Jurisprudência Arbitral Administrativa


Processo nº 152/2021-A
Data da decisão: 2022-06-24  Relações júrídicas de emprego público 
Valor do pedido: € 30.000,01
Tema: Relações Jurídicas de Emprego Público – Avaliação de desempenho no âmbito do SIADAP.
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DECISÃO ARBITRAL

 

I.             Das partes, do tribunal arbitral, do objeto e saneamento processual

 

A Demandante (“A”), A..., NIF..., residente na Rua ..., ..., ..., ...-... ...,

 

apresentou petição inicial nos termos do artigo 10.º do Novo Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem Administrativa (adiante, abreviadamente, designado por “Regulamento do CAAD”), contra

 

o Demandado (“B”), B..., com sede na ... ...-... Lisboa e o NIPC... .

 

O B... é Demandado, conforme dimana da norma do n.º 2 do artigo 10.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) enquanto pessoa colectiva de direito público.

 

A presente arbitragem em matéria administrativa corre sobre a matéria de relação jurídica de emprego público decorre junto do CAAD, na Avenida Duque de Loulé, n.º 72 A, 1050-091 Lisboa.

Não oferece qualquer hesitação a legitimidade do CAAD, enquanto centro de arbitragem institucionalizada  em apelo ao Despacho n.º 5097/2009, de 27 de janeiro de 2009, publicado no Diário da República, 2.ª série – N.º 30 – 12 de fevereiro de 2009, nem a possibilidade de vinculação prévia à sua jurisdição, in casu, administrativa.

 

De acordo com a Portaria n.º 1120/2009, de 30 de setembro, e em conformidade com o disposto do artigo 187.º, n.ºs 1 e 2, do CPTA, o Ministério ..., os serviços centrais, pessoas colectivas públicas e entidades a funcionar no seu âmbito, estão vinculados à jurisdição deste Centro de Arbitragem   relativa:

 

“a composição de litígios de valor igual ou inferior a 150 milhões de euros” e que, entre o mais, tenham por objeto “questões emergentes de relações jurídicas de emprego público, quando não estejam em causa direitos indisponíveis e quando não resultem de acidente de trabalho ou de doença profissional”.

 

Por isso mesmo, o B... enquanto parte Demandado, está vinculado à jurisdição deste Tribunal Arbitral, mas, igualmente, pelo valor da ação (€30.000,01) ou pelo objeto do litígio, esta ação integra-se inequivocamente no âmbito da referida vinculação, sendo este Tribunal competente para a decisão arbitral que foi constituído a 30-04-2022, após o pedido de constituição que teve o seu acto de aceitação a 28-09-2022 a que corresponde o registo #... .

 

Quanto à sua composição (um/a Árbitro/a) encontra previsão no artigo 15.º e no n.º 1 do artigo 16.º, ambos do Regulamento da Arbitragem , tendo a signatária sido designada, após aceitação escrita nos termos definidos no Código Deontológico, ocorrida a 25-11-2021.

 

Seguindo a orientação do direito constituído deve proferir decisão em consonância com os artigos 5.º, n.º 1, alínea f), e 26.º, n.º 1, do Regulamento da Arbitragem , o que se terá protelado por singelos dias devido a doença da árbitra no final do mês de Maio e prolongado no início do mês de junho que assolou, a aqui a árbitra, por infecção provocada pelo vírus SARS-CoV-2

 

Chamamos à colação o teor do Despacho Arbitral proferido em 30-04-2022, onde o Tribunal teve oportunidade de explicitar, nos termos do Regulamento CAAD, que a submissão do litígio a tribunal constituído pressupunha aceitação deste, bem como das demais normas que regulam a sua atividade (vide artigo 2.º, n.º 1), tendo decorrido com toda a regularidade.

 

Foi ainda trazido esclarecido que da decisão arbitral proferida por um Tribunal constituído no âmbito do CAAD, cabem os mesmos recursos que caberiam da sentença proferida pelos Tribunais estaduais de primeira instância a menos que as partes tenham renunciado a esse Direito.

 

Afigurando-se que a renúncia à faculdade de recorrer só opera se exercida por ambas as partes ou pelas partes em litígio, decidiu-se que a decisão será recorrível se forem reunidos os demais pressupostos formais e substanciais necessários para admissão do recurso, nos termos do sobredito artigo 27º, n. º 2 do Regulamento do CAAD.

 

Decorrida a fase instrumental quanto à decisão a proferir e considerando o disposto no artigo 5.º sob a epígrafe «Princípios» do Regulamento CAAD, em particular, ao teor da alínea b) que refere “Autonomia do tribunal na condução do processo e na determinação das regras aplicáveis” e no artigo 30.º, n.º 3 da Lei da Arbitragem Voluntária (“LAV”) foi determinado que, quando não sejam definidas regras processuais aplicáveis à presente arbitragem, supletivamente, serão aplicadas os conceitos e regras decorrentes, em primeira linha, do CPTA e depois do CPC (doravante Código de Processo Civil).

A instituição da arbitragem voluntária assenta na autonomia privada: nela se funda a constituição e o funcionamento de órgãos a quem competem alguma das funções que a lei fundamental atribui aos tribunais (artigo 206.º do CRP).

 

Saneado o processo, cumpre-nos concluir que:

 

●             o Tribunal é competente e foi validamente constituído;

●             as partes têm personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas;

●             a representação das partes por mandatários está conforme;

●             inexiste matéria a decidir quanto ao âmbito acima indicado;

●             não subsistem nulidades processuais ou de outra natureza.

 

Atribui-se à causa o valor de € 30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo).

 

Como questão precípua à presente decisão, resulta do Despacho Arbitral proferido o entendimento de ser dispensada: “realização da prova testemunhal indicada pela Demandante e dispensar a realização da audiência de prova, conquanto, ao abrigo dos princípios pelos quais se rege o processo arbitral, entende este Tribunal que sejam notificadas as partes para, querendo, se pronunciar sobre o entendimento e intenção de prescindir da prova testemunhal e da a realização da audiência de prova e, caso mantenha o interesse, indicar o facto ou factos sobre o(s) qual(ais) irá incidir o depoimento das testemunhas indicadas.”

 

Devidamente notificadas as partes do sobredito Despacho e do teor daquele segmento decisório, vieram as partes apresentar a sua pronúncia. A Demandante declarou que “pretende produzir prova testemunhal em juízo, pelo que dessa produção prescinde”.

 

Por sua vez, o Demandado informou “nada tem a opor relativamente à pretensão do tribunal em proferir decisão com base na prova documental, concordando com a dispensa da realização de audiência de julgamento e de alegações finais, como se propõe no referido despacho arbitral”.

Entendeu este Tribunal, em alusão aos princípios inscritos no Regulamento, designadamente da “a autonomia do tribunal na condução do processo e na determinação das regras aplicáveis” e da “celeridade e flexibilidade processual”, mais ainda no disposto no n.º 4 do artigo 18.º do Regulamento, dispensar a produção de prova testemunhal e a realização da audiência de prova, passando-se à presente decisão.

 

II – Do objeto da presente ação e das posições das Partes

 

A Demandante integra a carreira de conservador de registos, é titular de um dos postos de conservador da Conservatória do Registo Comercial de ..., provida, em regime de substituição, na ... Conservatória do Registo Predial de ..., a que corresponde a 1.ª classe, com efeitos a 1 de março de 2020, por despacho da Exmª. Presidente do Conselho Directivo do B..., de 09-06-2020.

 

Com a presente ação impugna o despacho de homologação de 02-06-2021, da Exmª. Presidente do Conselho Diretivo do B..., pelo qual foi indeferida a sua reclamação à avaliação referente ao biénio 2017-2018, no âmbito do SIADAP 3, pela qual lhe foi atribuída a avaliação de Desempenho Adequado/3,999 valores.

 

Com tal objeto e com o pedido inscrito e formulado a final na sua petição inicial, a Demandante pretende que seja “declarado que o acto impugnado violou a lei, sendo, por isso, inválido, sendo anulado ou julgado nulo''.

 

Para tanto, sumariamente, a Demandante alega o seguinte:

 

a)            Exerce de forma ininterrupta as funções de Conservador de Registos, de 1.ª Classe, na ... Conservatória do Registo Predial de ..., desde que provida, em regime de substituição, por despacho de nomeação de 17-01-2006, aceite em 03-02-2006;

b)           Que, no exercício de tais funções, foi avaliada, por referência ao biénio 2017-2018, segundo o disposto na Lei n.º 66-B/2007, de 28 de dezembro - Sistema Integrado de Gestão e Avaliação do Desempenho na Administração Pública – SIADAP 3;

c)            A avaliação foi dirigida pela Exma. Conservadora C..., na qualidade de inspetora extraordinária;

d)           A inspetora extraordinária propôs a atribuição da avaliação de 4,680/Desempenho Relevante;

e)           A proposta de avaliação foi validada pelo Conselho Coordenador da Avaliação (CCA) com menções de desempenho relevante e de desempenho inadequado;

f)            Viria a proposta de avaliação a não ser validada e a inspetora extraordinária notificada a fim de reformular a sua proposta;

g)            A inspetora extraordinária manteve a sua proposta de avaliação de desempenho;

h)           O CCA, depois de analisadas as propostas de avaliação, fixou as propostas finais de avaliação;

i)             O CCA fixou a nota de 4,760 valores como a última nota a considerar para Desempenho Relevante na carreira de Conservador de Registos;

j)             O CCA deliberou convolar a nota da Demandante em 3,999/Desempenho Adequado, nota com o valor quantitativo mais elevado da menção qualitativa imediatamente anterior à de relevante.

k)            A deliberação do CCA, pela qual foi atribuída a nota de 3,999/Desempenho Adequado foi homologada pela Exmª. Presidente do B..., por despacho de 25-03-2021;

l)             A Demandante reclamou daquele ato, sobre o qual recaiu o despacho que vem impugnado pela presente ação.

 

Revela-se ainda a seguinte factualidade trazida pela Demandante:

 

m)          No exercício das suas funções na ... Conservatória do Registo Predial de ... a Demandante chefia uma equipa constituída de 5 Oficiais de Registo, a cujos elementos constitutivos foi atribuída a nota individual de 4,840, a que corresponde a avaliação de desempenho de relevante.

 

Acrescenta a estes factos e sustenta a sua posição em considerações de direito, as quais passaremos a elencar:

 

a)            O desacordo de nota atribuída à Demandante e à sua “equipa” consubstancia uma violação do princípio da proporcionalidade, na sua vertente da adequação e da proporcionalidade stricto sensu, nos termos do artigo 266.º, n.º 2 da CRP e do artigo 7.º do CPA;

b)           E o entendimento de ilegalidade da fundamentação exarado no despacho que se pronunciou sobre a reclamação da Demandante quando confrontado com o disposto no SIADAP 3.

 

Regularmente citado dos termos da petição inicial, o Demandado contestou a ação arbitral, defendendo-se por impugnação, tanto na matéria de facto, quer de direito.

 

A posição manifestada pelo Demandado consubstancia-se, em grande parte, no seguinte:

a)            O processo avaliativo da Demandante correspondeu ao período compreendido entre 01/01/2017 e 31/12/2018, tendo sido escolhidos os objetivos e competências enunciadas no processo administrativo junto com a Contestação;

b)           A avaliadora C... propôs a avaliação da Demandante de 4,680 valores/Relevante, resultante da média ponderada calculada segundo o disposto no artigo 50.º do SIADAP;

c)            Pela deliberação de 25-03-2020, o CCA validou as propostas de avaliação, com menção de desempenho relevante e de desempenho inadequado, ao abrigo do n.º 1 do artigo 69.º do SIADAP, relativas à carreira de conservador de registos, com o número total de 142 propostas de desempenho relevante passíveis de validação, num universo total de 567 trabalhadores;

d)           Destas, foram apresentadas 522 propostas de desempenho relevante, das quais 380 delas não foram validadas, por força do estatuído no artigo 75.º do SIADAP;

e)           Quanto a estas propostas não validadas, a CCA notificou os avaliadores para, querendo, reformular as propostas de avaliação;

f)            A avaliadora C... foi notificada daqueles termos em 14/05/2020, pelo que, em 19/05/2020 informou que mantinha a proposta de avaliação;

g)            O CCA reúne para a análise e fixação das propostas finais de avaliação em 02/07/2020, nessa data deliberou como última data validada como desempenho relevante 4,760 valores e que as propostas de desempenho relevante não validades ficariam convoladas em 3,999 valores/desempenho adequado, ao abrigo do artigo 50.º do SIADAP;

h)           A deliberação foi notificada à Demandante a 04/12/2020, bem como do prazo para fazer intervir a Comissão Paritária (CP), prevista no SIADAP, artigo 70.º;

i)             A Demandante não requereu a intervenção da CP;

j)             Em 25/03/2021, por despacho do Conselho Diretivo do Demandado foi homologado a avaliação de 3,999 valores/desempenho adequado da Demandante, despacho notificado à Demandante a 29/04/2021;

k)            A 11/05/2021, a Demandante reclamou do ato de homologação, requerendo o reconhecimento de nível elevado às competências Iniciativa e Autonomia, Coordenação, Negociação e Persuasão e Tolerância à Pressão e Contrariedades, o que fez nos termos do artigo 72.º do SIADAP;

l)             Recebida a reclamação, foi a avaliadora notificada para se posicionar face aos argumentos da Demandante, tendo esta mantido a classificação proposta;

m)          A reclamação da Demandante mereceu o indeferimento da Presidente do Conselho Diretivo do Demandado, datado de 02/06/2021, com os fundamentos consignados na informação n.º .../DRH/2021, por sua vez notificado à Demandante a 28/06/2021;

n)           Sobre o despacho de 02/06/2021 incidiu recursos hierárquico, apresentado a 28/092021, também este indeferido.

 

Desta factualidade, largamente coincidente com a alegada pela Demandante, expendeu ainda o Demandado a seguinte argumentação jurídica:

 

a)            A avaliação de desempenho dos trabalhadores da Administração Pública traduz-se no exercício de poder predominantemente discricionário, sendo esta tarefa dominada pela autonomia e à qual a sindicabilidade é restrita;

b)           O dever de avaliar incide sobre a aptidão e qualidade dos desempenhos dos avaliados, dispondo os avaliadores de liberdade na conformação dos elementos e fatores decisórios e respetiva avaliação;

c)            E tal entendimento resulta também da jurisprudência, circunscrevendo a sindicabilidade a situações de erro manifesto ou grosseiro ou o uso de critérios desajustados;

d)           Ficaria a apreciação da presente demanda circunscrita ao defendido pela jurisprudência – a erros notórios – da classificação atribuída à Demandante, o que, no caso dos autos, segundo o Demandado, de todo o modo, a resposta sempre seria negativa;

e)           Do que se refere ao desacordo de nota atribuída à Demandante e à sua “equipa” e à violação do princípio da proporcionalidade, as alegações desta não são válidas, porquanto a proposta do avaliador foi de classificar com Relevante/4,680 valores;

f)            Tanto será assim, porquanto é inquestionável o carater subjetivo, pessoal e individual da avaliação e mesmo as competências e objetivos da Demandante e da sua equipa são necessariamente diferentes, até por força da Lei (do Decreto-Lei n.º 115/2018, de 21 de dezembro) logo incomparáveis.

g)            Tal avaliação não singrou por conta dos “tetos máximos” ou quotas estabelecidas pelo Legislador;

h)           E, no caso da Demandante, o esgotamento da quota por outros trabalhadores melhor classificados, aportou a não validação pelo CCA da proposta da avaliadora, convolando-se em proposta de desempenho adequado, isto por força do disposto no n.º 1 do artigo 75.º do SIADAP;

i)             A respeito da violação do princípio da proporcionalidade, o Demandado aponta um vício à Demandante, transposto pela omissão do cumprimento de alegar e provar de facto e de direito os fundamentos desse mesmo vício – nos termos da alínea f), do n.º 2 do artigo 78 do CPTA e do n.º 1 do artigo 5.º do CPC;

j)             Careceu a Demandante de alegar e argumentar sobre a violação do princípio da proporcionalidade e da violação de Lei;

k)            Mais aduz o Demandado sobre a valoração das competências Iniciativa e Autonomia, Coordenação, Negociação e Persuasão e Tolerância à Pressão e Contrariedades e a sua valoração em 5 valores, carece a Demandante de razão, porquanto as competências encontram-se enunciadas e referidas na Lei;

l)             Por outro lado, também imputa o Demandado à Demandante a omissão do ónus probatório, em sede de reclamação, não apresentou elementos que permitissem tirar outras conclusões que aquelas inscritas na avaliação, limitando-se a formular alegações meramente colusivas, sem com isso tenha logrado provar o seu desempenho acima do padrão médio exigível;

m)          Concluindo que a Demandante nada alega para pôr em causa o juízo avaliativo sobre o seu desempenho e que o despacho não padece de vícios e está conforme os princípios e Lei que lhe são aplicáveis;

 

Por conseguinte, da sua contestação, o Demandado pugna ao Tribunal peticionado que “deverá julgar-se absolutamente improcedente a presente ação, absolvendo-se o demandado do pedido, uma vez que o ato administrativo impugnado não é nulo nem padece de qualquer vício gerador de anulabilidade.”

 

Findos os articulados e confrontados os requerimentos probatórios tal como indicado pelas partes nas respectivas peças processuais (cfr. art. 20.º, n.º 1 do Regulamento CAAD), verifica-se que as partes indicaram prova documental e, pela Demandante, requereu-se prova testemunhal.

 

No que respeita à produção de prova testemunhal, como já anotado acima e depois de auscultadas as partes, decidiu o Tribunal prescindir da produção daquele meio de prova, encontrando-se estes autos suficientemente providos.

De qualquer das formas, a matéria retratada e a decisão a proferir nestes autos é essencialmente de direito, estando, igualmente, o conhecimento do pedido da Demandante amplamente balizado na Jurisprudência, porquanto a matéria ajuizada está, em grande medida, dentro da margem discricionária da Administração.

 

Já no que concerne à prova documental registou-se a seguinte produção:

●             Despacho de homologação de 02-06-2021, da Exmª. Presidente do Conselho Directivo do B... (Doc. n.º 1);

●             Despacho de homologação de 09-06-2020, da Exmª. Presidente do Conselho Directivo do B... (Doc. n.º 2);

●             Avaliação do SIADAP 3 (Doc. n.º 3).

 

Pelo Demandado foi apresentado a seguinte prova documental:

●             Comunicação eletrónica de 29/09/2021 (Doc. n.º 1);

●             Processo administrativo (PA);

●             Despacho da Srª Secretária de Estado da Justiça de 20/01/2022 (junta após o conhecimento do Despacho Arbitral).

 

Findos estes articulados, conclusos os presentes autos, foram as partes notificadas para, caso tivessem interesse e vislumbrassem utilidade, juntarem:

 

a)            compromisso arbitral – subscrito por Demandante e pelo Demandado – que, especificamente, atribua competência ao CAAD para apreciação deste litígio, devidamente assinada, em formato original, e produzindo os seus efeitos na data do primeiro pedido de constituição deste tribunal arbitral;

b)           (novos) documentos, eventuais correções e esclarecimentos de questões suscitadas nas peças processuais.

 

Nada foi renovado relativamente ao pedido da autora na sua PI para a junção de Cópia de documento comprovativo da menção atribuída aos funcionários, Srs. D..., E..., F..., G... e H... e o Tribunal, nada entendeu impulsionar.

 

No Despacho Inicial foi notificado ainda às partes que, ultrapassado o prazo de 30 (trinta) dias concedido para o efeito, iria, ao abrigo o artigo 5.º, alínea c) e f) do Regulamento CAAD proferir decisão no processo arbitral.

 

A este trecho do despacho nenhuma das partes acedeu, tendo decorrido o referido prazo, pelo que se impõe decidir. Dispõe o artigo 25.º do Novo Regulamento de Arbitragem Administrativa, a decisão arbitral “contém uma descrição concisa da base factual, probatória e jurídica que a fundamenta.”

 

Cumpre, pois, apreciar e decidir a presente ação arbitral.

 

A – Da Fundamentação de Facto:

 

A.1 – Factos Provados:

 

Do confronto dos articulados submetidos pelas partes e da prova documental junta, com o relevo especial para o processo instrutor junto pelo Demandado, resultam como provados e essenciais à decisão a prolatar os seguintes factos:

 

1)            A Demandante é Conservadora de Registos, do mapa de pessoal da Conservatória do Registo Comercial de ..., atualmente as suas funções na ... Conservatória do Registo Predial de ..., em regime de substituição, lugar a que corresponde a 1.ª classe, com efeitos a 1 de março de 2020, por despacho da Exmª. Presidente do Conselho Diretivo do B..., de 09- 06-2020;

2)            A Demandante exerce de forma ininterrupta aquelas funções na ... Conservatória do Registo Predial de ... desde a sua nomeação interina, de acordo com o despacho de nomeação de 17-01-2006, aceite em 03-02-2006;

3)            Ainda no exercício dessas funções, o seu desempenho no biénio 2017/2018, correspondente ao período que dista de 01/01/2017 a 31/12/2018, foi avaliado, segundo o disposto no SIADAP 3;

4)            A avaliação foi realizada pela Exma. Conservadora C..., o que fez na qualidade de inspectora extraordinária;

5)            Na ficha de avaliação de desempenho foram fixados, respetivamente, os seguintes objetivos e competências:

 

6)            A Avaliadora propôs ao Conselho Coordenador da Avaliação (CCA) a atribuição de uma avaliação de 4,680/Desempenho Relevante;

7)            Tal avaliação correspondeu ao somatório da média ponderada sobre a pontuação obtida no parâmetro resultados e no parâmetro competência, sendo, respetivamente, de 5,000 e 4,200 valores;

8)            O CCA validou as propostas de avaliação com menções de desempenho relevante e de desempenho inadequado e identificou o número máximo de 142 propostas de desempenho relevante passível de validação, num universo de 567 trabalhadores, com 522 proposta de desempenho relevante, das quais 380 não validadas;

9)            Das propostas não validadas, deliberou a CCA notificar os avaliadores para, querendo, alterar as propostas de avaliação, na qual se incluía a proposta de avaliação da Demandante;

10)         Na data de 14/05/2020 foi a avaliadora notificada de tal deliberação, tendo a avaliadora informado da manutenção da sua proposta inicial, por email datado de 19/05/2020;

11)         Novamente reunido, em 02/07/2020, a CCA analisou e fixou as propostas finais de avaliação de desempenho, tendo, também, validado a última nota a considerar para Desempenho Relevante na carreira de Conservador de Registos, correspondente à classificação de 4,760 valores, com critérios de desempate;

12)         Como consequência, a CCA deliberou que as propostas de desempenho relevante não validadas, aqui se inclui a da Demandante, seriam convoladas em 3,999/Desempenho Adequado, pois este seria o valor quantitativo mais elevado da menção qualitativa imediatamente anterior à de relevante.

13)         A 04-12-2020, por comunicação eletrónica, foi a Demandante notificada da proposta de avaliação sujeita a homologação, para os termos e efeito do disposto no artigo 70.º do SIADAP;

14)         A proposta final da CCA, segundo a qual a Demandante foi avaliada de Desempenho Adequado/3,999, foi homologada por despacho da Exmª. Presidente do B..., de 25-03-2021 e notificada à Demandante em notificada em 29-04-2021;

15)         A Demandante apresentou reclamação do ato de homologação em 11-05-2021;

16)         No mesmo dia (11-05-2021) foi a reclamação remetida à avaliadora e solicitada pronúncia sobre a mesma;

17)         Na sua pronúncia (14-05-2021), a avaliadora manteve a valoração da sua proposta e emitiu pronúncia no sentido de indeferir a reclamação;

18)         Em 02-06-2021, a Exmª. Presidente do B..., emitiu despacho a indeferir a reclamação, com a fundamentação constante da informação n.º .../DRH/2021, do qual a Demandante foi notificada a 28-06-2021, mantendo-se a avaliação de Desempenho Adequado/3,999.

 

Importa ressaltar que estes factos dados como provados resultaram de toda a prova documental junta pelas partes (e não impugnada), tanto pela Demandante como pelo Demandado, com especial atenção ao processo administrativo junto.

 

Dá-se como relevante o acordo das partes quanto à factualidade inicial – ou não impugnação dos factos -, correspondente a toda a tramitação do procedimento avaliativo da Demandante pelo Demandado e plasmado na prova documental.

 

Como tal, remetendo-se as partes para a prova documental junta e para os articulados, passando-se de imediato ao âmago da presente ação.

 

A.2 – Fundamentação da matéria de facto dada como provada e não provada:

 

A – Do mérito do pedido:

 

O SIADAP ou o sistema integrado de gestão e avaliação do desempenho na Administração Pública, tal como estabelecido e desenvolvido pela Lei n.º 66-B/2007, de 28 de dezembro, é aplicável ao desempenho dos serviços públicos, dos respetivos dirigentes e demais trabalhadores. Este SIADAP enquadrou-se no processo de reforma assente em objetivos de qualidade e excelência, liderança e responsabilidade e mérito e qualificação.

 

Os objetivos globais e centrais do SIADAP são:

(1) a promoção da qualidade dos serviços e organismos da Administração Pública;

(2) a mobilização dos funcionários em torno da missão essencial do serviço, orientando a sua actividade em função de objectivos claros e critérios de avaliação transparentes;

(3) o reconhecimento do mérito;

(4) a potenciação do trabalho em equipa;

(5) a promoção da comunicação entre hierarquia;

(6) a identificação de necessidades de formação – mas não necessariamente por esta hierarquia.

 

Por outro lado, como decorre do artigo 5.º da Lei n.º 66-B/2007, de 28 de dezembro, na sua redação mais recente, o SIADAP subordina-se aos seguintes objetivos:

 

(1) a coerência e integração, com a ação da Administração Pública alinhada com os seus objetivos e políticas;

(2) a responsabilização e desenvolvimento da Administração Pública, seus dirigentes e colaboradores para com os resultados dos serviços e melhorias organizacionais e competências;

(3) a universalidade e flexibilidade dos sistemas de gestão do desempenho a todos os serviços, com a devida adaptação a situações específicas;

(4) a transparência e imparcialidade para a utilização de critérios objetivos e públicos na gestão do desempenho;

(5) a eficácia e eficiência na obtenção dos resultados previstos;

(6) a orientação para a qualidade dos serviços;

(7) a comparabilidade dos desempenhos dos serviços, confrontando com padrões nacionais e internacionais;

(8) a publicidade dos resultados da avaliação dos serviços;

(9) a publicidade na avaliação dos dirigentes e trabalhadores;

(10) a participação dos dirigentes e dos dirigentes na fixação dos objetivos dos serviços; e (11) a participação dos utilizadores na avaliação dos serviços.

O SIADAP, conforme dispõe a Lei n.º 66-B/2007, de 28 de dezembro, integra subsistemas (3): o SIADAP 1, Avaliação do Desempenho dos Serviços da Administração Pública; o SIADAP 3, Avaliação do Desempenho dos Dirigentes da Administração Pública; e o SIADAP 3, Avaliação do Desempenho dos Trabalhadores da Administração Pública.

 

Para o que à presente ação importa, o SIADAP 3 comporta um ciclo de avaliação bienal (com referência ao desempenho nos dois anos civis anteriores), sendo efetuada com base em resultados decorrentes de objetivos individuais contratualizados, em consonância com os próprios objetivos da respetiva unidade orgânica e com competências previamente fixadas, tudo isto, tendo em vista a avaliação dos conhecimentos, capacidades técnicas e comportamentais adequadas ao exercício de uma função (cfr. artigo 41.º e seguintes do SIADAP).

 

É a Lei do SIADAP a dispor sobre as condições do processo avaliativo do desempenho do trabalhador, garantindo o seu rigor e objetividade, de que depende logo da verificação de requisitos funcionais (cfr. artigo 42.º do SIADAP).

 

A avaliação do desempenho do SIADAP 3 encontra-se parametrizada no seu artigo 45.º, incidindo sobre os parâmetros resultados e competências. Os primeiros obtidos na prossecução de objectivos individuais em articulação com os objectivos da respectiva unidade orgânica e os segundos visam avaliar os conhecimentos, capacidades técnicas e comportamentais adequadas ao exercício de uma função.

 

Os objetivos são fixados a cada trabalhador em harmonia com os resultados que se espera da unidade orgânica onde se integra. Estes são fixados clara e rigorosamente, obedecendo a princípios de necessidade, adequação, possibilidade e proporcionalidade, devendo ser entre 3 (no mínimo) e 7 (no máximo).

 

O trabalhador deve alcançar estes objetivos, objeto de negociação entre trabalhador e avaliador (n.º 1 e 3 do artigo 61.º do SIADAP), pelos quais será avaliado quanto ao grau de concretização alcançado e, em regra, de acordo com o seu desempenho individual (salvo as exceções do n.º 3 do artigo 46.º e n.º 4 do artigo 47.º do SIADAP).

 

O desempenho e avaliação dos objetivos contratualizados é determinado nos termos do artigo 47.º do SIADAP, operando por indicadores previamente estabelecidos e expressa em 3 níveis de valoração: Objetivo superado – a que corresponde uma pontuação de 5; Objetivo atingido – a que corresponde uma pontuação de 3; e Objetivo não atingido – a que corresponde uma pontuação de 1.

 

Por sua vez, o resultado deste parâmetro retira-se da média aritmética da soma das pontuações obtidas em cada um dos objetivos fixados e expressa até às centésimas/milésimas.

 

Já o parâmetro competências define-se como as capacidades, os conhecimentos, e comportamentos considerados essenciais para o eficiente e eficaz exercício de funções, visando avaliar os conhecimentos, capacidades técnicas e comportamentais adequadas ao exercício de uma função (cfr. Artigo 4.º, alínea a) e 45.º, alínea b) do SIADAP) e são contratualizadas em função da categoria, carreira e concreto posto de trabalho e dos resultados que se pretende que sejam alcançados pela unidade orgânica/equipa multidisciplinar (cfr. Artigo 68.º do SIADAP). As competências não podem ser em número inferior a 5.

 

Tal como o parâmetro resultados, as competências são avaliadas por indicadores e expressas numa escala de 3 níveis: Competência demonstrada a um nível elevado – a que corresponde uma pontuação de 5; Competência demonstrada – a que corresponde uma pontuação de 3; e Competência não demonstrada ou inexistente- a que corresponde uma pontuação de 1 (artigo 49.º do SIADAP).

 

A pontuação final deste parâmetro resulta da média aritmética obtida na totalidade das competências e, da mesma forma que os resultados, fixados e expressa até às centésimas/milésimas.

 

Da conjugação dos resultados destes parâmetros resulta o resultado da avaliação final, de acordo com uma média ponderada, em que 60% é do parâmetro resultados/objetivos e 40% do parâmetro competências e corresponderá à menção final qualitativa de: Desempenho relevante – a que corresponde uma avaliação final de 4 a 5; Desempenho adequado – a que corresponde uma avaliação final de 2 a 3,999; e Desempenho inadequado – a que corresponde uma avaliação final de 1 a 1,999 .

 

De mencionar, pois não é despiciendo, a avaliação de desempenho produz efeitos, entre outros, à alteração do posicionamento remuneratório e à atribuição de prémios de desempenho

nos termos da legislação aplicável.

 

Porque à resolução do presente diferendo não importa aprofundar mais o regime aportado pela Lei do SIADAP, crê-se, com esta breve incursão, ter ficado suficientemente enquadrado no processo avaliativo do desempenho na Administração Pública.

 

Marcado na presente decisão o enquadramento legal por que se rege a avaliação de desempenho no âmbito do SIADAP, importa acrescentar a esta equação as alegações da Demandante, contrapondo-as com as do Demandado e os princípios e limites pelo qual se rege os poderes decisórios deste Tribunal.

 

Isto porque, ainda que a avaliação de desempenho na Administração Pública esteja suficientemente desenvolvida na Lei do SIADAP, o acto de avaliar de acordo com os parâmetros definidos na Lei é uma atividade que se traduz no exercício de um poder discricionário atribuído à Entidade Administrativa e a toda a cascata de decisores (avaliador, CCA, Dirigente Máximo do Serviço).

 

Diga-se a este respeito, este Tribunal jamais se poderia substituir aos intervenientes da avaliação de desempenho. Cabe-lhe sim, sindicar se a avaliação de desempenho, perante a factualidade levantada no procedimento avaliativo e apreciar se ela foi feita de acordo com os princípios legais aplicáveis (leia-se em sentido amplo), se violou alguma desses princípios e, a final, se essa avaliação é justa.

 

Ultrapassando esta fronteira que acabamos de delimitar, estaria este Tribunal a imiscuir-se num âmbito que não lhe compete. Configuraria isso uma intromissão inadmissível no âmbito administrativo, como tal, a intervenção deste Tribunal deverá cingir-se ao exercício de avaliação de erros grosseiros e/ou notórios.

 

Este aspecto vem sendo realçado pela jurisprudência dos tribunais administrativos, decidindo-se repetidamente que a avaliação de desempenho “que a avaliação do desempenho dos trabalhadores da Administração Pública reentra na chamada discricionariedade administrativa, pelo que apenas será judicialmente sindicável em circunstâncias manifestamente excepcionais”  – porque já vem suficientemente referida pelo Demandado na sua contestação -  artigos 28.º e 29.º  - e por economia processual, abstemo-nos de citar.

 

Ultrapassada este ponto fundamental dos poderes deste Tribunal quanto ao pedido da Demandante impõe-se analisar as alegações esgrimidas pelas partes.

 

Na sua petição inicial vem a Demandante (assim como na reclamação apresentada) discordar da avaliação a si atribuída pelo Demandado, principiando os motivos de tal discordância com a discrepância da nota atribuída à equipa chefiada pela Demandante e a valoração atribuída a cada um dos elementos da equipa.

 

Tal discrepância seria, no seu ponto de vista, geradora da violação do princípio da proporcionalidade, imposto à Administração Pública por força do disposto no artigo 266.º n.º 2, da CRP e do artigo 7.º do CPA. E mais ainda, tal princípio, pertencente ao bloco de legalidade aplicável à actuação da Administração, conforma e limita o exercício de poderes discricionários.

 

Afirma-se já perante as partes perentoriamente as considerações aduzidas pela Demandante à dimensão e concretização daquele princípio, restando a este Tribunal determinar se a discrepância apontada pela Demandante à sua valoração e à da sua equipa é violadora do princípio da proporcionalidade nas vertentes por esta introduzidas e geradora do vício de violação de lei.

 

Ora, atento ao enquadramento, a avaliação de desempenho de acordo com a Lei do SIADAP, opera por parâmetros, sendo que, no início do ciclo de avaliação, esses parâmetros serão contratualizados entre avaliador e avaliado e, segundo a Lei do SIADAP, encontram-se perfeitamente delimitados e – passe o pleonasmo – perfeitamente parametrizados.

 

E estes parâmetros, na letra da Lei do SIADAP e a avaliação que lhes seguem, são, regra geral de natureza individual, pessoal e subjetiva (vide artigos 46.º e 47.º do SIADAP) e a exceção é a fixação de parâmetros de responsabilidade partilhada – o que não é o caso dos autos. Ademais, os parâmetros de avaliação são fixados tendo em conta o posto de trabalho e funções específicas de cada trabalhador.

 

A definição dos parâmetros e a avaliação deles não pode (deve) ser dissociada das concretas funções do avaliada, uma vez que, se o avaliado chefia uma equipa, certamente nos parâmetros de avaliação serão avaliados componentes dessa chefia, mas a avaliação do chefe e da equipa não tem de necessariamente andar de mãos dadas.

 

Atente-se que neste caso, a discordância do Demandado prende-se com a discrepância entre a sua avaliação e a avaliação individual dos elementos que formam essa equipa, por sinal avaliados com 4,840 valores.

 

Ora, o que se entenderia se a avaliação da sua equipa fosse abaixo da avaliação? Iria querer ser avaliada em função da sua equipa, ainda que o seu desempenho individual fosse de caráter de excelência. Certamente iria pugnar pelo inverso.

 

Conclui-se que a alegação quanto à violação do princípio da proporcionalidade deve improceder, valendo, a concretização demonstrada a nível geral dos princípios ínsitos da Lei do SIADAP.

 

De evidenciar ainda a circunstância da valoração da Demandante ter-se registado em  4,680/Desempenho Relevante, dando-se a convolação daquela valoração para Desempenho Adequado/3,999 valores em momento ulterior, tal como previsto no artigo 75.º, por atingidas as percentagens máximas para as avaliações qualitativas de desempenho relevante.

 

A Demandante prossegue o seu périplo argumentativo aduzindo a este Tribunal que os motivos explanados na sua reclamação foram desatendidos, verificando um erro na avaliação das competências “Iniciativa e Autonomia”, “Coordenação”, “Negociação e Persuasão” e “Tolerância à Pressão e Contrariedades”, valorados em 3/ competência demonstrada.

 

A Demandante introduz ainda à crise do objeto arbitral que: Os mesmos “factos e circunstâncias” são apreciados sob vários ângulos e sob esses ângulos são avaliados. Porquanto a avaliação de desempenho é una, avaliado sob diversos ângulos, seguindo o disposto na Portaria n.º 359/2013, de 13 de dezembro, de onde se retira, segundo a Demandante, um mesmo comportamento pode ser observado sob diversos ângulos e, dentro de cada ângulo de observação, ter a notação que lhe caiba. Pelo que não pode o Demandado de avaliar determinado comportamento do funcionário em determinados termos como relevante para “planeamento e organização” com o fundamento em já o ter avaliado nesses termos em “orientação para resultados”!

 

Ora, tal deverá improceder, porquanto, a sindicabilidade judicial do ato impugnado, se retém com a avaliação de desempenho e quando se refere à concreta razão de ter sido atribuída determinada valoração e não outra, cinge-se à apreciação da existência de erro notório ou grosseiro e não à bondade da valoração atribuída.

 

Apenas e só perante erro notório ou grosseiro deverá este Tribunal intervir, porque, em contrário, estaria a entrar no âmbito da decisão administrativa.

 

Insurge-se a Demandante contra um erro de avaliação do comportamento do sujeito, por violação do artigo 2.º da Portaria n.º 359/2013, de 13 de dezembro e, concomitantemente, do anexo VI da referida Portaria.

 

Tal como é alegado, o desempenho do funcionário é uno, porém, é decomposto, para efeitos de avaliação, com referência às competências sujeitas àquela avaliação. Sendo assim, é avaliado segundo o seu desempenho e de acordo com os parâmetros (ou competências) escolhidas ou contratualizadas (de entre as permitidas legalmente) e sobre estas competências impendem distintas valorações, densificadas por comportamentos.

 

 

Tais comportamentos, densificadores da competência escolhida ou contratualizados, são específicos desta competência, até porque as competências previstas na já mencionada Portaria avaliam diferentes componentes do desempenho do funcionário. Daqui se conclui, mesmo que idêntico comportamento fosse empregue na avaliação de determinada competência, seria numa acepção distinta.

 

Assim dito, revela-se oportuno ainda centrar na retoma das considerações iniciais: ainda que a nossa resposta à alegação anterior fosse diferente, parece-nos assertivo, teria sempre de improceder.

 

Porquanto,

 

o escopo da avaliação de desempenho encerra nela uma componente discricionária do avaliador, do CCA e do órgão dirigente máximo, na qual não estamos legitimados a interceder.

 

É assim pois que estamos confinados a controlar o erro notório ou grosseiro (ou contradição evidente que fosse) na avaliação.

 

Não compete assim ao tribunal arbitral alterar a classificação, não se revelam demonstrativos da existência de erro notório e/ou grosseiro, nem podemos associar à avaliadora, à CCA ou ao órgão dirigente máximo uma avaliação contrária aos princípios legalmente aplicáveis.

 

Deste modo, sem necessidade de outros considerandos, por manifestamente desnecessários e inúteis, importa ao tribunal apenas poder sindicar os aspectos vinculados dos actos praticados.

 

Quanto aos não vinculados, ou seja, os praticados no exercício das faculdades discricionárias de atuação, em zonas de avaliação subjetiva, os tribunais não podem sindicar a avaliação de mérito, salvo em casos de erro manifesto ou ostensivamente inadmissível.

 

O juízo avaliativo final é um juízo complexo, global, inserido naquilo a que se designou chamar “justiça administrativa”, resultante da ponderação de todos aqueles critérios e elementos, em larga medida de pendor subjectivo por inexistirem na lei balizas que permitam imputar, com objectividade, um determinado padrão de comportamento a cada uma das classificações previstas na lei.

 

Em princípio, só ao Demandado pertence valorar o desempenho da ora Demandante, sem prejuízo de qualquer erro de apreciação flagrante e ostensivo poder ser jurisdicionalmente sindicado e causar a invalidade do acto de avaliação, condição que aqui não se verifica, dado que das alegações feitas, bem assim como do probatório não resulta de forma expressa e patente um erro grosseiro e manifesto que caiba ao Tribunal sindicar.

 

Assim sendo, impõe-se concluir, desde já, que o tribunal arbitral não poderá emitir a pretendida pronúncia condenatória nos moldes em que vem peticionada.

 

 D – Da Decisão Arbitral

 

Tudo visto, a pretensão da Demandante tem necessariamente de ser julgada improcedente e dela absolvido o demandado.

 

Custas a cargo do Demandante.

 

Registe e notifique.  

24 de junho de 2022

 

O/A Árbitro/a,

 

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Maria Angelina Ferreira Teixeira