Decisão Arbitral
Demandante: A…
Demandado: B… (B)
I. Relatório
1. A…, titular do cartão de cidadão nº … e do número de identificação fiscal…, residente na Rua…, Lote…, nº…, …, …-… …,
instaurou neste Tribunal Arbitral do Centro de Arbitragem (CAAD) a presente acção contra
B…, com sede na Av. …, …, …-…, …,
Tendo deduzido os seguintes pedidos:
1) ser reconhecido o seu direito à compensação pela caducidade dos contratos de trabalho a termo certo resolutivo celebrados entre Demandante e Demandado, contabilizados desde 1 de Outubro de 2009 a Agosto de 2013; e, em consequência,
2) ser o Demandado condenado a pagar-lhe a quantia de € 4.874,36 referente ao período em que o Demandado não pagou a referida compensação.
3) ser o Demandado condenado no pagamento das custas com o presente processo de arbitragem.
2. Notificado para responder veio o Demandado defender-se:
- a incompetência do Tribunal Arbitral;
- a caducidade do direito de acção
-
por impugnação, alegando, em síntese, a improcedência da acção e em consequência, a sua absolvição do pedido.
3. A Demandante, notificada da contestação apresentada pelo Demandado, respondeu às excepções pugnando pela sua improcedência.
4. Constituído este Tribunal Arbitral foram as partes notificadas da intenção do tribunal de decidir o processo com base na prova documental junta e no processo instrutor e para apresentarem alegações, querendo, no prazo de 10 dias.
Apenas a Demandante apresentou alegações e nenhuma das partes se pronunciou contra a referida intenção.
II. Saneamento
Conhecimento prévio das excepções invocadas:
1. Incompetência do tribunal
O Demandado na sua defesa suscitou a excepção da incompetência material deste Tribunal Arbitral para decidir o presente litígio, com fundamento em que, não obstante o pedido formulado ser a condenação do Demandado a pagar à Demandante a quantia de € 4.874,36, está também em causa a apreciação da questão prévia essencial “relacionada com a existência ou não de ilegalidade na mobilização da contratação a termo certo”, o que exigiria a atribuição à acção de um valor mínimo de € 30.000,01.
Diga-se desde já que não assiste razão ao Demandado.
Não cabe no âmbito desta acção, nem como questão prévia essencial (como alega o Demandado), aquilatar da legalidade ou validade dos contratos celebrados. Com efeito, decorre de todos os diplomas legais aplicáveis, consoante a data de início e termo dos contratos celebrados entre as partes – artigos 83.º, 84.º, n.º 1 e 279.º da Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro RCTFP, artigos 10.º, n.º (s) 3 e 4 da Lei n.º 35/2014, de 20 de Junho – que, em caso de nulidade ou anulação do contrato de trabalho, este produz efeitos como se fosse válido em relação ao tempo em que seja executado. Estando apenas em causa o direito à compensação por caducidade, é despiciendo apreciar a validade ou legalidade dos contratos celebrados, uma vez que todos eles foram executados.
Pelo Despacho n.º …/2010, de 22 de Julho, do Presidente do B…, publicado no DR nº …/2010, foi aprovado o Regulamento de Resolução alternativa de litígios do B… . Nos termos do artigo 6.º deste Regulamento, o Demandado vinculou-se ao Centro de Arbitragem Administrativa – CAAD - para dirimir os litígios emergentes de relações reguladas pelo ECPDESP no âmbito das matérias objecto de regulamentação e em litígios de valor não superior a € 5.000,00.
Dispõe o n.º 1 do artigo 32.º do CPTA que “Quando pela acção se pretende obter o pagamento de uma quantia certa é esse o valor da causa. Por seu turno, decorre do artigo 31.º n.º 1 que o valor da causa resulta da utilidade económica imediata do pedido e esta tem, necessariamente, de ser aferida pelo efeito que se pretende obter através da acção.
Ora o efeito jurídico pretendido com esta acção resulta do pedido formulado; no caso, o de condenação do Demandado a pagar a compensação no montante de € 4.874,83, cabendo, por isso, no elenco dos litígios da competência deste tribunal.
Nestes termos, julga-se improcedente por não verificada a excepção aduzida da incompetência material deste Tribunal
2. Caducidade do direito de acção
Alega o Demandado que com a presente acção, cujo requerimento inicial foi apresentado em 16 de Janeiro de 2016, a Demandante pretende a anulação do acto do Sr. Presidente do B…, comunicado à Demandante pelo Oficio S/… /…/2015, de 17.04.2015, pelo que a presente acção é extemporânea ”tendo sido largamente ultrapassado o prazo peremptório da impugnação previsto na “alínea b) do n.º 1 do CPTA”.
Pese embora não se indicar o dispositivo legal em causa, tudo indica que se pretende referir à alínea b) do n.º 1 do artigo 58.º do CPTA (na redacção dada pelo DL n.º 214-G/2015, de 2 de Outubro, que entrou em vigor em 2015-12-01), que estabelece o prazo de três meses, a contar da notificação, para a impugnação de actos nulos ou anuláveis.
A Demandante respondeu à excepção deduzida, pugnando pela sua improcedência, com fundamento em que a presente acção foi instaurada no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado do saneador/sentença que absolveu o Demandado da instância, na acção com idêntica causa de pedir e pedido (com excepção do valor) que instaurou no CAAD em 14 de Agosto de 2015, pelo que se mantêm os efeitos civis derivados da propositura da primeira acção.
Vejamos então,
Na presente acção a Demandante pede o reconhecimento do direito à compensação pela caducidade dos contratos celebrados e a consequente condenação do Demandado no pagamento dessa compensação. Esta acção enquadra-se, pois, na previsão do art. 66.º do CPTA (na redacção do DL 214 - G/2015) de acção administrativa de condenação à prática de acto devido. Nos termos do disposto no n.º 1 do art. 69.º do CPTA, em situações de inércia da Administração, o direito de acção caduca no prazo de um ano contado desde o termo do prazo legal estabelecido para a omissão do acto devido; ou, nos termos do n.º 2, no caso de indeferimento do requerimento, o prazo de propositura da acção é de três meses, sendo aplicável o disposto no n.º 3 do artigo 58.º e nos artigos 59.º e 60.º do CPTA.
No caso, o último contrato celebrado entre Demandante e Demandado cessou em 20 de Outubro de 2014, tendo aquela solicitado o pagamento da compensação pela caducidade dos contratos em 6 de Fevereiro de 2015, o qual foi indeferido conforme despacho notificado à mesma pelo ofício enviado em 20 de Abril de 2015. Perante estes factos, da aplicação da referida norma, o direito de acção teria caducado por ter sido ultrapassado o prazo de 3 meses para a propositura da acção.
E não se afigura que esta situação seja ressalvada por via dos efeitos civis derivados da propositura da primeira acção. Com efeito, o regime estatuído no n.º 2 do art. 279.º do CPC, só permite aproveitar os efeitos civis decorrentes da propositura da acção anterior, sem prejuízo do disposto na lei civil relativamente à prescrição e à caducidade dos direitos. Assim, por força do disposto nos artigos 327.º e 303.º do CC, o efeito impeditivo da caducidade só se verifica se a nova acção for proposta no prazo de trinta dias a contar do trânsito em julgado da sentença que absolveu o réu da instância e se a absolvição da instância ocorrer por motivo não imputável à Autora. Ora, a absolvição da instância resultou da incompetência do tribunal devido ao valor da acção atribuído pela A., pelo que a propositura desta segunda acção não tem o efeito impeditivo da caducidade.
Porém, à data dos factos alegados no requerimento inicial estava ainda em vigor o CPTA na versão anterior à do DL 214 – G/2014, de 02 -10. Importa pois analisar a questão face às regras então aplicáveis.
Nos termos do n.º 1 do artigo 37.º do CPTA “seguem a forma da acção administrativa comum os processos que tenham por objecto litígios cuja apreciação se inscreva no âmbito da jurisdição administrativa e que nem neste Código nem em legislação avulsa, sejam objecto de regulação especial.”
Como ensina Mário Aroso de Almeida, Manual de Processo Administrativo, 2013, Almedina, a distinção estabelecida no CPTA entre acção administrativa comum e acção administrativa especial assenta no critério de saber se a pretensão se reporta ou não ao exercício de poderes de autoridade. Assim, cabe a forma de acção administrativa especial às situações em que estão em causa actuações da Administração conformadoras da esfera jurídica dos particulares; em que a Administração actua numa posição de supremacia, no exercício de poderes de autoridade, definindo unilateralmente, através de actos administrativos, o direito aplicável ao caso individual, ou com carácter de generalidade e abstracção, através de normas regulamentares. O âmbito da aplicação da acção administrativa comum é definido por exclusão, seguindo esta forma de processo toda a acção para a qual não corresponda uma outra forma específica.
O direito da Demandante à compensação pela caducidade dos contratos não resulta nem pressupõe um acto administrativo que defina a situação; pedido o pagamento de quantias a título de compensação por caducidade, a obrigação ou não de pagar a compensação resulta directamente das normas jurídico-administrativas aplicáveis. Pelo que, nos termos da alínea e) do n.º 2 do art. 37.º do CPTA (então vigente) ao presente litígio seriam aplicáveis as normas que regulam a acção administrativa comum.
Ora, nos termos do disposto no artigo 41.º do CPTA “Sem prejuízo do disposto na lei substantiva, a acção administrativa comum pode ser proposta a todo o tempo.”
Assim, uma vez que na versão anterior ao DL 2014-G/2015, esta acção podia ser proposta a todo o tempo, a aplicação sem mais da lei nova, que reduziu o prazo para três meses, traduzir-se-ia na extinção do direito de acção, o que é inaceitável por força da Constituição, por ofensa do direito a uma tutela jurídica efectiva.
Tem assim aplicação o disposto no n.º 1 do artigo 297.º do Código Civil, nos termos do qual o prazo de três meses para a propositura da acção estabelecido no artigo 69.º na redacção do DL 214-G/2015 só começa a contar a partir da entrada em vigor da nova lei, ou seja, a partir de 1 de Dezembro de 2015.
Nestes termos, tendo o requerimento inicial dado entrada em 16 de Janeiro de 2016 a acção foi apresentada no prazo de três meses a contar da entrada em vigor do DL 241-G/2015, julga-se improcedente por não verificada a excepção invocada de caducidade do direito de acção.
Assim sendo:
O tribunal arbitral é materialmente competente.
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas.
O processo não enferma de vícios que o invalidem.
III. Factos provados
Com relevância para a apreciação do pedido neste litígio estão assentes os factos alegados na petição inicial, na medida em que estão documentados e não sofreram qualquer contestação pela Demandada, que os aceitou expressamente ou manifestou concordância sobre os mesmos.
Está assim provado que:
a) A Demandante exerceu funções docentes no Instituto … B…, tendo celebrado vários contratos de trabalho em funções públicas a termo resolutivo certo, a saber:
· de 1 de Outubro de 2009 a 31 de Julho de 2010, com a remuneração de € 1.615,01
· de 1 de Outubro de 2010 a 31 de Julho de 2011, com a remuneração de € 1.816,89
· de 1 de Setembro de 2011 a 31 de Agosto de 2012, com a remuneração de €1.816,89
· de 8 de Outubro de 2012 a 31 de Agosto de 2012, com a remuneração de € 1.816,89
· 21 de Outubro de 2013 a 20 de Outubro de 2014, com a remuneração de € 1.816,89
(doc. n.º 2 a 6);
b) O objecto definido em todos os contratos celebrados foi o exercício de funções equiparadas às de categoria de Professor Adjunto, em regime de tempo parcial (80%, no primeiro contrato, e 90%, nos restantes), previsto no Estatuto da Carreira de Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico (ECPDESP), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 185/81, de 1 de Julho, alterado pelo Decreto-lei n.º 207/2009, de 31 de Agosto e no Regulamento de Contratação de Pessoal Especialmente contratado do IPC (doc. n.º 2 a 6);
c) A não renovação dos contratos não decorreu da vontade do trabalhador;
d) Por requerimento de 6 de Fevereiro de 2015, a Demandante solicitou ao Demandado o pagamento da compensação por caducidade dos contratos de trabalho celebrados com o Demandado (página 17 do Processo Administrativo);
e) O Demandado, por ofício com a referência …/… /…/2015, datado de 23 de Fevereiro de 2015, notificou a Demandante, através do envio de cópia da Informação …/… /…/2015, de 16/02/2015, que mereceu o despacho de Concordância do Presidente do Demandado, para exercer o direito do contraditório (página 18 a 20 do PA);
f) Nos termos da referida informação, a Demandante apenas tinha direito à compensação pela caducidade do contrato a termo, celebrado em 21.10.2013 e termo a 20.10.2014;
g) A Demandante pronunciou-se nos termos e para os efeitos do artigo 100.º do CPA, defendendo o direito a que lhe fosse processada a compensação pela caducidade relativa a todo o tempo em que esteve vinculada ao Demandado;
h) Por Despacho de concordância do Presidente do Demandado, sobre a Informação …/… /…/2015, datado de 17.04.2015, foi indeferido o requerido pela Demandante, com excepção do direito à compensação pela caducidade do contrato a termo celebrado a 21.10.2013;
i) A referida informação com o Despacho de concordância do Presidente do Demandado foi notificada à Demandante pelo Ofício com a referência …/… /…/2015, datado de 17.04.2015;
j) Em conformidade, foi processado o pagamento da compensação pela caducidade do último contrato celebrado em 21.10.2013;
k) Em 14 de Agosto de 2015 a Demandante apresentou no CAAD em requerimento inicial contra o Demandado, com a mesma causa de pedir ao apresentado a 16 de Janeiro de 2016;
l) O Demandado foi citado na acção e contestou;
m) No âmbito dessa acção foi proferido, em 17 de Dezembro de 2015, saneador/ sentença, o qual decidiu pela incompetência deste Tribunal Arbitral para dirimir o litígio, atendendo ao valor da causa fixado, de € 5.034,03 (por força do pedido de pagamento de compensação no montante de € 4.874,83 acrescido de juros), e em consequência absolveu o Demandado da Instância.
IV. Fundamentos de direito
1. Introdução
A questão decidenda reconduz-se à análise da existência ou não do direito da Demandante a exigir do Demandado o pagamento de uma compensação pela caducidade dos contratos de trabalho a termo resolutivo celebrados, sucessivamente, entre ambos de 2009 até 2012 (uma vez que foi processado o pagamento da compensação por caducidade do contrato celebrado em 21.10.2013).
Está provado nos autos, pela prova documental e por acordo das partes, que a Demandante celebrou com a Demandada cinco contratos de trabalho em funções públicas a termo certo resolutivo, para exercer funções docentes inerentes à categoria equiparada a professor adjunto em regime de tempo parcial, sendo que só lhe foi processada a compensação por caducidade relativamente ao último contrato.
A Demandante considera que tem direito à compensação pela caducidade de todos os contratos celebrados com o Demandado. Por um lado, porque, no seu entender, tal obrigação já existia anteriormente à Lei 66/2012, de 31 de Dezembro, a qual com a nova redacção dada ao artigo 252.º n.º 3 visou colocar termo a quaisquer dificuldades interpretativas anteriores; por outro lado, porque considera que os vários contratos sucessivos, para efeitos de contabilização da compensação devem ser vistos com um só, e por isso no cálculo da compensação deve ser considerada a antiguidade desde 2009 até 2014, nos termos da alínea B do artigo 9.º do Regime Transitório, introduzido pelo DL 207/2009, de 31 de Agosto, alterado pela Lei n.º 7/2010, de 13 de Maio.
O Demandado entende que não existe um vínculo único e que a eventual obrigação de pagamento da compensação pela caducidade do contrato de trabalho a termo tem de ser considerada casuisticamente e de acordo com o enquadramento legal vigente à data da cessação de cada um dos contratos individualmente considerados. No seu entender, do artigo 252.º, n.º 3 do RCTFP, na redacção da Lei 58/2008, de 11 de Setembro, não resulta o direito à compensação pela caducidade dos contratos celebrados até Outubro de 2013.
Face a estas posições temos duas questões distintas a esclarecer:
a) saber se os contratos devem ser vistos como um só; e, não o sendo,
b) saber se face ao enquadramento legal vigente em cada um deles existia ou não obrigação de compensação por caducidade.
2. Análise
2.1. Enquadramento dos contratos
Alega a Demandante que, “nos termos da lei e do direito aplicáveis ao caso sub judice os contratos que sejam objecto de renovação são, nos termos do actual artigo 61.º, n.º 3 da LGTFP (anterior artigo 104.º, n.º 4 do RCTFP), considerados como único contrato, pelo que para efeitos de contabilização da compensação pela caducidade do contrato de trabalho a termo resolutivo certo terá de se tomar em consideração todo o tempo de serviço por si prestado na entidade demandada, atento o princípio da continuidade do exercício de funções públicas inserto no actual artigo 11.º da LGTFP que corresponde ao anterior artigo 84.º da LVCR).” E prossegue alegando que “tal interpretação vale mutatis mutandis para o caso dos autos face ao disposto na al. a) do artigo 9.º-B do Regime Transitório introduzido pelo DL n.º 207/2009, de 31 de Agosto, alterado pela Lei n.º 7/2010, de 13 de Maio.”
O artigo 11.º da LGTFP prevê que “O exercício de funções ao abrigo de qualquer modalidade de vínculo de emprego público, em qualquer dos órgãos ou serviços a que a presente lei é aplicável releva como exercício de funções públicas na carreira, na categoria ou na posição remuneratória, conforme os casos, quando os trabalhadores, mantendo aquele exercício de funções mudem definitivamente de órgão ou serviço.” Ora, no caso, os contratos a termo certo não se renovaram. Não houve mudança de carreira, nem categoria, nem houve mudança de órgão ou de serviço. Desta forma, não estão reunidos os pressupostos de que depende a aplicação do princípio da continuidade do exercício de funções públicas.
O contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo não está sujeito a renovação automática e não se converte em caso algum em contrato por tempo indeterminado (artigo 104.º, n.º (s) 2 e 4 da RCTFP. Não é por isso aplicável, como a Demandante pretende, o artigo 61.º, n.º 3 da LGTFP, anterior artigo 104.º da RCTFP, que pressupõem a renovação do contrato. Assim, dos normativos invocados pela Demandante não se pode concluir, antes pelo contrário, da existência de um vínculo único.
Por seu turno, o regime transitório estabelecido pelo DL 207/2009, de 31 de Agosto, alterado pela Lei 7/2010, não é aplicável à Demandante porque de acordo com a factualidade alegada, não reúne os requisitos para a sua aplicação. Este regime transitório era aplicável à transição dos contratos de provimento para o novo regime dos contratos de trabalho em função pública, para salvaguardar direitos e expectativas legítimas adquiridas no âmbito do antigo regime.
A Demandante foi contratada em 1 de Outubro de 2009, pelo que lhe era já aplicável o novo regime estabelecido no DL 207/2009, de 31 de Agosto, não havendo lugar à aplicação do regime transitório estabelecido naquele diploma. Nos termos do artigo 12.º do ECPDESP os professores convidados são contratados a termo certo, em regime de tempo parcial. O contrato de trabalho a termo resolutivo certo caducava no termo fixado, a não ser que fosse expressamente comunicada a intenção de o renovar. Não tendo ocorrido renovação dos contratos, todos cessaram no respectivo termo do prazo contratual. Donde, não se verifica, como a Demandante pretende, um vínculo único, mas tantos quantos os contratos celebrados.
Assim, para efeitos do direito à compensação pela caducidade dos contratos, os sucessivos contratos celebrados entre a Demandante e o Demandado têm de ser analisados contrato a contrato.
2.2. Do direito ou não à compensação por caducidade
Temos assim que no caso, foram celebrados 5 contratos, devendo apreciar-se o direito à compensação por caducidade contrato a contrato, face ao regime vigente em cada um deles, sendo que o último está fora do âmbito desta acção por ter sido reconhecido o direito à compensação e processado o respectivo pagamento.
Aquando da celebração dos 3 primeiros contratos - 01/10/2009 a 1/07/2010, 01/10/2010 a 31/07/2011 e 01/09/2011 a 31/08/2012 - vigorava a Lei 59/2008, cujo art. 252.º estabelecia que:
“1. O contrato caduca no termo do prazo estipulado desde que a entidade impugnadora pública ou o trabalhador não comuniquem, por escrito a vontade de o renovar.
2. (…)
3. A caducidade do contrato a termo certo que decorra da não comunicação, pela entidade empregadora pública, da vontade de o renovar confere ao trabalhador o direito a uma compensação correspondente a (…)”
São sobejamente conhecidas as diferentes posições e interpretações deste normativo perfilhadas ao longo dos anos pelos nossos Tribunais, umas no sentido de reconhecer o direito à compensação pela caducidade do contrato a termo, outras em sentido contrário. A este propósito não pode ignorar-se o Acórdão do STA n.º 3/2015 que uniformizou a jurisprudência nos seguintes termos:
“No domínio da redacção inicial do artigo 252º, nº 3 do RCTFP, aprovado pela Lei nº 59/2008, de 11/9, a caducidade do contrato de trabalho a termo certo cuja renovação fosse já legalmente impossível não conferia ao trabalhador o direito à compensação mencionada nessa norma.”
Tem razão a Demandante quando refere que a situação em apreço no citado acórdão “é manifestamente diferente da situação da Requerente”. Contudo, apesar dessas diferenças, o Acórdão é bem esclarecedor relativamente ao entendimento perfilhado quanto à compensação por caducidade do contrato a termo certo, o qual não pode por isso deixar de ser tido em conta nesta decisão.
O que deste Acórdão resulta é que na redacção da Lei 59/2008, “a compensação não advinha de qualquer caducidade, “mas de um certo tipo de caducidade “a que decorresse da não comunicação, por parte da entidade empregadora pública, da vontade de renovar o contrato”. Esclarecendo mais adiante que “a caducidade nele prevista era, tão-somente, a que decorresse de uma não renovação do contrato – por falta da comunicação tempestiva da “vontade de o renovar”. Afastando assim as compensações, nos casos em que o contrato caducasse sem concurso da vontade do empregador, por força da lei.
“E isto pela razão óbvia de que esta caducidade, operando fatalmente “ex vi legis”, era alheia à vontade do empregador público, ou seja, não decorria do facto dele não comunicar a vontade de renovar o contrato”.
Retira-se, assim, que é entendimento do STA que a caducidade do contrato de trabalho a termo certo, cuja renovação ainda fosse legalmente possível conferia aos trabalhadores, nos termos do art. 252.º n.º 3, o direito à compensação nele prevista.
Ora, relativamente aos 3 primeiros contratos celebrados pela Demandante, nos termos do art. 12.º do DL 207/2009 e art. 14.º do RCTFP, não havia qualquer impedimento legal à sua renovação. A renovação dependia unicamente da comunicação por parte da Demandada em renovar o contrato.
Consequentemente, acompanhando-se o entendimento perfilhado no citado Acórdão do STA, uma vez que “a renovação dos contratos não era legalmente impossível”, impõe-se concluir pelo direito da Demandante à compensação pela caducidade dos contratos celebrados em 1/09/2009, em 1/10/2010 e em 1/09/2011.
Relativamente ao contrato celebrado em 08/10/2012 que caducou em 31/08/2013, estava já em vigor a Lei n.º 66/2012, que alterou a redacção do art. 252.º nos termos seguintes:
“1. O contrato caduca no termo do prazo estipulado desde que a entidade empregadora ou o trabalhador não comuniquem, por escrito, 30 dias antes do prazo expirar, a vontade de o renovar.
2. (…)
3. A caducidade do contrato a termo confere ao trabalhador o direito a uma compensação, excepto quando aquela decorra da vontade do trabalhador.”
4. A compensação a que se refere o número anterior corresponde a 20 dias de remuneração base por cada ano completo de antiguidade, sendo determinado do seguinte modo:
(…)
c) o valor diário da remuneração base é o resultante da divisão por 30 da remuneração base mensal;
d) em caso de fracção de ano, o montante da compensação é calculado proporcionalmente ….”
Assim, tendo a caducidade do contrato ocorrido em Agosto de 2013, já na vigência da Lei n.º 66/2012, é aplicável ao contrato o regime nesta estabelecido para a caducidade, sendo por isso devida a compensação pela caducidade do contrato. Na hipótese, de que se discorda, de não se considerar aplicável a nova redacção do artigo 252.º, a compensação seria sempre devida pelas razões acima apontadas para os outros três contratos.
Chegados aqui poder-se-ia colocar a questão da prescrição destes créditos, uma vez que o artigo 337.º do Código de Trabalho de 2009 (aplicável por remissão do artigo 4.º da LGTFP) dispõe que o crédito do trabalhador emergente de contrato de trabalho prescreve decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em cessou o contrato. Todavia a prescrição, por força do disposto no artigo 303.º do Código Civil não é do conhecimento oficioso do tribunal, necessitando, para ser eficaz, de ser invocada por aquele a quem aproveita. Ora, o Demandado não arguiu a excepção da prescrição dos créditos, pelo que não cabe a este Tribunal pronunciar-se sobre a mesma.
Posto isto, calculando-se os valores da compensação devida pela caducidade dos quatro contratos nos termos do disposto no artigo 252.º do RCTFP tem a Demandante direito a receber as seguintes quantias:
Contrato de 01/10/2009 a 31/07/2010 (10 meses de duração)
- Remuneração diária: € 1.615,01: 30 = € 53,83
- Proporção dias do ano: 303 X 20: 365 = 16,60
- Valor da compensação: € 53,83 X 16,60 = € 893,58
Contrato de 01/10/2010 a 31/07/2011 (10 meses de duração)
- Remuneração diária: € 1.816,89: 30 = € 60,56
- Valor de compensação: € 60,56 X 16,60 = € 1.005,30
Contrato de 01/09/2011 a 31/08/2012 (12 meses)
- Remuneração diária: € 60,56
- Valor de compensação: € 60,56 X 20 = € 1.211,20
Contrato de 08/10/2012 a 31/08/2013 (10 meses e 23 dias)
- Remuneração diária: € 60,56
- Proporção dias base: 327 X 20: 365 = 17,92
- Valor da compensação: € 60,56 X 17,92 = € 1.085,24
Embora com enquadramento jurídico diverso do configurado pela Demandante, e ajustando a decisão ao efeito jurídico pretendido por esta com os pedidos formulados – reconhecimento do direito à compensação pela caducidade dos contratos, contabilizado desde 1 de Outubro de 2009 - é reconhecido o direito ao pagamento da compensação pela caducidade dos contratos celebrados entre 01/10/2009 a 31/07/2010, 01/10/2010 a 31/07/2011, 0109/2011 a 31/08/2012 e 08/10/2012 a 31/08/2012 no montante total de € 4.195,32 (quatro mil, cento e noventa e cinco euros e trinta e dois cêntimos) e, em consequência, deve a Demandada pagar-lhe o referido montante.
V. Decisão
Em face do exposto, o tribunal decide:
Julgar procedente o pedido de reconhecimento do direito da Demandante à compensação pela caducidade dos contratos celebrados entre Outubro de 2009 e 2012 e, em consequência, condenar a Demandada a pagar à Demandante a quantia de 4.195,32 (quatro mil, cento e noventa e cinco euros e trinta e dois cêntimos)
Fixa-se o valor do processo em € 4.195,32 (quatro mil, cento e noventa e cinco euros e trinta e dois cêntimos), por aplicação do n.º 1 do artigo 32.º do CPTA, aplicável ex vi artigo 29.º do Regulamento de Arbitragem do CAAD.
Fixa-se o valor dos encargos de arbitragem de acordo com a tabela do CAAD.
Notifique-se
Lisboa, 9 de Agosto de 2016
O Árbitro
Margarida de Almeida e Costa