DECISÃO ARBITRAL
Demandante:
1 – A...
2 – B...
3 – C...
4 – D...
5 – E...
6 – F...
7 – G...
Demandada: Ministério da Justiça
I. RELATÓRIO
A – PARTES E OBJETO
Os Demandantes instauraram neste Tribunal Arbitral do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), a presente Ação contra
O Demandado Ministério da Justiça, NIPC 600017613, com sede na Praça do Comércio, 1149-019 Lisboa.
Peticionam os Demandantes na presente ação:
a) Que lhes seja reconhecido, na qualidade de EPC, e no período compreendido entre 01-01-2020 e 31-12-2022, o direito a um suplemente de risco correspondente a 25% da retribuição base prevista para a 2.ª posição remuneratória da categoria de inspetor da carreira especial de investigação criminal, a qual deverá corresponder à 1.ª posição;
b) Que seja o demandado condenada a pagar a cada um dos 1 a 6 Demandantes as diferenças remuneratórias em falta, relativas ao suplemente de risco em apreço, no montante global de 13.607,58€, acrescidos de juros de mora vencidos e vincendos, calculados à taxa legal em vigor, e até efetivo e integral pagamento.
c) Que seja o demandado condenada a pagar ao 7 Demandante as diferenças remuneratórias em falta, relativas ao suplemento de risco em apreço, no montante de 8.388,12€, acrescidos de juros de mora vencidos e vincendos, calculados à taxa legal em vigor, e até efetivo e integral pagamento.
Regularmente citado, o Demandado aduziu, em tempo, a sua Contestação, na qual pugna pela improcedência dos pedidos e sua consequente absolvição, apresentando defesa por impugnação.
B – DA LEGITIMIDADE DAS PARTES
A Demandante tem personalidade e capacidade judiciária, nos termos do artigo 8.º- A do CPTA, e legitimidade para agir, nos termos da norma do n.º 1 do artigo 9.º do CPTA.
A Demandada tem, igualmente, legitimidade nos termos da norma do artigo 10.º do CPTA.
C – SANEAMENTO DO PROCESSO
Não foi requerida prova testemunhal, nem nos presentes autos se vislumbra qualquer relevância da sua existência, face à prova documental produzida, que se releva de extrema importância para a boa decisão da causa.
O objeto do litígio é tão-só matéria de direito, pelo que não há necessidade de audiência e de apresentação de alegações finais.
O Tribunal é composto pelo árbitro singular signatário, o qual integra a lista de árbitros do CAAD em matéria administrativa, e é competente, nos termos do disposto na Portaria n.º 1120/2009, de 30 de setembro, que vincula os serviços centrais, pessoas coletivas públicas e entidades que funcionam no âmbito do Ministério da Justiça, à jurisdição do CAAD.
Valor da Causa
Os Demandantes atribuíram à presente ação o valor de 21.995,70€. O Demandado nada disse sobre a matéria.
Nos termos do artigo 32.º, n.º 1 do CPTA, quando pela ação se pretenda obter o pagamento de quantia certa, é esse o valor da causa. Nesta ação, os Demandantes cumularam vários pedidos. Assim, nos termos do n.º 7 do referido artigo, o valor da causa é a quantia correspondente à soma dos valores de todos eles.
Por este motivo, fixa-se o valor da causa no valor de 90.033,60€, correspondente ao somatório das diferenças salariais.
D – DO MÉRITO DO PEDIDO
Questões que ao Tribunal Arbitral cumpre decidir:
Tudo visto e analisado, ponderadas as provas existentes, atento o Direito aplicável, cumpre apreciar e decidir do mérito do pedido em relação aos Demandantes.
Os Autores para fundamentarem o seu pedido alegam na petição inicial que integraram as carreiras de Apoio à Investigação Criminal e que transitaram para a carreira de Especialista de Polícia Científica (EPC), com efeitos a 01/01/2020.
Mais alegam que, nos termos do art. 98.º, n.º 4 do EPPJ/2019 passaram a ter direito ao suplemento de risco definido no art. 99.º, n.º 3 e 4 da LOPJ/1990, até à regulamentação do suplemento previsto no art. 75.º do EPPJ/2019. Tendo por isso direito ao peticionado suplemento de risco correspondente a 25% do índice 100 da tabela indiciária da carreira de investigação criminal. Acrescentando, ainda, que deixou de existir qualquer distinção entre os funcionários integrados na carreira de EPC para efeitos do suplemento de risco.
Distribuído o processo, foi o Réu citado para contestar.
O Réu apresentou contestação onde alegou, em síntese, que os critérios de atribuição do suplemento de risco, até 01-01-2020, eram os enunciados no art. 99.º do LOPJ/1990, ou seja, eram graduados de acordo com o ónus da função dos diferentes grupos de pessoal, bem assim ao risco, insalubridade e penosidade que lhes estão associados. E que os artigos 75.º, n.º 2 e 98.º, n.º 3 e 4 do EEPJ continuam a exigir os mesmos critérios que se exigiam pela LOPJ/1990. Deste modo, o que revela para efeitos de atribuição de um suplemento de risco ao pessoal de apoio à investigação criminal é o exercício efetivo de funções nas áreas funcionais de criminalística, de telecomunicações e de segurança (funções que os Demandantes não exerciam no período invocado).
Juntou dentro do respetivo prazo o processo administrativo.
São duas as questões a decidir, configuradas a partir da causa de pedir, do pedido, da posição assumida pelos Demandantes na Petição Inicial e do Demandado na Contestação:
1. A norma transitória do art. 98.º, n.º 3 e 4 do EEPJ/2019 determina a aplicação uniforme do suplemento de risco a todas as carreiras de Especialista de Polícia Científica (EPC) (como sustentam os Demandantes) ou antes uma aplicação diferenciada, consoante as funções concretamente exercidas, como acontecia ao abrigo do art. 99.º da LOPJ/1990 (como sustenta o Demandado) ?
2. Caso a resposta à primeira questão seja positiva, importa averiguar se a aplicação do n.º 4 do art. 99.º do EPPJ/2019 se reporta à remuneração base prevista para a 1.º posição remuneratória da nova categoria de inspetor da carreira especial de investigação criminal ou se reporta ao anterior 1.º escalão da categoria de Agente.
II – FUNDAMENTAÇÃO
A. FACTOS PROVADOS
Com relevância para a decisão a proferir, face ao alegado por ambas as partes e aos documentos juntos, consideram-se provados os seguintes factos:
1. Os Demandantes integraram até 31 de dezembro de 2019 as carreiras de Apoio à Investigação Criminal.
2. Até essa data, auferiam, nos termos do art. 99.º, n.º 5 do DL n.º 295-A/90, de 21 de setembro, um suplemento de risco correspondente a 20% do índice 100, da respetiva tabela indiciária da antiga carreira de pessoal de apoio à investigação criminal, que era de 667,94€, no montante de 133,59€.
3. Com a entrada em vigor do DL n.º 138/2019, de 13 de setembro, e por Despacho do Diretor Nacional, os demandantes transitaram para a carreira de Especialista de Polícia Científica (EPC), com efeitos a 01/01/2020.
4. O Demandante manteve em relação aos demandantes o mesmo suplemento de risco, que vinha a atribuir até 2020, calculado com base em 20%, no período compreendido entre 01-01-2020 e 31-12-2022.
5. Os 1.º a 6.º Demandantes receberam, no período supramencionado, a título de suplemento de risco os seguintes montantes:
- Janeiro a dezembro de 2020: 1.870,26€
- Janeiro a dezembro de 2021: 1.870,26€
- Janeiro a dezembro de 2022: 1.870,26€
6. O 7.º Demandante recebeu:
- Janeiro a dezembro de 2020: 1.870,26€
- Janeiro a dezembro de 2021: 1.068,72€
- Janeiro a dezembro de 2022: 534,36€
7. Em 03-10-2024 os Demandantes requereram o pagamento das diferenças entre o suplemento de risco que vinham a auferir desde 01-01-2020 e aquele que tinham direito desde essa data.
8. Em 24-10-2024 foram notificados da decisão de indeferimento, por Despacho do Senhor Nacional Adjunto, de 07-10-2024.
9. Deixou de existir na atual carreira especial de investigação criminal a categoria de Agente.
B. FACTOS NÃO PROVADOS
1. Os colegas que já integravam a carreira de EPC antes de 2019 auferiam, no mesmo período, suplemento de risco correspondente a 25% do índice 100 da tabela indiciária da carreira de investigação criminal, no montante mensal de 456,21€, em 2020 e 2021, e de 460,32€, em 2022.
A convicção do Tribunal quanto aos factos considerados provados e não provados resulta dos documentos juntos com a petição inicial e com a contestação, e face ao que foi considerado aceite e/ou não impugnado pelas partes.
C. DO DIREITO
As questões a resolver são duas:
1. A norma transitória do art. 98.º, n.º 3 e 4 do EEPJ/2019 determina a aplicação uniforme do suplemento de risco a todas as carreiras de Especialista de Polícia Científica (EPC) (como sustentam os Demandantes) ou antes uma aplicação diferenciada, consoante as funções concretamente exercidas, como acontecia ao abrigo do art. 99.º da LOPJ/1990 (como sustenta o Demandado) ?
2. Caso a resposta à primeira questão seja positiva, importa averiguar se a aplicação do n.º 4 do art. 99.º do EPPJ/2019 se reporta à remuneração base prevista para a 1.º posição remuneratória da nova categoria de inspetor da carreira especial de investigação criminal ou se reporta ao anterior 1.º escalão da categoria de Agente.
Quanto à 1.ª questão, cumpre saber se, de janeiro de 2020 a dezembro de 2022, o suplemento de risco a que tinham direito, deveria ser de 25% do valor da 2.ª posição remuneratória da categoria de inspetor (conforme defendido pela Demandantes) ou de 20% do índice 100 da tabela indiciária (conforme defendido pela Polícia Judiciária).
O que está em causa é a interpretação do regime transitório previsto no n.º 4 do art. 98.º do EPPJ/2019, que remete para o disposto no n.º 4 do art. 99.º da LOPJ/1990, enquanto não entrou em vigor a regulamentação prevista no n.º 2 do art. 75.º do EPPJ/2019.
E, consequentemente, apurar qual o quantum do suplemento de risco que lhes é devido entre 01-01-2020, data em que, com a reestruturação das carreiras da PJ transitaram para a nova carreira de EPC, e 31-12-2022, data anterior ao início dos efeitos previstos no Decreto-Lei n.º 139-C/2023, de 29 de dezembro (01-01-2023).
Os Demandantes sustentam, em suma, o seguinte:
- O Decreto-Lei n.º 295-A/90, de 21 de setembro, (LOPJ/1990) no seu artigo 99.º, n.º 3, 4 e 5, atribuía aos funcionários que integram o grupo de pessoal de apoio à investigação criminal um direito a um suplemento de risco correspondente a 20% do índice 100 da respetiva tabela indiciária, salvaguardando o direito dos funcionários integrados nas áreas funcionais de criminalística, de telecomunicações e de segurança a um suplemento de risco fixado em 25% do índice correspondente ao 1.º escalão.
- Ou seja, o legislador na LOPJ/1990 graduava o suplemento de risco consoante as diferentes funções dos grupos de pessoal, se fossem da carreira de investigação criminal, criminalística, telecomunicações e segurança, ou do grupo de apoio à investigação criminal.
- O EPPJ/2019 veio alterar o Decreto-Lei n.º 275-A/2000 e introduziu alterações ao direito ao suplemento de risco auferido pelos profissionais integrados na nova carreira de EPC, em concreto pelo artigo 98.º, n.º 4, de modo transitório até à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 138-C/2023.
- Segundo este artigo, o disposto no n.º 4 do artigo 99.º da LOPJ/1990 é aplicável aos trabalhadores da carreira de EPC.
- Antes da reestruturação de 2019, a carreira era integrada por duas carreiras especiais: a do pessoal de investigação criminal e a do pessoal de apoio à investigação criminal, englobando esta última as categorias profissionais de especialista superior, de especialista, de especialista adjunto, de especialista auxiliar e, igualmente, de segurança.
E quanto à carreira de apoio à investigação criminal, o legislador distinguia quanto ao suplemento de risco a atribuir aos especialistas, em função da área funcional onde se integravam (art. 99.º, n.º 4 e 5 da LOPJ/1990).
- Atualmente, a antiga carreira de apoio à investigação criminal, divide-se em carreira de especialista de polícia científica (antigos especialistas) e a carreira de segurança (antigos seguranças).
- Então, o legislador colocou fim à diferenciação por funções, para efeitos do suplemento de risco, uniformizando o tratamento dado a todos os trabalhadores da carreira especial de EPC.
- Com esta alteração, o legislador abandonou a antiga diferenciação entre os conteúdos funcionais, passando a dispor que o suplemento de risco, independentemente da área funcional em que o especialista se integre, é sempre de 25% da remuneração correspondente ao 1.º escalão.
- Com esta alteração, os Demandantes passaram a ter direito a 25% do índice 100 da tabela indiciária da carreira de investigação criminal, ao invés de manterem o suplemento de 20%.
- Apesar disso, o Demandado manteve o suplemento de risco calculado nos termos da legislação anterior (20%).
- Com este comportamento, o Demandado viola o art. 98.º do EPPJ/2019, o artigo 99.º da LOPJ/1990, bem como os princípios da legalidade, igualdade, justiça e razoabilidade.
O Demandado alega, em síntese, que:
- De acordo com o n.º 1 do artigo 99.º da LOPJ/1990, os trabalhadores da PJ têm direito a um suplemento de risco, graduado com o ónus da função dos diferentes grupos de pessoal, em razão do risco, insalubridade e penosidade que estão associados.
- Que o legislador utilizou duas normas distintas no artigo 98.º do EPPJ/2019 para aplicar o suplemento de risco. Uma dirigida aos trabalhadores da carreira de investigação criminal e de segurança (n.º3) e outra aos trabalhadores da carreira de EPC (n.º4).
- O n.º 3 destina-se a manter o direito ao suplemento de risco nas condições em que auferiam antes da entrada em vigor desta lei. E o n.º 4 estabelece o regime do suplemento de risco aplicável aos trabalhadores da nova carreira de EPC, por remissão para o artigo 99.º, n.º 4 da LOPJ/1990.
- O que releva para efeitos de atribuição de um suplemento de risco de montante superior é o exercício efetivo de funções nas áreas funcionais de criminalística, telecomunicações e de segurança. Funções não exercidas pelos Demandantes.
- A razão de ser da atribuição de um suplemento de risco igual ao da investigação criminal reside no facto de estes terem que acompanhar a investigação criminal, em diligências exteriores, nomeadamente buscas, sujeitando-os a uma maior perigosidade.
- As funções exercidas pelos Demandantes não se inserem nas áreas funcionais estabelecidas no n.º 4 do artigo 99.º da LOPJ/1990.
- O legislador não quis acabar com a distinção / graduação do suplemento de risco consoante as áreas em que exercem funções, pois o Decreto-Lei n.º 139-C/2023 de 29 dezembro, no seu artigo 4.º faz uma distinção.
- Subsistindo, assim, a situação preexistente quanto ao regime / montante do suplemento de risco auferido pelos Demandantes.
- Não se verifica violação do principio da legalidade, igualdade, justiça e razoabilidade.
Apreciando a questão jurídica:
O artigo 99.º da LOPJ/1990, que ainda hoje se mantem em vigor, dispõe:
“3 - O suplemento de risco para os funcionários da carreira de investigação criminal é fixado em 25% do índice 100 da respectiva tabela indiciária.
4 - Os funcionários integrados nas áreas funcionais de criminalística, de telecomunicações e de segurança têm direito a suplemento de risco de montante igual ao fixado no número anterior.
5 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, os funcionários que integram o grupo de pessoal de apoio à investigação criminal têm direito a um suplemento de risco correspondente a 20% do índice 100 da respectiva tabela indiciária.”
Ou seja, os funcionários que integravam o grupo de pessoal de apoio à investigação criminal que exercem funções nas áreas de criminalística, telecomunicações e de segurança recebiam um suplemento de risco superior ao dos seus colegas de carreira, igual ao dos funcionários da carreira de investigação criminal.
Este regime vigorou sem alterações de 1990 a 31-12-2019.
O artigo 98.º, n.º 3 e 4 do EPPJ/2019, entrou em vigor em 1/1/2020, e para além de salvaguardar a manutenção do referido artigo, introduziu-lhe alterações.
O legislador definiu que, a partir de 1/1/2020, os trabalhadores da carreira de investigação criminal e da carreira de segurança mantinham o direito ao suplemento nos termos da LOPJ/1190. Ou seja, não introduziu alterações neste ponto.
Mas quanto aos demais trabalhadores, estipulou no n.º 4 do art. 98.º do EEPJ/2019 que o regime do art. 99.º, n.º 4 do LOPJ se aplicava aos trabalhadores da carreira de EPC. Sem, mais considerações.
Ou seja, o legislador deixou de distinguir entre os trabalhadores da carreira de EPC. Então, todos os trabalhadores da carreira especial de EPC beneficiam do disposto no artigo 99.º, n.º 4 da LOPJ/1990, isto é, de um suplemento de risco idêntico ao dos trabalhadores de investigação criminal.
É inequívoco que o legislador quis introduzir uma alteração no regime dos EPC, pois se o seu objetivo fosse mante-los na situação em que estavam antes de 2020, teria adotado no n.º 4 uma formulação idêntica ao do n.º 3 “mantêm o direito (…) nas condições em que o auferem na data de entrada em vigor do presente decreto-lei”. Ou teria remetido para os n.º 4 e 5 do artigo 99.º, n.º 4 da LOPJ/1990. Mas não foi isso que o legislador definiu.
Do mesmo modo, no preâmbulo do EPPJ/2019 elucida-se que a opção é de tratamento unitário dos EPC, por todas as áreas funcionais inerentes à carreira serem essenciais à investigação criminal: “A nova carreira de especialista de polícia científica, ancorada nos conhecimentos técnicos e científicos necessários à interpretação dos sinais, vestígios e provas recolhidas na realização da inspeção judiciária e à análise pericial, tem natureza unicategorial e grau de complexidade três, valorizando-se profissionalmente uma atividade que embora instrumental, é essencial à própria investigação criminal.
É clara a intenção de uniformização do tratamento dos trabalhadores da carreira especial de EPC, sem privilegiar os que exercem funções nas áreas de criminalística e telecomunicações em relação às restantes. Tanto que, a carreira especial de EPC é caracterizada como unicategorial (artigo 36.º n.º 2 do EPPJ) sendo que os seus conteúdos funcionais são definidos de forma equivalente, sem distinção valorativa de umas áreas funcionais em relação a outras.
E não podemos concordar com a argumentação do Demandado de que Decreto-Lei n.º 139-C/2023 que regula definitivamente a atribuição do suplemento de risco mantem a distinção consoante as áreas em que os EPC exercem as funções. Pois, o n.º 4 apenas distingue entre “funções de inspeção e identificação judiciária”, não distingue entre áreas de criminalística e telecomunicações. Quanto aos demais trabalhadores da carreira de EPC o suplemento é uniformizado.
A nossa conclusão torna-se ainda mais evidente se olharmos para o artigo 99.º, n.º 5 do EPPJ/2019, que regula o regime transitório a aplicar-se aos trabalhadores que não transitaram para a carreira especial de EPC, porque não eram detentores dos requisitos legais, ou porque não manifestaram vontade. De acordo com esse número esses trabalhadores mantem o suplemento do n.º 5 do artigo 99.º da LOPJ/1990, nas condições em que auferiam na data de entrada em vigor do presente decreto lei.
Ou seja, a interpretação defendida pelo Demandado implica pagar o mesmo suplemento de risco aos trabalhadores que transitaram para a categoria de EPC e aos que não transitaram, bem como aos trabalhadores integrados em carreiras gerais, nomeadamente pessoal operário e auxiliar.
Mais, o legislador, aqui, teve o cuidado de remeter expressamente para o n.º 5 do artigo 99.º, o que demonstra que não foi sua vontade remeter do n.º 4 do art. 98.º do EPPJ/2019 para o n.º 5 do art. 99.º da LOPJ/1990.
Face ao exposto, conclui-se que, tendo os Demandantes transitado para a carreira de EPC, com efeitos a 1/1/2020, é lhes aplicável o disposto no artigo 98.º, n.º 4 do EPPJ/2019, pelo que beneficiam, desde essa data, de um suplemento de risco idêntico ao dos trabalhadores de investigação criminal, nos termos do n.º 4 do art. 99.º da LOPJ/1990.
Quanto à segunda questão:
Alegam os Demandantes que têm direito ao suplemento de risco de valor correspondente a 25% da retribuição base prevista para a 2.ª posição remuneratória da categoria de inspetor da carreira especial de investigação criminal, que é para todos os efeitos a 1.ª posição da nova categoria de inspetor da carreira especial, uma vez que deixou de existir a categoria de Agente.
É que segundo o artigo 68.º do EPPJ/2019 a 1.ª posição remuneratória é apenas aplicável aos funcionários que se encontram em período experimental, os quais transitam automaticamente para a 2.ª posição remuneratória se concluírem com sucesso o período experimental.
Assim, materialmente é a 2.ª posição remuneratória que configura verdadeiramente a 1.ª posição da categoria de inspetor na nova carreira.
O Demandado nada disse quanto a esta questão.
Na verdade, a interpretação defendida pelos Demandantes configura-se como a única interpretação atualista possível. Tanto que, o Demandado não arguiu nenhum fundamento contrário a esta interpretação.
Conclui-se que para o cálculo da percentagem de 25% tem de ser utilizada a remuneração base prevista para a 2.ª posição remuneratória da categoria de inspetor da carreira especial de investigação criminal.
Consequências práticas:
Considerando procedente o primeiro pedido dos Demandados: “reconhecer que os demandantes, na qualidade de EPC, e no período compreendido entre 01-01-2020 e 31-12-2022, têm direito a um suplemento de risco correspondente a 25% da retribuição base prevista para a 2.ª posição remuneratória da categoria de inspetor da carreira especial de investigação criminal, a qual deverá corresponder à 1.ª posição”, importa tirar as consequências quanto ao 2.º e 3.º pedido “pagar a cada demandante as diferenças remuneratórias em falta, (…) acrescidos de juros de mora vencidos e vincendos”.
Os Demandantes receberam no período supramencionado, a título de suplemento de risco 133,59€/mês e discriminaram os seguintes valores,
Os 1.º a 6.º receberam:
- Janeiro a dezembro de 2020: 1.870,26€
- Janeiro a dezembro de 2021: 1.870,26€
- Janeiro a dezembro de 2022: 1.870,26€
O 7.º Demandante recebeu:
- Janeiro a dezembro de 2020: 1.870,26€
- Janeiro a dezembro de 2021: 1.068,72€
- Janeiro a dezembro de 2022: 534,36€
E deviam ter recebido 456,21€/mês, em 2020 e 2021, e 460,32€/mês, em 2022 (multiplicados por 14).
Aplicando a diferença a esse período, resulta um valor reclamado dos 1.º a 6.º Demandantes de:
- Janeiro a dezembro de 2020: 4.516,68€
- Janeiro a dezembro de 2021: 4.516,68€
- Janeiro a dezembro de 2022: 4.574,22€
No total de 13.607,58€ para cada Demandante.
Quanto ao 7.º Demandante, encontra-se em falta:
- Janeiro a dezembro de 2020: 4.516,68€
- Janeiro a dezembro de 2021: 2.580,95€
- Janeiro a dezembro de 2023: 1.290,48€
No total de 8.388,12€.
Note-se que os cálculos dos Demandantes estão corretos, não tendo sido aliás contestados pelo Demandado.
Ao que somam os juros à taxa legal devida.
Decisão
Em razão do supra exposto, julga-se:
Procedentes os pedidos formulados pelos Demandantes, sendo o Demandado condenado a pagar a cada um dos 1.º a 6.º Demandantes as diferenças remuneratórias, relativas ao período entre 1/1/2020 e 31/12/2022, no valor de 13.607,58€, e ao 7.º Demandante no valor de 8.388,12€, acrescidos dos juros de mora vencidos e vincendos, calculados à taxa de 4% até à data de integral e efetivo pagamento, sem prejuízo de outra taxa que, entretanto, venha a vigorar.
Notifiquem-se as partes e promova-se a publicitação da decisão arbitral, nos termos do art.º 5.º, n.º 3, do Regulamento de Arbitragem Administrativa (CAAD).
Porto, 27 de Março de 2025,
O Árbitro,
Durval Tiago Ferreira