DECISÃO ARBITRAL
I. RELATÓRIO
A. Tribunal Arbitral e processo aplicável………………………………………………………1
B. Partes, Pedido, Convenção, Competência, Objecto do Litígio e Prova…………………..2
C. Articulados e Requerimentos……………………………………………………….……….6
II. FUNDAMENTAÇÃO
D. Factos…………………………………………………………………..……………………..8
E. Direito…………………………………………………………………………………..……11
E.1 Conhecimento de exceções (ainda não apreciadas através de Despacho)……………….16
E.2 Inconstitucionalidade…………………………………………………………………...…..20
E.3 Diferenças Remuneratórias……………………………………………………………...….26
III. DISPOSITIVO
F. Decisão………………………………………………………………………….……………41
IV. CUSTAS
Fixação e Repartição………………………………………………………………...………
A) Tribunal Arbitral e processo aplicável
1. No dia 15 de Março de 2022 foi proferido nos autos o seguinte Despacho Inicial:
Este Tribunal Arbitral foi constituído a 10.03.2022, com a aceitação e notificação da composição às partes (cfr. Artigo 17º nº 2 do Regulamento do CAAD, Despacho do Secretário de Estado da ... nº 5097/2009, DR II Série – nº 30, de 12 de Fevereiro e demais legislação ali citada).
2. Importa proferir Despacho Inicial nos termos do artigo 18º nº 1 e nº 5 do RCAAD. Desde já, por se considerar ser instrumental à decisão a proferir e considerando quanto disposto no artigo 5º nº 1 al. b), c) e d) do RCAAD e no artigo 30º nº 3 da Lei da Arbitragem Voluntária (LAV), determina-se que, quando o Regulamento do CAAD e a LAV não definirem as regras processuais aplicáveis, supletivamente, serão aplicados os conceitos e as regras decorrentes, primeiro, do CPTA e depois do CPC.
3. Mostra-se requerida a apensação de processo pelo Demandado. Considerando que o Demandante é Oficial de Registos e a existência do Processo 136/2021-A no qual as partes acordaram na apensação, mostrando-se estes autos ainda a aguardar consolidação de todas as apensações em ordem a prosseguir, notifique-se o Demandante para manifestar se pretende também a apensação deste processo, dando o seu acordo expresso à apensação requerida.
B) Partes, Pedido, Apensação, Convenção de Arbitragem, Competência, Objecto do Litígio e Prova:
4. A 25 de Abril de 2022 foi proferido o seguinte Despacho: Considerando a posição manifestada pela Demandante, indefere-se a apensação (13º nº 1 do RAACAAD).
5. Nesta medida figura nos autos como Demandante ou Autora A..., por sua vez, como Demandado ou R. o B... IP.
6. As partes têm capacidade e estão representadas, cumprindo desde já averiguar se o Tribunal é competente nos termos das disposições conjugadas dos artigos 1º e 8º do RCAAD, 1º, 18º e 46º nº 3 a) i) e iii) da LAV e 180º do CPTA (Admitindo a verificação oficiosa, Manuel Pereira Barrocas, Manual da Arbitragem, Almedina 2ª Edição, pag. 255). Tudo sem embargo de este poder dever do Tribunal Arbitral dever ser utilizado sempre tendo em consideração o princípio internacionalmente reconhecido do favor arbitrationis.
7. Acresce que a incompetência é ainda suscitada pela Demandada, resumindo-se no artigo 39º da sua contestação: Assim, a constituição de instâncias arbitrais encontra-se vedada ao âmbito de direitos e interesses indisponíveis, tal como se verifica reserva de competência jurisdicional exclusiva dos tribunais do Estado, como seja o julgamento de questões de inconstitucionalidade ou de ilegalidade de normas
8. Vejamos, a competência do tribunal arbitral pressupõe antes de mais a arbitrabilidade do litígio cujo objecto deve ser abrangido pela convenção de arbitragem, a existência de uma convenção de arbitragem válida e eficaz entre as partes e a regular constituição do Tribunal Arbitral.
9. Defina-se então o objecto do litígio, desde já se admitindo como sujeito a prova todos os factos que de forma, directa ou indirecta, possam contribuir para o correcto apuramento da verdade e melhor apreciação e aplicação de direito: A Autora, Oficial de Registo, intenta a presente acção arbitral pedindo o reconhecimento do direito, ao longo dos anos, a diferenças relativas ao vencimento de categoria e exercício, bem como emolumentos pessoais, todos resultantes de actualização salarial devida, pedindo ainda a declaração de inconstitucionalidade, por violação do princípio da igualdade, das normas que alteraram o estatuto remuneratório dos oficiais de registo, fixando o regime de apuramento da remuneração base, de tudo decorrendo pedido de reposicionamento na tabela remuneratória e a condenação no pagamento das diferenças daí resultantes.
10. Vejamos agora a Convenção de Arbitragem a que os Autores aderiram com a apresentação no CAAD da Petição Inicial. O Ministério ... encontra-se vinculado à jurisdição do CAAD através da Portaria n.º 1120/2009, de 30 de Setembro, no que respeita ao B... I.P. [alínea j) do artigo 1.º], sendo que, essa vinculação diz respeito a litígios com valor igual ou inferior a € 150.000.000 € que tenham por objecto questões emergentes de relações jurídicas de emprego público (primeira parte da alínea a) do n.º 2 do mesmo artigo 1.º). A segunda parte da mesma alínea a) do n.º 2 do artigo 1.º da citada Portaria reitera a ressalva consagrada na parte final da alínea d) do n.º 1 do artigo 180.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, pelo que a vinculação não abrange questões sobre “direitos indisponíveis”. Por outro lado, o nº 3 da mesma Portaria excepciona da aplicação do nº 2 os litígios relativos a remunerações e progressões respeitantes às específicas carreiras ali descritas.
11. Por sua vez, a competência material do Centro de Arbitragem Administrativa do CAAD afere-se em função da lei geral, dos seus Estatutos e do seu Regulamento de Arbitragem. O CAAD tem por objeto, a resolução de litígios respeitantes a relações jurídicas de emprego público (n.º 2 do artigo 3.º dos Estatutos do CAAD e 180º do CPTA e Despacho do Secretário de Estado da ... nº 5097/2009, DR II Série – nº 30, de 12 de Fevereiro).
12. De acordo com o artigo 8º do RCAAD e o artigo 18º nº 1 “in fine” da LAV, na apreciação da competência do Tribunal, cabe apreciar a arbitrabilidade do litígio, na sua vertente objectiva, face ao objecto do litígio, e subjectiva face à posição das partes e do específico Tribunal Arbitral. Esta disposição legal consagra no domínio da arbitragem voluntária o chamado princípio da Kompetenz-Kompetenz, Competência-Competência, Competence of tribunal to rule on its own jurisdiction ou Kompetenzprüfung durch das Schiedsgericht.
13. Considerando o objecto do litígio supra definido e o conteúdo da Portaria em referência, a que a Demandante aderiu, agora, de forma voluntária, cumpre concluir pela validade e eficácia da Convenção, considerando-se o litígio relativo a remuneração e posição remuneratória arbitrável, na medida em que não se trata de direito indisponível, em absoluto, como resulta claro dos artigos 119º e 280º do Código do Trabalho e 175º da LGTFP e é confirmado pela exclusão expressa do nº 3 da citada Portaria de Adesão. No mais, o Tribunal Arbitral decidirá de acordo com o Direito, impondo-se-lhe as normas imperativas (Diga-se ainda que, se bem o entendemos, acompanhamos Raúl Ventura quando afirma as suas muitas dúvidas quanto à convenção arbitral, enquanto atribuidora da competência a um Tribunal Arbitral para conhecer direitos, afectar, de alguma forma, a disponibilidade do direito em apreciação - Raúl Ventura “Convenção de Arbitragem”, in ROA 46, p. 289 a 413).
14. Decidir de acordo com o Direito (185º nº 2 do CPTA e artigo 26º nº 1 do RAACAAD) é, desde logo, decidir de acordo com a Constituição da República Portuguesa, ou seja, recusar a aplicação de direito ( de normas) quando estas violem a Constituição. Analisada a Petição Inicial e os pedidos, o que pede a Demandante é a não aplicação de normas por violarem a Constituição e, nessa medida, a declaração da sua ilegalidade por inconstitucionalidade, repristinando-se regime anterior. Ora nada impede que um Tribunal Arbitral aprecie, de forma concreta e incidental, a constitucionalidade de norma e recuse a sua aplicação se concluir pela inconstitucionalidade, dessa decisão cabendo recurso para o Tribunal Constitucional (artigos 209º nº 2, 202º e 204º da CRP). Neste sentido os Acórdãos do TC nº 230/86, de 8 de Julho, 52/92 de 5 de Fevereiro, 250/96 de 29 de Fevereiro, nº 181/2007 de 8 de Março e 202, 2014 de 3 de Março e J.J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição…, II, 4ª Ed. Pag 552). Improcede pois, por todos os motivos expostos, a excepção de incompetência deduzida pelo Demandado
15. Aqui chegados, em ordem a declarar verificada a competência resta apenas verificar a medida da arbitrabilidade uma vez que as partes atribuem a competência a este Tribunal Arbitral também em função do valor, que não poderá exceder 150 milhões de Euros, o que, por sua vez, exige também a verificação do Regulamento do CAAD quanto à regularidade da constituição do Tribunal Arbitral. Ora o Regulamento de Arbitragem do CAAD exige que as partes indiquem o valor da causa (artigo 10º nº 1 al. d), o que a Demandante fez, indicando o valor de 15.000 €. Verifica-se, no entanto, que do somatório dos pedidos resulta valor indeterminável, bastando atentar nos pedidos formulado quanto a emolumentos pessoais ou a ser fixada uma remuneração média resultante da média nacional aplicada à mesma categoria da Demandante. Fixa-se assim o valor dos autos nos termos do artigo 34º nº 2 do CPTA (30.001,00 €), importando dar por verificada a competência deste Tribunal para conhecer o litígio.
16. Nestes termos, porque de arbitragem e vontade das partes se trata, nos termos do artigo 22º nº 4 do RCAAD, considerando o objecto dos autos definido supra, fixam-se os Temas da Prova seguintes: Categoria e Remuneração ( de categoria, exercício e emolumentos pessoais) da Demandante no período relevante nos autos; Tomadas de Posição do Demandado quanto às pretensões da Demandante no mesmo período; Actos normativos de actualização de índice e tabelas; Acto normativo de alteração de carreira/ alteração de regime remuneratório; Tomadas de Posição e Notificação de reposicionamento feito pelo Demandado; Diferenças salariais de trabalhadores em posicionamento igual ao da Demandante;
17. Assim, antes de se decidir quanto à aplicação do disposto no Artigo 18º nº 4 do RAAD do CAAD, notifiquem-se as partes para, em 20 dias, juntarem projecto da Matéria, de facto, que consideram provada ou assente, mediante acordo, indicando ainda qual a matéria, de facto, que consideram relevante mas sobre a qual não foi possível acordo ( em PDF e word editável), indicando, neste caso, cada uma das partes de que forma considera esses factos ( sobre os quais não houve acordo) já provados ou de que forma os pretende provar.
18. No dia 23 de Maio de 2022 foi proferido o seguinte Despacho: Vistos os Requerimentos juntos pelas partes quanto aos factos provados por acordo e prova a considerar quanto aos restantes. Entende-se que, ressalvado o que se ordenará de seguida, os autos se mostram em condições de prosseguir para sentença, assim: 1. Pronunciem-se as partes nos termos previstos no artigo 18º nº 4 do RAACAAD; 2.Notifique-se o Demandado para efeitos de junção dos elementos solicitados pela Demandante no fim da sua Petição Inicial (“vencimento de exercício dos vários escriturários superiores com vencimento correspondente ao 2.º escalão da tabela remuneratória anteriormente aplicável, à data da entrada em vigor do DL 115/2018”) bem como para esclarecer se o que resulta dos artigos 255º a 257º da Contestação é a admissão das “assimetrias salariais”, antes e após transição para a nova carreira e tabela, uma vez que tal parece conflituar com o que afirma depois em 258º e 259º do mesmo articulado.3. Notifique-se a Demandante para juntar a Prova Documental, de que disponha, demonstrativa do que afirma no artigo 155º da Petição Inicial.
19. No dia 20 de Junho de 2022 foi proferido o seguinte Despacho: Vistos os Requerimentos juntos pelas partes. Ouvidas as partes, com o seu acordo, os autos prosseguem para decisão sem mais instrução. Ficam as partes notificadas para, querendo, apresentarem alegações escritas pelo prazo simultâneo de 20 dias, podendo cada uma responder às Alegações da outra parte em prazo de 10 dias contado da apresentação das Alegações. Notifique-se.
C) Articulados e Requerimentos
20. A Demandante submeteu Petição Inicial a 30 de Dezembro de 2021, acompanhada de 4 documentos, formulando os seguintes Pedidos: a) ser reconhecido o direito da Autora a auferir o valor de €7.063,33 a titulo de diferenças de vencimento de categoria e o Réu seja condenado no pagamento de tal quantia; b) ser reconhecido o direito da Autora a auferir o valor total de €3.496,43 a titulo de diferenças de vencimento de exercício e o Reu seja condenado no pagamento de tal quantia e a recalcular corretamente o vencimento de exercício da Autora; c) ser reconhecido o direito da Autora aquando da transição para a nova tabela a auferir 1439,22€ entre o nível 19 e 23 e posição 2 e 3 da TRU e a receber a titulo de diferenças de vencimento o valor de €1.718,64 e o Reu seja condenado no pagamento de tal quantia; d) ser reconhecido o direito da Autora a receber os emolumentos pessoais em falta a calcular pelo Réu; e) ser afastada a aplicação do art. 10.º n.º 1 e n.º 4 do DL n.º 145/2019 de 23/09 á Autora por inconstitucionalidade na interpretação de acordo com a qual para apuramento do vencimento base será considerado o vencimento de exercício calculado com base na Portaria n.º 1448/2001 e suas sucessivas renovações; f) ser repristinado o Decreto-Lei n.º 519-F2/1979 de 29 de dezembro e o disposto na Portaria n.º 940/99 de acordo com os quais se fixa a forma de calculo do vencimento de exercício a que os oficiais de registo tinham direito á data da entrada em vigor do DL 115/2018 (diploma que criou o regime da carreira especial dos oficiais de registo) e com base nisso calcular o vencimento médio nacional de um escriturário superior no 2.º escalão e aplicá-lo á Autora com consequente alteração da sua posição remuneratória; caso isso não seja exequível, aplicar á Autora o vencimento médio nacional de um escriturário superior no 2.º escalão á data da entrada em vigor do DL 115/2018, com consequente alteração da sua posição remuneratória.
21. O R. B... submeteu Contestação a 2 de Fevereiro de 2022, concluindo: a)Deve ser julgada procedente a invocada exceção de incompetência material desta instância arbitral para conhecer e declarar a inconstitucionalidade de atos legislativos e normativos legais, absolvendo-se o Demandado da instância; b) deve julgar-se procedente a invocada exceção dilatória de intempestividade da prática de ato processual (in caso, de instauração da presente ação), e concludentemente, absolver-se o Demandado da instância, ao abrigo do estatuído no art.° 89° n° 1 alínea k) e n.° 2 do CPTA; c) deve julgar-se procedente a invocada exceção dilatória inominada de impropriedade do meio processual, com a consequente absolvição do Demandado da instância, nos termos do disposto nos art.º 89°, n.° 2 do CPTA, 278° n.° 1 al. e) e 576° n.° 2 do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi artigos 1° do CPTA; d) em todo e qualquer caso, e mesmo que assim não se entenda, deve julgar-se absolutamente improcedente a presente ação, absolvendo-se a entidade demandada dos pedidos.
22. A 16 de Maio de 2022 a Demandante pronunciou-se sobre as excepções invocadas.
23. Autor e Demandado manifestaram ainda, nos seus articulados iniciais, a sua intenção de não prescindir do direito ao Recurso da presente Decisão (Neste sentido o Ac. STA de 4.4.2019 disponível em www.dgsi.pt).
24. Nos dias 16 de Maio e 17 de Maio de 2022 as partes submeteram requerimentos nos termos do quais fixaram por acordo expresso parte da matéria de facto, tendo ainda sustentado a restante factualidade relevante para a qual não alcançaram acordo.
25. A 17 de Maio o Demandado juntou os 6 documentos que acompanhavam a Contestação.
26. Manifestaram ainda as partes o seu acordo a que fosse proferida sentença sem mais produção de prova.
27. O Demandado pronunciou-se ainda quanto às diferenças salariais através de requerimento de 3 de Junho de 2022 e o Demandante, através de Requerimento de 5 de Junho de 2022, juntou ainda documento para prova das diferenças salariais (artigo 155º da PI, em que funda o pedido de declaração de inconstitucionalidade).
28. Através de Requerimentos de 11 e 12 de Julho de 2022 as Partes apresentaram Alegações.
I. FUNDAMENTAÇÃO
D) Dos Factos:
Considerando a prova produzida, resultaram provados os seguintes Factos:
29. A Autora A..., casada, residente na ..., n.º ..., ..., ..., ..., portadora do cartão do cidadão n.º ..., válido até 27-04-2028 e do NIF ... é oficial de registos, estando colocada na Conservatória dos Registos Civil e Predial de ....
30. Da nota biográfica junta (documento n.º 1 junto com a PI), resulta que:
a) Em Janeiro de 2000 a Autora foi nomeada a título provisório escriturária da Conservatória do Registo Civil de ..., lugar de que tomou posse em 17/04/2000, tendo-se convertido em definitiva em 17-04-2001
b) Em 2000 a Autora auferia pelo índice 150 do 1.º escalão.
c) Em Janeiro de 2003, foi nomeada escriturária da Conservatória dos Registos Civil e Predial de ..., lugar que aceitou em 10/03/2003.
d) Em Abril de 2003, por força de progressão na carreira (pelo decurso de 3 anos), passou a auferir pelo escalão 165, 2º escalão.
e) Em Abril de 2010 foi promovida à categoria de Escriturária Superior, passando a auferir pelo índice 190, 1º escalão.
f) A A. transitou para a carreira/categoria de oficial de registos, com efeitos reportados a 01.01.2018, passando a auferir vencimento pelo 2º escalão do índice 200,
g) A título de vencimento de categoria auferiu mensalmente os valores constantes do Doc. 1 junto à PI (que aqui se dão por integralmente reproduzidos).
h) Ainda, a título de participação emolumentar auferiu mensalmente os valores constantes da nota biográfica junta como Doc. 1 (que se dão aqui por integralmente reproduzidos).
i) A A obteve ainda a avaliação de desempenho que resulta da nota biográfica junta.
31. As diferenças remuneratórias dos oficiais de registo (ainda que com a mesma categoria e antiguidade), resultantes da participação emolumentar na conservatória e regime de origem (parte variável da remuneração), mantiveram-se desde o ano 2000 até à data presente.
32. Em 29/05/2000, o Gabinete de Gestão Financeira do Ministério da ... remeteu ao Diretor-Geral dos Registos e do Notariado, o ofício n.º ... (DOC 1 da Contestação), através do qual procedeu ao envio das tabelas de atualizações dos vencimentos e participações emolumentares dos Conservadores, notários e oficiais, e o qual foi remetido e divulgado a todos os serviços de registos e de notariado, nos termos do qual expressamente se refere: “Uma vez que as participações emolumentares dos Oficiais, de acordo com o n.º 4 do art. 61.º do Decreto-Lei n.º 519/F2/de 29 Dezembro são consideradas para todos os efeitos vencimento de exercício e as mesmas correspondem a 100% e 170% do valor do índice de cada funcionário, artigo 4.º e 5.º da Portaria 940/99, de 27 de outubro; somando o valor da atualização do vencimento de categoria e o de exercício verifica-se em todas as situações um aumento superior a 3.000$00, o mesmo acontecendo nas participações emolumentares variáveis. Pelo facto não se procedeu a alterações até ao índice 200, conjugados que foram o artigo 41.º do Decreto-Lei n.º 70-A/2000, de 5 de Maio, Portaria n.º 239/2000, de 29 de abril, e n.º 2 da Circular Série A, n.º 1271 de 17 de Abril da Direcção Geral do Orçamento.”
33. Em 2003, foi publicado no Boletim dos ... (...) n.º 10/2003, de novembro de 2003, pags. 3 e 4, o despacho n.º 20/2003 do então Diretor dos Registos e do Notariado (DOC 2 da junto com a contestação), nos termos do qual se divulgava o Despacho do Secretário de Estado da ..., proferido em 14 de Novembro de 2003, no qual se referia que "em relação ao ano de 2003, se decidiu não aplicar ao referido pessoal das carreiras dos oficiais dos registos e do notariado o disposto no n.° 1 do art.° 41.° do DL 5412003, de 28/3, que aprovou a revalorização indiciária, até ao índice 325, incluído" —cfr. DOC. 2.
34. Em novembro de 2004, foi publicada no ... n.º 10/2004, pags. 4 e 5, a Informação da Direção de Serviços de Recursos Humanos (DOC 3 junto com a contestação) da qual resultava que "no ano de 2004, apenas beneficiam da atualização salarial de 2%, aqueles funcionários cuja remuneração, correspondente à soma do valor dos seus vencimentos de categoria e de exercício, seja igual ou inferior a €1024,00
35. A deliberação do Conselho Diretivo do Demandado de 20/01/2020 ( Doc. 4 junto com a Contestação) que aprovou a lista nominativa de transições para as novas carreiras especiais de conservador de registos e de oficial de registos, estabelecidas de acordo com o DL n.º 115/2018, de 21/12, incluindo para as respetivas novas tabelas remuneratórias previstas nos anexos I, II e III do DL n.º 145/2019, de 23/09), é conhecido da Demandante desde 29 de janeiro de 2020 – data em que recebeu e-mail com esta informação sobre o seu reposicionamento remuneratório à luz das novas tabelas.
36. A Autora passou a auferir mensalmente o valor de €1.377,84, que se situa entre o nível 15 e 19 e entre a posição 1 e 2 da tabela remuneratória única, prevista no anexo II ao referenciado DL n.° 145/2019 (DOC. 5 junto com a Contestação).
37. Na sequência da aprovação da Lei n.° 53-Al2006, de 29 de dezembro (LOE para 2007, cujo art.° 133° extinguiu o Cofre dos Conservadores, Notários e Funcionários da Justiça e por força do determinado no n.° 2 do art.° 17.° do Decreto-Lei n.° 129/2007, de 27/04, que determinou que: "Até à implementação do plano de contas (…), a liquidação e o processamento das remunerações do pessoal dos serviços de registo ficam a cargo desses serviços e o seu pagamento fica a cargo dos serviços centrais do B..., IP.
38. Os Factos provados (linha 30 e 31) resultaram do acordo expresso das partes e requerimento conjunto apresentado nesse sentido, bem como dos Documentos juntos com a PI. Quanto ao facto 32, mais do que do documento junto pela A. para o demonstrar, resulta da admissão do demandado no seu requerimento de 3 de Junho de 2022 e restante posição a esse respeito assumida nos restantes articulados, procurando justificar essas diferenças remuneratórias. Os Factos 33 a 37 resultam dos Documentos juntos pelo Demandado com a Contestação. O Facto 38 resulta da publicação do referido Diploma legal.
Factos não provados
39. Não se apurou em concreto o valor de emolumentos pessoais auferidos mensalmente ao longo da carreira. Não se entenderam relevantes para a decisão a proferir quaisquer outros factos.
E) Do Direito
Vejamos, em suma, o regime legal que enquadra a Decisão a proferir:
40. Consta no preambulo do Decreto-lei n.º 131/91 de 2 de abril (que apenas foi revogado pelo Decreto-Lei n.º 145/2019), que “as disposições estatutárias dos conservadores, notários e oficiais de registos, no atinente ao seu estatuto remuneratório, têm a particularidade de integrar duas componentes – o vencimento base, reportado ao antigo sistema de letras da função pública que, em articulação com os novos princípios salariais, se passará agora a referir a uma escala indiciária, e a componente variável – participação emolumentar, que é fixada de acordo com o rendimento produzido pela respetiva repartição. Consta ainda deste diploma, no seu artigo 1.º n.º 1 que “as escalas indiciárias relativas aos ordenados dos conservadores e notários e dos oficiais dos registos e do notariado constam, respetivamente, dos mapas I e II anexos ao presente diploma, do qual fazem parte integrante”. No n.º 2 do artigo 1.º consta que “as escalas salariais que constam do número anterior referenciam-se ao índice 100 da escala indiciária do regime geral e acompanham a atualização deste índice.”
41. No mapa II consta:
Designação
|
Escalões
|
|
1
|
2
|
3
|
4
|
5
|
6
|
Chefe seção dos registos centrais
|
305
|
315
|
325
|
335
|
350
|
-
|
Ajudante principal
|
305
|
315
|
325
|
335
|
350
|
-
|
Primeiro ajudante 1.º classe
|
255
|
265
|
280
|
290
|
305
|
-
|
Segundo ajudante 2.º classe
|
210
|
225
|
235
|
245
|
255
|
-
|
Escriturário superior
|
190
|
200
|
215
|
225
|
235
|
-
|
Escriturário
|
150
|
165
|
175
|
185
|
195
|
210
|
42. Por sua vez, de acordo com o Decreto-lei n.º 519-F2/1979 de 29 de dezembro a parte remuneratória dos oficiais de registo e notariado era composta por uma parte fixa que é o vencimento de categoria, mas também por participação emolumentar que era determinada pela aplicação de determinadas percentagens sobre a receita mensal líquida do serviço (art. 54.º) e por isso apurada mensalmente.
43. Acresciam ainda emolumentos pessoais (artigo 61º e Decreto n.º 55/80 de 8 de outubro, no seu art. 137.º n.º 1), correspondentes aos cobrados pela realização de atos de registo civil fora das repartições. Estes emolumentos pessoais tinham natureza de suplementos remuneratórios dos trabalhadores integrados nas carreiras da Autora e são verbas definidas nas tabelas do notariado e dos registos civil, predial, comercial, automóveis e navios, anexas à portaria n.º 996/98 de 25 de novembro que visam remunerar os trabalhadores pelo “estudo e preparação em função do grau de complexidade, bem como a realização dos atos fora das instalações do serviço ou fora das horas regulamentares” – art. 9.º n.º 1 do DL n.º 322-A/2001 de 14 de dezembro (com as alterações do DL n.º 194/2003 de 23-08, DL n.º 8/2007 de 17-01, DL n.º 324/2007 de 28-09, DL n.º 116/2008 de 04-07) e art. 63.º do DL n.º 519-F2/79 de 29-12.
44. No tocante à participação emolumentar, a Portaria n.º 940/99 aplicou limites ao cálculo da mesma, assim como determinou que deveria ser distribuída por todos os oficiais, na proporção dos respetivos vencimentos de categoria, sendo o cálculo feito mensalmente – art. 1.º, 2.º, 3.º, 8.º. Esse mesmo diploma determinou que, no mínimo, era assegurada uma participação emolumentar correspondente a 100% do vencimento de categoria do oficial de registo (art. 4.º). E que aos oficiais das Conservatórias de Registo Centrais e do Arquivo Central era assegurado, como mínimo, uma participação emolumentar igual ao respetivo vencimento de categoria acrescido de 70% (art. 5.º). No entanto, através da Portaria n.º 1448/2001 de 22/12, foi fixado transitoriamente para o ano de 2002 que a parte emolumentar passava a ser constituída pela média aritmética da participação emolumentar apurada de janeiro a outubro de 2001 (não sendo consideradas as faltas, licenças, destacamentos, requisições, substituições ou acumulações de funções, nem penas disciplinares que impliquem perda de remuneração) na conservatória onde os funcionários se encontrassem a exercer funções em tal período (dispondo ainda a Portaria quanto ao regime aplicável em caso de alteração da Conservatória ou outras alterações). A Portaria n.º 110/2003 de 29 de janeiromanteve em vigor, durante o ano de 2003, as regras sobre a determinação do vencimento da parte emolumentar dos oficiais de registo, previsto na Portaria n.º 1448/2001 de 22 de dezembro, determinando que as participações emolumentares calculadas de acordo com as regras deste diploma serão atualizadas de acordo com a taxa que vier a ser fixada para o índice 100 da escala indiciária do regime geral. A Portaria n.º 110/2004 de 29 de janeiro entrou em vigor a 1 de janeiro de 2004, e manteve integralmente o regime das duas portarias anteriores (Portaria n.º 1448/2001 e 110/2003). A Portaria n.º 768-A/2004 de 30 de junho estendeu os efeitos da Portaria n.º 110/2004 de 29 de janeiro de 1 de junho até 31 de dezembro de 2004. A Portaria n.º 52/2005 de 20 de janeiro estendeu os efeitos das Portarias anteriores de 1 de janeiro até 30 de abril de 2005 e a Portaria n.º 496/2005 de 31 de maio estendeu os seus efeitos a partir de 1 de maio de 2005. A Portaria n.º 40/2006 de 12 de janeiro estendeu os efeitos das Portarias anteriores a partir de 1 de janeiro de 2006, o mesmo acontecendo com a Portaria n.º 206/2007 de 15 de fevereiro que estendeu os efeitos das anteriores portarias a partir de 1 de janeiro de 2007; o mesmo aconteceu com a Portaria n.º 118/2008 que estendeu os efeitos desde 1 de janeiro de 2008; a Portaria n.º 92/2009 de 28 de janeiro estendeu os efeitos desde 1 de janeiro de 2009, a Portaria n.º 1459/2009 de 31 de dezembro estendeu os efeitos desde 1 de janeiro de 2010; a Portaria n.º 29/2011 de 11 de janeiro estendeu os efeitos desde 1 de janeiro de 2011.
45. Depois, a Lei Orçamento de Estado para 2014 (Lei n.º 83-C/2013 de 31 de dezembro) no seu artigo 34.º prorrogou as regras de determinação da parte emolumentar dos oficiais de registo fixadas na Portaria n.º 1448/2001 de 22 de dezembro; a Lei de Orçamento de Estado para 2015 (Lei n.º 82-B/2014 de 31 de dezembro) no seu art. 52.º n.º 2 prorroga as regras de determinação da parte emolumentar dos oficiais de registos fixadas na Portaria n.º 1448/2001 de 22 de dezembro e mantidas em vigor nos anos subsequentes; a Lei de Orçamento de Estado para 2017 (Lei n.º 7-A/2016 de 30 de março) no seu art. 24.º n.º 2 prorroga as regras de determinação da parte emolumentar dos oficiais de registos fixadas na Portaria n.º 1448/2001 de 22 de dezembro e mantidas em vigor nos anos subsequentes; a Lei Orçamento de Estado para 2017 (Lei n.º 42/2016 de 28 de dezembro) no seu art. 27.º prorroga as regras de determinação da parte emolumentar dos oficiais de registos fixadas na Portaria n.º 1448/2001 de 22 de dezembro e mantidas em vigor nos anos subsequentes; a Lei Orçamento de Estado para 2018 (Lei n.º 114/2017 de 29 de dezembro) no seu artigo 32.º n.º 3 prorroga as regras de determinação da parte emolumentar dos oficiais de registos fixadas na Portaria n.º 1448/2001 de 22 de dezembro e mantidas em vigor nos anos subsequentes, até à publicação da revisão do sistema remuneratório; a Lei Orçamento de Estado para 2019 (Lei n.º 71/2018 de 31 de dezembro) no seu art. 33.º n.º 1 prorrogou as regras de determinação da parte emolumentar dos oficiais de registos fixadas na Portaria n.º 1448/2001 de 22 de dezembro e mantidas em vigor nos anos subsequentes.
46. Em 21 de dezembro de 2018, foi publicado o Decreto-Lei n.º 115/2018, que estabeleceu o regime da carreira especial de oficial de registos, revendo assim as carreiras de ajudante e escriturário dos registos e notariado. De acordo com o mesmo diploma, transitaram para a carreira especial de oficial de registos, categoria de oficial de registos, os ajudantes principais, primeiros ajudantes e segundos ajudantes integrados nos quadros do registo civil e predial; transitaram igualmente para a mesma categoria os ajudantes principais, primeiros ajudantes e segundos ajudantes que na sequencia da privatização optaram pela integração em serviço do B..., IP, bem como aqueles que regressam ao serviço do B..., IP; transitam igualmente para a mesma categoria os atuais ajudantes principais, primeiros ajudantes e segundos ajudantes dos serviços de notariado não abrangidos pela privatização; transitam igualmente para a mesma categoria os atuais escriturários e escriturários superiores da carreira de escriturário dos registos e do notariado, assim como os escriturários e escriturários superiores que na sequencia da privatização do notariado, regressem ao serviço do B..., IP.
47. Nesse mesmo diploma previu-se que até à entrada em vigor do previsto no art. 6.º (a determinação do número de posições remuneratórias e a identificação dos respetivos níveis remuneratórios faz-se por diploma próprio, a aprovar) mantem-se em vigor a situação remuneratória dos trabalhadores que transitam para a carreira especial de oficial de registos (art. 43.º).
48. Em 23 de setembro de 2019, foi publicado o Decreto-Lei n.º 145/2019, que produziu efeitos a 1 de janeiro de 2020, que estabeleceu o regime remuneratório da carreira especial de oficial.
49. Das alterações promovidas pelo Decreto-Lei nº 145/2019, destacam-se: a concentração, num único diploma, do regime remuneratório; a atualização do conceito de remuneração base nestas carreiras, eliminando-se a divisão entre vencimento da categoria e vencimento de exercício, a determinação do número de posições remuneratórias e a identificação dos correspondentes níveis remuneratórios; a transição dos trabalhadores para a nova tabela retributiva garantindo o princípio do não retrocesso salarial. No que se refere à transição dos trabalhadores para a tabela remuneratória o regime remuneratório aplica os princípios fixados no artigo 41.º da Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, na sua redação atual, bem como no artigo 104.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, na sua redação atual, designadamente o da neutralidade orçamental na transição e o da sustentabilidade na evolução remuneratória das carreiras.
50. Deste diploma consta ainda que a remuneração base é o montante pecuniário correspondente ao nível remuneratório da posição remuneratória onde o trabalhador se encontra na carreira e/ou categoria de que é titular (art. 3.º). Consta ainda que na transição para a nova tabela remuneratória da carreira especial de oficial de registos (anexo II), os trabalhadores desta carreira são reposicionados na posição remuneratória da categoria de oficial de registos a que corresponde nível remuneratório cujo montante pecuniário seja equivalente à remuneração base a que têm direito na data de entrada em vigor do presente decreto-lei (1 de janeiro de 2020), mas não inferior ao da primeira posição remuneratória da carreira e categoria de oficial de registos (art. 10.º n.º 2). Acrescenta-se ainda no n.º 3 do art. 10.º que em caso de falta de identidade de nível remuneratório, os trabalhadores são reposicionados em posição remuneratória, automaticamente criada, de nível remuneratório não inferior ao da primeira posição da categoria para a qual transitam, de montante pecuniário equivalente à remuneração base a que têm direito na data de entrada em vigor do presente decreto-lei. Esclarece ainda este diploma no seu art. 10.º n.º 4 que a remuneração base a que se referem os números anteriores, é a que resulta da soma do vencimento de categoria e do vencimento de exercício a que os trabalhadores tenham direito, de acordo com o posto de trabalho de que são titulares na data de entrada em vigor do presente decreto-lei.
51. O anexo II prevê que na carreira de oficial de registos, na categoria de oficial de registos, há as seguintes posições remuneratórias e níveis remuneratórios da tabela única:
Posições remuneratórias
|
Níveis remuneratórios da tabela única
|
1
|
15 (€1.205,08)
|
2
|
19 (€1.411,67)
|
3
|
23 (€1.618,26)
|
4
|
27 (€1.824,84)
|
5
|
31 (€2.031,43)
|
6
|
35 (€2.238,01)
|
7
|
37 (€2.341,30)
|
8
|
39 (€2.444,60)
|
9
|
42 €2.599,54)
|
52. Resulta ainda claro que a Portaria 1448/2001, de 29 de dezembro, ao ficcionar um rendimento da conservatória não revogou as Portarias 940 e 942/99, apenas revogadas por este diploma (artigo 14º), mantendo-se assim até esta revogação, o mínimo de 100% da remuneração de categoria como remuneração de exercício.
E.1 Conhecimento de Excepções (ainda não conhecidas através de Despacho):
53. Porque se mostrava relevante para esta apreciação a fixação da matéria provada e indicação do regime legal aplicável, vejamos agora as excepções invocadas pela Demandada que se mostram apenas agora em condições de ser conhecidas.
54. Veio o Demandado (além da incompetência para conhecimento de
inconstitucionalidade supra decidida) invocar as excepções da intempestividade da instauração da presente acção (caducidade do direito de acção) e da impropriedade do meio processual, defendendo, quanto a estas, em suma, que o meio próprio seria a acção impugnatória, não podendo o A alcançar por via desta ação o efeito que apenas poderia resultar da impugnação de actos.
55. Para fundamentar tal alegação, quanto à actualização salarial peticionada, o Demandado invoca o Ofício n.º ..., de 29 de Maio de 2000, do Gabinete de Gestão-Financeira do Ministério da ..., remetido ao Director-Geral dos..., invoca também o Despacho n.º 20/2003 do Director-Geral dos..., devidamente publicado, invoca, por último, quanto à Transição para a nova Tabela Remuneratória, a deliberação do Conselho Directivo do B..., I.P., de 20 de Janeiro de 2020, onde se aprova o modo como é proposta a transição para a nova estrutura remuneratória comunicada à Autora através de e-mail.
56. Vejamos. Nos termos do n.º 1 do artigo 41.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), “Sem prejuízo do disposto na lei substantiva e no capítulo seguinte, a acção administrativa pode ser proposta a todo o tempo. Por sua vez, nos termos do artigo 148.º do Código do Procedimento Administrativo, “… consideram-se atos administrativos as decisões que, no exercício de poderes jurídico-administrativos, visem produzir efeitos jurídicos externos numa situação individual e concreta.” Sendo certo que resulta do artigo 38.º, n.º 2, do CPTA, que “não pode ser obtido por outros meios processuais o efeito que resultaria da anulação do ato impugnável.”
57. A redação anterior do citado n.º 2 do art. 38.º do CPTA era mais clara quanto à sua natureza de pressuposto processual, ao dizer que «a acção administrativa comum não pode ser utilizada para obter o efeito que resultaria da anulação do acto inimpugnável.». Mário Aroso de Almeida e Carlos Fernandes Cadilha (in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 4.ª edição, 2017, anot. ao art. 38.º do CPTA.) esclarecem sobre este aspeto, que «(…) A nova formulação decorrente da revisão de 2015, ao estatuir que "não pode ser obtido por outros meios processuais o efeito que resultaria da anulação do ato inimpugnável" explica-se pelo facto de ter sido eliminado o modelo dualista de formas de processo (…) Em todo o caso, o efeito útil da norma continua a ser o mesmo: destina-se a assegurar que a declaração de ilegalidade de um ato administrativo, a título incidental, não pode produzir o efeito de direito que apenas poderia ser obtido através de uma ação de impugnação desse ato. Pretende-se dizer, por conseguinte, que a anulação de um ato administrativo e a consequente eliminação da ordem jurídica não pode ser alcançada por um outro meio processual que não seja diretamente dirigido à impugnação contenciosa do ato e que não cumpra os pressupostos processuais próprios do processo impugnatório, mormente no tocante à tempestividade da propositura das ações de anulação (…)».
58. Recorrendo ainda às doutas palavras dos autores Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, “A circunstância de não estar, em regra, sujeita a prazo a dedução de pretensões relacionadas com atos administrativos, desde que não sejam de impugnação desses atos, explica que possam ser deduzidos, em regra sem dependência de prazo, pedidos condenatórios (ou de simples apreciação) respeitantes a situações constituídas por atos administrativos inimpugnáveis, desde que essas pretensões não visem obter a eliminação dos efeitos jurídicos dos atos em causa, mas a tutela de direitos ou interesses jurídicos afetados pelo desenvolvimento da situação jurídica constituída ao abrigo desses atos.” (in AROSO DE ALMEIDA, Mário, e FERNANDES CADILHA, Carlos Alberto - Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 4ª edição. Coimbra: Almedina, 2017, p. 284).
59. E resulta do artigo 51º nº 1 do CPTA: “Ainda que não ponham termo a um procedimento, são impugnáveis todas as decisões que, no exercício de poderes jurídico-administrativos, visem produzir efeitos jurídicos externos numa situação individual e concreta, incluindo as proferidas por autoridades não integradas na Administração Pública e por entidades privadas que atuem no exercício de poderes jurídico-administrativos.
60. Ora os referidos Ofícios e Despacho, são actos internos, não notificados ao Demandante e que não tinham por objecto produzir efeitos na sua situação individual e concreta. Ou seja, os actos impugnáveis são actos com eficácia externa, isto é, são aqueles que produzem efeitos jurídicos no âmbito das relações entre a Administração e os particulares, o que leva a excluir do conceito, desde logo, os actos internos, que se inscrevem no âmbito das relações inter-orgânicas ou das relações de hierarquia e que apenas indirectamente se poderão reflectir no ordenamento jurídico geral. Dos actos alegados pelo Demandado, constata-se que nenhum deles produz efeitos jurídicos externos numa situação individual e concreta, como tal não têm, não podem ter, a capacidade de fazer caducar qualquer direito do Demandante, improcedendo a excepção deduzida quanto às peticionadas actualizações salariais.
61. O mesmo se diga quanto a cada acto processador de vencimento, não sendo estes actos administrativos na medida em que não se verifica o duplo pressuposto exigido pela Doutrina e Jurisprudência. Neste sentido AC. TCAN de 18.12.2020 in www.dgsi.pt: I – A teoria dos atos processadores de vencimentos ou abonos como atos administrativos está subordinada a um duplo pressuposto: (i) que o ato consubstancie uma definição voluntária da Administração de uma situação jurídica unilateral e que, (ii) essa decisão seja comunicada de forma adequada de modo a permitir uma eficaz comunicação II- A falha na demonstração de tais requisitos conduz à conclusão que os atos de processamentos de vencimentos são inoponíveis ao Autor para efeitos impugnatórios.
62. Vejamos agora a mesma excepção de caducidade do direito de acção ao abrigo do artigo 38º nº 2 do CPTA, tendo por base a Deliberação do Conselho Directivo e o mail enviado à Autora, com a nova posição remuneratória.
63. A este propósito extrai-se das considerações em torno do conceito de acto administrativo impugnável de Mário Aroso de Almeida, em Estudos em Homenagem ao Professor Marcello Caetano, Vol. II, a propósito do art. 51º do CPTA:“ (…) A nosso ver, uma parte significativa dos actos que, tradicionalmente, não eram tidos, deste modo, como impugnáveis por carecerem de definitividade material, deve, hoje, entender-se que não são impugnáveis porque se encontram, desde logo, excluídos do próprio conceito de acto administrativo que resulta do artigo 120.º do CPA, na medida em que, como vimos, nele se faz apelo expresso ao conceito de decisão — elemento que, em bom rigor, se encontrava, a nosso ver, ínsito na definitividade material do acto administrativo, que supunha, quanto a nós, o conteúdo decisório do acto. Para que um acto jurídico defina situações jurídicas, é, na verdade, condição necessária, embora não suficiente, que ele possua um conteúdo decisório, não se esgotando na emissão de uma declaração de ciência, um juízo de valor ou uma opinião ( ). O acto materialmente definitivo exprimia, portanto, uma resolução que determinava o rumo de acontecimentos ou o sentido de condutas a adoptar. O acto materialmente definitivo continha, portanto, uma decisão. (...).
64. Ora, como se viu o artigo 148º do CPA e o artigo 51º do CPTA exigem, ambos, uma decisão para que se possa falar de acto administrativo impugnável. Daqui resulta que os despachos de actos que informam, certificam ou mandam certificar situações jurídicas, na medida em que os mesmos apenas encerrem meras declarações de ciência, transcrição ou reprodução da Lei ou do conteúdo de documentos ou a comprovação de factos ou situações jurídicas estabelecidas não são inovatórios e, por isso, não têm o conteúdo decisório que se exige para a sua impugnabilidade.
65. A transição para a nova tabela remuneratória resultou nas normas supra referidas, não deixando qualquer margem de decisão à Administração nem carecendo de qualquer acto para se tornar exigível pelo Demandado. Assim, as disposições legais que constituem a causa de pedir não reclamavam da Administração a prática de qualquer acto administrativo, tal como não a habilitavam à sua prática. Deste modo, sempre teria de entender-se que a sua prática, desprovida de qualquer base legal, não poderia ter por efeito conduzir à caducidade do direito de acção, por parte do Demandante.
66. Assim, o que está em causa nestes pedidos é a “existência de uma anterior norma legal onde radica esse direito a reconhecer, ou seja, de uma norma que, desde que verificados determinados pressupostos ou requisitos, projecta directamente na esfera jurídica do destinatário o direito que pretende seja reconhecido” (Acórdão do STA de 31 de Maio de 2005, proferido no processo n.º 078/04, disponível em www.dgsi.pt).
67. Por estes motivos não está em causa a impugnação de actos administrativos, mas apenas o reconhecimento de situações jurídicas subjectivas decorrentes de normas jurídico-administrativas nos termos da alínea f) do n.º 1 do artigo 37.º do CPTA. Nestes termos considera-se improcedente a invocada excepção da intempestividade da instauração da presente acção.
E. 2 Inconstitucionalidade da Norma
68. Entende-se adequado conhecer desde já da invocada inconstitucionalidade na medida em que, da declaração desta, resultaria a inutilidade da análise das consequências da transição para a nova tabela remuneratória.
69. A Demandante formula pedido no sentido de ser afastada a aplicação dos n.ºs 1 e 4 do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 145/2019, de 23 de Setembro, “por inconstitucionalidade na interpretação de acordo com a qual para apuramento do vencimento base será considerado o vencimento de exercício calculado com base na Portaria n.º 1448/2001 e suas sucessivas renovações”, porque violadora do princípio da igualdade ao atribuir remunerações diferentes para categorias iguais, devendo ser repristinado o Decreto-Lei n.º 519-F2/1979 de 29 de dezembro e o disposto na Portaria n.º 940/99, de acordo com os quais se fixa a forma de calculo do vencimento de exercício a que os oficiais de registo tinham direito á data da entrada em vigor do DL 115/2018 (diploma que criou o regime da carreira especial dos oficiais de registo) e, com base nisso, calcular o vencimento médio nacional de um escriturário superior no 2.º escalão e aplicá-lo à Autora com consequente alteração da sua posição remuneratória; caso isso não seja exequível, aplicar á Autora o vencimento médio nacional de um escriturário superior no 2.º escalão á data da entrada em vigor do DL 115/2018, com consequente alteração da sua posição remuneratória.
70. Ora, só da análise da formulação do pedido de declaração de inconstitucionalidade resulta a complexidade da matéria, que mereceu em 2.2.2022 pronúncia da Provedoria de Justiça, suscitando junto de SE a Secretária de Estado da ... a implementação de nova solução normativa destinada a eliminar o tratamento desigual resultante do diploma em apreciação.
71. Importa esclarecer assim que a Demandante faz apelo à figura de ordenados médios porque, naturalmente, entendeu que não basta no caso declarar a inconstitucionalidade da norma e fazer regressar o regime anterior uma vez que o regime anterior fazia depender a remuneração de exercício, sendo esta variável, dos resultados da Conservatória, o que, com o desaparecimento da competência territorial e a transição para os registos on-line veio a perder relevo.
72. Diga-se que o Tribunal Constitucional tem entendido que a denominada repristinação das normas revogadas por norma declarada inconstitucional ocorre também nos casos de fiscalização concreta de constitucionalidade, como pode ver-se pelos seguintes acórdãos:
– n.º 490/89, de 13-7-1989, proferido no recurso n.º 49/88, publicado no Boletim do Ministério da ... n.º 389, página 604, e em Acórdãos do Tribunal Constitucional volume 14, página 197;
73.
– n.º 175/90, de 5-6-90, proferido no processo n.º 118/89, publicado no Boletim do Ministério da ... n.º398, página 51. ).
74. Assim, fora de casos excepcionais em que outros valores constitucionais possam impor uma limitação dos efeitos da decisão de inconstitucionalidade (como se prevê, para os casos de fiscalização abstracta nos n.ºs 3 e 4 do art. 282.º), deverá entender-se que o afastamento da aplicação de normas com fundamento em inconstitucionalidade tem como corolário a aplicabilidade do regime que essas normas tenham revogado.
75. Assim, à luz de um critério de evidência, a modificação legislativa que a Autora pretende deste Tribunal não é a declaração de inconstitucionalidade, fazendo regressar o regime anterior, cujo resultado seria a manutenção da alegada desigualdade. O que pretende a A. é antes uma reformulação do regime remuneratório com recurso a remunerações médias, o que, desde logo, teria como efeito necessário um aumento da despesa no ano económico em curso, por referência ao Orçamento aprovado e em execução, o que colocaria em causa o disposto no n.º 2 do artigo 167.º da Constituição. Mais, uma opção como esta releva do poder legislativo e não do poder jurisdicional, pelo que, adiante-se, este Tribunal acabaria por usurpar funções que não são suas. Antes de se avançar, vejamos então se as referidas normas são inconstitucionais, por violação do princípio da igualdade.
76. Resulta claro da leitura do preâmbulo supra transcrito que o Legislador procurou vários objetivos com este Diploma, o primeiro de assegurar a transição desta carreira especial para a tabela remuneratória única, o segundo de evitar o retrocesso salarial, o terceiro o da neutralidade orçamental na transição e o da sustentabilidade na evolução remuneratória das carreiras. Nesta medida, a transição para a tabela única foi feita somando-se a remuneração de categoria com a de exercício, passando o resultado do somatório a funcionar como remuneração base.
77. Ora, é na remuneração de exercício que a questão se coloca, isto pois, segundo a Demandante a diferença na remuneração de exercício dependia de um variável de resultado de cada conservatória que, desde 2002, passou a ser um valor ficcionado, reportado a 2001, o que, considerando o regime legal supra referido e prova produzida, corresponde, no essencial, à verdade. Nos últimos 20 anos os oficiais de registo receberam assim uma componente da sua retribuição, a parte variável, em função de uma resultado fixo de 2001 ou, de forma supletiva, quando inferior, de valor mínimo igual à sua remuneração base. Com o desligamento da remuneração de exercício do resultado, a cada ano, da conservatória, desapareceu o fundamento para remunerar de forma diferente categorias iguais. O que durou, o legislador assim o permitiu, durante 20 anos. Ou seja, não foi a transição que criou a inconstitucionalidade mas sim o anterior regime. Alega a Demandante que tal regime era extraordinário, transitório e temporário e que agora se transformou em definitivo. Tem razão, em parte. Isto pois, não cremos que 20 anos seja um período transitório e que o que tenha tornado esse regime definitivo tenha sido a norma que se consolidou, mas antes o princípio da Confiança que consolidou o regime. Cumpre esclarecer.
78. Poderia o legislador, com o fim da competência territorial, introdução dos registos on-line, alterações no regime de emolumentos, ter retirado ou alterado a parte variável da remuneração. Não o fez. É permitido ao empregador retirar ao trabalhador determinados complementos salariais se cessar, licitamente, a situação que serviu de fundamento à atribuição dos mesmos, sem que daí decorra a violação do princípio da irreversibilidade da retribuição”, vide Ac. do TRL, de 29.09.2010, processo n.º 252/08. Idem, Ac. do TRL, de 12.10.2005, processo n.º 4086/2005 (MARIA JOÃO ROMBA), Ac. do STJ, de 13.11.2002, processo n.º 02S2318 (AZAMBUJA FONSECA), Ac. do STJ, de 22.10.2008, processo n.º 07S3666 (MÁRIO PEREIRA). Note-se, em especial, o Ac. do TRP, de 11.07.2018, processo n.º 11939/16 (JERÓNIMO FREITAS), o qual considera que “Não estando submetidas ao princípio da irredutibilidade da retribuição, essas prestações retributivas apenas são devidas enquanto perdurar a situação em que assenta o seu fundamento, sendo permitido à entidade empregadora suprimi-las quando cesse a situação específica que esteve na base da sua atribuição”. Aliás, como evidencia o Ac. do STJ, de 01.04.2009, processo n.º 08S3051 (VASQUES DINIS), “a irredutibilidade da retribuição não significa que não possam diminuir-se ou extinguir-se certas prestações retributivas complementares, apenas sendo devidas enquanto persistirem as situações que lhes servem de fundamento, podendo a entidade empregadora suprimir as mesmas logo que cesse a situação específica que esteve na base da sua atribuição”. Ora, cessando o seu fundamento e, por conseguinte, cessando a prestação da atividade nos termos verificados, a retribuição poderia ter sido ser recondicionada. Não foi. Certo é que, podendo o legislador ter alterado essa componente variável, não o fez, permitindo a sua manutenção por 20 anos, o que, repita-se, nos parece demasiado tempo para que se fale em regime transitório.
79. Mais, é também certo que, apesar de inserido no título relativo aos direitos e deveres económicos, sociais e culturais, há muito que o Tribunal Constitucional considera o direito à retribuição como um direito fundamental de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias. Neste sentido, veja-se o Ac. do TC, n.º 396/2011: “(...) Direito fundamental, esse sim é o direito à retribuição e direito de natureza análoga aos direitos liberdades e garantias, como é pacífico na doutrina e este tribunal tem também afirmado”.
80. Por sua vez, o princípio da irredutibilidade de retribuição tem sido analisada pelo Tribunal Constitucional, especialmente no caso de trabalhadores da função pública, que tem os vencimentos determinados por legislação específica, tendo o TC, no seu ac. n.º 396/2011, emitido pronúncia no sentido de “não pode assim entender-se que a intocabilidade salarial é uma dimensão garantística contida no âmbito de protecção do direito à retribuição do trabalho ou que uma redução do quantum remuneratório traduza uma afectação ou restrição desse direito. Direito fundamental esse sim, é o direito à retribuição. Mas uma coisa é o direito à retribuição, outra, bem diferente, é o direito a um concreto montante dessa retribuição”.
81. Nesta medida, o Tribunal Constitucional tem modificado o entendimento sobre o alcance e tutela constitucional do princípio da irredutibilidade retributiva, sendo que as mais recentes decisões têm caminhado para o princípio da tutela da confiança. Cremos ser manifestamente o princípio que o legislador pretendeu tutelar quando se referiu ao não retrocesso salarial. Pretendeu o Legislador proteger a confiança que os funcionários colocaram num determinado recebimento de um valor durante 20 anos e com o qual tomaram as suas decisões de vida (compra de casa, escola dos filhos, viatura, etc.). Nesta medida, esta confiança depositada, num estado de direito, é merecedora de tutela.
82. Assim, em ordem a apurar a constitucionalidade das normas e regime, cremos que o confronto deverá fazer-se entre o princípio da igualdade e o princípio da proteção da confiança, ambos na sua dimensão retributiva. Vejamos.
83. O princípio da igualdade consignado no artigo 13 ° da C. R. P. determina que a situações de facto iguais sejam aplicadas decisões iguais e a situações diferentes decisões diferentes (cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional n° 7695. de 25.06.1997, in D. R. II série, n° 284, de 10.12.1997). No entanto, como se afirma no Ac. STA de 26.09.2007 - Rec. 1.187/06: “o princípio da igualdade traduz-se numa proibição do arbítrio, impondo, na consideração das suas dimensões igualizante e diferenciante, um tratamento igual de situações de facto iguais e um tratamento diverso de situações de facto diferentes". A obrigação de igualdade de tratamento exige que «aquilo que é igual seja tratado igualmente, de acordo com o critério da sua igualdade, e aquilo que é desigual seja tratado desigualmente, segundo o critério da sua desigualdade».
84. O princípio da igualdade, deve ser entendido como limite objectivo da discricionariedade legislativa, não vedando à lei a realização de distinções. Proíbe-Ihe, antes, a adopção de medidas que estabeleçam distinções discriminatórias, ou seja, desigualdades de tratamento materialmente infundadas, sem qualquer fundamento razoável (vernúnftiger grund) ou sem qualquer justificação objectiva e racional. Numa expressão sintética, o princípio da igualdade, enquanto princípio vinculativo da lei, traduz-se na ideia geral de proibição do arbítrio (willkúrverbot). Também o Tribunal Constitucional vem perfilhando a interpretação do princípio da igualdade como proibição do arbítrio. Afirma-se, com efeito, no Acórdão n.°39/88 (Diário da República, l Série, de 3 de Março de 1988): «O princípio da igualdade não proíbe, pois, que a lei estabeleça distinções. Proíbe, isso sim, o arbítrio, ou seja: proíbe as diferenciações de tratamento sem fundamento material bastante, que o mesmo é dizer sem qualquer justificação razoável, segundo critérios de valor objectivo, constitucionalmente relevantes.
85. Assim, como restrição de um direito a remuneração igual, deve a alteração em apreciação passar no crivo do princípio da proporcionalidade decorrente do nº 2 do artigo 18º da Constituição, encontrando-se uma justificação suficiente para a limitação, ponderando-se se esta é referenciável à garantia de um outro direito, também ele dotado de tutela constitucional, e se a mesma se afigura como adequada à estrutura de ambos os direitos em confronto. Intrinsecamente relacionado com o princípio da igualdade está o princípio da proporcionalidade (art. 5°, n° 2 do CPA e 266°, n° 2 da CRP), também designado como da proibição do excesso, e que constitui igualmente um limite interno da discricionariedade administrativa, à luz do qual a Administração deve prosseguir a sua actividade de realização do interesse público pelos meios menos onerosos e que imponham menos sacrifícios aos administrados, ou seja, deve actuar "de forma idónea, apropriada e ajustada à situação que tem pela frente... sem escusados excessos, sem desnecessário gravame aos interesses das pessoas que com ela estão em relação, sem o que seria intolerável, arbitrária e demasiado opressiva.”
86. Nessa medida, entende este Tribunal que é nesse confronto entre igualdade e proteção da confiança que se deve fazer o teste da proporcionalidade, uma vez que que a irredutibilidade não é em si mesma direito fundamental (apenas o direito a retribuição o é) mas apenas assume esse valor ao abrigo do princípio da proteção da confiança. Vejamos então se a restrição ao princípio da igualdade se justifica.
87. Em primeiro lugar, como se referiu antes, não é a presente Lei que coloca em causa o princípio da igualdade, este ficou colocado em causa durante 20 anos, quando desapareceu a razão e motivo para pagamento de remuneração de exercício diferente. Ou seja, o que a presente Lei faz é manter, porque necessária, ou talvez melhor, proteger, uma remuneração que dura há 20 anos, mesmo após o seu fundamento ter desaparecido. Nesta medida, cremos que seria inaceitável, passados 20 anos, vir reduzir a remuneração de exercício uma vez que tal não aconteceu quando o motivo desapareceu, criando-se assim a expectativa legítima e merecedora de tutela de que a remuneração não seria reduzida (remuneração, repita-se, com a qual as os trabalhadores vivem há 20 anos e com a qual construíram o seu nível de vida, compraram, carro, casa, pagam impostos e os estudos dos seus filhos ou apoiam os seus idosos). Nesta medida a restrição do princípio da igualdade, ou a continuação da sua restrição, mostra-se necessária e adequada para manter a proteção da confiança dos trabalhadores que há 20 anos a recebem, mesmo depois de ter findado o motivo que a justificava. Por outro lado, não se vê como seria possível proteger a confiança sem restringir ou sacrificar a igualdade. Não seria sustentável para as contas públicas, tal como ponderado pelo legislador, nivelar todos os trabalhadores pela remuneração mais elevada, mesmo a remuneração média teria impactos relevantes, por outro lado, criar uma remuneração média e um suplemento especial de não redutibilidade ou de proteção da confiança, a atribuir apenas a alguns, não eliminaria a desigualdade, pagando-se apenas em formato de suplemento que desapareceria um dia. Assim, não se vê como proteger a confiança sem a (manutenção da) restrição da igualdade. Por fim, não se vê que seja excessiva a manutenção de remunerações diferentes, desde logo porque o que se faz é manter a situação tal como estava, nada de novo se criando, por outro lado a igualdade é parcialmente assegurada com a integração da remuneração de exercício de todos os trabalhadores na sua remuneração única, mantendo igual o que era igual e diferente o que há vinte anos era diferente e que, por esse motivo, para tutela de quem em tal confiou, se justifica manter-se sem que tal elimine a igualdade em absoluto, basta ver que a situação futura ficará igual ao que foi nos últimos 20 anos, sendo de acreditar que quem recebia mais tinha confiança na sua manutenção e, quem recebia menos, não poderia esperar vir a receber o mesmo que os que mantinham há 20 anos remunerações variáveis com origem em determinada colocação.
88. Pelos motivos expostos, entende-se não se verificar a invocada Inconstitucionalidade, motivo pelo qual se aplicarão as normas em apreciação.
E.3 Diferenças Remuneratórias
89. Aqui chegados, considerando a factualidade provada, vejamos então as restantes questões a decidir e que se reconduzem, em suma, a saber se as actualizações salariais (actualização de índice 100 e alteração de índices) e invocadas pela Demandante são devidas e a actual posição em que tal deixa a Autora na nova Tabela Remuneratória Única. Por sua vez entende a Demandada que atentas as características especiais da Carreira dos Oficiais de Registo, nomeadamente a existência de remuneração de categoria e de exercícios (o que na prática duplica a remuneração base), tais actualizações não se aplicam a esta carreira.
90. Ora, verificado que os diplomas aplicáveis à Carreira ( supra 41 e 45) ordenavam a aplicação da actualização do índice 100 à remuneração de categoria e exercício e que os diplomas que procederam à actualização do índice 100 ( Por exemplo a Portaria n.o 239/2000, de 29 de Abril) não excluíram esta carreira, bem como as normas que procederam à revalorização dos índices (artigo 41º do DLEO para o ano 2000) não excluíram este regime, não se vê como é possível a interpretação feita pelo Demandado, sem que tal resulte de um total afastamento do teor dos sucessivos textos normativos, o que não é admissível ao intérprete ( artigo 9º nº 2 e 3 do Código Civil).
91. Assim, a actualização do índice 100 aplica-se à remuneração de categoria e de exercício e a revalorização dos índices tem igualmente efeito nas duas componentes sempre que a remuneração de exercício corresponda, no mínimo, à remuneração de categoria.
92. Já no caso em que a remuneração de exercício tenha sido fixada em valor superior à remuneração de categoria (por efeito da Portaria n.º 940/99 e da Portaria n.º 1448/2001) a Portaria n.º 110/2003, de 29 de janeiro, veio determinar que as participações emolumentares, assim calculadas, serão atualizadas de acordo com a taxa que vier a ser fixada para o índice 100 da escala indiciária do regime geral.
93. No mesmo sentido a Circular Série A nº 1271 e as tabelas remuneratórias actualizadas ao longo dos anos de acordo com o entendimento da DGAEP.
94. Assim, importa apurar o regime legal que determinou ao longo dos anos a actualização do índice 100 e a revalorização dos índices e sua aplicação à carreira em apreciação. De acordo com a Portaria n.º 239/2000 de 29 de abril, com efeitos a 1 de janeiro de 2000, o índice 100 foi fixado em 58.383$00 ou seja, €291,21 e a tabela de vencimentos era a seguinte:
Designação
|
Escalões
|
|
1
|
2
|
3
|
4
|
5
|
6
|
Chefe seção dos registos centrais
|
305
|
315
|
325
|
335
|
350
|
-
|
Ajudante principal
|
305 (178.100$00)
|
315 (184.000$00)
|
325 (189.800$00)
|
335 (195.600$00)
|
350 (204.400$00)
|
-
|
Primeiro ajudante 1.º classe
|
255 (148.900$00)
|
265 (154.800$00)
|
280 (163.500$00)
|
290 (169.400$00)
|
305 (178.100$00)
|
-
|
Segundo ajudante 2.º classe
|
210 (122.700$00)
|
225 (131.400$00)
|
235 (137.200$00)
|
245 (143.100$00)
|
255 (148.900$00)
|
-
|
Escriturário superior
|
190 (111.000$00)
|
200 (116.800$00)
|
215 (125.600$00)
|
225 (131.400$00)
|
235 (137.200$00)
|
-
|
Escriturário
|
150 (87.600$00)
|
165 (96.500$00)
|
175
(102.200$00)
|
185 (108.100$00)
|
195 (113.900$00)
|
210 (122-700$00)
|
95. Por sua vez, o art. 41.º do DL n.º 70-A/2000 de 5 de maio, prevê que aos escalões da escala salarial das carreiras do regime geral e de regime especial a que correspondem os índices constantes da coluna I, passam, a partir de 01-01-2000, a corresponder os índices constantes da coluna 2:
Coluna 1
|
Coluna 2
|
110
|
113
|
115
|
118
|
120
|
123
|
125
|
127
|
130
|
132
|
135
|
137
|
140
|
142
|
145
|
147
|
150
|
152
|
155
|
157
|
160
|
162
|
165
|
166
|
170
|
171
|
175
|
176
|
180
|
181
|
185
|
186
|
190
|
191
|
195
|
196
|
200
|
201
|
96. Pelo que, em face disto, a tabela de vencimentos aplicável foi alterada, ou seja:
Designação
|
Escalões
|
|
1
|
2
|
3
|
4
|
5
|
6
|
Chefe seção dos registos centrais
|
305
|
315
|
325
|
335
|
350
|
-
|
Ajudante principal
|
305
|
315
|
325
|
335
|
350
|
-
|
Primeiro ajudante 1.º classe
|
255
|
265
|
280
|
290
|
305
|
-
|
Segundo ajudante 2.º classe
|
210
|
225
|
235
|
245
|
255
|
-
|
Escriturário superior
|
191
|
201
|
215
|
225
|
235
|
-
|
Escriturário
|
152
|
166
|
176
|
186
|
196
|
210
|
97. Por sua vez, em 2001, o índice 100 foi fixado em 60.549$00, ou seja, €302,02 (Portaria n.º 80/2001 de 8 de fevereiro) com efeitos a partir de 01-01-2001.
98. E, de acordo com o previsto no art. 49.º do DL 77/2001 de 5 de março, com efeitos a partir de 01-01-2001, aos escalões da escala salarial das carreiras do regime geral e do regime especial a que correspondem os índices constantes da coluna 1, passaram a corresponder os índices constantes da coluna 2, conforme quadro abaixo:
Coluna 1
|
Coluna 2
|
113
|
116
|
118
|
120
|
123
|
125
|
127
|
129
|
132
|
134
|
137
|
139
|
142
|
144
|
147
|
148
|
152
|
153
|
157
|
158
|
162
|
163
|
166
|
167
|
171
|
172
|
205
|
206
|
99. Pelo que a tabela de vencimentos foi alterada, ou seja:
Designação
|
Escalões
|
|
1
|
2
|
3
|
4
|
5
|
6
|
Chefe seção dos registos centrais
|
305
|
315
|
325
|
335
|
350
|
-
|
Ajudante principal
|
305
|
315
|
325
|
335
|
350
|
-
|
Primeiro ajudante 1.º classe
|
255
|
265
|
280
|
290
|
305
|
-
|
Segundo ajudante 2.º classe
|
210
|
225
|
235
|
245
|
255
|
-
|
Escriturário superior
|
191
|
201
|
215
|
225
|
235
|
-
|
Escriturário
|
153
|
167
|
176
|
186
|
196
|
210
|
100.Em 2002 o índice foi atualizado para €310,33 (Portaria n.º 88/2002 de 28 de janeiro), com efeitos a partir de 01-01-2002.
101.E houve atualização de índices, de acordo com ao art. 41.º do DL n.º 23/2002 de 1 de fevereiro, com efeitos a partir de 01-01-2002 (aos escalões da escala salarial das carreiras do regime geral e do regime especial a que correspondem os índices constantes da coluna 1 passam a corresponder os índices constantes da coluna 2), conforme quadro abaixo:
Coluna 1
|
Coluna 2
|
116
|
119
|
120
|
123
|
125
|
128
|
129
|
132
|
134
|
137
|
139
|
141
|
144
|
146
|
148
|
150
|
153
|
155
|
158
|
160
|
163
|
165
|
167
|
169
|
172
|
174
|
176
|
177
|
181
|
182
|
186
|
187
|
191
|
192
|
196
|
197
|
201
|
202
|
206
|
207
|
210
|
211
|
102.Pelo que a tabela de vencimentos aplicável foi alterada, ou seja:
Designação
|
Escalões
|
|
1
|
2
|
3
|
4
|
5
|
6
|
Chefe seção dos registos centrais
|
305
|
315
|
325
|
335
|
350
|
-
|
Ajudante principal
|
305
|
315
|
325
|
335
|
350
|
-
|
Primeiro ajudante 1.º classe
|
255
|
265
|
280
|
290
|
305
|
-
|
Segundo ajudante 2.º classe
|
211
|
225
|
235
|
245
|
255
|
-
|
Escriturário superior
|
192
|
202
|
215
|
225
|
235
|
-
|
Escriturário
|
155
|
169
|
177
|
187
|
197
|
211
|
103.Em 2003, o índice manteve-se (Portaria n.º 303/2003 de 14 de abril). Mas houve atualização de índices, de acordo com ao art. 41.º do DL n.º 54/2003 de 28 de março, com efeitos a partir de 01-01-2003 (aos escalões da escala salarial das carreiras do regime geral e do regime especial a que correspondem os índices constantes da coluna 1 passam a corresponder os índices constantes da coluna 2), conforme quadro abaixo:
Coluna 1
|
Coluna 2
|
325
|
330
|
320
|
325
|
315
|
320
|
310
|
315
|
305
|
310
|
300
|
305
|
295
|
299
|
290
|
294
|
285
|
289
|
280
|
284
|
275
|
279
|
270
|
274
|
265
|
269
|
260
|
264
|
255
|
259
|
250
|
254
|
245
|
249
|
240
|
244
|
236
|
240
|
235
|
239
|
230
|
233
|
225
|
228
|
220
|
223
|
215
|
218
|
211
|
214
|
207
|
210
|
202
|
205
|
200
|
203
|
197
|
200
|
195
|
198
|
192
|
195
|
190
|
193
|
187
|
190
|
185
|
188
|
182
|
185
|
180
|
183
|
177
|
180
|
175
|
178
|
174
|
177
|
169
|
172
|
165
|
167
|
160
|
162
|
155
|
157
|
150
|
152
|
146
|
148
|
141
|
143
|
137
|
139
|
132
|
134
|
128
|
130
|
123
|
125
|
119
|
121
|
104.Pelo que a tabela de vencimentos foi novamente alterada:
Designação
|
Escalões
|
|
1
|
2
|
3
|
4
|
5
|
6
|
Chefe seção dos registos centrais
|
310
|
320
|
330
|
335
|
350
|
-
|
Ajudante principal
|
310
|
320
|
330
|
335
|
350
|
-
|
Primeiro ajudante 1.º classe
|
259
|
269
|
284
|
294
|
310
|
-
|
Segundo ajudante 2.º classe
|
214
|
228
|
239
|
249
|
259
|
-
|
Escriturário superior
|
195
|
205
|
218
|
228
|
239
|
-
|
Escriturário
|
157
|
172
|
180
|
190
|
200
|
214
|
105.Em 2004, o índice 100 manteve-se (Portaria n.º 205/2004 de 3 de março).
106.Mas o art. 43.º do Decreto-Lei n.º 57/2004 de 19 de março previa que “aos escalões da escala salarial das carreiras do regime geral e de regime especial a que correspondem os índices constantes da coluna 1 do mapa 1 anexo ao presente diploma passam, a partir de 01-01-2004, a corresponder os índices constantes da coluna 2 do mesmo mapa”, conforme quadro infra:
Coluna 1
|
Coluna 2
|
330
|
337
|
325
|
332
|
320
|
326
|
315
|
321
|
310
|
316
|
305
|
311
|
299
|
305
|
294
|
300
|
289
|
295
|
284
|
290
|
279
|
285
|
274
|
280
|
269
|
274
|
264
|
269
|
259
|
264
|
254
|
259
|
249
|
254
|
244
|
249
|
240
|
245
|
239
|
244
|
233
|
238
|
229
|
234
|
228
|
233
|
224
|
229
|
223
|
228
|
219
|
223
|
218
|
222
|
215
|
219
|
214
|
218
|
211
|
215
|
210
|
214
|
206
|
210
|
205
|
209
|
203
|
207
|
200
|
204
|
198
|
202
|
195
|
199
|
193
|
197
|
190
|
194
|
188
|
192
|
185
|
189
|
183
|
187
|
180
|
184
|
178
|
182
|
177
|
181
|
172
|
175
|
170
|
173
|
167
|
170
|
162
|
165
|
157
|
160
|
152
|
155
|
148
|
151
|
143
|
146
|
139
|
142
|
134
|
137
|
130
|
133
|
125
|
128
|
121
|
123
|
107.Pelo que a tabela de vencimentos foi novamente alterada:
Designação
|
Escalões
|
|
1
|
2
|
3
|
4
|
5
|
6
|
Chefe seção dos registos centrais
|
316
|
326
|
337
|
335
|
350
|
-
|
Ajudante principal
|
316
|
326
|
337
|
335
|
350
|
-
|
Primeiro ajudante 1.º classe
|
264
|
274
|
290
|
300
|
316
|
-
|
Segundo ajudante 2.º classe
|
218
|
233
|
244
|
254
|
264
|
-
|
Escriturário superior
|
199
|
209
|
222
|
233
|
244
|
-
|
Escriturário
|
160
|
175
|
184
|
194
|
204
|
218
|
108.Em 2005, o índice 100 foi fixado em €317,16 (Portaria n.º 42-A/2005) com efeitos a 01-01-2005.Em 2006, o índice 100 foi fixado em €321,92 (Portaria n.º 229/2006 de 10 de março), com efeitos a 01-01-2006.Em 2007, o índice 100 foi fixado em €326,75 (Portaria n.º 88-A/2007 de 18 de janeiro), com efeitos a 01-01-2007.Em 2008, o índice 100 foi fixado em €333,61 (Portaria n.º 30-A/2008 de 10 de janeiro), com efeitos a 01-01-2008. Em 2009, o índice 100 foi fixado em €343,28 (Portaria n.º 1553-C/2008 de 31 e dezembro), com efeitos a 01-01-2009 (art. 2.º “nos termos da subalínea i) da alínea b) do art. 18.º da LOE para 2019 e dos n.º 3 e n.º 4 do art. 4.º do DL 353-A/89 de 16-10, os índices 100 de todas as escalas salariais são atualizados em 2,9%”).
109.Em 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2016, 2017 e 2018 o índice 100 manteve o mesmo valor.
110.Em 2019, foi aumentada, com o Decreto-Lei n.º 29/2019, a retribuição mínima na Administração Pública, produzindo dessa forma alterações na Tabela Única de Remunerações.
111.Em 2020 foi publicado o Decreto-lei n.º 10-B/2020, que produziu efeitos desde 01-01-2020, permitindo as seguintes atualizações na Tabela Única de Remunerações:
- base mínima remuneratória €645,07 (4.º nível)
- nível 5.º corresponde a €693,13
- acima do nível 5.º atualização de 0,3%
- entre €635,07 e €683,13 aumento de 10,00€
- entre €683,14 e €691,06 aumento de 0,3%
112.Em 2021, foi publicado o Decreto-Lei n.º 10/2021, que estabelece as seguintes atualizações na Tabela Única Remuneratória com efeitos a 01-01-2021:
- base mínima remuneratória €665,00
- aumento de €10,00 para as remunerações correspondentes aos níveis 5, 6 e 7 (até €791,91)
- aumento de €10,00 para as remunerações situada entre €645,07 e €791,91
- entre €791,92 e €801,90 passa para €801,91
113.Facilmente se compreende, pelo que resulta da fundamentação e regime aplicável, que, tendo o Demandado remunerado a Demandante, a título de categoria e exercício, por índice inferior àquele que era devido (remunerações provadas em 31 g) e h) versus as aplicáveis constantes de 95 a 115), naturalmente são devidas a este as diferenças salariais correspondentes.
114. Assim, a título de remuneração de categoria:
a) em 2000: a Autora recebeu 87.600$00 (índice 150, posição 1), ou seja, €436,95, mas deveria ter recebido 88.768$00 (índice 152), ou seja €442,77. Assim, recebeu a menos (de abril a dezembro incluindo subsídio de férias e de natal) €5,82 x 11 meses =€64,02.
b) em 2001: a Autora, de Janeiro a Novembro, recebeu 90.900$00 (índice 150 posição 1) ou seja, €453,41 – em face da atualização do índice 100 –, mas deveria ter recebido €462,09 (porque o índice 152 passou para o índice 153). Recebeu a menos €8,68 x 13 meses, o que perfaz €112,84. Em Dezembro recebeu €453,03, pelo que recebeu a menos €9,06, o que totaliza €121,90.
c) em 2002: a Autora recebeu €465,50 (índice 150 posição 1) – em face do aumento do índice 100 –, mas deveria ter recebido €481,01 (índice 155). Recebeu a menos €15,51 x 14 meses, o que perfaz o valor de €217,14.
d) em 2003: em Janeiro e Abril a Autora recebeu €465,50; em Fevereiro recebeu €139,65; em Março recebeu €325,85; de Maio a Dezembro recebeu €512,04. Nesse ano, o índice 155 atualizou para 157 pelo que deveria ter recebido €487,22. A partir de Abril, por força de progressão na carreira, a Autora passou a auferir €512,04 pelo índice 165, 2º escalão. Todavia, nesse ano o índice 165 passou para 167, pelo que deveria ter recebido €518,25. Pelo que recebeu menos: Janeiro e Abril: recebeu menos €21,72 x 2 meses= €43,44; Fevereiro: €325,85; Março: €139,65;Maio a Dezembro: €6,21 multiplicada por 10(inclui subsidio de férias e de natal) = €62,10.Num total de €571,04.
e) em 2004, a Autora recebeu €512,04. No entanto, nesse ano, o índice 167 foi atualizado para 170. Pelo que deveria ter recebido €527,56. A diferença é de €15,52 multiplicada por 14 meses, perfaz o valor de €217,28.
f) em 2005, a Autora recebeu €512,04 em Janeiro. Em Fevereiro recebeu €534,58; em Março recebeu €551,23; e partir de Abril recebeu €523,31. Nesse ano, apenas o índice 100 foi atualizado. Pelo que a Autora teria direito a receber €539,17 (índice 170), pelo que a diferença é de: Janeiro: €27,13; Fevereiro: €4,59;Março: recebeu mais €12,06;Abril a Dezembro: €15,86, multiplicada por 11(inclui subsidio de férias e de natal), perfaz o valor de €174,46. Totalizando €218,24
g) em 2006, a Autora recebeu de Janeiro a Março o valor de €523,31; em Abril o valor de €554,75; em Maio e Junho o valor de €513,46 e de €513,17; o valor de €531,17 de Julho a Outubro e Dezembro; e o valor de €495,76 em Novembro. Nesse ano, apenas o índice 100 foi atualizado para €321,92. Pelo que a Autora teria direito a receber €547,26 (índice 170). Mas como anteriormente estava mal calculado, a diferença é de: Janeiro a Março: €23,95 x 3 meses = €71,85; Abril: recebeu a mais €7,49; Maio e Junho: €33,80 + €34,09 + €33,80 (subsidio de férias) =€101,40;Julho a Outubro e Dezembro: €16,09 x 6 meses (incluindo subsídio de natal) = €96,54;Novembro: €51,50,O que perfaz o valor total de €313,80.
h) em 2007, a Autora recebeu €539,14. Nesse ano, apenas o índice 100 foi atualizado para €326,75. Assim, a Autora tinha direito a receber €555,48 (índice 170), pelo que a diferença é de €16,34, multiplicada por 14 meses, perfaz o valor de €228,76.
i) em 2008, a Autora recebeu €550,46. Nesse ano, apenas o índice 100 foi atualizado para €333,61. Pelo que a Autora tinha direito a receber €567,14 (índice 170), sendo a diferença de €16,68. Isso multiplicado por 14 meses perfaz o valor de €233,52.
j) em 2009, a Autora recebeu €566,41. Nesse ano, apenas o índice 100 foi atualizado para €343,28. Pelo que a Autora tinha direito a receber €583,58 (índice 170) pelo que a diferença é de €17,17, multiplicada por 14 meses, perfaz o valor de €240,38.em 2010, de Janeiro a Março, a Autora recebeu €566,41. Mas devia receber €583,58 (índice 170), pelo que recebeu menos €17,17 x 3 meses = €51,51.Em Abril, a Autora foi promovida à categoria de escriturário superior (índice 190, escalão 1) e passou a receber €652,23. Todavia, aquele índice, por força das atualizações verificadas, correspondia à data, ao índice 199, com o valor de €683,13. Assim, a diferença é de €30,90, x 11 meses, o que perfaz o valor de €339,90, Num total de€391,41
k) entre 2011 e 2017, a Autora auferiu €652,23 (escalão 190). Nesse ano, não houve atualização do índice 100. No entanto, o escalão pelo qual a Autora deveria ver a sua remuneração calculada era pelo índice 199, ou seja, no valor de €683,13, pelo que a diferença mensal é de €30,90 (€683,13 - €652,23). Assim: (€30,90 x 14 meses) = 432,60 x 7 anos = €3.028,20
l) em 2018, a Autora transitou para a carreira/categoria de oficial de registos, por via legislativa, mas continuou a receber pela mesma tabela remuneratória anteriormente mencionada. E fruto do tempo decorrido, passou a auferiu o vencimento pelo escalão 2, índice 200, recebendo €669,39. No entanto, o índice 200 tinha passado a corresponder ao índice 209 a que correspondia o valor de €717,46. Pelo que a Autora tinha direito às diferenças de vencimento, no valor de €48,07 x 14 meses= €672,98.
m) em 2019, de Janeiro a Novembro a Autora auferiu €677,98/mês. A partir de Dezembro passou a auferir €686,56. No entanto, o escalão da Autora correspondia a €717,46 (índice 209). Pelo que a Autora tem direito às diferenças de vencimento, no valor de €513,24 (diferença mensal de €39,48 x 13 meses) e de €31,42 (no tocante à diferença do mês de Dezembro). Num total de €544,66 (€513,24 + €31,42).
115.Tudo somado, a título de remuneração de categoria, tem a Demandante a receber um total de €7.063,33.
116.Ora, tendo em conta que o vencimento de categoria foi incorretamente calculado, nos termos supra, e face ao disposto na lei, tal teve consequências ao nível do vencimento de exercício a que a Autora tinha direito. Assim,
a) em 2000: a Autora recebeu 87.600$00 (índice 150, posição 1), ou seja, €436,95, mas deveria ter recebido 88.768$00 (índice 152), ou seja €442,77. Assim, recebeu a menos €5,82 x 11 meses =€64,02.
b) em 2001: a Autora, recebeu 90.900$00 (índice 150 posição 1) ou seja, €453,41, à exceção dos meses de Agosto em que recebeu 81.720$00 (€407,62) e de Dezembro em que recebeu €453,03. Em face da atualização do índice 100 deveria ter recebido €462,09 (porque o índice 152 passou para o índice 153). Recebeu a menos: Janeiro a Julho, Setembro a Novembro: €8,68 x 12 meses =€104,16;Agosto: €54,47;Dezembro: €9,06, o que totaliza €167,69.
c) em 2002: em Janeiro a Autora recebeu €453,03; de Fevereiro a Outubro e Dezembro recebeu €465,50; e em Novembro recebeu €449,98 (índice 150 posição 1) – em face do aumento do índice 100 –, mas deveria ter recebido €481,01 (índice 155). Recebeu a menos: Janeiro: €27,98; Fevereiro a Outubro e Dezembro: €15,51 x 11 meses = €170,61, Novembro: €31, 03 x 2 = €62,06. O que perfaz o total de €260,65
d) em 2003: em Janeiro e Abril a Autora recebeu €465,50; em Fevereiro recebeu €139,65; em Março recebeu €325,85; em Maio recebeu €472,4; e Junho recebeu €484,18. Nesse ano, o índice 155 atualizou para 157 pelo que deveria ter recebido €487,22. A partir de Abril, por força de progressão na carreira, a Autora passou a auferir €512,04 pelo índice 165, 2º escalão. Todavia, nesse ano o índice 165 passou para 167, pelo que deveria ter recebido €518,25. Pelo que recebeu menos: Janeiro e Abril: recebeu menos €21,72 x 2 meses= €43,44; Fevereiro: €325,85; Março: €139,65; Maio: €45,83; Junho: €34,07. Num total de €588,84.
e) em 2004, em Fevereiro, a Autora recebeu €510,93. No entanto, nesse ano, o índice 167 foi atualizado para 170. Pelo que deveria ter recebido €527,56. A diferença é de €16,63.
f) em 2005, a Autora recebeu €528,55 em Janeiro. Em Outubro recebeu €504,17. Nesse ano, apenas o índice 100 foi atualizado. Pelo que a Autora teria direito a receber €539,17 (índice 170), pelo que a diferença é de: Janeiro: €10,62;Outubro: €35,00;Totalizando €45,62.
g) em 2006, a Autora recebeu de Janeiro a Março o valor de €540,18; em Maio recebeu €530,00; e em Novembro recebeu €511,73. Nesse ano, apenas o índice 100 foi atualizado para €321,92. Pelo que a Autora teria direito a receber €547,26 (índice 170). Mas como anteriormente estava mal calculado, a diferença é de: Janeiro a Março: €7,08 x 3 meses = €21,24; Maio: €17,26; Novembro: €35,53,Num total de €74,03.
h) em 2010, em Abril, a Autora foi promovida à categoria de escriturária superior (índice 190, escalão 1) e passou a receber €652,23. Todavia, aquele índice, por força das atualizações verificadas, correspondia à data, ao índice 199, com o valor de €683,13. A título de vencimento de exercício recebeu 671,65. Assim, a diferença é de €11,48 x 11 meses, o que perfaz o valor de€126,28.
i) entre 2011 e 2017, a Autora auferiu €652,23 (escalão 190). Nesse ano, não houve atualização do índice 100. No entanto, o escalão pelo qual a Autora deveria ver a sua remuneração calculada era pelo índice 199, ou seja, no valor de €683,13. A Autora auferiu a título de vencimento de exercício 671,65, pelo que a diferença mensal é de €11,48 (€683,13 - €671,65). Assim: (€11,48 x 14 meses) = €160,72 x 7 anos = €1.125,04.
j) em 2018, a Autora transitou para a carreira/categoria de oficial de registos, por via legislativa, e passou a auferir o vencimento emolumentar de €679,40 (escalão 2, índice 200). No entanto, o índice 200 tinha passado a corresponder ao índice 209 a que correspondia o valor de €717,46. Pelo que a Autora tinha direito às diferenças de vencimento, no valor de €38,06 x 14 meses= €532,84
k) em 2019, de Janeiro a Novembro a Autora auferiu €681,73/mês. A partir de Dezembro passou a auferir €687,16. No entanto, como atrás explicitado, o escalão da Autora correspondia a €717,46 (índice 209). Pelo que a Autora tem direito às diferenças de vencimento, no valor de €464,49 (diferença mensal de €35,73 x 13meses) e de €30,30 (no tocante à diferença do mês de Dezembro). No total de €494,79.
117.Tudo somado ascende a €3.496,43.
118.Como se viu, em 23 de setembro de 2019, foi publicado o Decreto-Lei n.º 145/2019, que produziu efeitos a 1 de janeiro de 2020, sendo que nesta data de transição para a Nova tabela remuneratória o Demandado pagava à Autora, a título remuneratório, como vencimento de categoria: €686,56 e como vencimento emolumentar: €687,16. Isto quando a Autora deveria receber, como vencimento de categoria €717,46 e como vencimento emolumentar €717,46.
119.Assim, a Autora, em 1 de janeiro de 2020, auferia €1.377,84 [(€686,56+ €687,16) + €4,12 referente à atualização de 0,3% - DL 10-B/2020 de 20/03] e por isso foi colocada entre o nível 15 e 19 e entre a posição 1 e 2 da tabela remuneratória única, mas deveria ter sido considerado o vencimento de €1.439,22 [(717,46 x 2) + €4,30 referente à atualização de 0,3% - DL 10-B/2020 de 20/03], ficando a Autora, por efeito da Lei, colocada entre o nível 19 e 23 e entre a posição 2 e 3 da TRU.
120.Como tal, em 2020 e 2021 (não foi formulado pedido quanto a diferenças vincendas ao longo do processo e até integral pagamento) a Autora deveria ter auferido mais €1.718,64, indo o Demandado condenado a pagar essasdiferenças salariais (1.439,22 – 1377,84 = €61,38) x (14 meses de 2020 = 859,32) + (14 meses de 2021 = €859,32).
121.Quanto ao pedido formulado a título de emolumentos pessoais, a Autora alega, em resumo que, como os emolumentos pessoais são distribuídos pelos funcionários da repartição na proporção dos respectivos ordenados, o facto de o vencimento de categoria e o vencimento de exercício estarem mal calculados implicaria também um recálculo da distribuição dos emolumentos pessoais. Não foi, no entanto, feita prova a este respeito, nem pelo Demandante, nem pelo Demandado (e de Arbitragem se trata) ficando por apurar quanto recebeu a Autora a este título e quanto deveria ter recebido, o que dependeria da proporção recebida por terceiros. A igual conclusão se tem de chegar quanto ao impacto do recebimento de terceiros na remuneração de exercício. Prova que não foi feita, motivo pelo qual falecem estas pretensões.
II. DISPOSITIVO
G. Decisão
Considerando quanto decorre da fundamentação de facto e de direito, importa julgar, parcialmente, procedente a acção e condenar o Demandado a:
a) Pagar à Autora o valor de €7.063,33 a título de diferenças de vencimento de categoria e o valor de €3.496,43 a título de diferenças de vencimento de exercício.
b) Pagar à Autora, desde a transição para a nova tabela a quantia de 1.439,22€ que resulta do posicionamento entre o nível 19 e 23 e posição 2 e 3 da TRU, e a receber a título de diferenças de vencimento o valor de €1.718,64, devido até final de 2021.
III. CUSTAS
H. Fixação e Repartição
Não se podendo fixar critério diferente de repartição, deverão os encargos ser suportados nos termos previstos no artigo 29º nº 5 do RCAAD.
Deposite-se, registe-se e notifiquem-se as partes.
O ÁRBITRO
Nuno Pereira André
Lisboa, 10 de setembro de 2022