RELATÓRIO
O … e doravante designado como “Demandante”, com sede (Conselho Directivo Nacional) na … veio propor a presente acção contra o …, doravante designado como “Demandado” em nome dos seus associados (doravante designados, em conjunto, como “Demandantes”), em exercício de funções na …
a. …;
b. …;
c. …;
d. …;
e. …;
f. …;
g. …;
h. …;
i. …;
j. …;
k. …;
l. …;
m. …;
n. …;
o. …;
p. …;
q. …;
r. …;
s. …;
O Demandante pede que seja reconhecido pelo Demandado, o direito colectivo dos trabalhadores da …, aqui por si representados, a auferir emolumentos pessoais em conformidade com a Lei e respeito pelo conteúdo essencial de direitos fundamentais, pelo que impugna cada acto administrativo de processamento de remuneração mensal desde Janeiro de 2010 (inclusive) e também o acto administrativo consubstanciado no despacho de 29 de Abril de 2020 da Senhora Presidente do Conselho Directivo do Demandado, exarado na Informação n.º …/DRH/2020, datada de 27 de Março de 2020 (integrante de relatório final datado de 23 de Abril de 2020).
Para tanto, o Demandante invoca em suma que:
1. Os dezanove Oficiais … aqui por si representados, em exercício de funções na …, vinham auferindo emolumentos pessoais regularmente, como componente da sua remuneração mensal, até que, a partir de Janeiro de 2010 (inclusive) deixaram se ser pagos esse emolumentos aos mesmos trabalhadores, tal como aos demais colegas da ….
2. Deixando, desde então, de ser pagos os emolumentos pessoais devidos aos trabalhadores da …, de entre os quais os aqui concretamente representados pelo Demandante, estes viram a sua massa salarial ilegalmente e mesmo inconstitucionalmente, reduzida, à revelia do expressamente previsto e garantido no artigo 112º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro.
3. Em vez de se ter dado cumprimento ao disposto no 112º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, vigente mesmo depois da entrada em vigor da LTFP, antes o Demandado acabou por deixar de pagar, em absoluto, quaisquer emolumentos pessoais aos trabalhadores do ... em exercício de funções na mesma …, e sem que lhes apresentasse sequer alguma justificação para essa redução (preterição) da remuneração que lhes era devida e que, por isso, lhes vinha sendo regularmente paga até finais de Dezembro de 2009.
4. O Demandado apenas apresentou a fundamentação que entende para a redução, reportada a Janeiro de 2010 e verificada desde então até ao presente, da remuneração dos trabalhadores em causa no relatório sobre o qual incidiu despacho de 29.04.2020 da Senhora Presidente do Conselho Directivo do … mediante concordância e consequente indeferimento do requerido em 19.12.2019 pelo Demandante, e também, no âmbito do mesmo processo decisório, na Informação n.º …/DRH/2020, datada de 31.01.2020, notificada, em 14.02.2020, ao Demandante, para efeitos de pronúncia em sede de audiência prévia, nos termos do artigo 122º, n.º1, do Código do Procedimento Administrativo (CPA).
5. Este acto administrativo viola os artigos 112º e 266º, nº 2 da Constituição da República Portuguesa (CRP) porqu derroga o que expressamente é determinado por acto normativo mediante um despacho, ou despachos, de um organismo público.
6. Sendo por isso nulo, por força do que dispõe o artigo 161º, n.º 2, alíneas b) e d), do CPA, por violação do conteúdo essencial dos aludidos preceitos constitucionais.
7. Como são, por consequência, nulos cada um dos actos de processamento de remuneração no segmento que respeita à respectiva componente dos emolumentos pessoais.
8. O despacho de 29.04.2020 da Senhora Presidente do Conselho Directivo do Demandado, viola ainda o artigo 59º, n.º 3, da CRP e, enquanto concretizações legais deste ditame fundamental, o artigo 72º, n.º 1, alínea d), da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LGTFP), e o artigo 129º, n.º 1, alínea d), do Código do Trabalho (CT).
9. O artigo 146º, alínea b), da LGTFP, dita que os emolumentos pessoais são componente da remuneração (mensal) dos trabalhadores e a esses emolumentos, enquanto suplementos remuneratórios, aplicava-se e deve aplicar-se o já aludido artigo 112º, n.ºs 2 e 3, da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro – aliás, no que configurava e configura mais uma protecção especial dos “salários”, como estabelecido no artigo 59º, n.º 3, da CRP.
10. O despacho de 29.04.2020 da Senhora Presidente do Conselho Directivo do Demandado, viola ainda os artigos 12º, 13º e 266º, nºs 1 e 2 da CRP e também os artigos 3º, 4º, 6º, 8º e 9º do CPA, na medida em que outros trabalhadores do Demandado existem que auferem aqueles emolumentos sem pratiquem actos que os geram.
11. O despacho de 29.04.2020 da Senhora Presidente do Conselho Directivo do Demandado viola, também, o artigo 112º, nºs 2 e 3 da Lei nº 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, mantido em vigor mesmo depois da entrada em vigor da Lei nº 35/2014, de 20 de Junho (LGTFP).
Na sua contestação, o Demandado veio defender-se por excepção e por impugnação, alegando em suma que:
a. Por excepção (da intempestividade da instauração da acção)
12. Dos pedidos formulados na presente ação decorre que o Demandante vem impugnar, relativamente a cada um dos seus representados, cada acto administrativo de processamento de remuneração mensal, desde janeiro de 2010, assim como o ato administrativo consubstanciado no despacho de 29/04/2020 que indeferiu a pretensão do Demandante, invocando que os mesmos enfermam, designadamente de vício gerador de anulabilidade por violação do artigo 112º da Lei n o 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, e dos artigos 3º, 4º 60 8º e 9º do Código do Procedimento Administrativo (CPA).
13. Ora, se no entender do Demandante, o despacho de indeferimento de 29/04/2020 e os aludidos atos de processamento de remuneração violavam a lei e padeciam de vício gerador de anulabilidade, os mesmos deveriam ter sido impugnados, nos termos do artigo 58º nº 1, alínea b) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), o que não aconteceu.
14. A Lei nº 1-A/2020 de 19 de Março, veio aprovar medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, e determinou nos nºs 2 e 3 do seu artigo 7º a suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os tipos de processos e procedimentos. até data a definir por decreto-lei no qual fosse declarado o termo da situação excecional em causa.
15. Posteriormente, o artigo 8º da Lei n 0 16/2020, de 29 de Maio, procedeu à revogação do aludido artigo 7º da Lei n 0 1-A/2020 com efeitos a 03/06/2020.
16. E, no que concerne à forma como a contagem dos prazos devia ser retomada, o legislador veio esclarecer no artigo 6º da aludida Lei nº 16/2020 que "os prazos de prescrição e caducidade que deixem de estar suspensos por força das alterações introduzidas pela presente lei são alargados pelo período de tempo em que vigorou a sua suspensão".
17. O regime excecional de suspensão do prazo para as impugnações judiciais vigorou entre 9 de Março de 2020 (cfr. artigo 6º, nº 2, da Lei n 0 4-A/2020, de 6 de Abril) e 2 de junho de 2020, ou seja, um total de 86 dias.
18. O aqui Demandante foi apenas notificado do despacho que indeferiu a sua pretensão no dia 30.04.2020 pelo que só a partir dessa data se pode considerar suspenso o prazo de que o mesmo dispunha para impugnar judicialmente o acto em dissídio.
19. In casu, a suspensão verificou-se entre 01.05.2020 e 02.06.2020, ou seja, pelo período de 33 dias.
20. Sendo este, o prazo que (por força do disposto no artigo 6º da Lei n. 0 16/2020) deve acrescer ao prazo de três meses previsto no artigo 58º. nº 1 alínea b) do CPTA.
21. E, não, o prazo de 86 dias, como defende o Demandante.
22. Pese embora a suspensão de prazos prevista no artigo 7º da Lei n. 0 1-A/2020 tenha, efetivamente, perdurado 86 dias, tal não significa que seja este o prazo a considerar para efeitos de aplicação do disposto no artigo 6º da Lei n. 0 16/2020, antes se impondo a análise de qual o prazo aplicável em cada caso concreto.
23. Não se concebe que o legislador tenha pretendido alargar todos os prazos de caducidade e prescrição (que estiveram suspensos ao abrigo do artigo 70 Lei nº 1A/2020) em 86 dias, pois a ser assim, estaríamos a dar um tratamento igual a situações que são, manifestamente, desiguais.
24. Note-se que, a vingar a tese do Demandante, cairíamos na situação absurda de um prazo de prescrição ou caducidade iniciado, por exemplo, a 31.05.2020 — que, consequentemente, esteve suspenso, apenas, dois dias iria beneficiar (injustificadamente) de um alargamento idêntico (i.é., 86 dias) que um outro prazo cujo decurso se tivesse iniciado em 10.03.2020.
25. O Demandante faz uma incorreta interpretação e aplicação do artigo 6º da Lei nº 16/2020.
26. Sendo de salientar que as orientações divulgadas pelo Demandado através do Flash Informativo n 0 …/2020, de 20 de julho - a que o Demandante faz referência no artigo 75º do seu articulado — em nada contendem com aquilo que se referiu, porquanto as mesmas tiveram por escopo esclarecer os serviços, tão-somente, em matéria registral (como, de resto, bem evidencia o seu teor).
27. Tendo em conta que entre o dia 30.04.2020 e o dia 02.06.2020 (data em que cessou a suspensão dos prazos de prescrição e caducidade) decorreram 33 dias de suspensão, o Demandante dispunha do prazo de três meses previsto no artigo 58º nº 1, alínea b) do CPTA para intentar a presente ação (prazo, este, que, em circunstâncias normais, terminaria em 01.09.2020, por força do artigo 58º nº 2 do CPTA) acrescido de 33 dias.
28. O que lhe possibilitaria, pois, intentar a presente ação até ao dia 06.10.2020.
29. Quando a presente ação foi intentada no dia 07.10.2020, estava ultrapassado o prazo de que o Demandante dispunha para impugnar o despacho que lhe foi notificado em 30.04.2020.
30. E, pelo mesmo motivo, também os atos de processamento de remunerações que, aqui, o Demandante reputa de ilegais - e tendo em conta que os trabalhadores são notificados dos recibos de vencimento no dia 21 de cada mês - não foram tempestivamente postos em causa pelos trabalhadores, com exceção dos atos de processamento referentes aos meses de Julho, Agosto e Setembro de 2020.
31. Verifica-se a intempestividade da instauração da presente ação na parte em que se impugnam com fundamento em vicio gerador de anulabilidade) a decisão de indeferimento consubstanciada no despacho de 29.04.2020, assim como os atos de processamento de remunerações de Janeiro de 2010 a Junho de 2020.
32. A intempestividade da prática de atos processuais constitui uma exceção dilatória que determina a absolvição da instância (artigo 89º, nºs 2 e 4, alínea k) do CPTA.
b. Por impugnação
33. Os representados do Demandante integram a carreira de … e exercem funções na …
34. Através de requerimento rececionado no …, em 19.12.2019, o Demandante veio solicitar, em representação dos trabalhadores identificados na petição inicial, seus associados que fosse:
i. reconhecido e efetivado o direito a auferirem emolumentos pessoais como componente do seu vencimento mensal, determinado e a pagar mensalmente de acordo com o que se prevê no artigo 12º, nº 2 da Lei n. 0 12-A/2008, de 27 de Fevereiro; e
ii. reconhecido e efetivado o direito a receberem o diferencial entre os emolumentos pessoais auferidos e aqueles que lhes eram mensalmente devidos, enquanto suplemento remuneratório integrante da sua remuneração, desde janeiro de 2010 (inclusive) até que comece a ser efetivamente pago o valor que lhes é mensalmente devido àquele título, em cumprimento e aplicação do disposto no artigo 12º, nº 2 da mencionada Lei n 0 12-A/2008.
35. Recebido o requerimento e analisada a questão, foi elaborada a Informação no …/DRH/2020 de 31.01.2020, na qual se propôs o indeferimento dos pedidos formulados pelo, ali, requerente, nos termos e pelos fundamentos constantes da aludida Informação. (Fls. 67 a 72 do p.a.)
36. Em virtude de a decisão ser desfavorável à sua pretensão, o aqui Demandante foi notificado, em 14.02.2020 e através do ofício no …/DRH-SAJPR, do projeto de decisão constante na Informação no …/DRH/2020, nos termos do disposto no artigo 121º do CPA para, no prazo de 10 dias úteis, querendo, informar por escrito o que entendesse por conveniente sobre o teor da referida informação (Fls. 75 do p.a.).
37. O Demandante veio exercer o seu direito de participação na tomada de decisão, manifestando a sua discordância relativamente ao projeto de decisão comunicado (Fls. 79 a 86 do p.a.).
38. Analisada a pronúncia, concluiu-se que a argumentação aduzida pelo requerente, em sede de audiência prévia, não era passível de determinar qualquer alteração ao sentido da proposta de decisão consubstanciada na aludida informação no …/DRH/2020.
39. Nessa sequência, o Demandado proferiu a sua decisão final nos termos constantes da Informação no …/DRH/2020, que serviu de base e fundamentação ao despacho de concordância da Presidente do Conselho Diretivo do …, de 29.04.2020, mantendo as conclusões do projeto de decisão, no sentido do indeferimento do pedido do demandante (Fls. 90 a 100 do p.a.).
40. O demandante foi notificado (via eletrónica) em 30.04.2020 da decisão final, pelo ofício no …DRH-SAJPR. (Fls. 102 do p.a.).
41. Na presente ação o Demandante pretende, em síntese, a condenação do Demandado a reconhecer o direito dos trabalhadores, seus representados, a continuar a receber os emolumentos pessoais desde Janeiro de 2010, em conformidade com o disposto no artigo 112º, nºs 2 e 3, da Lei n. 0 12-A/2008, de 27 de Fevereiro.
42. Centrando toda a sua argumentação na tese de que o Demandado deixou de pagar aos seus representados emolumentos pessoais, em janeiro de 2010, pelo que, desde então, estes viram a sua massa salarial ilegalmente e mesmo inconstitucionalmente, reduzida, à revelia do expressamente previsto e garantido no artigo 112º da Lei nº 12-A/2008, de 27 de Fevereiro.
43. O Demandado sempre pagou a remuneração devida aos trabalhadores em causa, sendo certo que estes nunca deixaram de receber os emolumentos pessoais que lhes eram devidos de acordo com a legislação aplicável nesta matéria.
44. Os trabalhadores dos … integram carreiras de regime especial cujo estatuto remuneratório foi revisto através do Decreto-Lei n. 0 145/2019, de 23 de Setembro.
45. Até à entrada em vigor deste diploma legal, a remuneração base mensal dos trabalhadores das carreiras especiais dos … era constituída por duas componentes: o vencimento de categoria e uma parte variável, constituída pela participação emolumentar (também designada por vencimento de exercício).
46. O vencimento de categoria reportava-se às escalas indiciárias previstas nos Mapas I e II, anexos ao Decreto-Lei no 131/91, de 2 de Abril que foi revogado DL no 145/2019, de 23 de Setembro
47. E o vencimento de exercício ou participação emolumentar que era calculado com referência à receita global líquida de cada … (artigo 61º nº 4, do Decreto-Lei no …-F/79, de 29 de Dezembro - norma revogada pela alínea b) do art.0 140 do Decreto-Lei no 145/2019) e era distribuída na proporção dos respetivos vencimentos de categoria (no que se refere aos oficiais …) ou por aplicação de determinadas percentagens sobre a receita mensal líquida (no caso dos conservadores), de acordo com as regras fixadas nas Portarias nº 940/99 e 942/99, de 27 de Outubro (diplomas revogados pelas alíneas g) e h) do artigo 14º do DL nº 145/2019).
48. Para além destas duas componentes, os trabalhadores dos … auferiam, ainda, emolumentos pessoais nos termos do artigo 63º do Decreto-Lei nº 519-F/79 e do artigo 137º do Decreto Regulamentar no 55/80, de 8 de Outubro.
49. Em 23 de Setembro de 2019, foi publicado o DL no 145/2019, diploma que veio estabelecer o novo regime remuneratório das carreiras especiais de …
50. Este novo estatuto remuneratório, que iniciou a produção de efeitos em 01.01.2020, veio determinar no seu artigo 2º do citado DL no 145/2019, que a remuneração dos conservadores … passava a ser composta por remuneração base, suplementos remuneratórios e prémios de desempenho e/ou de produtividade.
51. No que respeita à remuneração base, eliminou-se, pois, a diferenciação entre vencimento de categoria e vencimento de exercício, passando aquela a ser composta por uma verba única, constituída pelo montante pecuniário correspondente ao nível remuneratório da posição remuneratória onde o trabalhador se encontra na carreira elou categoria de que é titular (artigo 3º do DL no 145/2019.
52. Já no que se refere à matéria dos suplementos remuneratórios, o novo diploma estabeleceu, no artigo 5º que os trabalhadores dos … passam a beneficiar dos suplementos remuneratórios previstos no aludido decreto-lei e demais legislação especial que lhes seja aplicável.
53. O artigo 6º determinou que os … mantinham o direito ao abono dos emolumentos pessoais previstos no artigo 63º do Decreto-Lei no 519-F2/79 (na sua redação atual) e na Portaria no 996/98 de 25 de Novembro.
54. Donde, a partir de 01.01.2020, continuou a ter aplicação o disposto no citado artigo 630 DL nº 519-F2/79, mantendo-se o direito dos trabalhadores a serem abonados de emolumentos pessoais, tal como sucedia como no anterior sistema remuneratório.
55. Os emolumentos pessoais têm a natureza de suplementos remuneratórios, os quais acrescem à remuneração base dos trabalhadores que integram as carreiras especiais de conservador de ….
56. E têm por escopo compensar os trabalhadores pelo acréscimo de trabalho que decorre da realização de actos em circunstâncias especiais, tais como o estudo e preparação de certos actos de registo em função do seu grau de complexidade, elaboração (a pedido dos interessados) de requerimentos e preenchimento de requisições indispensáveis para a prática de actos de registo ou pedidos de certidão, ou ainda pela prestação do trabalho fora do local habitual ou fora do horário normal de trabalho; tarefas que os trabalhadores não estão, pois, obrigados a realizar.
57. As verbas a cobrar a título de emolumentos pessoais encontram-se previstas nas tabelas anexas à Portaria no 996/98 de 25 de Novembro, e são cobradas com fundamento no artigo 9º do Regulamento Emolumentar …, aprovado pelo Decreto-Lei nº 322-A12001 de 14 de Dezembro (RERN).
58. No caso concreto do registo … tais verbas estão determinadas no nº 1 do artigo 7º da respetiva tabela de emolumentos aprovada pela citada portaria, nos seguintes termos:
i. Pelo requerimento ou preenchimento do impresso-requisição para realização de qualquer acto de registo sobre cada veículo — 750$00 / 3,74 €;
ii. Quando o requerimento ou requisição se destinar a obter uma certidão 250$00 1,25 €.
59. Estipulando o nº 2 do referido preceito legal, que a totalidade dos emolumentos pessoais cobrados reverte a favor de todos os trabalhadores em funções na … na proporção dos respetivos vencimentos de categoria.
60. Encontrando-se o montante máximo dos emolumentos a perceber pelos trabalhadores fixado em valor não superior a metade do respetivo vencimento de categoria, conforme dispõe o Despacho Normativo n. 0 229/91, de 23 de setembro.
61. Sendo, ainda, de salientar que, de acordo com o disposto no artigo 137º do Decreto Regulamentar nº 55/80, de 8 de Outubro, tais emolumentos revertem apenas para os trabalhadores que direta ou indiretamente colaborem na prática dos referidos atos.
62. Tendo este normativo sido objeto de interpretação pelo despacho de Sua Exa. o Secretário de Estado da Justiça, de 15.03.1982, que fixou que "(...) nos termos do artigo 153º do Decreto Regulamentar n. 0 55/80, considera-se que colaboram direta ou indiretamente, nos actos que dão origem à perceção de emolumentos de natureza pessoal, todos os funcionários da repartição que se encontrem no exercício efetivo de funções ou no gozo de licença para férias. "
63. Está-se diante dum suplemento remuneratório que se reveste de caráter incerto e ocasional, pois o abono de emolumentos pessoais ao trabalhador está condicionado pela vontade das partes, apenas se verificando, se e quando são praticados, a pedido dos cidadãos, actos que dão origem à cobrança de emolumentos pessoais.
64. O valor a receber mensalmente pelos trabalhadores a título de emolumentos pessoais (quando devido) não é fixo mas sim variável, já que depende dos emolumentos pessoais cobrados pelos serviços de registo pela realização dos aludidos atos geradores de emolumentos.
65. Cabendo aos próprios trabalhadores aferir, perante cada acto de registo lavrado na …(e de acordo com a legislação aplicável nesta matéria) se há, ou não, lugar à cobrança de emolumentos pessoais pelos referidos actos e, com base no valor total dos emolumentos pessoais cobrados ao longo do mês pela … é que, posteriormente, é apurado o montante do suplemento remuneratório a pagar a cada trabalhador. na proporção da respetiva remuneração.
66. Sendo de realçar que, pese embora o Demandado seja responsável pelo pagamento das remunerações aos seus trabalhadores, na realidade, a competência para o correspondente processamento pertence a cada uma das respetivas unidades orgânicas.
67. Pese embora o pagamento das remunerações seja tratado centralmente pelo Demandado, são os próprios serviços de registo que inserem na aplicação informática dos vencimentos (AIV), no início de cada mês, os elementos necessários para efeitos de pagamento das remunerações dos seus trabalhadores.
68. Veja-se o ofício circular de 28.11.2006, remetido aos serviços de registo na sequência da alteração dos procedimentos que vinham sendo praticados até então em matéria de processamento de remunerações, no qual se esclarece que "A DGRN procederá ao pagamento dos vencimentos mediante a disponibilização aos serviços extemos de uma aplicação informática de recolha de elementos que lhes possibilitará inserir os valores calculados mensalmente para o pessoal sobre o qual tenham a responsabilidade de efetuar o processamento de remunerações (apuramento de todos os abonos e descontos a efetuar). " (Cfr. doc. nº 1 da Contestação).
69. São as próprias c… que, no início de cada mês, depois de apurarem o montante de emolumentos pessoais que cabe a cada trabalhador, introduzem na aplicação informática o valor a ser pago a título de suplemento remuneratório a cada um dos seus trabalhadores.
70. O que deixa bem patente que, não são os serviços centrais do Demandado, mas, sim, os próprios serviços de registo que, mensalmente, apuram (face ao total de emolumentos pessoais cobrado no mês anterior) e, consequentemente, determinam o montante a auferir por cada trabalhador a título de emolumentos pessoais.
71. Neste enquadramento, e para que melhor se compreenda a matéria em análise, importa referir que, no seguimento do despacho do, então, Presidente do …, datado de 02.02.2010, a … foi objeto de auditoria, em Fevereiro de 2010, para verificação do cumprimento (pela mesma) das normas em vigor em sede de cobrança e processamento de emolumentos.
72. E analisada a prática deste serviço em matéria de cobrança de emolumentos pessoais, concluiu-se no relatório final da mencionada auditoria que: (Fls. 23 a 46 do p.a.)
a prática da … que consiste em processar este tipo emolumentar de forma generalizada pelo preenchimento de um reduzido conjunto de itens do requerimento de modelo aprovado é censurável e deve ter termo imediato. Afigura-se-nos que apenas são devidos emolumentos pessoais nos casos em que a intervenção do oficial se traduza no preenchimento, ou ajuda substancial ao preenchimento, do requerimento ou do modelo único de requerimento, eventualmente acompanhado da explicitação sobre a documentação instrutória necessária ou do sentido e alcance jurídico do acto praticado ou a praticar e cujo registo se tem em vista. O completamento de alguns itens que não traduza um esforço de mérito funcional ou jurídico não justifica qualquer tipo de processamento a esse título. "
73. Por outro lado, mostra-se, ainda, de toda a relevância salientar que, com vista a uniformizar procedimentos quanto aos termos em que eram devidos emolumentos pessoais pelo preenchimento do impresso-requisição para o pedido de registo sobre veículos, foi proferido, em 15.11.2010, pelo, então, Presidente do …, o Despacho n. 0 114/2010 no qual se determinou que: (cfr. fls. 61 e 62 do p.a.)
a. Os emolumentos pessoais pelo preenchimento do impresso-requisição para a realização de qualquer acto de registo sobre veículos, nos termos da alínea a) do n. 0 1 do artigo 7. 0 da Tabela Emolumentar do …, aprovada pela Portaria n. 0 99608, de 25 de novembro, só são devidos pelo preenchimento integral da mesma, efetuado a solicitação expressa do interessado;
b. Não são devidos emolumentos pessoais pelo preenchimento de requisição para certidão, previsto na alínea b) do nº 1 do referido artigo 7º já que, nos temos do artigo 111º, nº 1 do Código do Registo Predial, aplicável ao registo de veículos, por força do artigo 29º do Decreto-Lei nº 54/75, de 12 de Fevereiro, o pedido desta pode ser verbal.
74. Em 17.12.2010 foi proferido o Despacho n. 0 129/2010 que veio esclarecer os serviços que, para efeitos do disposto na alínea a) do Despacho nº 114/2010, "há preenchimento integral do dito impresso-requisição quando, a pedido dos interessados, se verifique o preenchimento da totalidade ou da generalidade dos elementos essenciais do facto submetido a registo, acompanhado de explicitação do sentido e alcance de cada menção preenchida.".
75. E que "não se pode ter por relevante para o processamento de emolumentos pessoais o completamento de requisições que na sua globalidade já se encontrem preenchidas, traduzido no mero preenchimento de simples menções no acto de conferência do pedido de registo.”.
76. Ali se tendo determinado, ainda, que o correspondente processamento de emolumentos pessoais deve "ser sempre justificado em simples nota junta ao processo com identificação do funcionário responsável pelo acto. "
77. A partir do mês de Janeiro de 2011 (subsequentemente à divulgação dos aludidos despachos) verificou-se uma diminuição no valor auferido pelos trabalhadores da … a título de emolumentos pessoais.
78. Tal redução prende-se, não com o facto de o Demandado ter deixado de reconhecer aos trabalhadores da … o direito a auferir emolumentos pessoais (como, erradamente, alega o Demandante), mas, sim, com o facto de a partir de 2011 a … ter passado a efetuar uma aplicação mais rigorosa das normas legais e das orientações superiormente emanadas sobre esta matéria.
79. Os trabalhadores da … nunca deixaram de receber os emolumentos pessoais que lhes são devidos.
80. E a comprovar tal realidade estão as notas de abonos e descontos de cada um dos representados do Demandante, que o Demandado juntou aos presentes autos:
• … - Doc. n. 0 4
• … - Doc. n. 0 5
• … - Doc. n 6
• … - Doc. n. 0 7
• … - Doc. n. 0 8
• … - Doc. n. 0 9
• … - Doc. n 10
• … - Doc. n 0 11
• … - Doc. n 0 12
• … - Doc. n. 0 13
• … - Doc. n 0 14
• … - Doc. n 0 15
• … - Doc. n 0 16
• … - Doc. n o 17
• … - Doc. n. 0 18
• … - Doc. n. 0 19
• … - Doc. n. 0 20
• … - Doc. n. 0 21
• … - Doc. n 0 22
81. A argumentação do Demandado, no sentido de que os emolumentos pessoais deixaram de ser distribuídos e processados aos trabalhadores da … desde Janeiro de 2010, é infundada.
82. Em momento algum o Demandado deixou de reconhecer e pagar aquele acréscimo remuneratório aos seus trabalhadores.
83. Na sequência da divulgação dos citados despachos nºs 114/2010 e 129/2010 e à inspeção realizada à …, aquele serviço de registo alterou o procedimento que vinha tendo relativamente à aplicação da tabela de emolumentos do …, o que redundou na diminuição dos emolumentos pessoais cobrados na … e, consequentemente, nos valores a distribuir pelos trabalhadores do serviço.
84. Não se compreende o alcance da argumentação do Demandante no sentido de que "nenhuma justificação ou fundamentação foi sequer, em devido tempo e como se impunha à Administração, apresentada aos trabalhadores da … para a redução da sua remuneração (na respectiva componente de emolumentos pessoais)".
85. A justificação e fundamentação para a mencionada "redução da sua remuneração" está no facto de os trabalhadores da … (subordinados, que estão, ao dever de zelo e ao dever de obediência previstos nos números 7 e 8 do artigo 73º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP), aprovada pela Lei nº 35/2014 de 20 de junho) terem passado a fazer uma aplicação mais conforme do artigo 7º da tabela de emolumentos.
86. Os emolumentos pessoais, por terem a natureza de um suplemento remuneratório, destinam-se a compensar os trabalhadores pelas circunstâncias específicas em que o trabalho é prestado, sendo, pois, devidos, "pelo exercício de funções em postos de trabalho que apresentam condições mais exigentes relativamente a outros postos de trabalho caracterizados por idêntico cargo ou por idênticas carreira e categoria" - cfr. artigo 159º nº 1 da LTFP.
87. E apenas serão devidos no caso de se verificarem as condições que fundamentam a sua atribuição e enquanto estas condições persistirem.
88. No caso concreto do registo …, os actos que podem gerar a cobrança (e consequente distribuição) dos emolumentos pessoais são, como referido, a elaboração de requerimentos ou o preenchimento do impresso-requisição de atos de registo sobre veículos.
89. Pelo que este suplemento só será suscetível de ser cobrado pelas … (e subsequentemente distribuído pelos trabalhadores) quando os interessados solicitarem a prática de algum daqueles actos previstos na tabela emolumentar.
90. Prática, essa, porém, que o legislador entendeu traduzir-se numa tarefa extraordinária, face às funções habitualmente desenvolvidas pelos trabalhadores do registo de veículos, na medida em que há um esforço acrescido do trabalhador que, substituindo-se aos interessados, prepara, estuda e redige documentos que, em princípio, a eles competia elaborar e apresentar; isto, sem prejuízo dos demais serviços da … terem de continuar a ser assegurados, de igual modo, pelos trabalhadores.
91. A argumentação do Demandante no sentido de que a conduta do Demandado é violadora do disposto no artigo 112º da Lei nº 12-A/2008, de 27 de fevereiro, mostra-se desprovida de todo e qualquer sentido.
92. O artigo 112º da Lei nº 12-A/2008 tem por escopo garantir que, nas situações de revisão dos suplementos remuneratórios ocorridas por força do estatuído no nº 1 desse mesmo artigo, o trabalhador continue, em caso de extinção total ou parcial desses suplementos remuneratórios. a ser abonado do seu exacto montante pecuniário até ao fim da sua vida ativa na carreira ou na categoria por causa de cuja integração ou titularidade adquiriram direito aos mesmos.
93. A revisão dos suplementos remuneratórios ocorreu, apenas, com o novo estatuto remuneratório consagrado no Decreto-Lei nº 145/2019. de 23 de Setembro.
94. O referido diploma legal não extinguiu o direito ao abono de emolumentos pessoais, antes mantendo, no seu artigo 6º, o seu abono aos trabalhadores dos registos, nos termos previstos no artigo 63º do DL n.0 519-F2/79 e na Portaria nº 996/98.
95. A questão em dissídio não tem enquadramento no regime de revisão de suplementos remuneratórios previsto nos nºs 2 e 3 do artigo 112º da Lei nº 12-A/2008 que se destina a proteger os trabalhadores nas situações em que a revisão ocorrida por força do nº 1| daquele artigo redunda na extinção total ou parcial dos suplementos remuneratórios criados por norma especial anteriormente à entrada em vigor da LVCR.
96. O que não se verificou no caso do suplemento remuneratório em causa, cujo regime foi mantido na íntegra pelo DL nº 145/2019.
97. Também não assiste razão ao Demandante relativamente à argumentação expendida no artigo 26º e segs da p.i.
98. Pois, terá sido precisamente por estar vinculado aos princípios gerais de direito aplicáveis à Administração Pública — e com vista ao escrupuloso cumprimento de tais princípios, também, pelos serviços de registo - que o Demandado promoveu a elaboração e divulgação pelas … dos despachos n.0 114/2010 e 129/2010.
99. Os despachos em apreço não determinaram regras diferentes do que se mostra previsto na lei quanto à forma como devem ser cobrados os emolumentos pessoais no registo …, nem o Demandado actuou fora das suas atribuições e competências ao proferir tais despachos.
100. O que se pretendeu com a elaboração e divulgação dos despachos n. 0 114/2010 e 129/2010 do Presidente do Demandado foi assegurar a uniformização dos procedimentos entre os vários serviços de …, e clarificar (tendo em conta, não só a letra da lei, como, igualmente, o espírito do legislador e o fim que esteve subjacente à previsão contida no artigo 7º da Tabela de emolumentos de …) as situações em que podia ser exigido o pagamento dos emolumentos em causa aos cidadãos.
101. Nem os despachos em causa, nem os actos impugnados padecem do vício de nulidade nos termos das alíneas b) e d) do nº 2 do artigo 161º do CPA.
102. Sendo destituídas de sentido as invocadas violações do artigo 59º nº 3 da CRP, bem como do artigo 72º no 1, alínea d) da LTFP e do artigo 129º, nº 1, alínea d) do Código do Trabalho, que o Demandante assaca aos actos impugnados.
103. Nunca o Demandado deixou de reconhecer aos trabalhadores da … o direito à perceção de emolumentos pessoais, pois que o aludido suplemento remuneratório continuou (e continua) a ser-lhes abonado.
104. O direito à perceção de emolumentos pessoais não pode ser considerado como um direito adquirido na esfera jurídica dos trabalhadores dos ….
105. Os emolumentos pessoais não integram a remuneração base destes trabalhadores, antes tendo a natureza de suplementos remuneratórios cujo pagamento depende da verificação de diversos circunstancialismos, os quais podem, ou não, ocorrer mensalmente.
106. Também, quanto à alegada violação dos artigos 12º e 13º bem como do artigo 266º nºs 1 e 2 da CRP, e à alusão feita relativamente à disparidade e arbitrariedade do pagamento de emolumentos aos trabalhadores dos vários serviços do Demandado, o Demandante carece de razão.
107. Os despachos nº 114/2010 e nº 129/2010 do Presidente do Demandado não se destinaram apenas à … mas sim a todos os serviços de registo com competência para a prática de atos de registo … que. tal como a …, ficaram vinculados ao seu teor.
108. E tiveram por escopo asseverar a uniformização de procedimentos a adotar pelas … em matéria de cobrança de emolumentos pessoais, depois de se ter constatado que havia alguma desarmonia na forma como os serviços de registo interpretavam e aplicavam o artigo 7º da Tabela de emolumentos do …
109. A conduta do demandado não belisca o princípio da igualdade, ou qualquer outro princípio a que está vinculado nos termos do artigo 266º da CRP, bem como dos artigos 3º 4º 6º 8º e no artigo 90 do CPA.
110. Se alguns trabalhadores de outros serviços de registo auferem montantes superiores a títulos de emolumentos pessoais, relativamente àqueles que são auferidos pelos trabalhadores da …, tal circunstância prende-se com o facto de as tabelas de emolumentos anexas à Portaria n. 0 996/98 preverem a cobrança de outras verbas, que não estão previstas para o …, situação que leva a que o total de emolumentos pessoais a distribuir pelos trabalhadores de outros serviços de registo possa ser, efetivamente, mais elevado do que aquele que é distribuído pelos serviços de ….
111. A pretexto, veja-se a tabela de emolumentos do registo predial ou do registo comercial, que preveem a cobrança de emolumentos pessoais pelo estudo e organização do processo pré-registral - emolumento que pode alcançar o valor de 29,93€ - sendo esta verba inexistente na tabela de emolumentos do registo ….
112. Ainda, relativamente à alusão feita pelo Demandante relativamente aos trabalhadores que prestam funções em regime de mobilidade (ou comissão de serviço) nos serviços centrais do Demandado, era entendimento deste que àqueles trabalhadores assistia o direito à perceção dos emolumentos pessoais, como se desempenhassem funções no seu serviço de origem.
113. Entendimento que tinha por fundamento a equiparação legal que resultava do no 3 do artigo 51º do DL no 87/2001 de 17 de Março (repristinada pelo artigo 7º do DL no 20/2008, de 31 de Janeiro, na redação dada com a redação do artigo 11º do D.L. nº 122/2009, de 21/05) que determinava que "os funcionários do serviços externos que desempenhem funções em comissão de serviço ou em regime de requisição ou de destacamento nos órgãos ou serviços da D… conservam os direitos inerentes ao quadro de origem como se nele exercessem funções"
114. Apesar do novo estatuto remuneratório dos trabalhadores dos registos ter sido claro ao manter o direito ao abono de emolumentos aos conservadores e …, facto é que não contemplou norma de teor semelhante ao n o 3 do artigo 51º do aludido Decreto-Lei 87/2001.
115. Razão pela qual, a partir de 01.01.2020, os trabalhadores que exercem funções nos serviços centrais do Demandado deixaram de ser abonados do suplemento remuneratório em causa.
116. Pelo que, a argumentação do Demandante desenvolvida nos artigos 56º e segs do seu articulado carece, igualmente, de fundamento.
Ainda em sede de Contestação, o Demandado veio requerer que, no que respeita à questão prévia suscitada na presente peça processual, que seja ordenada a notificação do Demandante para vir manifestar, de forma expressa, se aceita acordar na possibilidade de ser interposto recurso jurisdicionai da decisão que vier a ser proferida para o tribunal estadual competente.
Em sede de réplica, o Demandante veio pronunciar-se sobre a alegada excepção, aduzindo que:
117. O Demandante, com a presente demanda pretende ver declarada a nulidade de vários actos administrativos, tais como, os processamentos das remunerações dos Associados /funcionários que representa na presente acção,
118. A nulidade pode ser invocada a todo o tempo.
I - Saneamento do processo
a. O Tribunal é competente e foi validamente constituído.
b. As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se regularmente representadas.
c. Não existem nulidades.
II - Da Excepção
Como supra se descreveu, o Demandado invocou, a título de excepção, a intempestividade da instauração da acção, alegando que são invocados vícios que são sancionáveis com a anulabilidade e que a acção foi interposta depois do prazo previsto no artigo 58º, nº 1, alínea b) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), mesmo considerando a disciplina excepcional, no que aos prazos tange, prevista no artº 7º da Lei nº 1-A/2020, de 19 de Março, no artº 6º, nº 2 da Lei nº 4-A/2020, de 6 de Abril e no artº 8º da Lei nº 16/2020, de 29 de Maio.
Sucede que não lhe assiste razão.
Com efeito, como resulta da petição inicial (p.i.) o Demandante invoca a nulidade do acto administrativo consubstanciado no despacho de 29.04.2020 da Senhora Presidente do Demandado e a consequente nulidade de cada um dos actos administrativos de processamento de remuneração mensal desde Janeiro de 2010 (inclusive).
Ora, nos termos do artigo 58º, nº 1 do CPTA, a nulidade pode ser invocada a todo o tempo, sendo que a tempestividade ou a intempestividade terão que ser aferidas em função do pedido formulado.
Assim, relega-se para final a questão de saber se o pedido formulado perante este Tribunal arbitral o foi em tempo e sem prejuízo do que vier a resultar da apreciação dos diversos pedidos formulados pelo Demandado, desde já se julga improcedente a excepção invocada pelo Demandado.
III – Da questão prévia
Nos termos do nº 2 do artigo 27º do Regulamento de Arbitragem Administrativa, se as partes não tiverem renunciado aos recursos, da decisão arbitral cabem os mesmos recursos que caberiam da sentença proferida pelos Tribunais de 1ª Instância.
Isto significa que a renúncia ao recurso tem de ser expressa, não valendo o silêncio como renúncia.
Nos presentes autos o Demandante não renunciou ao recurso, o mesmo sucedendo com o Demandado (embora, neste caso, o tenha feito de forma expressa).
Temos assim que está aberta a via de recurso para os Tribunais estaduais, o que dispensa, por economia processual, a notificação do Demandante para os efeitos requeridos pelo Demandado.
IV - Dos Factos
a. Factos provados
Com interesse para os autos, mostram-se provados os seguintes factos:
i. Os dezanove … aqui representados pelo Demandante, integram o Mapa de Pessoal do Demandado e exercem funções na …;
ii. O Demandante dirigiu ao Demandado, em representação de vinte sete daqueles trabalhadores, o requerimento de 1912.2019 - doc. 3 da p.i. (por confissão);
iii. Em 14.02.2020, o Demandante foi notificado da Informação n.º …/DRH/2020, datada de 31.01.2020, para efeitos de pronúncia ao abrigo da figura de audiência prévia – doc. 4 da p.i. (por confissão);
iv. O Demandante, em 28.02.2020 pronunciou-se em sede de audiência prévia, no âmbito e para efeitos de participação no processo decisório sobre o requerido em 19.12.2020 (por confissão);
v. Por correio electrónico de 30.04.2020 o Demandante, na pessoa da sua mandatária, foi notificado do despacho de 29.04.2020 da Senhora Presidente do Demandado que indeferiu o que foi também requerido em 19.12.2020 (por confissão);
vi. O Demandado sempre pagou a remuneração que entendeu devida aos trabalhadores em causa, sendo certo que estes nunca deixaram de receber os emolumentos pessoais que lhes foram pagos de acordo com o entendimento que o Demandado serem devidos por força da legislação aplicável nesta matéria (docs. 4 a 22 da Contestação).
b. Factos não provados
Não se provaram, com interesse para os presentes autos, mais factos.
V – Do Direito
Nos presentes autos discutem-se as seguintes questões controvertidas:
a. É nulo o Despacho de 29.04.2020, da Senhora Presidente do Demandado e são consequentemente nulos os actos de processamento da remuneração dos trabalhadores representados pelo Demandante? Em alternativa;
b. São anuláveis aqueles sobreditos actos administrativos?
O artigo 161º do Código do Procedimento Administrativo (CPA) determina o seu nº 1 que são nulos os actos administrativos para os quais a lei comine expressamente essa forma de invalidade.
Desde já se pode concluir que em nenhum dos diplomas invocados pelas Partes ou em qualquer outro que não tenha sido invocado, se determina expressamente que a sua violação acarrete a nulidade dos actos administrativos aqui postos em crise.
Mas o mesmo artigo 161º, agora no seu nº 2 elenca, não exaustivamente, as situações que geram a nulidade de um acto administrativo.
Como aquele elenco não é, como dissemos, exaustivo, a doutrina tem-se encarregado de desenhar as situações que são geradoras da nulidade de um acto administrativo.
E, neste domínio é de destacar o ensinamento de Vieira de Andrade (Lições de Direito Administrativo, 2ª ed., Coimbra 2011, pág. 177) para quem “(…) os elementos essenciais no artigo 133º/1 do CPA são os indispensáveis para que se constitua qualquer acto administrativo, incluindo os que caracterizam cada espécie concreta. Não pode valer, pois, como acto administrativo, uma decisão sem autor, sem destinatário, sem fim público, sem conteúdo, sem forma, ou com vícios graves equiparáveis a tais carências absolutas, em função do tipo de acto administrativo”, explicitando que “a nulidade haverá sempre de reportar-se a um desvalor da actividade administrativa com o qual o princípio da legalidade não pode conviver, mesmo em nome da segurança e da estabilidade, como acontece no regime-regra da anulabilidade. Assim, por exemplo, será nulo um acto que contenha uma ilegalidade tão grave que ponha em causa os fundamentos do sistema jurídico, não sendo, em princípio, aceitável que produz efeitos jurídicos, muito menos feitos jurídico estabilizados.”.
Também a jurisprudência vai no mesmo sentido, de que é exemplo o Ac. do STA, de 17.02.2012, proferido no âmbito do Procº nº 0187/12, segundo o qual “Elementos essenciais, no sentido do nº 1 do art. 133º do Código do Procedimento Administrativo, cuja falta determina a nulidade do acto administrativo, serão todos aqueles que se ligam a momentos ou aspectos legalmente decisivos e graves dos actos administrativos, além daqueles a que se refere o seu nº 2”.
Embora produzidos do domínio do anterior CPA, os citados ensinamentos não deixam de ser actuais, razão pela qual os subscrevemos.
Revendo agora o conteúdo do Despacho da Senhora Presidente do Demandado de 29.04.2020, apura-se que o mesmo tem um autor e tem destinatários, prossegue um fim público, possui um conteúdo e respeita a forma devida e, por último, não se apresenta com vícios de tal modo graves que possam ser equiparados à ausência das sobreditas características.
Nem o seu conteúdo põe em causa os fundamentos do sistema jurídico que lhe está subjacente, qual seja o regime de participações emolumentares dos trabalhadores das ….
Assim se concluindo que o Despacho da Senhora Presidente do Demandado de 29.04.2020 não é nulo.
Por este motivo também não são nulos todos os demais actos administrativos consequentes.
Decaindo, nesse particular, tudo o que alegado vem pelo Demandante.
Vejamos agora se o mesmo acto administrativo é anulável, ou seja, se padece de vícios que imponham semelhante sanção.
Importa dizer desde já que, como ficou provado, o Demandado sempre pagou aos representados do Demandante os montantes respeitantes à participação emolumentar na medida do entendimento que que faz da legislação aplicável nesta matéria.
Na verdade, o Demandado invoca que o artigo 6.º do DL no 145/2019 determina que que os … tem direito ao abono dos emolumentos pessoais previstos no artigo 63º do Decreto-Lei no 519-F2/79 (na sua redação atual) e na Portaria no 996/98 de 25 de Novembro.
O que significa que, tendo em atenção a data de entrada em vigor do citado DL no 145/2019 que ocorreu a 01.01.2010 (cfr. artigo 15º), se manteve em vigor o disposto no citado artigo 630 DL nº 519-F2/79, que, no seu nº 1 determina que “Os emolumentos especiais cobrados pela realização de actos de registo civil e do notariado fora das repartições e os cobrados pela elaboração e feitura de requerimentos a que se refere o n.º 1 do artigo 68.º do presente diploma revertem, como emolumentos de natureza pessoal sujeito aos descontos legais, em proveito dos funcionários da repartição, na proporção dos respectivos ordenados.”.
Sobre a elaboração e feitura dos requerimentos a que se refere o n.º 1 do artigo 68.º do DL nº 519-F2/79 rege o disposto nos Despachos nº 114/2010 e nº 129/2010 do Presidente do Demandado, que aqui não postos em causa.
Conclui-se assim que o Despacho da Senhora Presidente do Demandado de 29.04.2020 não viola normativo algum, na medida em que se conforma e respeita os diplomas e os Despachos supra citados.
Não se verifica, assim, o vício de ilegalidade que poderia gerar a sua anulação.
Por outro lado, não estando em causa, como se viu que não está, o pagamento de um suplemento remuneratório mas, tão só, as regras de cálculo dos montantes devidos a cada um dos trabalhadores credores dessa prestação, decai toda a argumentação expendida pelo Demandante a respeito da violação da LVCR, à LGTFP, ao CT e à própria CRP.
Acresce que o acto administrativo impugnado se encontra devidamente fundamentado, não podendo ser confundido o desacordo quanto à respectiva fundamentação com a falta ou insuficiência desta.
Mostrou-se cumprida a formalidade essencial de audiência prévia.
E a autora do acto detém a competência para o praticar.
Tudo visto, a pretensão do Demandante tem necessariamente que ser julgada improcedente e dela absolvida o Demandado.
O que acarreta a improcedência dos demais pedidos.
Custas a cargo do Demandante.
Notifique-se.
O Árbitro
(Gonçalo Ribeiro da Costa)