SUMÁRIO: O decreto-lei n.º 1/2025, de 16 de janeiro que confere a percentagem anual de aumento de 2,15 às ajudas de custo e aos suplementos da Administração Pública, aplica-se ao Instituto de Registos e Notariado, nos termos do artigo 159.º da LTFP.
DECISÃO ARBITRAL
A Árbitra Maria Alexandra Mesquita, designada pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formar este Tribunal Arbitral Singular profere decisão nos termos que seguem:
I. RELATÓRIO
a. Das Partes
1. A..., citada por Autora ou Demandante, portadora do cartão de cidadão n.º..., válido até 2030-08-04, contribuinte fiscal n.º ..., com morada na Rua Dr. ..., nº ..., ..., ... –... ..., em 23 de agosto de 2024, veio junto do Tribunal Arbitral Administrativo intentar ação arbitral administrativa, contra o INSTITUTO DOS REGISTOS E DO NOTARIADO I.P., Instituto Público integrado na orgânica do ao Ministério da Justiça – daqui em diante nomeado por Entidade Demandada ou IRN,IP, com o NIPC 508184258, e sede na Avenida D. João II, Lote 1.08.01, Edifício H, Parque das Nações, 1990-097 Lisboa.
2. O pedido da Autora reconduz-se à impugnação para a anulação, ou declaração de nulidade da decisão exarada por despacho do Exmo. Senhor Dr. B..., Vogal do Conselho Diretivo do IRN, em 25.05.2024, sobre requerimento da autora onde requer a anulação do ato administrativo de indeferimento do acréscimo remuneratório que a Autora vinha auferindo pelo exercício de funções em mobilidade interna na Conservatória dos Registos Civis de ...(CRC).
Nos termos do Regulamento do CAAD, foi a signatária designada como árbitro singular, considerando-se o Tribunal Arbitral singular constituído, após a sua aceitação, com data de 21 de outubro de 2024.
B). Do objeto da ação arbitral
B.1 Da Demandante
a). Por despacho de 25 de janeiro de 2007 do Exmo. Senhor Diretor Geral dos Registos e do Notariado (vd. Diário da República n.º 33, Série II de 2007-02-15, p. 4102, Despacho (extrato) n.º 2376/2007, de 29 de janeiro foi a Autora, nomeada para o lugar de conservadora da Conservatória do Registo Civil e Predial de ... .
b). Cinco anos depois em 12.04.2012 no âmbito do procedimento simplificado de seleção, publicitado sob a Ref.ª .../2012 – SPGRH/CE, previsto no Despacho n.º 20/2012, e por despacho do Senhor Presidente do IRN.IP, de 08.08.2012, ora Entidade Demandada, ficou a Autora colocada na Conservatória do Registo Civil de...[i],em regime de mobilidade interna na categoria, pelo período de dezoito meses. (Doc3).
c)Mobilidade essa que tem vindo a ser prorrogada anualmente até 31.12.2022 (Doc. 4 a 12.).
d).No entanto em 15.11.2022[ii], tendo já presente a situação de mudança de serviço e a pedido da Entidade Demandada,a Autora assinou uma declaração na qual aceitou continuar a desempenhar funções na Conservatória do Registo Civil de..., em regime de mobilidade interna na categoria. (doc. 15 e 16). Situação que se mantém até hoje, como veremos.
e). No âmbito de procedimento concursal para ocupação de 28 postos de trabalho, ficou a Autora aprovada na carreira de Conservador de Registos, tendo sido colocada na Conservatória do Registo Civil e Predial de..., lugar que aceitou, tendo assinado o respetivo contrato de trabalho em funções públicas, por tempo indeterminado, com efeitos a partir de 01.01.2023, mantendo-se, no entanto, em mobilidade, na Conservatória do Registo Civil de ..., funções que assegura, como refere, ininterruptamente, desde 2012 até à presente data.
f). Na sequência da assinatura da referida aceitação, a Autora foi notificada em 21.12.2022, que, “na sequência da respetiva anuência”, e por despacho da Senhora Diretora do Departamento de Recursos Humanos do IRN de 20.12.2022“foi autorizada a mobilidade na categoria de V. Exa. na Conservatória do Registo Civil de ..., com efeitos (início) a contar de 01.01.2023 - data da produção dos efeitos do contrato de trabalho em funções públicas[iii], para ocupação do posto de trabalho para o qual foi selecionada, no âmbito do concurso para preenchimento de lugares de oficial de registos.
g). Mobilidade essa em vigor até 30 de junho de 2024, e posteriormente, prorrogada até 31de dezembro de 2024, (Doc.17) e (doc. 18).
h). Conforme resulta do recibo de vencimento da autora referente a janeiro de 2023, foi-lhe pago[iv] o acréscimo remuneratório correspondente ao diferencial para a participação emolumentar de ..., no valor de € 1.430,85.
i) Este facto criou na Demandante a expectativa que a sua situação remuneratória no que respeita ao suplemento remuneratório decorrente da situação de mobilidade na categoria na Conservatória do Registo Civil de ..., se manteria inalterada, não só por ser o que resulta da legislação em vigor, como também é o que resulta do sentido da comunicação datada de 21.12.2022, ao referir a anuência dada pela Autora na continuação da presente situação de mobilidade (Doc. 17) e alínea h) desta transcrição da Petição Inicial (PI). E acrescenta,
j). Aliás, comprovado, como esperado, no vencimento de janeiro de 2023, no que respeita ao suplemento remuneratório decorrente da situação de mobilidade na categoria na Conservatória do Registo Civil de ..., se manteve inalterada, não só por ser o que resulta da legislação em vigor, como também é o que resulta do sentido da comunicação datada de 21.12.2022, ao qual a Autora a anuiu, junto da entidade Demandada, pela continuação da sua situação de mobilidade na Conservatória de ... .
k). Sucede, porém, que, apesar de se encontrar em mobilidade na Conservatória do Registo Civil de..., a partir de fevereiro de 2023, deixou de lhe ser processado no seu vencimento o acréscimo respeitante à diferença da comparticipação emolumentar correspondente ao diferencial para a participação do emolumento de ..., no valor de € 1430,85. No entanto,
l). Em 10/08/2023 foi notificada para no prazo de 30 dias a contar da data da notificação da guia de reposição abatida no montante de 699,38€, proceder ao seu pagamento junto da autoridade fiscal, o referido montante pago a mais no mencionado mês de janeiro anterior, situação que se gerou por mero lapso de processamento por parte do Demandado, o que,
m). Na verdade, conforme se veio a verificar posteriormente, o pedido de reposição não se tratou de mero lapso, mas, sim, em decorrência de informação sobre a qual recaiu despacho a requerer a reposição de parte da importância recebida em janeiro de 2023, no montante aqui referido em l), exarado pela Senhora Diretora do Departamento de Recursos Humanos, Dra. Teresa de Almeida, invocando para tal a desconformidade do pagamento, não por lapso, mas tendo por fundamento a aplicação à situação da Demandante, em vista do novo contrato de trabalho, o artigo 56.º do Decreto-Lei n.º 519-F2/79, de 29 de dezembro[v], às situações de substituição previstas no artigo 10.º n.º 3 do Decreto-Lei n.º 115/2018, de 21 de dezembro[vi] e que consta de uma deliberação do Conselho Diretivo de 30 de novembro de 2021[vii].
n). Em 18.09.2023, a Autora solicitou que lhe fosse facultado o teor daquela Deliberação do Conselho Diretivo de 30 de novembro de 2021, quanto à aplicação do 56.º do Decreto-Lei n.º 519- F2/79, de 29 de dezembro às situações de substituição previstas no artigo 10.º n.º 3 do Decreto-Lei n.º 115/2018, de 21 de dezembro, a fim de compreender o teor da fundamentação da reposição que lhe foi notificada (Doc. 22).
o). Por email datado de 20.09.2023, a Autora foi informada pela Coordenadora do Departamento de Recursos Humanos do IRN, Dra. ... de que:
“Em resposta à comunicação infra, informa-se que o pedido em causa foi remetido à Sra. Diretora de Departamento, a quem compete a autorização para a disponibilização do documento em causa, considerando que o mesmo consubstancia informação de ordem interna e de trabalho, estabelecendo regras de interpretação e orientação destinadas a Departamento de Recursos Humanos. No entanto, atendendo à ausência da Sra. Diretora de Departamento, por motivo de férias, até à próxima segunda-feira, não será contado o prazo constante da notificação 5 remetida, até que haja decisão relativa à solicitação efetuada.” (doc. 23).
p). Em 10.05.2024 a Autora, ora a Demandante, reiterou novamente o pedido de obtenção da Deliberação do Conselho Diretivo de 30.11.2021, sem que até à presente data tal pedido lhe tenha sido acedido (doc. 26).
q). A Autora veio ainda endereçando requerimentos internamente em 29.12.2023[viii], 02.02.2024 e 10.05.2024[ix], via email, à Exa. Senhora Presidente do Conselho Diretivo peticionando a argumentação interna a ser aplicada na gestão dos vencimentos pelos Recursos Humanos do IRN,IP, na parte que diz respeito na à reposição do valor processado em janeiro de 2023 e por ela, Autora, reposto, como se descreveu em k, (docs. 27, 28 e 29).
r). Em 24.05.2024, a Autora pronunciou-se em sede de audiência prévia dos interessados junto da entidade Demandada com os seguintes fundamentos de facto e de direito que vieram a fazer parte do Pedido de Pronúncia Arbitral com o qual agora este tribunal arbitral singular se defronta e cuja fundamentação integral fazem parte integrante, nos termos legais, que agora sucintamente, se transcreve:
r). Desde 20 de agosto de 2012, na sequência dos resultados do Procedimento Simplificado de Seleção de Conservadores, para exercício de funções em regime de mobilidade, previsto no Despacho n. 20/2012, de 12 de abril, a ora signatária foi designada para exercer funções na Conservatória do Registo Civil de..., em regime de substituição legal, sistuação que se mantém até ao dia de hoje.
No âmbito do concurso para preenchimento de lugares de conservador de registos, publicitado sob a Referência n.1/2021, a signatária ficou colocada na Conservatória do Registo, Civil, Predial e Comercial de ..., lugar que aceitou (com efeitos a 01 de janeiro de 2023, data da assinatura do contrato de trabalho em funções públicas, para ocupação do referido posto de trabalho), tendo permanecido em mobilidade e em substituição legal na Conservatória do Registo Civil de..., e com a direção da referida Conservatória desde 20 de agosto de 2012, até à presente data[x].
«No entanto, a partir de janeiro de 2023, deixou de lhe ser processado no seu vencimento o acréscimo remuneratóriorespeitante à diferença do vencimento de exercício correspondente ao lugar do conservador titular da Conservatória do Registo Civil de ..., acréscimo, esse, devido pelo exercício de funções em substituição legal, que se manteve.
Não houve, desde 20 de agosto de 2012 e até ao momento, qualquer alteração na natureza das funções desempenhadas, nem das responsabilidades assumidas, inerentes ao lugar de direção na referida Conservatória.
Deste modo, mantendo-se as funções exercidas pela signatária, ininterruptamente, de 20 de agosto de 2012 até ao dia de hoje, vem solicitar a Vossa Exa. a reposição dos valores não processados desde janeiro de 2023.
s). Relativamente ao projeto de decisão notificado à requerente, desde já se refere que o mesmo não merece acolhimento nem aceitação por parte da Autora como infra se transcreve, sucintamente:
………
De acordo com o disposto no artigo 8.º do CPA, que institui os Princípios da Justiça e da Razoabilidade, a Administração Pública deve "... rejeitar as soluções manifestamente desrazoáveis ou incompatíveis com a ideia de Direito, nomeadamente em matéria de interpretação das normas jurídicas e das valorações do exercício da função administrativa”.
....
Este princípio tem também assento no artigo 266.º, n.º 2 da CRP, como uma diretriz de atuação· aos órgãos da administração pública cujas atuações devem ·ser justas e razoáveis.
Pretende-se que a Administração fundamente as suas decisões e os seus comportamentos em interpretações razoáveis das normas que habilitam a sua ação.
Isto é, a Administração deve escolher, de entre as interpretações viáveis, a que se apresentar mais razoável· em concreto, sendo permitido ao Tribunal fiscalizar a referida interpretação no sentido de apurar se é ou não a mais razoável (cfr. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 19 de fevereiro de 2014, Proc. n 701/12; Relator, Exmo. Senhor Conselheiro Ascensão Lopes).
t). Ora, é pertinente referir que a mobilidade visa a tutela do interesse público da Administração, buscando fundamento em razões de eficiência dos serviços ou da economia para o erário público. Como salientam Paulo Veiga e Moura e Cátia Arrimar, «nunca se poderá constituir uma situação de mobilidade apenas em resultado de um interesse meramente pessoal do trabalhador público».
u). Deste modo, o acesso à mobilidade por parte do trabalhador não constitui um instrumento jurídico de modificação do vínculo contratual orientado· para a tutela do direito à carreira· do mesmo. Trata-se, na verdade, de um instrumento ao dispor da Administração Pública para gestão dos seus recursos humanos, como resulta expressamente do artigo 92.º, n.º 1 da LGTP[xi]. De acordo com este preceito, «quando haja conveniência para o interesse público, designadamente quando a economia, a eficácia e a eficiência dos órgãos ou os serviços o imponham; os trabalhadores podem ser sujeitos a mobilidade».
Da letra dos preceitos acima identificados, a interpretação jurídica das normas aplicáveis mais razoável à situação em concreto seria a de manter o pagamento do acréscimo remuneratório pela manutenção do exercício de funções, acrescido de chefia, em regime de mobilidade nos termos peticionados pela requerente.
«O ato administrativo em questão, escudado no parecer do Centro de Competências Jurídicas do Estado - JurisAPP, parte do erróneo pressuposto de constituição de uma nova situação de mobilidade a partir de 01 de janeiro de 2023, não aplicando, ao caso, o disposto no n. 2 do artigo 11.º do DL n.º 145/2019, de 23 de setembro, que prevê o «direito à manutenção do abono do acréscimo remuneratório -previsto no anterior enquadramento, aos trabalhadores que se mantiverem em exercício de funções em regime de mobilidade em substituição em 01 de janeiro de 2020, e enquanto tal situação de substituição se mantiver, como é o caso da signatária, que mantém estas funções de substituição legal na Conservatória do Registo Civil de... , em regime de mobilidade, ininterruptamente, desde 20·de agosto de 2012.
Tal conclusão (do Parecer citado, referimos nós) não resulta da letra da lei e não cumpre o dever de a Administração Pública fundamentar as suas decisões e os seus comportamentos em interpretações razoáveis das normas que habilitam a sua ação. Ao não optar pela interpretação, de entre as viáveis, a que se apresenta mais razoável ao caso em concreto, o ato impugnado viola os princípios da justiça e da razoabilidade constantes no artigo 8.º do CPA e no artigo 266.º n.º 2 da CRP, o que implica a anulabilidade do ato administrativo ora impugnado nos termos do estatuído no n.º 1 do artigo 163.º do CPA.
Acresce ainda que no âmbito do princípio da proporcionalidade, previsto no artigo 7.º n.1 do CPA e com assento na Lei Fundamental (artigo 266.º, n.º 2 da CRP), uma medida só será proporcional se dela decorrerem, de forma razoável ou adequada mais benefícios, tendo em vista o fim público proposto; do que prejuízos para os restantes direitos, interesses ou bens jurídicos em confronto.
Sendo certo que, o cumprimento deste princípio obriga a Administração Pública a explicitar o juízo de ponderação realizado entre os benefícios que as medidas têm para interesse público e as desvantagens que as mesmas acarretam para a esfera jurídica dos interessados.
Ora, do teor do ato administrativo em crise não se vislumbra qualquer evidência de que tal juízo de ponderação foi, sequer, ponderado no iter cognitivo da decisão, padecendo, por isso, do desvalor da anulabilidade (cfr. artigo 163.º n.1 do CPA).
« Assim, pelos fundamentos acima transcritos, há que reconhecer à requerente o direito a receber o acréscimo remuneratório pelo exercício de funções em regime de mobilidade nos termos peticionados pela mesma.
Na sequência do supra exposto, a requerente, requer, desde já, a apreciação dos fundamentos aqui invocados e a consequente alteração do projeto de decisão, procedendo o IRN, 1.P. à reposição do acréscimo remuneratório».
Termos em que se requer a v. Exa. Se digne:
Aceitar os argumentos ora apresentados e reapreciar o projeto de decisão ora em apreço, considerando o supra invocado pela pronunciante, com as legais consequências.
s) Em sede de alegações a Demandante voltar a enfatizar, densificando mais finamente a questão ora controvertida, quer em sede constitucional, quer em sede administrativa e que aqui se dão por inteiramente reproduzidas, para todos os efeitos legais e ainda sobre esta matéria se chama à colação jurisprudência do CAAD cujos argumentos proferidos, numa situação em tudo semelhante a esta, e que consta do processo 395/2022-A, que subscrevemos.
Em 2 de setembro de 2024, foi o demandado IRN, IP, citado por via postal para contestar.
B.2 Do Demandado
1). Em 25 de setembro de 2024, apresentou a Entidade Demandada, IRN,IP, junto do Centro de Arbitragem Administrativa e dirigido ao Senhor Presidente do Centro de Arbitragem Administrativa a sua Contestação que o fez nos seguintes termos.
2). Começa por transcrever o pedido da Demandante, invocando a Inimpugnabilidade do ato administrativo referente ao não pagamento do acréscimo remuneratório aqui controverso (sic), no montante de 1.457,01€ (com a atualização a 2023) e que diz respeito ao pagamento do mesmo no mês de janeiro de 2023, e cujos argumentos apresentados pela Entidade Demandada, no ato de indeferimento acima transcrito, se dá agora por integralmente reproduzido, para todos os efeitos legais.
No entanto,
3). Em 17 de fevereiro de 2025, já em sede de alegações referiu a Entidade Demandada que mantinha a sua posição inicial, que transcreveremos, em parte, e para o que interessa à causa:
Considerando que não foram, entretanto, realizadas novas diligências de prova no processo, o demandado reitera, outrossim, toda a defesa apresentada em sede de contestação, formulando, aqui, as seguintes conclusões:
«A Autora pretende que seja determinada a nulidade/anulação do Despacho do Vogal do Conselho Diretivo do IRN,IP, de 25.05.2024, Dr. B..., que indeferiu o pedido de reposição do acréscimo remuneratório (sic) respeitante à diferença do vencimento de exercício formulado pela ora A. em 29.12.2023, com as legais consequências; mais peticionando a condenação do IRN, IP» “a pagar à Autora o montante que foi reduzido à sua remuneração mensal, em cerca de €1,459,00 Euros, até a prolação de sentença, e que à presente data se cifra em, pelo menos, €32.724,75, acrescido de juros de mora à taxa legal”.
4). Sucede que, entretanto, sobreveio o trânsito em julgado do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 19.03.2024, que confirmou a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, no âmbito do Processo nº 2009/22.4BELSB (decisão que, por sua vez, determinou a anulação da deliberação do Conselho Diretivo do IRN, IP, de 09/06/2022, consubstanciada na homologação das listas finais de ordenação e colocação dos candidatos, no âmbito do concurso aberto através do Aviso com a referência 1/2021-DRH/SPRH(CR).
5).) Em sequência dos acórdãos referidos, por Despacho de 25.09.2024, o Vogal do Conselho Diretivo procedeu à substituição do seu Despacho de 25.05.2024[1] (ato aqui impugnado pela A.), nos seguintes termos:
“Considerando que a reconstituição da situação hipotética atual que se impõem por força da execução da sentença proferida pelo TAC de Lisboa no âmbito do Processo nº 2009/22.4BELSB (que determinou a anulação da deliberação do Conselho Diretivo do IRN, IP, de 09/06/2022) determinando a consequente anulação do CTFP[xii] celebrado com a aqui requerente para ocupação de posto de trabalho de conservador de registo da CRP de ... e que, nessa conformidade, a mesma continua a ocupar o correspondente posto de trabalho na CRPCom de ... (não se verificando, pois, qualquer alteração à situação jurídico funcional considerada aquando da constituição da sua mobilidade para a CRC de ... e ulteriores prorrogações), reconhece o direito da conservadora de registos A... o, à manutenção do pagamento da designada “participação emolumentar de substituição” se e enquanto se mantiver essa situação, com efeitos retroativos e reconstituindo-se a situação da trabalhadora.” – Doc.(12) junto com a contestação da. Entidade Demandada.
6). Pelo que conclui que pela,
alteração superveniente das circunstâncias, por revogação do ato aqui impugnado, de 25 de maio de 2024, e substituído por novo despacho do vogal de conselho diretivo, Dr. B..., de 25.09.2024, na sequência da sentença proferida pelo Tribunal Central Administrativo Sul de 19/03/2024 que é a seguinte:
«Por força da alteração das circunstâncias decorrente da execução dessa decisão, a A. viu a sua colocação no posto de trabalho da CRP de ... anulada, tendo voltado à situação jurídica anterior (integrando, assim, o mapa de pessoal da CRPCom de ... onde ocupa posto de trabalho de conservador de registos)[2], por não ter obtido colocação no procedimento concursal em causa[3]» cfr. Doc. 8 a 11 juntos com a contestação.
7) Em sede de alegações escritas, de 18 de fevereiro de 2025, foi dado a conhecer a este tribunal arbitral o despacho de 25 de setembro de 2024, da qual resulta inequivocamente que a situação da Autora estava resolvida em seu beneficio e de acordo como o que tinha vindo a sindicar neste processo arbitral, nos termos seguintes:
Essa decisão foi devidamente notificada à ora A. por correio eletrónico de 25.09.2024.
Tendo o ato sub judice (despacho de 25 de maio de 2024, dizemos nós), sido substituído por Despacho de 25.09.2024 do Vogal do Conselho Diretivo, que reconheceu a manutenção do direito da A. a auferir o acréscimo remuneratório (sic)pelo exercício de funções em mobilidade em substituição na CRC de ..., afigura-se inexorável que logrou a aqui A. obter a satisfação do pedido formulado e que motiva a presente ação.
« Tal em nada invalida a argumentação jurídica que foi apresentada, em sede administrativa, dizemos nós, mas por mera alteração dos pressupostos de facto».
8). No seguimento deste novo despacho e no âmbito do principio do contraditório, este tribunal arbitral solicita, por despacho de 27 de março de 2025, que a Autora ofereça ao processo o que tem a referir sobre o sobredito despacho de 25 de setembro de 2024, a fim de avaliar a expectável situação da exceção por inutilidade superveniente da lide e que passamos a transcrever, na integra:
«Na sequência do meu pedido de 29.12.2023, de reposição de acréscimo remuneratório correspondente à “Participação Emolumentar de Substituição” na Conservatória do Registo Civil de..., o qual me deixou de me ser pago a partir de janeiro de 2023, verifico que no vencimento mensal de março de 2025 me foram abonadas as quantias respeitantes a retroativos dos meses de fevereiro de 2023 a fevereiro de 2025.
Contudo, constato encontrarem-se ainda em faltam os seguintes pagamentos:
I. «Reposição do Acréscimo Remuneratório respeitante ao mês de janeiro de 2023, este valor foi-me pago com o vencimento do mês de janeiro/23, porém procedi em 21.09.2023 ao reembolso da quantia devida, na sequência do pedido de devolução que me foi feito através da v/ Informação n.º 600 DRH-UPR de 10.08.2023, sob pena se o não fizesse poder ter de o pagar em sede execução fiscal.
II. Pagamento do Acréscimo Remuneratório respeitante ao mês de março de 2025, mês da própria nota de abonos, valor que me é devido, uma vez que me mantenho em substituição legal.
III. Atualizações salariais sucessivas efetuadas pelo Governo aos vencimentos da função pública, as quais se devem fazer refletir no valor do acréscimo remuneratório, com efeitos a janeiro de 2023 (2% - o valor passou a ser de €1.459,47), adicional de abril de 2023 (1% - €1.474,06), janeiro de 2024 (3% - €1.518,28) e janeiro de 2025 (2,1% - €1.550,17) e bem assim as necessárias atualizações nos Subsídios de Férias e de Natal de 2023 e 2024 –
Os retroativos apurados reportam-se à quantia única de 1.430,85 € (valor esse devido no ano de 2022), sem que lhe tenham sido feitas as respetivas atualizações».
Até à presente data, março de 2025, a Autora ainda não recebeu resposta da parte da Entidade Demandada, nem a reposição dos valores em falta, conforme comunicação supra, e que totaliza o valor global de €4.997,00)».
«Desta forma, ainda não se encontra regularizada a situação financeira da Demandante, relativamente aos quantitativos em atraso e peticionados na presente ação, não tendo por isso dado conhecimento do facto ao tribunal.
9). Em 7 de abril de 2025, a Entidade Demandada veio ao processo informar do pagamento dos retroativos à Demandante, onde junta toda a documentação mantida com aquela sobre esta questão, vinte páginas, e que se transcreve apenas o que para agora interessa:
«Em resposta à comunicação infra, que desde já agradecemos, começo por apresentar as minhas desculpas pelos lapsos ocorridos e que, muito bem, refere no primeiro e segundo pontos, os quais foram corrigidos no processamento relativo aocorrente mês de abril que hoje se concluiu.
No que às atualizações remuneratórias invocadas no terceiro ponto, cumpre informar que, na interpretação deste Instituto do disposto nos sucessivos diplomas que suportam as atualizações das remunerações da Administração, nomeadamente no art.º 6.º da Lei n.º 1/2025, de 16.01, não se inclui o acréscimo remuneratório devido pelo exercício de funções em regime de
substituição.
O acréscimo em causa, que não reveste as características de suplemento, não constitui remuneração passível de atualização, atento o facto de se suportar em valores apurados por aplicação de regras ínsitas em legislação cuja vigência se manteve, embora condicionada, até dezembro de 2019 e foi revogada pelo Decreto-Lei n.º 145/2019, de 23.09, ou seja, a Portaria n.º 942/99, de 27.10».
II. SANEAMENTO
2.1. Este tribunal arbitral administrativo fixa o valor da causa na presente ação arbitral, no montante de 32.724,75€, em conformidade com o preceituado nos artigos 31.º a 33.º do CPTA, ex vi dos artigos 5.º e 26.º do Novo Regulamento de Arbitragem do CAAD e ainda nos termos do n.ºs 1 e 2, do artigo 306.º do Código do Processo Civil (CPC). Montante no valor da causa firmado pela Autora.
2.2. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária, têm legitimidade e estão devidamente patrocinadas nos autos.
O Presente Tribunal é competente por força da vinculação à arbitragem institucionalizada do CAAD, por parte da Entidade Demandada, constante da Portaria n.º 1120/2009, de 30 de setembro e, em especial, do disposto do disposto no artigo 1.º, n.º 1, al. j) e n.º 2, al. a) deste instrumento regulamentar.
III. FUNDAMENTAÇÃO
III.1. FACTOS PROVADOS
Perante ao alegado pelos sujeitos processuais e documentos anexos junto ao processo, consideram-se assentes os factos essências para esclarecimento deste tribunal arbitral:
1. Por despacho de 25 de janeiro de 2007 foi a Autora nomeada para o lugar de Conservadora da Conservatória do Registo Civil de ... .
2. Em 12 de abril de 2012 e no âmbito de procedimento simplificado de seleção, publicado no Diário da Republica citado em B.1, alínea d), ficou colocada na Conservatória de Registo Civil de ..., em regime de mobilidade interna na categoria, pelo período de 18 meses.
3. Até 31 de dezembro de 2022 essa mobilidade continuou a ser prorrogada por períodos sucessivos de 18 meses, através do procedimento de mobilidade interna, na Conservatória de Registo Civil de ... .
4. Em 21 de Dezembro de 2022, na sequência da sua anuência, foi autorizada a mobilidade, agora na categoria, na Conservatória do Registo Civil de ..., a contar de 1 de janeiro de 2023, data da produção dos efeitos da assinatura do contrato de trabalho em funções públicas.
5. Mobilidade essa prorrogada, sucessivamente, até 31 de dezembro de 2024, e que se mantém até hoje.
6. Voltando atrás, agora em sede remuneração do suplemento por acréscimo remuneratório temos o seguinte panorama, ora controvertido.
7. Em 1 de janeiro de 2023, foi-lhe pago o a acréscimo remuneratório, no que respeita ao suplemento remuneratório (sic)[4] no montante de 1.430,85 €, decorrente da sua situação de mobilidade na categoria na Conservatória do Registo Civil de ..., uma vez que a sua situação profissional se manteve inalterada.
8. A partir de fevereiro de 2023, deixou de lhe ser processado esse acréscimo remuneratório respeitante à diferença da comparticipação emolumentar no montante de 1430,85 €.
9. Posteriormente, foi informada que não houve lapso, no pagamento do acréscimo remuneratório de janeiro de 2023 mas, sim, na decorrência de informação sobre a qual recaiu despacho exarado pela senhora Diretora do Departamento de Recursos Humanos, em vista do novo contrato de trabalho em funções publicas, cujo fundamento teve por base aplicação do artigo 10.º, n.º 3 do Decreto-Lei 519-F2/79 de 29 de dezembro aplicável às situações de substituição previstas no artigo 10.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 115/2018, de 21 de dezembro. E que consta de uma deliberação do Conselho diretivo de 30 de novembro de 2021, nunca facultada à Autora. Nessa decorrência foi exarado o despacho de 25 de maio de 2024, que deu causa a este processo arbitral.
10. E em 10 de agosto de 2023, foi notificada para repor o montante pago a mais pela Entidade Demandada no mês de janeiro de 2023 junto da autoridade fiscal, no valor de 699,38 €, uma vez que não se tratou de mero lapso de processamento, o que a Autora concretizou junto da autoridade fiscal que a Autora pagou, com o fim de evitar prejuízos junto da autoridade fiscal.
11. Por diversas vezes, a última da qual foi em 10 de maio de 2024, a Autora requereu o conhecimento da deliberação do Conselho Diretivo, não obtendo nunca resposta ao seu pedido, uma vez que se tratava de informação interna e de trabalho, estabelecendo regras de interpretação e orientação destinadas ao Departamento de Recursos Humanos.
12. Mesmo declarando que era um documento essencial para elaborar a sua defesa, nunca teve acesso ao mesmo. O que originou que,
13. A entrada da Petição Inicial no CAAD, a 21 de agosto de 2024, sem a Demandante ter conhecimento ao que ali se dispunha e que deu causa à suspensão do controvertido acréscimo suplementar.
14. Posteriormente, em 25 de setembro de 2024, o Vogal do Conselho Diretivo procedeu à substituição do seu despacho de 25 de maio de 2024, tendo por argumento para a alteração do despacho, a sentença proferida elo TAC de Lisboa no âmbito do processo 2009/22. 4BELSF, que posteriormente veio a dar lugar ao acórdão doTribunal Central Administrativo Sul, de 19.03.2024, que confirmou a sentença proferida pelo TCA de Lisboa e que determinou a anulação da deliberação do Conselho Diretivo, decorrente da anulação do concurso já referido, pelo que a ora Demandante voltou a ser integrada na CRP de ..., não se verificando assim qualquer alteração à sua situação funcional considerada aquando da constituição da sua mobilidade para ... em 2012 e ulterioras prorrogações consecutivas e já aqui assinaladas, pelo que,
15. Reconheceu o direito da conservadora de registos A... à manutenção emolumentar de substituição, se e enquanto se mantiver essa situação, com efeitos retroativos e reconstituindo-se a situação da trabalhadora.
16. Com este despacho de 25 de setembro de 2024, do vogal do Conselho Diretivo, Dr. B..., lograria a Autora a satisfação do pedido e que motivou a presente ação arbitral junto do CAAD.
17. Em 26 de março de 2025, este tribunal arbitral, no âmbito da salvaguarda do direito ao contraditório foi concedido à Autora o direito a pronunciar-se sobre eventual exceção dilatória da inutilidade superveniente da lide, uma vez satisfeito, como parecia, o pedido que consta da PI e posteriores alegações e contraditórios concedidos a ambos.
18. Em resposta a Autora vem ao processo referir que estão ainda por regularizar, o que segue:
19. O acréscimo remuneratório do mês de janeiro de 2023, que deu causa à demanda arbitral, ainda não foi pago.
20. O acréscimo remuneratório do mês de março de 2025 estava por pagar (foi no vencimento de março que se fez o ajuste de contas, acrescentamos nós).
21. Não se fizeram as atualizações salariais sucessivas feitas pelo governo nos vencimentos da função que a Autora tem direito, que por sua vez ditam a percentagem dos acréscimos remuneratórios da Demandante.
22. Por último, fica provado que em 7 de abril de 2025, a entidade demandada vem a processo, no âmbito do contraditório, dar razão à Autora, informando que em tudo menos no que respeita ao pedido de atualizações dos suplementos – acréscimos patrimoniais[5], na Administração Pública desde 1 de janeiro de 2023, não foram pagos nos termos de sucessivos diplomas governamentais, nomeadamente, o artigo 6.º da Lei 1/2025 de 16 de janeiro, uma vez que o acréscimo em causa, não reveste as características de suplemento.
23. Fica provado que a Entidade Demandada, não concluiu, como referiu, que a situação financeira da autora estava regularizada, por ter chamado à colação e em sua defesa que os suplementos remuneratório, eram acréscimos patrimoniais e por essa razão estar fora do estatuído pelo Decreto lei 1/2025, de 16 de janeiro, nomeadamente, pelo artigo 6.º o que refere que o que ali está em causa é o pagamento de suplementos, e o que está em causa em juízo são acréscimos patrimoniais e não suplementos como o artigo 6.º expressamente refere.
Os factos dados como provados são aqueles que o Tribunal considera relevantes, não se considerando factualidade dada como não provada que tenha interesse para a decisão.
A convicção do Tribunal resultou também dos documentos juntos aos autos, quer pela Autora, quer, pela Entidade Demandada.
Foram dadas todas as oportunidades de exercerem o contraditório a ambas as partes.
III.2 DO DIREITO
III.2.1 DO MÉRITO
1) Antes de entrarmos propriamente no conhecimento da questão de mérito, temos de averiguar se com a publicação do decreto lei 1/2025 de 16 de janeiro, invocado pela Entidade Demandada, e no que diz respeito à densificação da noção de acréscimo remuneratório, como suplemento, situação que se tem de avaliar para o consequente, ou não, conhecimento do mérito do processo, caso se venha a verificar uma ampliação do pedido.
2) Analise.
No decurso da pronúncia arbitral a Entidade Demandada, e no âmbito do exercício do contraditório, invoca em seu proveito o recentemente publicado Decreto Lei n.º 1/2025 de 16 de janeiro, que confere aumento de 2,15% às ajudas de custo e aos suplementos concretamente, o seu artigo sexto, que de seguida transcrevemos:
Suplementos
Os suplementos remuneratórios que, nos termos da lei, tenham por referência a atualização salarial anual da função pública ou dos níveis da TRU, são atualizados em 2,15 %.
3) Como se verificou a Entidade Demandada acabou por dar razão à ora Demandante, densificando as razões e os montantes em falta que se indicaram nos factos provados desta decisão arbitral, e no decurso do despacho de 25 de setembro de 2024, proferido, como já bastas vezes se referiu, pelo Senhor Vogal do Conselho Diretivo, Dr. B..., da forma que agora se transcreve no que agora interessa:
4). Atenta a fundamentação infra, ao abrigo das competências que se encontram delegadas no signatário através da Deliberação do Conselho Diretivo n.º 1184/2021, publicada no Diário da República de 16 de novembro e nos termos do disposto no artigo 173.º do Código do Procedimento Administrativo, determino a substituição do meu Despacho de 25 de maio de 2024 - para cujo teor se remete e se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais - que indefere o pedido apresentado em 29.12.2023 pela conservadora de registos A... do requerimento, pelo seguinte:
Considerando que a reconstituição da situação hipotética atual que se impõem por força da execução da sentença proferida pelo TAC de Lisboa no âmbito do Processo nº 2009/22.4BELSB (que determinou a anulação da deliberação do Conselho Diretivo do IRN, IP, de 09/06/20221 ) determina a consequente anulação do CTFP celebrado com a aqui requerente para ocupação de posto de trabalho de conservador de registo da CRP de ... e que, nessa conformidade, a mesma continua a ocupar o correspondente posto de trabalho na CRPCom de ... (não se verificando, pois, qualquer alteração à situação jurídico funcional considerada aquando da constituição da sua mobilidade para a CRC de ... e ulteriores prorrogações), reconheço o direito da conservadora de registos A..., à manutenção do pagamento da designada “participação emolumentar de substituição” se e enquanto se mantiver essa situação, com efeitos retroativos e reconstituindo-se a situação da trabalhadora. Notifique-se a requerente da presente decisão.
Tal em nada invalida a argumentação jurídica que foi apresentada, mas, por mera alteração dos pressupostos de facto.
5) Dando assim provimento ao pedido da Autora no que diz respeito ao pagamento dos retroativos ora peticionados, conforme consta da matéria de facto fixada nos presentes autos. Parecendo ter ficado com este despacho a situação da Autora resolvida de acordo com o que vinha reivindicando.
6) Porém, não ficou totalmente regularizada a situação da Autora, no sentido que parecia tudo indicar a inutilidade superveniente da lide, não tivesse sido acrescentado um paragrafo final onde a Entidade demandada cita a recente publicação do Decreto-lei 1/2025, de 16 de janeiro, a aplicar à Autora e que alterou a base remuneratória e atualizou as remunerações e ajudas de custo, da Administração Pública (LTFP), no artigo 6.º do que transcrevemos:
Os suplementos remuneratórios que, nos termos da lei, tenham por referência a atualização salarial anual da função pública ou dos níveis da TRU, são atualizados em 2,15 %.
7) A Entidade Demandada vem defender que este artigo 6.º não é aplicado à Autora, uma vez que esta tem direito a um acréscimo remuneratório e, não, a um suplemento.
8) Há então que analisar o conceito de suplemento, no enquadramento jurídico do artigo 6.º do decreto-lei 1/2025 de 16 de janeiro, no âmbito da lei que é aplicada aos oficiais de registo LTFP[6] .
9) São condições de atribuição dos suplementos remuneratórios, nos termos do n.º 1 do artigo 159.º da LTFP, e transcrevemos:
São suplementos remuneratórios os acréscimos remuneratórios devidos pelo exercício de funções em postos de trabalho que apresentam condições mais exigentes relativamente a outros postos de trabalho caracterizados por idêntico cargo ou por idênticas carreira e categoria.
E, ainda no que toca às carreiras, dispõe,
10) . Artigo 84.º
Carreiras gerais e especiais
1 - As carreiras dos trabalhadores em funções públicas são gerais ou especiais.
2 - São gerais as carreiras cujos conteúdos funcionais caracterizam postos de trabalho de que a generalidade dos órgãos ou serviços carece para o desenvolvimento das respetivas atividades.
3 - São especiais as carreiras cujos conteúdos funcionais caracterizam postos de trabalho de que apenas um ou alguns órgãos ou serviços carecem para o desenvolvimento das respetivas atividades. E ainda,
4 - Apenas podem ser criadas carreiras especiais quando, cumulativamente:
a) Os respetivos conteúdos funcionais não possam ser absorvidos pelos conteúdos funcionais das carreiras gerais;
b) Os respetivos trabalhadores se devam sujeitar a deveres funcionais mais exigentes que os previstos para os das carreiras gerais.
11) Por fim o artigo 146.º, explicita que a composição da remuneração dos trabalhadores com vínculo de emprego público é composta por:
a) Remuneração base.
b) Suplementos remuneratórios.
c) Prémios de desempenho.
12) Uma primeira conclusão que não pode deixar de se retirar é que o acréscimo remuneratório, aqui controvertido, é um suplemento, nos termos do n.1 do artigo 159.º da LTFP, citado e já transcrito.
13). Chamamos à colação o acórdão do STA, 026/23.6BCLSB 10-04-2025, em que foi recorrente o IRN, IP, numa questão que só incidentalmente tem a ver com o que aqui se sindica, mas que define a complexidade aqui em análise.
Reproduziremos em parte o sumário do mencionado acórdão, como segue e que demonstra para todas as partes envolvidas acrescidas dificuldades.
«Está em causa uma divergência a respeito da interpretação de regras especiais sobre a transição de carreiras, que envolve um número elevado de litígios, e em que a solução de direito tem de ser encontrada a partir da interpretação conjugada das regras dos regimes especiais das carreiras «….» e em harmonia com os princípios que informam o regime geral do emprego público…»
14) Em favor da posição a tomar por este tribunal arbitral, cita-se um estudo sobre a Remuneração das Carreiras Especiais, do Professor Auxiliar da Faculdade de Direito de Lisboa, Luis Gonçalves da Silva e da Professora Auxiliar da Faculdade de Direito de Lisboa, Cláudia Madalena, com o título, DA REMUNERAÇÃO DAS CARREIRAS ESPECIAIS, que se debruça sobre a carreira dos oficias de registos no Instituo de Registo e Notariado, IP, onde são referidas considerações sobre a estrutura remuneratória daquele instituto publico[7], mas que nos ajuda a compreender a complexidade deste regime subsidiário dos oficiais de registo em mobilidade em tudo o que não está regulado pelo estatuto próprio dos conservadores do IRN,IP. Sucintamente:
Carreiras especiais: o artigo 29.º do Decreto-Lei n.º 353-A/89 referia-se às “Outras carreiras de regime especial”, estabelecendo o seguinte: “1 - As estruturas remuneratórias próprias das carreiras de regime especial não previstas neste diploma são objecto de diploma autónomo, designadamente as carreiras de informática, de técnico e técnico superior de aviação civil, dos oficiais de justiça, da administração tributária, do Tesouro, da contabilidade pública e do crédito público”.
Regimes especiais: o artigo 43.º do mesmo Decreto-Lei n.º 353-A/89, com a epígrafe “Salvaguarda de regimes especiais”, determinava: “1 - Ao pessoal dos institutos públicos que revistam a forma de serviços personalizados ou de fundos públicos e dos serviços públicos abrangidos pelo regime aplicável às empresas públicas ou de contrato individual de trabalho, bem como das conservatórias, cartórios notariais, e às situações identificadas em lei como regime de direito público privativo aplicam-se as respetivas disposições estatutárias”.
15) Pelo que, na acepção do, então, legislador, se diferenciava entre carreiras especiais do (artigo 29.º do decreto-lei n.º 353-A/89) e regimes especiais (artigo 43.º).
Por conseguinte, atendendo a que, não apenas por ser uma carreira especial, mas essencialmente por o seu estatuto remuneratório estar ressalvado da aplicação do regime geral, tendo um regime particularmente delineado, considera-se que, para que tal regime fosse posto em crise, teria sido necessário que nos referidos diplomas de execução orçamental constasse a intenção inequívoca do legislador. Intenção inequívoca essa que não pode resultar da mera referência às carreiras especiais, pois que, as demais carreiras especiais, não gozavam então da mesma ressalva de aplicação do regime geral. Sendo, assim, situações diversas, devendo o intérprete distinguir onde o legislador igualmente o fez.
O decreto lei 35/2014, veio legislar de novo a Lei do Trabalho de Funcionalismo Público, LTFP, revogando, pelo menos tacitamente, a anterior lei sobre esta matéria[8].
Voltando ao Parecer dos Professores da FDL, é ainda citada a doutrina de Marcello Caetano, na parte que diz respeito à noção material dos Suplementos - abrir parêntesis - que se tornou essencial sindicar após a publicação do decreto lei 1/2025 de 16 de janeiro, tendo por fundamento normas da LTFP, que são aplicáveis caso concreto, e que nos termos do último paragrafo da resposta de 7 de abril de 2025 do IRN,IP, em que refere que face ao artigo 6.º do diploma 1/2025 de 16 de janeiro, «não se inclui o acréscimo remuneratório devido pelo exercício de funções em regime de substituição – fechar parêntesis, e continuando a citar o Parecer, onde se refere à doutrina de Marcello Caetano, com a cautela do ano em que o autor a escreveu, e transcrevemos:
“O vencimento principal é a remuneração certa ou remuneração-base do cargo público, fixada por lei independentemente das circunstâncias relativas à pessoa que nele será provida, e ao lugar e ao modo do respectivo exercício”, podendo consistir “em ordenado (ou soldo, para os militares), ou emolumentos, e nele se compreendem os suplementos, subvenções ou melhorias que sejam concedidas genericamente a todos os funcionários, bem como o direito a habitação ou o abono para fardamento inerente a um cargo”,
“Os suplementos são remunerações acessórias, justificadas por circunstâncias especiais do exercício das funções, como o local, a natureza das tarefas, o risco ou a responsabilidade acrescida.”
https://www.cidp.pt/revistas/rjlb/2023/4/2023_04_1093_1155.pdf.
16) De tudo o que deixa dito, sendo certo que o IRN,IP pelo despacho de 7 de abril de 2025, tomou outra opção face ao pedido da Autora, podemos referir que não se justificou toda a explanação deste tribunal arbitral, em sede de Relatório uma vez que aquele despacho, vem abrir porta ao requerido pela Autora na sua totalidade, uma vez que,
1. Não se considera que tenha havido ampliação da PI, uma vez que por despacho do
Vogal do Conselho Diretivo do IRN,IP, foi pedido um pedido formal de desculpa pelos lapsos ocorridos nos primeiros e segundo pontos, os quais serão corrigidos, pelo o que se manteve incólume o pedido da Autora.
2. Quanto ao terceiro ponto, não tem razão o IRN,IP, uma vez que os acréscimos remuneratórios são suplementos e os suplementos são acréscimos remuneratórios nos termos do artigo 159.º da LTFP, aplicável à Autora para todos os efeitos legais, dele decorrente.
3. Em termos doutrinais os suplementos são remunerações acessórias, justificadas por circunstâncias especiais do exercício das funções, como o local, a natureza das tarefas, o risco ou a responsabilidade acrescida.”
4. Os oficias de registo, ou conservadores, são sujeitos a deveres funcionais mais exigentes que os previstos para as carreiras gerais, e à agora Demandante, acresce ao serviço normal de conservadora, ou oficial de registo, a função acrescida de chefia da conservatória de ... .
5. Os oficias de registo estão sujeitos à LTFP a uma remuneração base da função pública e a uma componente estatutária, cuja competência própria e exclusiva pertence ao IRN,IP.
6. Os oficiais de registo para além da componente estatutária, estão ainda sujeitos à LTFP, concretamente, ao seu artigo 159.º, que é lei de aplicação subsidiária ao seu estatuto profissional, entre o qual se densifica no artigo citado o aqui controvertido suplemento emolumentar, acréscimo remuneratório ou suplemento.
7. Situação que está esclarecida em parte nos factos provados desta decisão arbitral.
8. Fica, no entanto, sem efeito o pedido da Autora uma vez que é o próprio despacho de 7 de abril de 2025 que vem admitir o lapso cometido. Isto por um lado.
9. Por outro, a carreira dos oficias de registo em tudo o que não for especificamente regulado internamente (pelo instituto público) aplica-se a LTFP, como é o caso.
10. Os oficiais de registo da administração indireta do Estado estão abrangidos pela LTFP, nos termos do artigo 2.ª e a titulo subsidiário, nos termos do artigo 3.º que lhe confere a natureza de carreiras especiais.
11. Fica provado que os suplementos, ou emolumentos, estão regulados pela LTFP, nomeadamente no que diz respeito ao artigo 6.º da lei 1/2025 de 16 de junho, na situação que é reportada pela própria Entidade Demandante.
12. Fica provado que os suplementos são acréscimos remuneratórios nos termos do artigo 159.º da LTFP.
13. A incerteza pela opção de, indiscriminadamente, quer na PI, quer na Contestação, ambos os litigantes nomearem sem critério, a questão ora controvertida, quer seja por acréscimos remuneratórios, quer seja por emolumentos, quer seja por suplementos, como se provou na matéria de facto acima reproduzida das peças de ambas as partes, Demandante e Entidade demandada, deram lugar a uma conjuntura jurídica, que a própria Entidade Demandada não solucionou, quando, mais do que a Demandante, tinha a opção de não a criar.
14. Esta imprecisão face ao estabelecido pelo artigo 159.º, da já muito mencionada LTFP, deu azo a uma não intencional confusão que a nenhuma parte aproveitou, para o cabal entendimento jurídico do que se entende por suplemento remuneratório da lei a que está sujeita a Autora e à qual a Entidade Demandante mostrou algum desconhecimento, no que concerne ao suplemento remuneratório ora em crise.
15. São suplementos remuneratórios os acréscimos remuneratórios devidos pelo exercício de funções em postos de trabalho que apresentam condições mais exigentes relativamente a outros postos de trabalho caracterizados por idêntico cargo ou por idêntica carreira e categoria, cfr. artigo 159.º da LTFP.
16. A Demandante encontra-se no perfil jurídico aqui agora acabado de traçar, pelo que este tribunal arbitral, considera que nos termos da lei aplicável, os acréscimos governamentais, nos anos e diplomas invocados pela Autora lhe são devidos nos termos revindicados pela mesma junto da Entidade demandada, assim como no atual aumento de 2025, feito pelo decreto lei 1/2025 de 16 de janeiro, a que o artigo 6.º se refere e ao qual o IRN,IP, sendo, como é, um instituto público, estando sujeito à tutela e à superintendência do Governo, que lhe confere a Lei original 3/2004 de 15 de janeiro, tem o dever de a aplicar.
17. Pelo que lhe são devidos, como suplementos, os acréscimos patrimoniais a que tem direito, nas percentagens do aumento dos suplementos governamentais, durante os anos em crise, a que o INR,IP fica obrigado, nos termos legais.
IV – DECISÃO
1. Assim, pelo exposto, julga este tribunal arbitral singular julgar totalmente procedente os argumentos carreados pela Autora, com os fundamentos agora acabados de explanar, nomeadamente aqueles que decorrem da aplicação do artigo 159.º da LTFP.
2. Declara-se a desconformidade jurídica da não aplicação do artigo 6.º decreto lei n.º 1/2025, concretamente na não aplicação pela Entidade demandada por errada qualificação da natureza jurídica da remuneração em divida.
3. Pelo que a Entidade demandada deve reconhecer a natureza suplementar do acréscimo remuneratório e proceder ao pagamento das quantias em falta, agora ao mês de maio de 2025, ou na data do próximo pagamento dos honorários à Autora.
V - ENCARGOS PROCESSUAIS
Nos termos conjugados do n.1 do artigo 296.º do CPC e artigo 26.º do NRAAD é fixado o valor causa em 32.724,75€.
Os encargos processuais serão liquidados de acordo com a tabela prevista para a arbitragem administrativa nos termos do n. º1 e 6.º do artigo 29º do NRAAD do CAAD, em partes iguais pela Entidade demandada e pela Autora.
Notifiquem-se as partes com cópia desta Decisão e deposite-se o seu original no CAAD, nos termos legais.
Lisboa, 21 de maio de 2025.
A Árbitro
Maria Alexandra Mesquita
[1] Despacho do Vogal do Conselho Diretivo do IRN,IP, de 25.05.2024, Dr. B..., que indeferiu o pedido de reposição do acréscimo remuneratório sobre o requerimento da Demandante, já assinalado.
[2] Tendo permanecido, em mobilidade em substituição CRP de ..., acrescentamos nós.
[3] Por anulação do procedimento concursal, por dois acórdãos, do Tribunal Administrativo de Circulo de Lisboa e do TCA, Sul, aqui já referenciados.
[4] Suplemento remuneratório, situação que posteriormente foi posta em causa, em vista desse suplemento ser pela Entidade Demandada analisado, como um acréscimo patrimonial. E não como suplemento.
[5]Acréscimo remuneratório, no que respeita ao suplemento remuneratório (sic)[5] no montante de 1.430,85 €, decorrente da sua situação de mobilidade na categoria na Conservatória do Registo Civil de ... .
[6] Lei 35 de junho de 2014
[7] No âmbito da anterior lei de 1989, ali mencionada, e ainda residualmente em vigor.
[8] Ver jurisprudência do STA aqui mencionada.
[i]Os sublinhados são todos nossos.
[ii]Dez anos, com sucessivas prorrogações, na Conservatória de... .
[iii] Comunicação de 21 de dezembro de 2022 onde é referido:« É com satisfação que informo que, na sequência da respetiva anuência, que muito agradeço, por meu despacho de 20.12.2022, foi autorizada a mobilidade na categoria de V. Exa. na Conservatória do Registo Civil de ..., com efeitos (início) a contar de 01.01.2023 ⸺ data da produção dos efeitos do contrato de trabalho em funções públicas, para ocupação do posto de trabalho para o qual foi selecionado (a), no âmbito do concurso para preenchimento de lugares de oficial de registos, publicitado sob a Refª .../2021-DRH/SPFQ (CR). A mobilidade em questão vigorará até dia 30 de junho de 2024, nos termos do artigo 92.º e seguintes da Lei geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP), aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, conjugado com os n.ºs 1 e 2 do artigo 33.º do Decreto lei n.º 115/2018, de 21 de dezembro, salvo se ocorrerem motivos que determinem a prévia cessação».
[iv]Que lhe vinha a ser pago desde, 2012.
[v][v] Diploma que introduziu nova disciplina nos serviços dos registos e do notariado.
[vi] Diploma cuja redação veio regular as situações de substituição, com data de 2018.
[vii] Deliberação do Conselho Diretivo de 30 de novembro de 2021, tendo em vista e por fundamento a aplicação destes dois diplomas e que deu causa ao controvertido pedido de reembolso do pagamento do acréscimo remuneratório que aqui está em causa e do qual à Autora nunca lhe foi facilitado o acesso, embora varias vezes requerido, para elaborar a sua defesa.
[viii] Situação que mereceu resposta do vogal do Conselho Diretivo, Dr. B..., em 25 de setembro de 2024, determinando a substituição do ato administrativo anterior, e aqui controverso com data de 29 de dezembro de 2023, relativamente ao que a Demandante vem litigando contra o Demandado, dando razão àquela, como veremos.
[ix] Quatro meses e 11 dias depois foi a Demandante notificada para, querendo, exercer o direito de audiência prévia.
[x] A Demandante interpôs Pedido de Pronúncia Arbitral no Centro de Arbitragem Administrativa, em 21 de agosto de 2024.
[xi] Cf. artigo 92.º, n.1 da LTFP: 1 - Quando haja conveniência para o interesse público, designadamente quando a economia, a eficácia e a eficiência dos órgãos ou serviços o imponham, os trabalhadores podem ser sujeitos a mobilidade.
Desde 2012, tal como ficou demonstrado o Demandado, foi autorizando ora Demandante em continuidade e em mobilidade na Conservatória de..., com acrescidas responsabilidade de chefia. Vidé, as respetivas autorizações em substituição na Conservatória de ..., na situação de mobilidade que aqui estão identificadas pelos responsáveis dos recursos humanos da Conservatória de ... .
[xii] Contrato de Trabalho em Funções Públicas.