Jurisprudência Arbitral Administrativa


Processo nº 2/2013-A
Data da decisão: 2013-11-18  Relações júrídicas de emprego público 
Valor do pedido: € 30.001,00
Tema: Suplemento remuneratório
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Autor: A…

Demandado: B…[B…]

SENTENÇA

I RELATÓRIO

A…, (que ulterior e abreviadamente se designará também abreviadamente por “A…”), com sede na Av…, …, …, …, em …

instaurou neste Tribunal Arbitral do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), a presente acção contra

B…, representado pelo Ministério da Justiça, (abreviadamente “MJ”),

pedindo que seja declarada a existência do direito dos oficiais de justiça que asseguram os turnos nos Tribunais a serem remunerados com o suplemento  remuneratório sem a redução prevista nos art.ºs 32º, da Lei 64-A/2011 e 45º, da Lei 66-B/2012. A fundamentar a sua pretensão alegou, no essencial, que:

- o serviço de turno efetuado pelos oficiais de justiça tem a natureza jurídica de “suplemento remuneratório” [previsto no nº 4 do artigo 82º, da Lei 52/2008 e no nº 4, do artigo 73º, da Lei 3/99] e não de “trabalho extraordinário”;

- o pagamento do serviço de turno em questão deve ser qualificado como suplemento/acréscimo remuneratório, nos termos dos arts 38º, do DL 186-A/99, de 31-5 e 45º, do DL 28/2009, de 28-1, que acresce à remuneração, e é calculado nos termos do art. 33º-3 do DL 259/98, de 18-8

- da remissão para o nº 3 do artigo 33º, do DL nº 259/98, de 18-8, não resulta a qualificação jurídica ou a natureza do citado suplemento remuneratório mas tão somente é uma remissão para efeitos do cálculo do suplemento;

- a…, com a entrada em vigor do artigo 32º, da Lei 64-B/2011 [Orçamento do Estado para 2012], passou a remunerar os oficiais de justiça, que asseguram os turnos nos tribunais, com as reduções previstas no sobredito normativo;

- em 2013, continuou a mesma prática, agora estribada no disposto no artigo 45º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de dezembro [Orçamento do Estado para 2013]

 

 

Notificado para responder, o MJ veio contestar, alegando, também no essencial e em síntese:

A – Ilegitimidade Passiva

- a exceção da ilegitimidade passiva decorrente do entendimento de que a representação em juízo do Estado compete, nos termos do respetivo Estatuto [art 3º-1/a) da Lei nº 47/86, de 15/10 com a designação efetuada pela Lei nº 60/98, de 27-8] ao Ministério Público e não ao Ministério da Justiça;

- a ilegitimidade passiva é exceção dilatória que conduz à absolvição da instância [artigo 89º-1/d), do CPTA aplicável por força da remissão do art 29º, do Regulamento de Arbitragem do CAAD];

B – Caducidade parcial do direito invocado pelo demandante

- sendo os atos impugnados praticados mensalmente pela … [reduções no pagamento de horas extraordinárias], o direito invocado pelo demandante caducou em relação a todos os atos praticados há mais de 3 meses [artigo 58º-2/b), conjugado com  o artigo 89º-1/h), ambos do CPTA]

C – Ilegitimidade ativa

- o que está em causa e é invocado pelo A… demandante, configura interesses individuais legalmente protegidos dos trabalhadores representados [e não defesa de direitos e interesses coletivos] na medida em que o direito invocado só existe na esfera dos associados do demandante que exercem funções nos tribunais de 1ª instância;

- não identificando os associados que representa nem juntando as respetivas procurações, suscita dúvidas a legitimidade processual do autor;

- a ilegitimidade ativa constitui exceção dilatória que conduz à absolvição da instância [arts 88º-4 e  89º-1/d) e 2 a 4 do CPTA]

D – Impugnação

- o suplemento remuneratório em causa é apenas um acréscimo remuneratório atribuído em função das particularidades especiais do trabalho prestado, designadamente por se tratar de trabalho extraordinário [cfr arts 73º, da Lei 12-A/2008, de 27-2];

- o DL nº 259/98, prevê dois regimes de trabalho diferentes, com dois tipos de remuneração igualmente diferenciados: “trabalho extraordinário, noturno, em dias de descanso e feriados [cap. IV do DL 259/98, em que se insere o artigo 33º] e “trabalho por turnos” [cap III – artigos 20º e 21º];

- nesta ação está em causa o serviço urgente prestado pelos oficiais de justiça aos sábados, nos feriados que recaiam em segunda feira e no segundo dia feriado, em caso de feriados consecutivos;

- por isso, “turno” não respeita, no caso, ao modo particular de exercício de funções, a uma modalidade de horário de trabalho, mas à forma de determinação de quem o faz, que nem sequer é pessoal, pois é feita entre Tribunais [artigo 32º do Regulamento da LOFTJ]: os turnos são organizados de forma rotativa, em comarcas de um ou mais círculos judiciais, por ordem alfabética de comarcas;

- atentos os termos e/ou a forma como é remunerada, a prestação de trabalho dos oficiais de justiça encontra-se sujeita às reduções decorrentes das LOE de 2012 e 2013.

 

            A convenção de arbitragem e a constituição do Tribunal Arbitral

            A entidade demandada vinculou-se à jurisdição do CAAD a partir de 1-10-2009, pela Portaria nº 1120/2009, de 30-9.

Foi aceite por ambas as partes a nomeação do signatário, que integra a lista de árbitros deste Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), para, como árbitro único, apreciar e decidir o litígio.

Este Tribunal arbitral foi constituído, com a aceitação do encargo pelo signatário, em 19-7-2013, assumindo total e legal competência para dirimir o litígio à luz do Regulamento do CAAD (cf Despacho do Secretário de Estado da Justiça nº 5097/2009, DR II Série – nº 30, de 12 de Fevereiro e demais legislação aí citada).

 

            Despacho liminar e processo administrativo

Decorrente do meu despacho de 2 de setembro de 2013, vieram as partes aceitar que o processo fosse conduzido com base nos documentos juntos e no processo administrativo.

Nessa mesma data (2-9-2013), ficaram ambas as partes notificadas para apresentar alegações, querendo, no prazo sucessivo de 10 dias.

Embora notificada para o efeito, a entidade demanda não apresentou cópia do  processo administrativo.

 

Foram apresentadas alegações finais apenas pelo demandante que igualmente respondeu às exceções suscitadas.

Alegou, em síntese:

- que é ao Ministério da Justiça que cabe, nos termos do disposto em 2 e 3 do artigo 11º, do CPTA, a representação do Estado e não ao MP, na medida em que o objeto do pedido não configura uma ação de responsabilidade civil ou ação sobre contratos;

- trata-se de ação de simples apreciação [e não de impugnação dos processamentos de remunerações da…] com o objetivo de obter uma sentença que torne certo o direito em causa;

- é reconhecida, pela CRP e pela lei, às associações sindicais legitimidade processual (própria) para defesa dos direitos e interesses coletivos dos trabalhadores que representem e para a defesa coletiva (portanto, feita por uma entidade representativa de todos os trabalhadores) dos direitos e interesses individuais legalmente protegidos dos trabalhadores que representem, sem necessidade de outorga de poderes de representação e sem prova da filiação de trabalhadores lesados (cfr. entre muitos outros Ac. TC nº 103/2001);

- não se pode confundir este direito legal dos sindicatos com a representação jurídica e ou judiciária; antes se trata aqui de verdadeira legitimidade processual própria e atribuída pelos arts. 56º-1 CRP e 310º-2 RCTFP e não de um mandato.

- o Demandante, enquanto Sindicato como parte processual, é “representante” dos direitos/interesses dos trabalhadores (associados ou não) de certo sector de atividade (cfr. GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, CRP anot., 4ª ed., coment. ao art. 56º), e não como mandatário ou legal representante;

- ou seja, as associações sindicais, de acordo com o art. 56º CRP, defendem por “direito próprio” os direitos e interesses, individuais ou coletivos, dos trabalhadores, não sendo meras representantes ou mandatárias dos trabalhadores;

- a  legitimidade processual do Demandante está fixada claramente nos arts. 56º-1 da CRP e 310º-2 do RCTFP.

- face aos referidos arts. 56º CRP e 310º-2 RCTFP, é ilegal fazer depender a legitimidade processual própria do Demandante para defender em juízo os direitos ou interesses coletivos ou individuais dos trabalhadores, de um sector de atividade, da outorga de uma procuração de cada trabalhador ao sindicato do seu sector.

 

            Saneamento do processo

Este Tribunal Arbitral é absolutamente competente.

O processo, isento de nulidades que o invalidem, é o próprio e as partes legítimas e capazes, estando representadas por advogados.

Exceções

A –  Representação ilegal - Ilegitimidade  (passiva e ativa)

Não procedem  estas exceções.

Na verdade, o disposto no artigo 11º-2, do CPTA, não permite dúvidas a   respeito da representação e legitimidade do Ministério da Justiça quando dispõe que “(…) sem prejuízo da representação do Estado pelo Ministério Público nos processos que tenham por objecto relações contratuais e de responsabilidade, as pessoas colectivas de direito público ou os ministérios podem ser representados em juízo por licenciado em Direito com funções de apoio jurídico, expressamente designado para o efeito, cuja actuação no âmbito do processo fica vinculada à observância dos mesmos deveres deontológicos, designadamente sigilo, que obrigam o mandatário da outra parte.(…)”[sublinhado nosso]

E o n.º 3 do mesmo artigo “(…)para o efeito do disposto no número anterior, e sem prejuízo do disposto nos números seguintes, o poder de designar o representante em juízo da pessoa colectiva de direito público ou, no caso do Estado, do ministério compete ao auditor jurídico ou ao responsável máximo pelos serviços jurídicos da pessoa colectiva ou do ministério.”

A representação em juízo distingue-se da legitimidade processual [arts 9º e 10º, do CPTA] e da representação processual [artº 11º, do CPTA], respeitante ao patrocínio judiciário.

Estando em causa nesta ação o reconhecimento de direitos dos associados da associação sindical demandante, a representação da entidade demandada pode ser cometida a advogado ou a licenciado em direito com funções de apoio jurídico [cfr artigo 11º, do CPTA].

É o que ocorre no caso.

Por outro lado, não colhe o argumento de que estão em causa interesses individuais de alguns dos associados, não identificados, do A… demandante e não a defesa de interesses coletivos.

Ao abrigo do artigo 56º, nº1 da CRP, os Sindicatos dispõem de legitimidade ativa para fazer valer, independentemente de expressos poderes de representação dos trabalhadores diretamente lesados, o direito à tutela jurisdicional, em sede de contencioso administrativo, na defesa coletiva de interesses individuais dos trabalhadores que representem.

 Podendo, assim, estar em juízo, para fazer valer tal tutela, em nome próprio, embora subjazendo, e estando implícito sempre, que o fazem no interesse e em representação dos trabalhadores que representem.

Tratando-se, portanto, de uma representação coletiva por natureza e não de representação conferida caso a caso ou "ad hoc".

É esta a Jurisprudência do Tribunal constitucional desde há alguns anos, ou seja, a de que o artigo 56º, nº1, da Constituição, assegura, não apenas a defesa pelas associações sindicais dos interesses coletivos dos trabalhadores, mas também garante a possibilidade de as mesmas intervirem na defesa coletiva de interesses homogéneos dos trabalhadores representados pelo A…, sem necessidade de alegação e prova de filiação sindical ou da outorga de especiais poderes de representação [cfr Ac nº 118/97,  do Plenário, in "Diário da República", I Série A, de 24 de Abril de 1997,  Ac nº 103/2001, de 14-3-2001 e Ac nº 160/99 in "Diário da República", IIª Série, de 16 de Fevereiro de 2000].

Destarte, sem necessidade de outros considerandos ou argumentos, não se antolha fundamento para questionar a representação e/ou a legitimidade de qualquer das partes, atento o manifesto interesse destas em demandar e contradizer – Cfr ainda arts 24º-1 (a contrario) e 30º, do CPC.

Improcedem, por isso, as mencionadas exceções.

 

B – Caducidade parcial do direito de ação

Afigura-se óbvia a improcedência de tal exceção face ao objeto do pedido.

Na verdade, não está em causa a impugnação de atos administrativos, maxime, dos atos praticados mensalmente pela DGAJ de processamento dos abonos com reduções nos pagamentos.

Antes se trata na presente ação de um pedido de reconhecimento, aos oficiais de justiça que asseguram os turnos nos tribunais, de direito à não aplicação dos regimes de redução previstos nos Orçamentos do Estado para 2012 e 2013 [Leis 64-B/2011 (artigo 32º) e  66-B/2012 (artigo 45º)].

Destarte, não é obviamente pertinente invocar a exceção de caducidade decorrente do disposto no artigo 58º-2/b), do CPTA e que visa as ações de impugnação de atos anuláveis.

Improcede, assim, a mencionada exceção.

 

II FUNDAMENTAÇÃO

OS FACTOS

Com relevo para apreciação do pedido nesta ação para reconhecimento de direito, estão assentes os factos alegados na petição inicial na medida em que estão documentados e/ou não sofreram qualquer contestação pela entidade demandada, que assim os aceitou.

Consideram-se assim, e no essencial para a decisão, provados os seguintes factos:

a) Os Oficiais de Justiça asseguram o funcionamento dos Tribunais Judiciais de Comarca, através de turnos, para o serviço urgente aos sábados e feriados que recaiam em segunda-feira e no segundo dia feriado, sendo-lhes pago, por isso, um suplemento remuneratório.

b) Os serviços de processamento de vencimentos da Direção-geral da Administração da Justiça, aplicaram as reduções previstas nos arts. 32º da Lei n.º 64-B/2011 e 45º da Lei n.º 66-B 2012, nos montantes dos suplementos remuneratórios  previstos nos n.º 4 do art. 82º da Lei 52/2008 e nº. 4 do art. 73º da Lei 3/99.

 

O OBJETO DA AÇÃO E O DIREITO

Pede-se nesta ação que o Tribunal reconheça que os associados do autor, funcionários judiciais que asseguram os chamados “turnos” nos tribunais judiciais de primeira instância, sejam remunerados com o suplemento prevista na Lei, sem as reduções a que aludem os Orçamento do Estado para 2012 [Lei 64-A/2011 – artigo 32º] e 2013 [Lei 66-B/2012 – artigo 45º].

Trata-se, pois de ação para reconhecimento de direito com este objeto.

Vejamos as disposições legais relevantes aplicáveis, transcrevendo-as, pelo menos em parte, para melhor facilidade expositiva.

- Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais (Lei 52/2008):

Artigo 82.º

Serviço urgente

1 - Nos tribunais judiciais de comarca organizam-se turnos para assegurar o serviço urgente durante os períodos de férias.

2 - São ainda organizados turnos para assegurar o serviço urgente previsto no Código de Processo Penal, na lei de cooperação judiciária internacional em matéria penal, na lei de saúde mental, na lei de protecção de crianças e jovens em perigo, na e no regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional, que deva ser executado aos sábados, nos feriados que recaiam em segunda-feira e no segundo dia feriado, em caso de feriados consecutivos.

3 - A organização dos turnos a que se referem os números anteriores cabe, conforme os casos, ao presidente do tribunal de comarca e ao magistrado do Ministério Público coordenador, com prévia audição dos magistrados e, sempre que possível, com a antecedência de 60 dias.

4 - Pelo serviço prestado nos termos do n.º 2 é devido suplemento remuneratório, nos termos a definir por decreto-lei.

 - DL 186-A/99

Artigo 38.º

Suplemento remuneratório pelo serviço de turno

1 - Pelo serviço de turno aos sábados e feriados que não recaiam em domingo é devido acréscimo de remuneração aos magistrados, nos termos do n.º 3 do artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 259/98, de 18 de Agosto, calculando-se o valor da hora normal de trabalho com referência ao índice 100 das escalas salariais dos magistrados judiciais e do Ministério Público.

2 - A remuneração devida pela execução de serviço urgente aos sábados e feriados que não recaiam em domingo em tribunais com sede em comarcas não abrangidas pelo mapa VIII anexo ao presente diploma é a fixada no número anterior.

3 - Pelo serviço a que se refere o n.º 1 é devido acréscimo de remuneração aos oficiais de justiça, nos termos do n.º 3 do artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 259/98, de 18 de Agosto, a suportar pelo Cofre Geral dos Tribunais.

            - DL28/2009

Artigo 45.º

Suplemento remuneratório pelo serviço de turno

1 - Pelo serviço de turno previsto no artigo 40.º é devido acréscimo de remuneração

aos magistrados, nos termos do n.º 3 do artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 259/98, de 18

de Agosto, calculando-se o valor da hora normal de trabalho com referência ao índice

100 das escalas salariais dos juízes e dos magistrados do Ministério Público.

2 - Pelo serviço de turno referido no número anterior é igualmente devido acréscimo de remuneração aos oficiais de justiça, nos termos do n.º 3 do artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 259/98, de 18 de Agosto, até à revisão do estatuto e carreira dos funcionários de justiça nos termos legalmente previstos

 

            - DL 259/98   

SECÇÃO III

Trabalho em dias de descanso semanal, de descanso complementar e em feriados

Artigo 33.º

Regime

1 - A prestação de trabalho em dia de descanso semanal, de descanso complementar e em feriado pode ter lugar nos casos e nos termos previstos no artigo 26.º, não podendo ultrapassar a duração normal de trabalho diário.

2 - O trabalho prestado em dia de descanso semanal é compensado por um acréscimo de remuneração calculado através da multiplicação do valor da hora normal de trabalho pelo coeficiente 2 e confere ainda direito a um dia completo de descanso na semana de trabalho seguinte.

3 - A prestação de trabalho em dia de descanso complementar ou feriado é compensada apenas pelo acréscimo de remuneração referido no número anterior.

4 - Nos casos em que o feriado recaia em dia de descanso semanal aplica-se na íntegra o regime previsto no n.º 2.

5 - O regime previsto nos n.º 2, 3 e 4 pode ser aplicado ao pessoal dirigente e de chefia, desde que a prestação de trabalho seja autorizada pelo membro do Governo competente.

6 - O disposto no n.º 1 é aplicável aos funcionários e agentes que se deslocam ao estrangeiro em representação do Estado Português.

7 - A prestação de trabalho efectuada nos termos do número anterior confere o direito a um dia completo de descanso, a gozar de acordo com a conveniência do serviço.

 

- Lei 12-A/2008

SECÇÃO III

Suplementos remuneratórios

Artigo 73.º

Condições de atribuição dos suplementos remuneratórios

1 - São suplementos remuneratórios os acréscimos remuneratórios devidos pelo exercício de funções em postos de trabalho que apresentam condições mais exigentes relativamente a outros postos de trabalho caracterizados por idêntico cargo ou por idênticas carreira e categoria.

2 - Os suplementos remuneratórios estão referenciados ao exercício de funções nos postos de trabalho referidos na primeira parte do número anterior, sendo apenas devidos a quem os ocupe.

3 - São devidos suplementos remuneratórios quando trabalhadores, em postos de trabalho determinados nos termos do n.º 1, sofram, no exercício das suas funções, condições de trabalho mais exigentes:

a) De forma anormal e transitória, designadamente as decorrentes de prestação de trabalho extraordinário, nocturno, em dias de descanso semanal, complementar e feriados e fora do local normal de trabalho; ou

b) De forma permanente, designadamente as decorrentes de prestação de trabalho arriscado, penoso ou insalubre, por turnos, em zonas periféricas e de secretariado da direcção.

4 - Os suplementos remuneratórios são apenas devidos enquanto perdurem as condições de trabalho que determinaram a sua atribuição.

5 - Os suplementos remuneratórios são apenas devidos enquanto haja exercício efectivo de funções.

6 - Em regra, os suplementos remuneratórios são fixados em montantes pecuniários, só excepcionalmente podendo ser fixados em percentagem da remuneração base mensal.

7 - Com observância do disposto nos números anteriores, os suplementos remuneratórios são criados e regulamentados por lei e, ou, no caso das relações jurídicas de emprego público constituídas por contrato, por acordo colectivo de trabalho.

 

- Orçamento de Estado para 2012 (Lei 64-B/2011)

Artigo 32.º

Pagamento do trabalho extraordinário

 

1 - Durante a vigência do PAEF, como medida excepcional de estabilidade orçamental, todos os acréscimos ao valor da retribuição horária referentes a pagamento de trabalho extraordinário prestado em dia normal de trabalho pelas pessoas a que se refere o n.º 9 do artigo 19.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, alterada pelas Leis n.os 48/2011, de 26 de Agosto, e 60-A/2011, de 30 de Novembro, são realizados nos seguintes termos:

a) 25 % da remuneração na primeira hora;

b) 37,5 % da remuneração nas horas ou fracções subsequentes.

2 - O trabalho extraordinário prestado em dia de descanso semanal, obrigatório ou complementar, e em dia feriado confere às pessoas a que se refere o n.º 9 do artigo 19.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, alterada pelas Leis n.os 48/2011, de 26 de Agosto, e 60-A/2011, de 30 de Novembro, o direito a um acréscimo de 50 % da remuneração por cada hora de trabalho efectuado.

3 - O regime fixado no presente artigo tem natureza imperativa, prevalecendo sobre quaisquer outras normas, especiais ou excepcionais, em contrário e sobre instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho e contratos de trabalho, não podendo ser afastado ou modificado pelos mesmos.

 

            - Orçamento do Estado para 2013 – Lei 66-B/2012

Artigo 45.º

Pagamento do trabalho extraordinário

1 - Durante a vigência do PAEF, como medida excecional de estabilidade orçamental, todos os acréscimos ao valor da retribuição horária referentes a pagamento de trabalho extraordinário prestado em dia normal de trabalho pelas pessoas a que se refere o n.º 9 do artigo 27.º, cujo período normal de trabalho, legal e ou convencional, não exceda 7 horas por dia nem 35 horas por semana são realizados nos seguintes termos:

a) 12,5 % da remuneração na primeira hora;

b) 18,75 % da remuneração nas horas ou frações subsequentes.

2 - O trabalho extraordinário prestado pelo pessoal a que se refere o número anterior, em dia de descanso semanal, obrigatório ou complementar, e em dia feriado confere às pessoas a que se refere o n.º 9 do artigo 27.º o direito a um acréscimo de 25 % da remuneração por cada hora de trabalho efetuado.

3 - O regime fixado no presente artigo tem natureza imperativa, prevalecendo sobre quaisquer outras normas, especiais ou excecionais, em contrário e sobre instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho e contratos de trabalho, não podendo ser afastado ou modificado pelos mesmos.

 

Afigura-se igualmente relevante, para apreciação da questão:

 

-  O Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas – Lei 59/2008

 

SUBSECÇÃO V

Trabalho por turnos

Artigo 149.º

Noção

Considera -se trabalho por turnos qualquer modo de organizaçãodo trabalho em equipa em que os trabalhadores ocupem sucessivamente os mesmos postos de trabalho, a um determinado ritmo, incluindo o ritmo rotativo, que pode ser de tipo contínuo ou descontínuo, o que implica que os trabalhadores podem executar o trabalho a horas diferentes no decurso de um dado período de dias ou semanas.

Artigo 150.º

Organização

1 — Devem ser organizados turnos de pessoal diferente sempre que o período de funcionamento ultrapasse os limites máximos dos períodos normais de trabalho.

2 — Os turnos devem, na medida do possível, ser organizados de acordo com os interesses e as preferências manifestados pelos trabalhadores.

3 — A duração de trabalho de cada turno não pode ultrapassar os limites máximos dos períodos normais de trabalho.

4 — O trabalhador só pode ser mudado de turno após o dia de descanso semanal obrigatório.

5 — Os turnos no regime de laboração contínua e dos trabalhadores que assegurem serviços que não possam ser interrompidos, nomeadamente trabalhadores directamente afectos a actividades de vigilância, transporte e tratamento de sistemas electrónicos de segurança, devem ser organizados de modo que aos trabalhadores de cada turno seja concedido, pelo menos, um dia de descanso em cada período de sete dias, sem prejuízo do período excedente de descanso a que o trabalhador tenha direito.

SUBSECÇÃO VII

Trabalho extraordinário

Artigo 158.º

Noção

1 — Considera -se trabalho extraordinário todo aquele que é prestado fora do horário de trabalho.

2 — Nos casos em que tenha sido limitada a isenção de horário de trabalho a um determinado número de horas de trabalho, diário ou semanal, considera -se trabalho extraordinárioo que seja prestado fora desse período.

3 — Quando tenha sido estipulado que a isenção de horário de trabalho não prejudica o período normal de trabalho diário ou semanal, considera -se trabalho extraordinário aquele que exceda a duração do período normal de trabalho diário ou semanal.

4 — Não se compreende na noção de trabalho extraordinário:

a) O trabalho prestado por trabalhador isento de horário de trabalho em dia normal de trabalho, sem prejuízo do previsto no número anterior;

b) O trabalho prestado para compensar suspensões de actividade, independentemente da causa, de duração não superior a quarenta e oito horas seguidas ou interpoladas por um dia de descanso ou feriado, quando haja acordo entre a entidade empregadora pública e o trabalhador;

c) A tolerância de quinze minutos prevista no n.º 3 do artigo 126.º;

d) A formação profissional, ainda que realizada fora do horário de trabalho, desde que não exceda duas horas diárias.

Artigo 159.º

Obrigatoriedade

O trabalhador é obrigado a realizar a prestação de trabalho extraordinário, salvo quando, havendo motivos atendíveis, expressamente solicite a sua dispensa.

Artigo 160.º

Condições da prestação de trabalho extraordinário

1 — O trabalho extraordinário só pode ser prestado quando o órgão ou serviço tenha de fazer face a acréscimos eventuais e transitórios de trabalho e não se justifique a admissão de trabalhador.

2 — O trabalho extraordinário pode ainda ser prestado havendo motivo de força maior ou quando se torne indispensável para prevenir ou reparar prejuízos graves para o órgão ou serviço.

3 — O trabalho extraordinário previsto no número anterior apenas fica sujeito aos limites decorrentes do n.º 1 do artigo 131.º

Artigo 161.º

Limites da duração do trabalho extraordinário

1 — O trabalho extraordinário previsto no n.º 1 do artigo anterior fica sujeito, por trabalhador, aos seguintes limites:

a) Cem horas de trabalho por ano;

b) Duas horas por dia normal de trabalho;

c) Um número de horas igual ao período normal de trabalho diário nos dias de descanso semanal, obrigatório ou complementar, e nos feriados;

d) Um número de horas igual a meio período normal de trabalho diário em meio dia de descanso complementar.

2 — Os limites fixados no número anterior podem ser ultrapassados desde que não impliquem uma remuneração por trabalho extraordinário superior a 60 % da remuneração base do trabalhador:

a) Quando se trate de trabalhadores que ocupem postos de trabalho de motoristas ou telefonistas e de outros trabalhadores integrados nas carreiras de assistente operacional e de assistente técnico, cuja manutenção ao serviço para além do horário de trabalho seja fundamentadamente reconhecida como indispensável;

b) Em circunstâncias excepcionais e delimitadas no tempo, mediante autorização do membro do Governo competente ou, quando esta não for possível, mediante confirmação da mesma entidade, a proferir nos 15 dias posteriores à ocorrência.

3 — O limite máximo a que se refere a alínea a) do n.º 1 pode ser aumentado até duzentas horas por ano, por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho.

 

Conjugando, interpretando e aplicando as citadas disposições ao caso sub juditio, afigura-se que o trabalho prestado pelo oficiais de justiça por necessidade de serviço urgente, imposta por normas legais e processuais -  que impõem tal trabalho aos sábados, feriados que recaiam em segunda feira e no segundo dia feriado, no caso de feriados consecutivos - , sendo um trabalho denominado como “turno” não é, como parece óbvio, um “trabalho por turnos” nos termos assim qualificados pela Lei [cfr citado artigo 149º, do Regime de Contrato de Trabalho em Funções Públicas (RCTFP) aprovado pela Lei 59/2008 e transcrito supra].

Trata-se, pelo contrário, de trabalho prestado fora do horário normal de trabalho dos oficiais de justiça – e, por consequência, tem a natureza e qualificação legal de “trabalho extraordinário [cfr artigo 158º do RCTFP] – remunerado, por força de sucessivas disposições legais, com o acréscimo calculado nos termos do nº 3 do artigo 33º, do DL 259/98, ou seja, através da multiplicação do valor da hora normal de trabalho pelo coeficiente 2.

            E se se trata aqui de trabalho extraordinário, com pagamento de suplemento decorrente da natureza jurídica desse trabalho, não se antolham fundamentos válidos para excluir a respetiva remuneração -  calculada, como se viu, por referência ao valor da retribuição horária -  das medidas excecionais de estabilidade orçamental previstas nos artigos 32º e 45º, dos Orçamentos de Estado para 2012 e 2013, respetivamente e que são aplicáveis a todos os acréscimos ao valor da retribuição horária referentes ao pagamento de trabalho extraordinário prestado.

            Dito doutro modo: pelo chamado e citado “serviço de turno”, os oficiais de justiça têm direito ao pagamento de um “suplemento remuneratório” pela prestação desse “trabalho extraordinário”.

            Não existe assim - e, de algum modo, seria incompreensível senão mesmo inaceitável – fundamento para subtrair ou excecionar ao regime de cortes ou reduções orçamentais os suplementos auferidos pelos oficiais de justiça decorrentes de trabalho que outra qualificação não pode ter senão a de trabalho extraordinário.

III DECISÃO

Destarte, julga-se totalmente improcedente esta ação e, em consequência, absolve-se a entidade demandada do pedido.

  • Valor da causa: € 30.001
  • Notifiquem-se as partes, com cópia, e deposite-se o original desta sentença (art. 23º-3, do Regulamento).

Lisboa e CAAD, 18 de novembro de 2013

O juiz-árbitro

 

José A G Poças Falcão