 1 na petição inicial);

2)      O Demandante, em fevereiro de 2014, auferia o vencimento base mensal de 1.067,60€ (mil euros, sessenta e sete euros e sessenta cêntimos), correspondente ao 2.º escalão remuneratório da categoria de Escrivão Auxiliar (cfr. Nota de Abonos e Descontos junta pelo Demandante autos por requerimento de 15.03.2017);

3)      Através do Aviso n.º 21306/2010, publicado no DR, II Série, n.º 207, de 25.10.2010, a Direcção Nacional da B… fez pública a abertura de procedimento concursal interno de ingresso para o preenchimento de 16 postos de trabalho da carreia de especialista auxiliar do grupo de pessoal de apoio à investigação criminal, do mapa de pessoal da B… (cfr. Aviso n.º 21306/2010 junto como Doc. n.º 2 com a petição inicial);

4)      Do ponto 4 do Aviso.º 21306/2010 consta, entre outros requisitos de admissão exigidos, que os candidatos “Sejam titulares de relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado (nomeação ou contrato de trabalho em funções públicas) em serviços ou organismos da Administração Central. (Nos termos do n.º 4 do artigo 6.º da Lei n.º 12-A72008, de 27 de Fevereiro, e tendo em conta o disposto no artigo 22.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril).”;

5)      No que respeita ao vencimento e regalias, no ponto 6 do Aviso n.º 21306/2010 lê-se que o vencimento “é fixado nos termos da Tabela n.º 2 do anexo V ao Decreto-Lei n.º 275-A/2000, de 9 de Novembro, acrescida de suplemento de risco a que se refere o artigo 91.º do mesmo diploma. As regalias sociais são as genericamente vigentes para os trabalhadores da Administração Central.”;

6)      O Demandante concorreu ao referido concurso, na sequência do que foi nomeado definitivamente, em período experimental, como Especialista Auxiliar Estagiário, da carreira de Especialista Auxiliar, do mapa de pessoal da B… (cfr. Despacho (extrato) n.º 13926/2014, do Sr. Diretor Nacional-Adjunto da B…, publicado no DR, II Série, n.º 222, de 17.11.2014 e junto como Doc. n.º 2 com a petição inicial);

7)      O período de estágio do Demandante decorreu entre 1 de dezembro de 2014 e 1 de dezembro de 2015 (cfr. Despacho (extrato) n.º 8928/2016 do Sr. Diretor Nacional-Adjunto da B…, publicado no DR, II Série, n.º 132, de 12.07.2016, junto como Doc. n.º 2 na petição inicial);

8)      Durante o período de estágio, o Demandante auferiu o vencimento base mensal de 1.067,60€ correspondente vencimento que auferia na D… (cfr. Doc. n.ºs 3 e 6 juntos com a petição inicial);

9)      Por despacho do Sr. Diretor Nacional-Adjunto da B… de 20.06.2016 foi declarado concluído com sucesso o período experimental do Demandante e posicionado o mesmo na categoria de especialista auxiliar de escalão 1, com efeitos a 01.12.2015 - cfr. Despacho (extrato) n.º 8928/2016 do Sr. Diretor Nacional-Adjunto da B…, publicado no DR, II Série, n.º 132, de 12.07.2016, junto como Doc. n.º 2 na petição inicial);

10)  Após o período de estágio e até junho de 2016 o Demandante recebeu o vencimento base mensal de 1.067,60€ (cfr. Docs. n.ºs 4  e 5 junto com a petição inicial);

11)  No aviso de crédito de remunerações ao Demandante, referente ao mês de julho de 2016 e a creditar em 21.07.2016, é indicado um vencimento base mensal de 935,12€ (novecentos e trinta e cinco euros e doze cêntimos) (cfr. Doc. n.º 5 junto com a petição inicial);

12)  No aviso de crédito de remunerações ao Demandante, referente ao mês de julho de 2016 e a creditar em 21.07.2016, são indicadas deduções no valor de 132,48€ (cento e trinta e dois euros e quarenta e oito cêntimos) referentes aos vencimentos base de 12/15, 01/16, 02/16, 03/16, 04/16, 05/16 e 06/16 (cfr. Doc. n.º 5 junto com a petição inicial);

13)  Por força das deduções referidas no número anterior, no mês de Julho de 2016, o Demandante foi abonado com um total líquido de 224,87€ (duzentos e vinte e quatro euros e oitenta e sete cêntimos);

14)  Em 01.08.2016, o Demandante deu entrada de requerimento dirigido ao Sr. Diretor Nacional da B…, requerendo uma reavaliação do processo remuneratório e atribuição/ colocação na posição remuneratória igual à auferida no serviço de origem, ou seja, no montante mensal de 1.067,60€, com efeitos a 1 de dezembro de 2015 (cfr. Doc. n.º 6 e fls. 1 e 2 do processo administrativo);

15)  Sobre o requerimento referido no número anterior foi elaborada informação de serviço da URHRP/…, datada de 04.08.2016, na qual se conclui que “não existindo base legal para o solicitado pelo trabalhador, não poderá ser autorizada a colocação na posição remuneratória igual à auferida no serviço anterior” (cfr. Doc. n.º 6 junto com a petição inicial e fls. 3 e 4 do processo administrativo);

16)  Sobre a referida informação de serviço foi exarado, em 08.08.2016, despacho de “concordo” do Sr. Diretor Nacional Adjunto (cfr. fls. 4 do processo administrativo);

17)  Por correio eletrónico de 09.08.2016, o Demandante foi notificado da referida informação de serviço e do despacho nele exarado (cfr. fls. 5 e 6 do processo administrativo);

18)  Por requerimento que deu entrada em 17.08.2016, o Demandante apresentou Recurso para o Sr. Diretor Nacional da B… da decisão de indeferimento da sua pretensão, solicitando a reavaliação do processo remuneratório (cfr. fls. 9 e 10 do processo administrativo);

19)  Sobre o requerimento referido no ponto anterior foi elaborada informação de serviço da URHRP/…, datada de 25.08.2016, na qual se conclui que “não existindo base legal para o solicitado pelo trabalhador, não poderá ser autorizada a colocação na posição remuneratória igual à auferida no serviço anterior (cfr. fls. 11 e 12 do processo administrativo);

20)  Sobre a informação de serviço referida no número anterior foi exarado, em 26.08.2016, despacho do Sr. Diretor Nacional de “Notifique” (cfr. fls. 13 do processo administrativo);

21)  Por correio eletrónico de 26.08.2016, lido pelo Demandante em 29.08.2016, foi o Demandante da informação de serviço e do despacho nela exarado de 26.08.2016.

22)  Em 11.11.2016, o Demandante deu entrada no CAAD da petição inicial.

 

  1. Direito

 

Põe-se a questão de saber se o ingresso na carreira de especialista auxiliar, na sequência de procedimento concursal interno de ingresso, se faz no escalão 1 quando o funcionário detinha posição remuneratória superior à correspondente ao escalão 1 da nova carreira.

Nos termos do artigo 41.º, n.º 1, al. b) da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LGTFP), aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20.06, sobre “Revisão das carreiras, dos corpos especiais e dos níveis remuneratórios das comissões de serviço”,  sem prejuízo da revisão que deva ter lugar nos termos legalmente previstos, mantêm-se as carreiras que ainda não tenham sido objeto de extinção, de revisão ou de decisão de subsistência, designadamente as de regime especial e as de corpos especiais, bem como a integração dos respetivos trabalhadores, sendo que, até ao início de vigência da revisão, as carreiras em causa regem-se pelas disposições normativas aplicáveis em 31 de dezembro de 2008, salvo algumas disposições aí enumeradas posteriores que não têm aplicação no caso vertente.

As carreiras da B… são carreiras ainda por rever, pelo que, no que respeita à matéria que nos ocupa, haverá que atender ao disposto na Lei Orgânica da B…, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 275-A/2000, de 09.11. (LO…). No Capítulo V, artigos 100.º e seguintes da LO…, encontramos regulados os provimentos. Dentro desse capítulo, nos artigos 132.º e segs. estabelecem-se as regras aplicáveis ao pessoal de apoio à investigação criminal, no qual se inclui os especialistas auxiliares. Determina esse preceito (realçados nossos):

Artigo 132.º

Regra geral

 

1 - O ingresso nas carreiras do pessoal de apoio à investigação criminal faz-se no escalão 1, precedido de um período de estágio. 

2 - É condição de acesso a carreira de nível superior nas situações de mobilidade a classificação mínima de Bom nos anos relevantes para a mesma. 
3 - Nos casos em que houver lugar a procedimento interno de selecção, a progressão faz-se no escalão em que o funcionário se encontra posicionado até que seja integrado no escalão seguinte, nos termos previstos no n.º 2 do artigo 103.º 

4 - O tempo de serviço prestado nos termos do número anterior conta como prestado no novo escalão sempre que a integração se efectue na sequência do primeiro procedimento interno de selecção ao qual se possa submeter. 

5 - Nos casos em que a integração se faça para escalão com índice remuneratório inferior ao detido no escalão em que o funcionário se encontra posicionado, o funcionário vence pelo índice de origem.

Também com relevância para a questão que nos ocupa, determina o artigo 138.º do mesmo diploma (realçados nossos):

Artigo 138.º

Ingresso

 

1 - O estágio para ingresso nas carreiras do pessoal de apoio a investigação criminal obedece às seguintes regras:

a)      A admissão ao estágio faz-se por concurso; 

b) O estágio tem carácter probatório e deve integrar a frequência de cursos de formação directamente relacionados com as funções a exercer, sendo, no caso dos especialistas-adjuntos e dos seguranças, obrigatória a frequência de curso adequado ministrado no Instituto Superior de Polícia e Ciências Criminais no início do estágio; 

c) O estágio tem a duração de um ano;

 d) A frequência do estágio e feita em regime de contrato administrativo de provimento, no caso de indivíduos não vinculados a função pública, e em regime de comissão de serviço extraordinária, caso exista vínculo;

 e) Os estagiários aprovados são providos a título definitivo na respectiva carreira e os não aprovados regressam ao lugar de origem ou vêem o contrato rescindido, sem direito a qualquer indemnização, consoante se trate de indivíduos vinculados ou não à função pública; 
f) A não aprovação nos cursos de formação inicial previstos na parte final da alínea b) têm os efeitos previstos na alínea anterior.

 2 - A avaliação e classificação do estágio é determinada:

a)      Pela classificação de serviço, atribuída nos termos regulamentares, na qual se tem em consideração, sempre que possível, os resultados da formação profissional, considerando-se aprovados os estagiários com classificação igual ou superior a Bom;

b)      Nos casos de frequência obrigatória de cursos de formação inicial, pela classificação de serviço e pela classificação obtida nos cursos. 

3 - Os estagiários são remunerados nos termos da tabela indiciária constante do anexo V ao presente diploma, sendo reconhecido aos que já são funcionários a faculdade de optar, a todo o tempo, pela remuneração correspondente à categoria de origem. 
4 - O tempo de estágio, quando seguido de provimento definitivo, é contado como prestado na carreira
.

No contexto destas normas alega o Demandante que, apesar de o regime regra de ingresso na carreira de especialista auxiliar ser o de ingresso no escalão 1, após período de estágio, nos termos do artigo 132.º, n.º 1, da LO…, os restantes números desse artigo tutelam a posição remuneratória já detida pelo funcionário quando essa posição remuneratória seja superior à que lhe corresponderia na nova carreira. E, nesses casos, alega, o n.º 5 do artigo 132.º da LO… expressamente determina que o funcionário conserva a posição remuneratória já detida.

O Demandado, por seu turno, invoca que o artigo 132.º, n.º 1, da LO… é imperativo no sentido de que o ingresso de pessoal de apoio à investigação criminal se faz no escalão 1, precedido de um período de estágio, vedando a abertura de concurso de ingresso para a carreira de especialista auxiliar noutro escalão remuneratório. A faculdade de manter a remuneração de origem só se aplicaria durante o período de estágio, como estipula o n.º 3 do artigo 138.º da LO… . Concluído o estágio, essa faculdade cessaria e o ingresso far-se-ia no escalão 1. Mais alega que o n.º 132.º, n.º 5, da LO… apenas se refere a situações de “integração de trabalhadores na B…”, por exemplo em situações de mobilidade, e não a situações de “ingresso, após concurso, de trabalhadores nas carreiras da B…”.

Não oferece dúvida que a regra geral é a de que o ingresso nas carreiras do pessoal de apoio à investigação criminal se faz no escalão 1, precedido de um período de estágio, como dispõe o artigo 132.º, n.º 1, da LO… . Também não oferece dúvida que, durante o período de estágio, os estagiários que já são funcionários têm a faculdade de optar, a todo o tempo, pela remuneração correspondente à categoria de origem, como determina o n.º 3 do artigo 138.º da LO… . Assim, as dúvidas cingem-se a saber se, à luz do disposto no n.º 5 do artigo 132.º da LO…, findo o período de estágio, o funcionário vence pelo índice de origem quando o escalão 1 da carreira em que ingressa tem um índice remuneratório inferior ao índice remuneratório do escalão em que o funcionário se encontrava posicionado. A resposta é afirmativa. Desde logo, fazendo a interpretação literal da norma. Na verdade, a norma estabelece textualmente que nos casos em que a integração do funcionário se faça para escalão com índice remuneratório inferior ao detido no escalão em que o funcionário se encontra posicionado, o funcionário vence pelo índice de origem. E não se vê que o vocábulo “integração” afaste ou exclua, como preconiza o Demandado, as situações de ingresso, após concurso interno, de funcionário nas carreiras da B…, ou se refira apenas a casos de mobilidade, já que essa interpretação restritiva de “integração” não tem acolhimento normativo. Verifique-se, aliás, que a Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, que define e regula os regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas (diploma que, apesar de revogado, se aplica em várias matérias às carreiras não revistas e se aplica ao procedimento concursal interno de ingresso em causa, como estabelecido no ponto 2 do respetivo aviso), determina no artigo 40.º sobre a epígrafe “Integração em carreiras” que “os trabalhadores nomeados definitivamente e contratados por tempo indeterminado exercem as suas funções integrados em carreiras”, regulando nos artigos 50.º e seguintes o procedimento concursal para o preenchimento de lugares do mapa de pessoal. Com efeito, a nomeação definitiva pode verificar-se na sequência de procedimento interno de ingresso, como no caso, ficando assim o nomeado definitivamente integrado na carreira em causa. Como se lê no Despacho (extrato) n.º 13926/2014, do Sr. Diretor Nacional-Adjunto da B…, publicado no DR, II Série, n.º 222, de 17.11.2014 (Doc. 2 junto com a petição inicial), o Demandante e demais pessoas aí indicadas, foram “nomeados definitivamente, em período experimental, após procedimento concursal como Especialistas Auxiliares Estagiários, da carreira de Especialista Auxiliar, do mapa de pessoal da B…”. Portanto, o Demandante foi nomeado definitivamente e integrado nas carreiras da B… na sequência de concurso interno de ingresso. Em suma, quanto a este ponto, o artigo 132.º, n.º 5, da LO… ao referir-se a “integração” não exclui as situações de funcionários que ingressam nas carreiras da B… após procedimento concursal interno de ingresso. Acresce que, a interpretação propugnada pelo Demandado levaria a que o funcionário fosse remunerado por um índice remuneratório superior durante a fase de estágio do que após concluído com sucesso o estágio e integrado na carreira, o que não faz sentido. Por último, como nota o Demandante, não faria igualmente sentido que por força de concorrer a um procedimento interno de ingresso o funcionário fosse prejudicado sob o ponto de vista remuneratório, o que, aliás, iria de arrepio ao intuito de promover a mobilidade entre os serviços subjacente ao procedimento interno de recrutamento desencadeado, desincentivando tal mobilidade. Daí que o artigo 132.º, n.º 5, da LO… assegure, nessas situações, ao funcionário o índice remuneratório de origem. Diga-se, ainda, que no aviso do procedimento concursal em causa não foi feita qualquer menção a que o ingresso se faria no escalão 1, determinando-se apenas que seria aplicada a Tabela n.º 2 do anexo V da LO…, pelo que nem se pode dizer que foi dado a saber aos candidatos que o ingresso se faria no escalão 1. Conclui-se, por isso, quanto à primeira questão decidenda que o ingresso na carreira de especialista auxiliar, na sequência de procedimento concursal interno de ingresso, não se faz no escalão 1 quando o funcionário detinha posição remuneratória superior à correspondente ao escalão 1 da nova carreira, mantendo, nesse caso, o funcionário a posição remuneratória de origem. O que significa, no caso concreto, que o Demandante tem direito a auferir desde o termo do estágio até ao momento em que, por força da Tabela correspondente a Especialista Auxiliar da B…, possa progredir para a posição remuneratória seguinte o vencimento base mensal de origem (1.067,60€). Significando, ainda, que o Demandando violou o direito do Demandante ao determinar o seu posicionamento remuneratório no escalão 1 da carreira (a que corresponde o vencimento base mensal de 935,12€) com efeitos a 1 de dezembro de 2015 e ao deduzir no vencimento do Demandante do mês de julho de 2016 as quantias correspondentes à diferença entre os dois posicionamentos remuneratórios que haviam sida abonadas ao Demandante nos meses de Dezembro de 2015 a Junho de 2016. Face ao que se conclui quanto à primeira questão decidenda, torna-se desnecessário apreciar a segunda questão avançada, já que não foi abonado ao Demandante nos meses de Dezembro de 2015 a Junho de 2016 vencimento em montante superior ao devido. Porém, sempre se diga que, mesmo que admitisse a possibilidade de dedução do montante pago em excesso indevidamente – fosse esse o caso, que não é – no ou nos vencimentos subsequentes, nunca essa dedução poderia ser feita de molde a atingir o montante correspondente à retribuição mensal mínima garantida, à luz do princípio da dignidade da pessoa humana consagrado no artigo 1.º da Constituição da República Portuguesa e ínsito no artigo 59.º, n.º 1, al. a), e n.º 2, al. a) da Lei Fundamental. 

 

III.             DECISÃO

 

Atento o exposto, considera-se a ação procedente e, em consequência:

a)      Reconhece-se o direito do Demandante a auferir o vencimento base mensal que auferia enquanto Escrivão Auxiliar da D…, correspondente a 1.067,60€, desde 1 de dezembro de 2015 até ao momento em que, por força da Tabela aplicável à carreira de Especialista Auxiliar da B…, possa progredir para a posição remuneratória seguinte;

b)      Condena-se o Demandado a devolver ao Demandante as quantias correspondentes à diferença entre os dois posicionamentos remuneratórios e que haviam sido abonadas ao Demandante nos meses de Dezembro de 2015 a Junho de 2016 deduzidas no vencimento do Demandante de julho de 2016, acrescidas de juros de mora à taxa legal, contados desde a data em que foram efetuadas as deduções até efetivo e integral pagamento.

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Fixa-se o valor da ação em 30.000,01€.

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Fixa-se o valor dos encargos da arbitragem de acordo com a Tabela de Encargos Processuais do CAAD.

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Notifique-se.

 

Lisboa, 12 de julho de 2017

 

O Árbitro,

 

(Marisa Mirador)