Jurisprudência Arbitral Administrativa


Processo nº 161/2020-A
Data da decisão: 2021-06-29  Relações júrídicas de emprego público 
Valor do pedido: € 132.650,00
Tema: Relação Jurídica de Emprego Público – Suplemento de risco
Versão em PDF

 

                                                                        DECISÃO ARBITRAL

 

  1. Relatório

A … – Entidade Demandante, NIPC …, com sede na ……, em representação dos seus associados …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, … e …, intentou a presente ação contra o B, NIPC …, com sede na …, tendo formulado os seguintes pedidos: “a) Que venha a ser considerado nulo o ato administrativo praticado pela Demandada (…) pela prática do vício de violação de lei; b) Que aos Associados da Demandante venha a ser reconhecido o Suplemento de Risco atribuído às Chefias, este no valor de 20% da remuneração base mensal do respetivo cargo (…); c) Que aos Associados da Demandante venham a ser pagos todos os valores conforme se acham devidamente descriminados nos mapas e montantes mencionados (…) bem ainda do valor resultante do recalculo da pensão da associada … desde 31.01.2013 até 31.12.2019; d) Que lhes venham a ser pagos todos os juros legais, vencidos e vincendos, a que tenham direito (…); e) Que, devido à imputação da Responsabilidade Civil Extracontratual (…) a título de indemnização (…) que seja atribuído a cada um dos Associados da Demandante um valor pecuniário nunca inferior a 20% dos valores peticionados.”    

Regularmente citado o Demandado aduziu, em tempo, a sua contestação tendo apresentado defesa por exceção e impugnação, pugnando, a final, pela absolvição da instância ou improcedência dos pedidos.

O Demandante apresentou Réplica, na qual se pronunciou sobre as exceções invocadas pelo Demandado, requerendo a improcedência destas e concluindo, a final, como na petição inicial. 

*

Findos os articulados foi proferido despacho inicial no presente processo, em cumprimento do disposto no artigo 18º do Novo Regulamento de Arbitragem Administrativa (doravante NRAA). O Tribunal pronunciou-se sobre a condução dos trabalhos e a tramitação processual tendo concedido às partes, nos termos do n.º 4 artigo 18º do NRAA, o prazo de 10 dias para, querendo, se pronunciarem quanto à tramitação dos autos fixada. O Demandado foi ainda convidado, também no prazo de 10 dias, a corrigir o lapso ou a entregar cópia da Decisão Arbitral indicada no artigo 55º da sua contestação. Finalmente, as partes foram notificadas para, querendo, apresentarem alegações escritas, no prazo simultâneo de 10 dias, nos termos do estatuído no artigo 24º do NRAA.

*

Em resposta ao aludido despacho:

  1. A 14.06.2021 o Demandado confirma a identificação do processo referida no seu artigo 55º da Contestação e junta aos autos a respetiva Decisão Arbitral.
  2. A 15.06.2021 o Demandante apresenta pronúncia acerca da Decisão Arbitral junta pelo Demandado (supra referida).
  3. A 17.06.2021 o Demandado solicita o desentranhamento da pronúncia do Demandante acerca da Decisão Arbitral que foi junta ao processo (supra referida).
  4. A 16.06.2021 o Demandado e a 17.06.2021 o Demandante, apresentaram alegações escritas, nas quais reiteraram, respetivamente, a improcedência e procedência da ação.

*

Nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 27º do NRAA as partes afirmam expressamente que não renunciam à possibilidade de interposição de recurso da Decisão Arbitral.

*

O Demandado não procedeu à junção do Processo Administrativo, nos termos do n.º 4 do artigo 12º do NRAA, considerando que toda a documentação inerente ao mesmo já tinha sido junta aos autos pelo Demandante. 

 

  1. Saneamento do processo

 

  1. Dos articulados supervenientes

Na sua Contestação, o Demandado fez alusão à Decisão Arbitral n.º 1294/2019-A, indicando expressamente que assegurava a sua junção ao referido articulado. Contudo, tal não sucedeu. Questão que foi suscitada pelo Demandante na Réplica apresentada. Ora, o facto é que, versando a Decisão Arbitral n.º 1294/2019-A sobre a matéria de exceção invocada pelo Demandado, o Demandante poder-se-ia ter pronunciado sobre esse documento aquando da apresentação da Réplica caso essa Decisão Arbitral tivesse sido junta aos autos em devido tempo. Assim, é, pois, patente que o requerimento apresentado pelo Demandante, a 15.06.2021, ao abrigo do qual exerceu o competente direito ao contraditório, que lhe assiste, é processualmente legítimo e admissível.

 

  1. Exceção de incompetência material e exceção de incompetência para dirimir matérias relativas a remunerações e suplementos remuneratórios

 

Compulsados os autos verifica-se que o Demandado, na contestação apresentada, veio suscitar a exceção de “Incompetência do CAAD – em razão da matéria” sustentando que, resultando “claro que os litígios relativos às carreiras de investigação criminal da … respeitantes a «remunerações e suplementos» constituem uma das exceções” de vinculação, nos termos da alínea c) do n.º 3 do artigo 1º da Portaria n.º 1120/2009 de 30 setembro impõe-se ao decisor uma “interpretação atualista” que conclua por um entendimento coerente dentro da mesma organização – …. Ou seja, no seu entendimento, na …, estariam excluídos todos e quaisquer litígios decorrentes das matérias de remunerações e suplementos, independentemente da carreira.

O Demandado alega ainda a “Incompetência do CAAD para dirimir o presente litígio” uma vez que o objeto da lide versando, como já se referiu, sobre remunerações e suplementos, está excecionada da competência do CAAD nos termos alínea a) do n.º 2 do artigo 1º da já referida Portaria n.º 1120/2009 de 30 de setembro, uma vez que estão em causa direitos indisponíveis.

Em face do exposto, conclui, assim, pela verificação de exceções dilatórias que obstam a que o Tribunal conheça do mérito da causa, dando lugar à absolvição da instância (n.º 2 e alínea a) do n.º 4 do artigo 89º do CPTA).

O Demandante na réplica apresentada reitera o alegado na petição inicial, pugnando pela legítima intervenção do CAAD, tal como foi aceite pelas partes e consagrado na Portaria n.º 1120/2009 de 30 setembro.

Cumpre, então, decidir.

 

De acordo com o disposto na alínea f) do n.º 1 do artigo 5º e artigo 26º do NRAA compete ao tribunal decidir de acordo com o direito constituído.

Ora, no que aqui importa e porque se questiona a competência deste tribunal arbitral, o artigo 18º da Lei da Arbitragem Voluntária (Lei n.º 63/2011, de 14 de Dezembro) consagra que compete ao tribunal arbitral decidir sobre a sua própria competência (n.º 1) podendo fazê-lo mediante decisão interlocutória ou aquando da prolação da sentença sobre o fundo da causa (n.º 8).  

Isto posto,  

O CAAD – Centro de Arbitragem Administrativa foi criado pelo Despacho n.º 5097/2009 de 27 de janeiro do Secretário de Estado da Justiça, sendo um centro de arbitragem especializado, com competência para a resolução de litígios de direito público na área administrativa e tributária.

Ora, a submissão de um litígio à arbitragem do CAAD depende de convenção das partes (n.º 1 do artigo 8º do NRAA) sendo que, o n.º 2 do artigo 8º do NRAA determina o seguinte: “Quando, por portaria, regulamento ou qualquer outro meio legalmente admissível, os ministérios, instituições públicas de ensino superior ou outras pessoas coletivas se encontrem vinculados à jurisdição dos tribunais arbitrais a funcionar junto do CAAD, o interessado que manifeste vontade em resolver o litígio por via arbitral deve apenas identificar o instrumento de vinculação.”

Assim, conforme robustamente alegado pelas partes, pela Portaria n.º 1120/2009 de 30 setembro o Ministério da Justiça vinculou-se à jurisdição do CAAD sendo este centro competente para resolver (no que aqui importa) os conflitos relativos às relações jurídicas de emprego público (entre outras matérias). Consequentemente, nos termos do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 1º da aludida Portaria, a …, que opera hierarquicamente na dependência do Ministério da Justiça, encontra-se, assim, vinculada à jurisdição do CAAD.

Aqui chegados, importa aferir quais as matérias subsumíveis à jurisdição do CAAD atento o disposto nos números 2 e 3 do citado artigo 1º da Portaria n.º 1120/2009 de 30 setembro.

Dispõe o n.º 2 do artigo em escrutínio, que a … encontra-se vinculada ao CAAD para resolução de litígios de valor igual ou inferior a 150 milhões de euros e dentro deste universo, desde que os mesmos tenham por objeto a) Questões emergentes de relações jurídicas de emprego público, quando não estejam em causa direitos indisponíveis e quando não resultem de acidente de trabalho ou de doença profissional; b) Questões relativas a contratos por si celebrados.”

Ora, se é certo que a presente ação se enquadra dentro do limite de valor, que é matéria decorrente de uma relação jurídica de emprego público e que não resulta de acidente de trabalho nem de doença profissional, resta saber se estamos perante direitos indisponíveis (alínea a)). E, neste conspecto, acompanhando-se a diversa jurisprudência do CAAD sobre a presente matéria, a resposta é peremptoriamente negativa. Em particular citam-se, a este propósito, as Doutas Decisões Arbitrais proferidas nos processos n.º 1297/2019-A de 03 de março de 2020[1] e n.º 117/2020-A de 10 de janeiro de 2021:

«Na verdade, o que o legislador quis decididamente subtrair à jurisdição do CAAD foram, como se viu supra, por um lado, os litígios relativos a remunerações e suplementos de funcionários da carreira de investigação … e, por outro, todos os litígios tendo por objeto direitos absolutamente indisponíveis ou irrenunciáveis.

Ora, no caso, tratando-se de discutir a existência ou não do direito a subsídio de risco correspondente a uma parte ínfima [€ 11,80/mês1] da remuneração global dos trabalhadores representados pelo Sindicato autor, a indisponibilidade do respetivo direito não abrange esta parcela porquanto a mesma não ultrapassa notoriamente um terço da remuneração e, consequentemente, encontra-se tal parcela na esfera da disponibilidade de cada trabalhador à luz do que dispõe o artigo 175º, da LGTFP (Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas – Lei nº 35/2014, de 20-6): “o trabalhador não pode ceder, a título gratuito ou oneroso, os seus créditos a remunerações na medida em que estes sejam impenhoráveis”.

Relativamente aos salários, vencimentos ou remunerações dos trabalhadores em sentido amplo, a impenhorabilidade é, em regra, de dois terços (2/3), sendo limitada no máximo ao equivalente a três salários mínimos nacionais ou remunerações mínimas garantidas e, no mínimo, quando o trabalhador não tenha outros rendimentos, ao equivalente à remuneração mínima – Cfr. artigo 738º, do Código de Processo Civil.»

*

«Ora, no caso, tratando-se de discutir a existência ou não do direito a Subsídio de Risco, o Subsídio de Turno e o Trabalho Extraordinário correspondente da remuneração global dos trabalhadores representados pelos Demandantes, a indisponibilidade do respetivo direito não abrange estas parcelas porquanto a mesma não ultrapassa notoriamente um terço da remuneração e, consequentemente, encontra-se tal parcela na esfera da disponibilidade de cada trabalhador à luz do que dispõe o artigo 175º, da LGTFP (Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas – Lei nº 35/2014, de 20-6): “o trabalhador não pode ceder, a título gratuito ou oneroso, os seus créditos a remunerações na medida em que estes sejam impenhoráveis”.

Relativamente aos salários, vencimentos ou remunerações dos trabalhadores em sentido amplo, a impenhorabilidade é, em regra, de dois terços (2/3), sendo limitada no máximo ao equivalente a três salários mínimos nacionais ou remunerações mínimas garantidas e, no mínimo, quando o trabalhador não tenha outros rendimentos, ao equivalente à remuneração mínima – Cfr. artigo 738º, do Código de Processo Civil.»

Em face do exposto, estando em causa nos presentes autos o pagamento do suplemento de risco, cujo valor consiste numa percentagem sobre a remuneração base mensal (máximo de 20%), é manifesto que não é beliscada a indisponibilidade do direito, posto que não ultrapassa 1/3 da mesma (artigo 738º do Código do Processo Civil conjugado com o artigo 175º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas).

Acresce, por seu turno, o n.º 3 do artigo 1.º da Portaria n.º 1120/2009 de 30 setembro, que[t]Tendo em conta a natureza do vínculo de nomeação da relação jurídica de emprego público e as funções em causa, o disposto no número anterior é aplicável aos litígios relativos às carreiras de inspeção da …, de investigação … e do pessoal do corpo da … da Direção-Geral dos Serviços … exceto no que respeita a: (…) c) Remunerações e suplementos; (…)”

Pelas próprias razões enunciadas neste normativo, a matéria de remunerações e suplementos (entre outras) só está excecionada (no que aqui importa referir) em relação à carreira de investigação criminal da … – alínea b) n.º 1 e n.º 3 do artigo 62º do Decreto-Lei n.º 275-A/2000 de 9 novembro[2].

Ora, o Demandante representa trabalhadores pertencentes a um grupo de pessoal distinto – o Grupo de Pessoal de Chefia de Apoio à … (cfr. alínea c) n.º 1 e n.º 4 do artigo 62º do Decreto-Lei n.º 275-A/2000 de 9 novembro).

Dos incisos legais enunciados, resulta claro que a intenção do legislador foi excecionar determinadas matérias naquelas carreiras específicas, pelo que não colhe, de todo, a tese do Demandado no sentido do aludido normativo dever ser interpretado de forma generalista para todas as carreiras da …. São vastas as Decisões Arbitrais proferidas sobre o Suplemento de Risco no âmbito das carreiras de Apoio à …, e, no que diretamente concerne à apreciação da matéria exceptiva invocada, ressaltam-se, por revelarem especial acuidade no presente domínio, as Decisões Arbitrais supra referidas (n.º 1297/2019-A de 03 de março de 2020 e n.º 117/2020-A de 10 de janeiro de 2021), e, bem assim, a apreciação preconizada pela Decisão Arbitral proferida no Processo n.º 1284/2019-A, "a contrario sensu", que julgou a suscitada exceção de incompetência material procedente precisamente porque, naquele caso concreto, estava em causa uma carreira de …. O que, como destacado, não se observa na presente lide.   

 

Em face do exposto, e sem necessidade de mais delongas, improcedem as exceções dilatórias invocadas pelo Demandado.

*

O tribunal é, assim, competente, as partes são legítimas e a instância válida e regular, nada obstando ao conhecimento do mérito da causa.

 

  1. Questões a decidir

 

Atenta a configuração do petitório do Demandante verifica-se que, vem cumulado um pedido impugnatório – sobre o despacho de indeferimento do Diretor Nacional Adjunto datado de 22 de setembro de 2020 - com uma pretensão condenatória  – consubstanciada na prática de ato administrativo que, i) reconheça que o Suplemento de Risco devido no âmbito do exercício dos cargos de Chefe de Núcleo e Chefe de Setor (Grupo de Pessoal de Chefia …) é de 20% da remuneração base mensal do respetivo cargo e que consequentemente, ii) se determine o pagamento dos diferenciais devidos aos seus representados pelos períodos de tempo em que exerceram os respetivos cargos até 31 de dezembro de 2019 (juros incluídos), bem como iii) o pagamento de uma indemnização, a título de responsabilidade civil extracontratual, de 20% sobre os referidos diferenciais de cada representado do aqui Demandante (alíneas a) e c) do n.º 2 do artigo 4.º do CPTA).

Ora, o n.º 2 do artigo 66º do CPTA dispõe o seguinte: “Ainda que a prática do ato devido tenha sido expressamente recusada, o objeto do processo é a pretensão do interessado e não o ato de indeferimento, cuja eliminação da ordem jurídica resulta diretamente da pronúncia condenatória.” Assim, não obstante vir expressamente impugnado pelo Demandante o referido despacho de indeferimento, o objeto da presente ação circunscreve-se à luz do referido normativo à pretensão de condenação do Demandante, nos termos supra enunciados.    

 

  1. Fundamentação
  1. Factos provados

Analisados os articulados e os documentos juntos aos autos dão-se por assentes, com interesse para o processo, os seguintes factos:  

  1. Os aqui representados pelo Demandante - …. - possuem uma relação jurídica de emprego público com o Demandado, pertencem aos quadros deste e integram-se no Grupo de Pessoal de Chefia de ….
  2. A representada do Demandante … foi trabalhadora do Demandado, esteve igualmente integrada no Grupo de Pessoal de Chefia de … tendo, contudo, passado à reforma a 01.02.2013.
  3. Os representados do Demandante exerceram ou exercem, os seguintes cargos, durante os seguintes períodos de tempo:

Trabalhador

Chefe de Núcleo

Chefe de Setor

Início

Fim

Início

Fim

03.07.2009

21.03.2013

22.03.2013

12.09.2014

 

 

 

13.09.2014

22.07.2016

 

 

 

23.07.2016

31.12. ----

 

 

03.07.2009

02.07.2012

 

 

 

03.07.2012

12.09.2014

 

 

 

13.09.2014

02.07.2015

 

 

 

03.07.2015

31.12.----

11.06.1991

19.08.1999

20.08.1999

22.11.2000

 

 

 

21.05.2001

20.05.2007

 

 

 

21.05.2007

02.07.2009

 

 

 

03.07.2009

31.01.2013

 

 

03.07.2009

21.03.2013

 

22.03.2013

12.09.2014

 

 

 

13.09.2014

21.03.2016

 

 

 

22.03.2016

21.03.2019

 

 

 

22.03.2019

31.12.----

 

 

21.05.2001

20.05.2007

 

 

 

21.05.2007

02.07.2009

 

 

 

03.07.2009

02.07.2012

 

 

 

03.07.2012

12.09.2014

 

 

 

13.09.2014

02.07.2015

 

 

 

03.07.2015

02.07.2018

 

 

 

03.07.2018

31.12.----

 

 

04.12.2017

31.12.----

 

 

03.07.2009

02.07.2012

 

 

 

03.07.2012

12.09.2014

 

 

 

13.09.2014

02.07.2015

 

 

 

03.07.2015

02.07.2018

 

 

 

03.07.2018

31.12.----

 

 

03.02.2017

31.12.----

 

 

22.03.2013

12.09.2014

 

 

 

13.09.2014

21.03.2016

 

 

 

22.03.2016

31.12.----

 

 

21.01.2003

20.01.2006

 

 

 

21.01.2006

02.07.2009

 

 

 

03.07.2009

02.07.2012

 

 

 

03.07.2012

12.09.2014

 

 

 

13.09.2014

02.07.2015

 

 

 

03.07.2015

02.07.2018

 

 

 

03.07.2018

31.12.----

 

 

22.03.2013

12.09.2014

 

 

 

13.09.2014

21.03.2016

 

 

 

22.03.2016

21.03.2019

 

 

 

22.03.2019

31.12.----

 

 

03.02.2017

31-12-----

 

 

03.07.2009

02.07.2012

 

 

 

03.07.2012

12.09.2014

 

 

 

13.09.2014

02.07.2015

 

 

 

03.07.2015

02.07.2018

 

 

 

03.07.2018

31.12.----

 

 

 

  1. A 14 de setembro de 2020 os representados do Demandante – … – endereçaram um requerimento ao Diretor Nacional da …, nos termos do qual expuseram e requereram o seguinte: “(…) os(as) (…) têm/tiveram direito a Suplemento de Risco no valor de 20% da sua remuneração base mensal do respetivo cargo, conforme resulta do disposto no artigo 99º n.ºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 295-A/90 de 21 de Setembro, bem ainda, do artigo 161 n.ºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 275-A/2000 de 9 de Novembro. D – Contudo (…) sempre receberam o Suplemento de Risco abaixo do seu valor real e que deveria ser (…) no valor de 20% da sua remuneração base mensal do respetivo cargo. Face ao exposto requer-se a V. Exa. se digne ordenar que aos ora Mandantes sejam retificados e atualizados os suplementos de risco (…) acrescidos dos respetivos juros de mora vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento.”
  2. O referido pedido foi indeferido por despacho do Diretor Nacional Adjunto, datado de 22 de setembro de 2020.
  1. Factos não provados

Inexistem factos que devam considerar-se como não provados com relevo para a decisão.

  1. Direito

Nos termos da petição inicial apresentada o Demandante entende que os seus representados têm direito a receber o suplemento de risco no valor de 20% da respetiva remuneração base mensal desde o início do exercício dos cargos de chefia até 31 de dezembro de 2019, nos termos do disposto nos números 1 e 2 do artigo 99º do Decreto-Lei n.º 295-A/90 de 21 de setembro e números 1 e 2 do artigo 161º do Decreto-Lei n.º 275-A/2000 de 9 de novembro. No que à representada … diz respeito, pugna pelo mesmo entendimento, sendo que entre 31.01.2013 a 31.12.2019 pretende o recálculo da respetiva aposentação.

Por sua vez o Demandado defende, na argumentação aduzida na sua contestação, que, até 31.12.2019, o regime do suplemento de risco das chefias de setor e de núcleo decorria do Decreto-Lei n.º 42/2009 de 12 de fevereiro. Ou seja, embora o artigo 31º desse diploma tivesse revogado (parcialmente) o n.º 1 e o n.º 2 do artigo 161º do Decreto-Lei n.º 275-A/2000 de 9 de novembro, este manteve-se em vigor para o pessoal de chefia, pelo que o suplemento de risco era de “montante igual ao fixado à data de entrada em vigor deste diploma”. Já de acordo com o n.º 3, para o restante pessoal, o suplemento de risco é apurado “segundo o critério em vigor” à data de entrada daquele diploma, ou seja, atento o critério do artigo 99º do Decreto-Lei n.º 295-A/90 de 21 de setembro. Desta forma as referidas chefias saíram do critério do citado artigo 99º. 

 

Vejamos a quem assiste razão.

 

O Decreto-Lei n.º 295-A/90 de 21 de setembro veio, à data, atualizar o regime orgânico da …. No que aqui importa, destaca-se o artigo 72º que enumera os grupos de pessoal e as categorias profissionais, sendo que, na sua alínea a) identifica o “pessoal dirigente e de chefia”. De acordo com o Mapa I (Anexo do aludido diploma legal) o Pessoal de Chefia do Apoio à … são: Chefe de Área, Chefe de Setor e Chefe de Núcleo. O artigo 97º dispõe sobre a remuneração e no que concerne, em concreto, ao Suplemento de Risco o mesmo está consagrado no artigo 99º, nos seguintes termos:

“1 – Os funcionários ao serviço da … têm direito a um suplemento de risco, graduado de acordo com o ónus da função dos diferentes grupos de pessoal.

2 – O suplemento de risco para o pessoal dirigente e de chefia é fixado em 20% da remuneração base mensal do respetivo cargo.  

3 – O suplemento de risco para os funcionários da carreira de investigação criminal é fixado em 25% do índice 100 da respetiva tabela indiciária.

4 – Os funcionários integrados nas áreas funcionais de criminalística, de telecomunicações e de segurança têm direito a suplemento de risco de montante igual ao fixado no número anterior.

5 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, os funcionários que integram o grupo de pessoal de apoio à investigação criminal têm direito a um suplemento de risco correspondente a 20% do índice 100 da respetiva tabela indiciária.

6 – O pessoal operário e auxiliar tem direito a um suplemento de risco de montante igual ao fixado para o pessoal de apoio à investigação ….

7 - O suplemento de risco referido nos números anteriores é considerado para efeitos de subsídios de férias e de Natal, estando sujeito ao desconto de quota para aposentação e sobrevivência.”   

A regra aqui consagrada, é a de que todos os funcionários afetos à … têm direito a receber suplemento de risco, sendo que o seu montante varia em função do que for estabelecido para cada grupo de pessoal. E resulta claro do seu n.º 2 que, no caso do Pessoal Dirigente e de Chefia, o mesmo corresponde a 20% da remuneração base mensal do respetivo cargo. Saliente-se ainda que, de acordo com o n.º 1 do artigo 178º, o referido artigo 99º produziu efeitos “a partir de 01 de Outubro de 1989”

 

Até aqui, e durante a vigência do Decreto-Lei n.º 295-A/90 de 21 de setembro, não subsistem dúvidas.

 

Ora, a questão coloca-se com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 275-A/2000 de 9 de novembro que revoga o Decreto-Lei n.º 295-A/90 de 21 de setembro.

Verifiquemos, então, quais as alterações introduzidas e o impacto das mesmas no caso concreto.

O Grupo de Pessoal mantém-se. A única diferença é a autonomização da sua identificação em relação ao Pessoal Dirigente (alínea a) do n.º 1 do artigo 62º). O Grupo de Pessoal “Chefia de Apoio à …” encontra-se identificado na alínea c) do n.º 1 do artigo 62º e continua a compreender os mesmos cargos (n.º 4 do artigo 62º) - Chefe de Área, Chefe de Setor e Chefe de Núcleo – cujo descritivo funcional se encontra consagrado nos artigos 70º, 71º e 72º. Este diploma legal introduz, contudo, alterações ao nível das remunerações (n.º 2 do artigo 90º) sendo que, quanto ao suplemento de risco, o artigo 91º dispõe o seguinte:

“O suplemento de risco dos funcionários ao serviço da …, graduado de acordo com o ónus da função dos diferentes grupos de pessoal, será definido e regulamentado em diploma próprio, sem prejuízo do disposto no artigo 161.º

Qual o impacto desta alteração?

Mantém-se a regra de que o suplemento de risco é um direito que assiste a todos os funcionários da … e continua a diferenciar-se a atribuição do mesmo em função do grupo de pessoal.

A pedra de toque é que o legislador manifesta uma intenção futura de vir a regulamentar a atribuição do subsídio de risco em diploma próprio definindo, contudo, especificidades no artigo 161º. Ora, as especificidades previstas no artigo 161º são as seguintes:

“1 - O pessoal dirigente e de chefia, enquanto no exercício de tais funções, mantém o direito a suplemento de risco de montante igual ao fixado à data da entrada em vigor deste diploma.

2 - O montante do suplemento referido no número anterior é atualizável nos termos gerais previstos para a atualização anual da função pública.

3 - O restante pessoal da … mantém o direito ao suplemento de risco segundo o critério em vigor à data da entrada em vigor do presente diploma, até à regulamentação prevista no artigo 91.º

4 - O disposto nos números anteriores é aplicável ao pessoal que, à data da entrada em vigor do presente diploma, se encontre a desempenhar funções na … em regime de requisição.”

Dando cumprimento ao disposto no n.º 1 do artigo 161º o Pessoal Dirigente e de Chefia, enquanto se encontrar no exercício das respetivas funções (como é evidente), mantém o direito ao suplemento de risco. E qual é o montante? De montante igual ao fixado à data de entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 275-A/2000 de 9 de novembro. Ora, à data de entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 275-A/2000 de 9 de novembro (como amplamente se encontra explicado anteriormente) o subsídio de risco do Pessoal de Dirigente e de Chefia era de 20% da remuneração base mensal do respetivo cargo, o que, como referido, consubstanciava a regra que decorria da aplicação do Decreto-Lei n.º 295-A/90 de 21 de setembro. Ou seja, o Decreto-Lei n.º 275-A/2000 de 9 de novembro nada mais acrescenta e mantém a mesma disciplina para os cargos Dirigentes e de Chefia. Estes continuam a receber suplemento de risco correspondente a 20% da remuneração base mensal do respetivo cargo. Quando se lê o n.º1 do artigo 161º tem que se atender (saber) qual era a regra que estava a ser aplicada quando aquele diploma entrou em vigor. Em suma, o legislador veio consagrar, desta feita de forma concreta e objetiva, a mesma regra que era já aplicada até então.     

Do quadro legal que se delimitou, impera uma primeira conclusão: o n.º 1 do artigo 161º do Decreto-Lei n.º 275-A/2000 de 9 de novembro determina que, com a sua entrada em vigor, o Pessoal Dirigente e de Chefia, enquanto se mantiver no exercício das suas funções, continua a auferir o suplemento de risco no valor de 20% da remuneração base mensal do respetivo cargo. É esta a regra consagrada com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 275-A/2000 de 9 de novembro. Sendo que, de acordo com o n.º 2, o montante do suplemento é ainda atualizável nos termos gerais previstos para a atualização anual da função pública.

 

Aqui chegados entende-se, mais uma vez, que a interpretação sequencial destas normas é clara e insuscetível de criar qualquer tipo de dúvida.

Vejamos, então, se eventuais alterações ao Decreto-Lei n.º 275-A/2000 de 9 de novembro modificam o quadro legal aplicável ao suplemento de risco supra referido.

Ora, com impacto nas normas aqui em análise será de referir apenas o Decreto-Lei n.º 42/2009 de 12 fevereiro, considerando que este procede a uma alteração à redação do artigo 161º do Decreto-Lei n.º 275-A/2000 de 9 de novembro. Em concreto, o artigo 31º do Decreto-Lei n.º 42/2009 de 12 fevereiro, sob a epígrafe “Norma revogatória” determina o seguinte:

“São revogados:

  1. (…) os n.º 1 e 2 do artigo 161º, exceto no que respeita ao pessoal de chefia (…)”

Assim, por força da alteração operacionalizada pelo Decreto-Lei n.º 42/2009 de 12 fevereiro o n.º 1 do artigo 161º do Decreto-Lei n.º 275-A/2000 de 9 de novembro passou a ter a seguinte redação:

“1 - O pessoal de chefia, enquanto no exercício de tais funções, mantém o direito a suplemento de risco de montante igual ao fixado à data da entrada em vigor deste diploma.”

Ora, esta alteração é extremamente simples. Não se assiste a qualquer mutação do regime anteriormente vigente, apenas se exclui da aplicação do mesmo os Dirigentes. Quer isto significar que deixou de ser aplicável aos Dirigentes o suplemento de risco previsto no n.º 1 do artigo 161º do Decreto-Lei n.º 275-A/2000 de 9 de novembro, ou seja, de 20% da remuneração base mensal do respetivo cargo, porque era a regra que estava consagrada à data de entrada em vigor do próprio Decreto-Lei n.º 275-A/2000 de 9 de novembro (como é evidente não está aqui em causa a vigência do Decreto-Lei n.º 42/2009 de 12 fevereiro).     

 

Ante o exposto, extrai-se uma segunda conclusão: esta alteração teve impacto zero nos cargos de Chefia. A revogação só visou o Pessoal Dirigente. O que significa que o supra exposto, relativo ao quadro legal aplicável, se mantém inalterado. Continua a vigorar para o Pessoal de Chefia a regra consagrada neste normativo legal (n.º 1 do artigo 161º do Decreto-Lei n.º 275-A/2000 de 9 de novembro), ou seja, enquanto se mantiver no exercício das suas funções o Pessoal de Chefia aufere o suplemento de risco no valor de 20% da remuneração base mensal do respetivo cargo.

 

A alteração introduzida pelo Decreto-Lei n.º 42/2009 de 12 fevereiro tem um enquadramento e um sentido próprio. Surge na sequência da Lei n.º 37/2008 de 6 de agosto e veio consagrar o regime remuneratório dos Dirigentes da … (além de outras matérias). Daí ter revogado, em relação ao Dirigentes, o disposto no artigo 161º do Decreto-Lei n.º 275-A/2000 de 9 de novembro porque passou a vigorar em relação a estes o artigo 24º desse Decreto-Lei n.º 42/2009, em consonância com o artigo 55º da citada Lei n.º 37/2008 de 6 de agosto. Passou a distinguir-se (pela própria autonomização dos grupos de pessoal como supra se referiu) o Pessoal Dirigente e o de Chefia. Passaram a ter regimes distintos, o que é, aliás, facilmente percetível pela leitura atenta da Lei n.º 37/2008 de 6 de agosto. Esta lei veio aprovar uma nova Orgânica da … e revogou (artigo 58º) diversas normas do Decreto-Lei n.º 275-A/2000 de 9 de novembro mas manteve intacto o regime das Chefias de Núcleo e de Setor que é a única matéria que aqui importa.             

 

Visto o regime do Decreto-Lei n.º 275-A/2000 de 9 de novembro, com a única alteração com relevo para matéria aqui em causa, resta referir que o mesmo vigorou até ser revogado pelo Decreto-Lei n.º 138/2019, de 13 de setembro que entrou em vigor no dia 01 de janeiro de 2020. Assim, tendo vigorado até 31.12.2019 e atento o pedido formulado pelo Demandante, o quadro legal necessário para proferir decisão encontra-se traçado.   

*

O Demandante na argumentação aduzida na petição inicial faz ainda alusão às orientações proferidas pela DGAEP - Direção-geral da Administração e do Emprego Público sobre a presente matéria. A DGAEP nos termos do artigo 1º e 2º do Decreto Regulamentar n.º 27/2012 de 29 de fevereiro é um “serviço central da administração direta do Estado, dotado de autonomia administrativa”, tem como “missão apoiar a definição de políticas para a Administração Pública nos domínios da organização e da gestão, dos regimes de emprego e da gestão dos recursos humanos, assegurar a informação e dinamização das medidas adotadas e contribuir para a avaliação da sua execução” e uma das suas atribuições consiste precisamente em “d) Efetuar estudos e pareceres, bem como proceder à sistematização de informação sobre os regimes jurídicos relativos à qualificação e mobilidade de trabalhadores em funções públicas e às políticas ativas de emprego público;” 

Ora, pese embora já não subsistam dúvidas sobre o valor do subsídio de risco aplicável ao caso concreto, procedeu-se à consulta das tabelas do Sistema Retributivo da Administração Pública (disponível no site da DGAEP - Sistema Retributivo da Administração Pública 2008 página 107 e 115; Sistema Retributivo da Administração Pública 2009 (Carreiras/Categorias Não Revistas de Corpos Especiais) página 9 e nota n.º 26; Sistema Retributivo da Administração Pública 2010 (Carreiras/Categorias Não Revistas de Corpos Especiais) página 6 e nota n.º 15; Sistema Retributivo da Administração Pública 2011 (Carreiras/Categorias Não Revistas de Corpos Especiais) página 6 e nota n.º 15) e verificou-se que as mesmas corroboram o entendimento de que o suplemento de risco dos Chefes de Setor e Chefe de Núcleo do Pessoal de Apoio à … corresponde a 20% da remuneração base mensal do respetivo cargo, nos termos do n.º 1 do artigo 161.º do Decreto-Lei n.º 275-A/2000, de 9 de novembro.

*

Importa, ainda, salientar que as questões relacionadas com a atribuição do Suplemento de Risco no âmbito do disposto no Decreto-Lei n.º 295-A/90 de 21 de setembro e no Decreto-Lei n.º 275-A/2000, de 9 de novembro têm sido recorrentemente objeto de litigância, quer neste Centro de Arbitragem quer nos próprios Tribunais Administrativos. Assim, são de realçar, no que importa para o caso em apreço, as já referidas Decisões do CAAD proferidas nos Processos n.º 1297/2019-A e n.º 117/2020-A.

*

Na presente ação está em causa o exercício de cargos de Chefe de Núcleo e/ou Chefe de Setor nos períodos compreendidos entre 11.06.1991 e 31.12.2019 (data peticionada como limite). Atenta esta janela temporal são aplicáveis, nos termos supra expostos, o Decreto-Lei n.º 295-A/90 de 21 de setembro e o Decreto-Lei n.º 275-A/2000, de 9 de novembro. 

Nesta conformidade, verifica-se que assiste total razão ao Demandante, devendo ser reconhecido aos seus representados o direito, pelo período do exercício dos Cargos de Chefe de Núcleo ou Chefe de Setor, ao pagamento do Suplemento de Risco no valor de 20% da remuneração base mensal do respetivo cargo, até 31.12.2019, nos termos do n.º 2 do Decreto-Lei n.º 295-A/90 de 21 de setembro e posteriormente do n.º 1 do artigo 161.º do Decreto-Lei n.º 275-A/2000, de 9 de novembro.

Consequentemente, e no que concerne à condenação retroativa do Demandado, competir-lhe-á, em sede de execução do presente julgado, recalcular e reconstituir, de acordo com o supra determinado bem como com o demais quadro normativo aplicável à data, os pagamentos efetuados, durante os períodos de exercício dos cargos, em relação a cada representado do Demandante, apurando e procedendo ao pagamento dos eventuais diferenciais mensais remuneratórios, com as devidas e legais consequências.

Quanto aos juros de mora peticionados os mesmos são igualmente devidos, à taxa legal em vigor, desde o dia em que deviam ter sido pagos os montantes em falta, até efetivo e integral pagamento, considerando que compete ao Demandado reparar os danos que causou pela mora, que lhe é, assim, exclusivamente imputável (artigo 804º, a) do n.º 2 do artigo 805º e n.º 1 do artigo 806º do Código Civil, artigo 4º e n.º 3 do artigo 173º da LTFP).

Quanto à representada do Demandante …, atualmente aposentada, compete igualmente ao Demandado comunicar à Caixa Geral de Aposentações o recálculo dos pagamentos efetuados com vista a serem extraídas as eventuais consequências no cálculo da respetiva pensão.

*

O Demandante pugna ainda, a título de Responsabilidade Civil Extracontratual, por uma indemnização para cada um dos seus representados, de valor nunca inferior a 20% dos valores peticionados.

Para o efeito alega que os seus representados sofreram “danos patrimoniais” que se traduziram “numa diminuição do valor do Suplemento de Risco que deveria ter sido recebido (…)” e que “deve traduzir-se numa sanção, numa indemnização pecuniária, que nunca deve ser inferior a 20% (…) dos valores a receber pelos mesmos (…)”. Enquadra a sua pretensão no artigo 22º da CRP, Artigo 2º e 3º do Decreto-Lei n.º 48051 de 21 de novembro de 1967 e Anexo da Lei n.º 67/2007 de 31 de dezembro.

 

O regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas foi, durante décadas, regulado, essencialmente, pelo Decreto-Lei n.º 48051 de 21 de novembro de 1967. Contudo este diploma foi expressamente revogado pela Lei nº 67/2007, de 31 de Dezembro.

O regime jurídico a considerar para este efeito é o regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas, aprovado e publicado em anexo à Lei nº 67/2007, de 31 de dezembro, em especial os seus artigos 7º a 10º. Este regime confere sentido ao princípio consagrado no artigo 22º da CRP (como referido pelo Demandante) segundo o qual: “O Estado e as demais entidades públicas são civilmente responsáveis, em forma solidária com os titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, por ações ou omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício, de que resulte violação dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrem.”

Não obstante o regime legal especial, os pressupostos da responsabilização das entidades públicas são os mesmos que decorrem do princípio geral vertido no artigo 483º do Código Civil. Assim sendo, no caso concreto, para que o Demandado seja responsabilizado é necessário que se apure a existência de um facto voluntário, ilícito e culposo, que tenha causado danos aos representados do Demandante e que se estabeleça o nexo de causalidade entre aquele facto e estes danos.

Se podemos assumir que no presente caso existe: i) um facto voluntário praticado por parte do Demandado (controlável pela vontade humana pois apenas se exclui aqueles que decorrem de causas alheias à vontade, tais como causas naturais) que decorre da atuação/prática contínua inerente ao processamento de vencimentos e mesmo o próprio o ato de indeferimento praticado pelo Diretor Nacional Adjunto, datado de 22 de setembro de 2020; ii) ilicitude (artigo 9º) porque, como supra exposto, o pagamento do Suplemento de Risco foi efetuado em violação do disposto no n.º 2 do Decreto-Lei n.º 295-A/90 de 21 de setembro e n.º 1 do artigo 161.º do Decreto-Lei n.º 275-A/2000, de 9 de Novembro e tal traduziu-se no facto dos representados do Demandante não terem recebido o valor do suplemento de risco legalmente devido; iii) que existe culpa, considerando que o Demandante beneficia da presunção de culpa leve, nos termos do n.º 2 do artigo 10º e o Demandando não carreou para o processo qualquer factualidade suscetível de afastar esta presunção, verifica-se, contudo, que o Demandante não prova o iv) dano.

Ainda que se encontrem preenchidos os pressupostos supra referidos (de natureza cumulativa) o mesmo não se verifica em relação ao dano. O Demandante não faz qualquer tipo de prova dos danos sofridos pelos seus representados. Limita-se a tecer considerações genéricas, vagas, infundadas, apontando um valor abstrato, correspondente a 20% dos valores peticionados (podia ser 10% ou 30% era indiferente), aplicável de igual forma a todos os representados, valor esse que hipoteticamente arbitra de justo e cataloga inclusive como uma espécie de sanção. Os danos patrimoniais têm que resultar de prova produzida, carreada para o processo, sendo o ónus da prova do Demandante, que, manifestamente, não logrou cumprir na presente ação.

Ora, não se verificando um dos pressupostos legais e sendo os mesmos cumulativos, improcede o pedido do Demandante no que concerne ao pedido de indemnização por responsabilidade civil extracontratual. 

    

Saliente-se, contudo, a este propósito que, em bom rigor, os representados do Demandante, fruto da procedência do pedido condenatório nos termos supra, já serão devidamente ressarcidos pelos danos que sofreram.    

 

  1. Decisão

Em face do exposto, porque parcialmente provada, julga-se a presente ação parcialmente procedente e, em consonância, condena-se a Entidade Demandada a:

a) Reconhecer aos representados do Demandante, pelo período do exercício dos Cargos de Chefe de Núcleo ou Chefe de Setor até 31.12.2019, o direito ao pagamento do Suplemento de Risco no valor de 20% da remuneração base mensal do respetivo cargo, nos termos do n.º 2 do Decreto-Lei n.º 295-A/90 de 21 de setembro e posteriormente do n.º 1 do artigo 161.º do Decreto-Lei n.º 275-A/2000, de 9 de Novembro.

b) Recalcular e reconstituir de acordo com o supra determinado, bem como com o demais quadro normativo aplicável à data, os pagamentos efetuados, durante os períodos de exercício dos cargos, em relação a cada representado do Demandante, apurando e procedendo ao pagamento dos eventuais diferenciais mensais remuneratórios, com as devidas e legais consequências, incluindo juros de mora, à taxa legal em vigor, desde o dia em que deviam ter sido pagos os montantes em falta até efetivo e integral pagamento.

c) Comunicar à Caixa Geral de Aposentações o eventual recálculo dos pagamentos efetuados à representada do Demandante ….

Absolve-se a Entidade Demandada do demais peticionado.

 

*

  • Valor da causa fixado em 132.650,00€ conforme indicado pelo autor na petição inicial e de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 31º e n.º 1 do 32º ambos do CPTA e n.º 1 do artigo 299º e 306 º do CPC.
  • Observe-se, relativamente aos encargos processuais, o disposto no n.º 5 do artigo 29º do NRAA.
  • Notifique-se as partes e promova-se a publicitação da decisão arbitral, nos termos do n.º 3 do artigo 5.º do NRAA.

 

 

29.06.2021

 

Árbitro

Patrícia Fonseca



[1] Igualmente, neste sentido, Miguel Lucas Pires, in “Arbitragem administrativa e emprego público”, Revista do Ministério Público n.º 148, Outubro a Dezembro 2016, pág. 97 a 109. 

[2] Referência ao Decreto-Lei n.º 275-A/2000 de 9 novembro considerando o seu período de vigência e a data de entrada de entrada em vigor da Portaria n.º 1120/2009 de 30 de setembro.