DECISÃO ARBITRAL
I – Relatório
Em 20/09/2019, a Demandante, A..., apresentou petição inicial, tendo concluído pedindo como se segue: “NESTES TERMOS, Deve a presente acção ser julgada provada e procedente, e em consequência: a) Ser declarado nulo ou anulável a deliberação da B... de 11.06.2019 e, em consequência; b) Ser a Demandada condenada a praticar os actos devidos no âmbito do procedimento de avaliação por ponderação curricular requerido nos termos do n.º 5 do artigo 18.º da Lei do Orçamento de Estado para 2018 abstendo-se de aplicar qualquer regra de proporção, reconhecendo-se o direito da Demandante à pontuação de 5 nos parâmetros “Outros”, “Funções desempenhadas para além do conteúdo funcional” e “Outras funções ou cargos relevantes” nos anos de 2004 e de 2012 a 2015 e máxime com a consequente alteração do posicionamento remuneratório da Demandante nos anos de 2004 a 2017, com as legais consequências.”.
A Demandada, B..., foi citada, em 23/09/2019, para contestar o pedido formulado, querendo, no prazo de 20 dias.
Em 11/10/2019, em tempo, a Demandada apresentou contestação, pela qual deduziu defesa por impugnação, tendo ainda arguido exceção dilatória de inimpugnabilidade do ato.
Constituído o Tribunal Arbitral, foi proferido, em 22/10/2019, despacho inicial, pelo qual se determinou: a) a notificação da Demandante para que se pronunciasse, querendo, em dez dias, sobre a exceção arguida, ao abrigo do disposto na alínea d) do n.º 1 do art.5.º e no n.º 6 do art. 18.º NRAA; e b) a notificação das partes para se pronunciarem, no mesmo prazo, quanto à tramitação dos autos, nos termos da alínea c) do n.º 1 do art. 5.º e da alínea c) do n.º 1 e do n.º 4 do art. 18.º NRAA,
O despacho inicial previsto no art. 18.º NRAA foi notificado às partes em 22/10/2019.
Em 04/11/2019, em tempo, veio a Demandante pronunciar-se pela improcedência da exceção de inimpugnabilidade do ato, mais alegando o incumprimento do dever de envio do processo administrativo por parte da Demandada e pugnando pela produção da prova testemunhal e obtenção do depoimento de parte requeridos.
II – Apreciação de questões prévias: a exceção de inimpugnabilidade do ato
Cumprido o contraditório, o Tribunal Arbitral está em condições de conhecer da exceção de inimpugnabilidade do ato arguida pela Demandada, de harmonia com o previsto na alínea b) do n.º 1 do art. 18.º NRAA.
IIA – Fundamentação: A Matéria de Facto
Com relevância para conhecer da exceção de inimpugnabilidade do ato, consideram-se provados os seguintes factos:
1) A Demandante, A..., integra o mapa de pessoal da Demandada, B...– Despacho n.º .../2009, publicado na II Série do Diário da República n.º... .
2) Em 25/10/2018, a Demandante requereu a avaliação do seu desempenho, nos anos de 2004 a 2017, por ponderação curricular, nos termos previstos no n.º 5 do art. 18.º da Lei 114/2017, de 29 de dezembro, que aprovou a Lei do Orçamento do Estado para 2018 – fls. 3 a 170 do processo administrativo (p.a.)
3) Em 06/03/2019, o Presidente da B... homologou a avaliação do desempenho da Demandante nos anos 2004 a 2017 – vd. fls. 458 p.a.
4) Em 07/03/2019, a Demandante foi notificada da homologação da avaliação do seu desempenho – fls. 458 p.a.
5) Em 16/04/2016, na sequência de despacho do Presidente da B... datado de 04/04/2019, foi a Demandante novamente notificada da decisão que homologou a avaliação do seu desempenho, desta feita com elementos adicionais “abrindo-se novo prazo de reclamação” – fls. 501 e 502 a 511 p.a.
6) Do ato que homologou a avaliação do desempenho da Demandante resulta, ademais, que, relativamente aos anos de 2004 e 2012 a 2015, foi atribuída à trabalhadora uma pontuação de 4 nos parâmetros “Outros”, “Funções desempenhadas para além do conteúdo funcional” e “Outras funções ou cargos relevantes” e uma classificação final de “Bom” em cada um daqueles anos, com o fundamento, proposto pelos avaliadores e acolhido pelo Presidente do B..., que “A questão nuclear da reclamação e recurso atêm-se ao facto de certas funções – como o caso as de membro de um gabinete ministerial ou equiparado – não terem sido valoradas de forma idêntica às da chefia de unidades orgânicas da Administração Pública ou equiparadas; / Ora, tais funções, relevantes em si e em abstrato, não têm necessariamente, nem encontram na lei, uma via que lhes atribua relevância específica na carreira, mais ainda numa carreira que tem um conteúdo funcional único e muito singular. Tal a razão que motivou que nos “itens” acima referidos a valoração atribuída tivesse sido 4 e não 3 ou 5; / Tal não afasta, como noutro local se disse, a eventual relevância, mesmo assim indireta e em geral, que poderiam ter tarefas ou trabalhos específicos desenvolvidos e conexionados com o conteúdo funcional do posto de trabalho, mas que a trabalhadora não invocou;” / Outro entendimento, designadamente o de fazer relevar diretamente para ponderação curricular ou avaliação de desempenho o exercício de funções com este não diretamente conexionadas – mormente quando o regime de recrutamento não advenha de concurso mas, outrossim, de escolha e/ou requisição (de obrigatório acatamento) em função de outros critérios – dificilmente se compaginaria com os princípios constitucionais que são invocados.” – fls. 502 a 511 p.a.
7) Em 30/04/2019, a Demandante reclamou “de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 21.º do RAD-B...” do ato que lhe foi notificado “em 16.04.2019”, concluindo “Nestes termos e nos demais invocados nas reclamações e recurso anteriormente apresentados, deve a presente reclamação proceder em cumprimento dos preceitos legais neles referidos e, em consequência, ser atribuída à reclamante a avaliação final qualitativa de Muito Bom nos anos de 2004 e de 2012 a 2015, aplicando em sede de reposicionamento remuneratório o disposto no n.º 5 do artigo 16.º do RAD-B... a todos os anos em avaliação, conforme resulta do mesmo regulamento e do artigo 18.º da LOE 2018, substituindo-se assim os atos nulos por atos válidos e conformes à Constituição à LOE 2018, à Lei e ao RAD-B...” – fls. 514 a 521 p.a.
8) Para sustentar o pedido, manteve a Demandante que “O que a reclamante alega é que os cargos de adjunta e de chefe de gabinete (em substituição) de membros do Governo, são cargos e funções de reconhecido interesse público, como resulta do Decreto-Lei n.º 11/2012 de 20 de janeiro, e da alínea d) do art. 7.º do Despacho Normativo n.º 4-A/2010, publicado na 2.ª Série do Diário da República, de 8 de fevereiro, e como tal não podem deixar de ser valorados com a pontuação máxima” (art. 30.º da reclamação apresentada em 21/03/2019, para a qual a reclamação apresentada em 30/04/2019 remete). – fls. 530 e 491 p.a.
9) Por decisão de 09/05/2019, o Presidente da B... sustentou o ato por si praticado, asseverando que “A reclamante repete a linha de argumentação anteriormente desenvolvida, nada de novo acrescentando, pelo que mantenho as decisões anteriores com os fundamentos então aduzidos e que, a seguir, se transcrevem” reproduzindo depois a fundamentação vertida em despacho por si proferido em 02/01/2019 e concluindo que “a divergência entre a reclamante e os avaliadores é a de que a reclamante entende que alguém que exerce quaisquer funções que a lei reconheça como relevantes, de qualquer tipo ou natureza, deve necessariamente ser avaliada no serviço de origem com notação máxima. A este respeito, os avaliadores entenderam que o tempo de serviço deve ser necessariamente avaliado (e assim o fizeram) com notação, sempre, superior à mínima (o que fizeram), mas não necessariamente com a notação máxima, que reservaram para aqueles casos em que a própria lei e o regulamento aplicável admite a sua direta relevância na própria carreira. Considerando que os parâmetros em causa na presente reclamação – “Outros”, “Funções desempenhadas para além do conteúdo funcional” e “Outras funções ou cargos relevantes” – foram pontuados com a notação 4 (quatro), um ponto abaixo da pontuação máxima, só pode concluir-se que foram meritoriamente reconhecidos pelos avaliadores.” – fls. 570 a 573 p.a.
10) Inconformada, em 23/05/2019, a Demandante recorreu hierarquicamente, “de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 22.º do RAD-B...”, “da decisão do Presidente da B... que recaiu sobre a reclamação que apresentou em 30.04.2019”, concluindo que “Nestes termos: a) O ato de homologação da avaliação em causa deve ser substituído por outro que, reconhecendo os direitos da recorrente, confira a pontuação 5 nos parâmetros “Outros”, “Funções desempenhadas para além do conteúdo funcional” e “Outras funções ou cargos relevantes”, e a final a avaliação qualitativa de “Muito Bom” nos anos de 2004 e de 2012 a 2015, sanando os vícios do ato de homologação ferido de nulidade por violação de lei e por restrição dos direitos da recorrente. B) O ato administrativo de reposicionamento remuneratório consubstanciado no despacho do presidente da B... de 06.03.2019 deve ser considerado nulo e de nenhum efeito, determinando-se a prática de outro ato que se abstenha de aplicar à recorrente “a regra da proporção”, inventada pelo CCA sem qualquer base legal, e que consta agora daquele despacho” – fls. 522 a 590 p.a.
11) Por deliberação de 11/06/2019, notificada na mesma data à Demandante, a B... - reportando-se a anterior deliberação de 29/01/2019, pela qual havia determinado que a avaliação então sindicada fosse remetida aos avaliadores para que estes densificassem as razões que sustentaram as pontuações atribuídas e fosse, subsequentemente, proferido novo despacho de homologação - concluiu que “3. Suprida a insuficiência, foi o resultado homologado por despacho de 9 de maio p.p., em tudo se mantendo o que, quanto ao demais, ficou administrativamente consolidado com a suprarreferida deliberação. 4. E não existe lei ou norma constitucional (que, aliás, a recorrente invoca, mas sem identificar) nos termos da qual ao tempo de serviço público prestado fora da carreira deva corresponder uma notação predeterminada, muito menos que essa seja a máxima. 5. Termos em que se nega provimento ao recurso.” – fls. 591 a 597 p.a.;
12) Em 20/09/2019, a Demandante apresentou petição inicial, tendo pedindo: “NESTES TERMOS, Deve a presente acção ser julgada provada e procedente, e em consequência: a) Ser declarado nulo ou anulável a deliberação da B... de 11.06.2019 e, em consequência; b) Ser a Demandada condenada a praticar os actos devidos no âmbito do procedimento de avaliação por ponderação curricular requerido nos termos do n.º 5 do artigo 18.º da Lei do Orçamento de Estado para 2018 abstendo-se de aplicar qualquer regra de proporção, reconhecendo-se o direito da Demandante à pontuação de 5 nos parâmetros “Outros”, “Funções desempenhadas para além do conteúdo funcional” e “Outras funções ou cargos relevantes” nos anos de 2004 e de 2012 a 2015 e máxime com a consequente alteração do posicionamento remuneratório da Demandante nos anos de 2004 a 2017, com as legais consequências.”.
Não há factos não provados relevantes para o conhecimento da exceção de inimpugnabilidade do ato.
A convicção do Tribunal quanto à matéria de facto formou-se após análise da prova documental que consta dos autos e que se consubstancia no processo administrativo e nos documentos juntos pela Demandante com a petição inicial, cuja exatidão não foi impugnada pela Demandada.
IIB – Fundamentação: a Matéria de Direito
O Tribunal Arbitral está vinculado na sua pronúncia ao princípio do pedido, sob pena de anulabilidade da decisão proferida, de harmonia com o previsto na alínea v) do n.º 2 do art. 46.º da Lei da Arbitragem Voluntária (LAV), aprovada pela Lei n.º 63/2011, de 14 de dezembro, no n.º 1 do art. 185.º-A do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), aprovado pela Lei n.º 15/2002, de 22 de fevereiro, na redação em vigor, e no n.º 1 do art. 27.º NRAA, pelo que não pode conhecer da legalidade de ato diferente do que se mostra impugnado.
O pedido deduzido pela Demandante consiste na anulação (ou declaração de nulidade) da “deliberação da B... de 11.06.2019 e, em consequência (...)”, pelo que o pedido anulatório deduzido se refere, indubitavelmente, à deliberação da B... que incidiu sobre o recurso hierárquico apresentado em 23/05/2019, cumulando a Demandante esta pretensão com o pedido de condenação da Demandada à prática de vários atos que entende serão consequentes à anulação do ato, por apenas assim se reconstituir a situação de facto que existiria se o ato, que reputa ilegal, não tivesse sido praticado, conforme previsto no n.º 1 do art. 173.º CPTA.
Entende a Demandada que o ato impugnado é meramente confirmativo do ato de homologação da avaliação de desempenho da Demandante, esse sim, com o potencial de lesar dos seus direitos e interesses legalmente protegidos.
A Demandante, por sua vez, pugna pela impugnabilidade da deliberação da B... de 11/06/2019 com o argumento de que se trata de ato com eficácia externa e, portanto, lesivo dos seus interesses; e de que não estamos perante de ato confirmativo daquele que homologou a avaliação do seu desempenho, mas sim perante “um novo acto administrativo que decide no mesmo sentido que um acto anterior”, porquanto “assenta em novos pressupostos e tem em conta uma nova factualidade”.
Dispõe o n.º 1 do art. 53.º CPTA que não são impugnáveis os atos “que se limitem a reiterar, com os mesmos fundamentos, decisões contidas em atos administrativos anteriores”.
Conforme decidido no Ac. TCA Sul, de 22/11/2018, prolatado no Proc. n.º 1661/17.7BESNT, relatado por Sofia David, disponível para consulta em www.dgsi.pt, “a definição de acto confirmativo foi inovatoriamente estabelecida no art.º 53.º, n.º 1, do CPTA, ali se entendendo, para efeitos do contencioso administrativo, que a identidade de objeto e de decisão entre o acto confirmado e o acto confirmativo bastam para a ocorrência de tal confirmatividade, que é também uma condição de inimpugnabilidade do acto confirmativo. Ou seja, nos termos do citado preceito um acto que se limita a manter um acto anterior sem alterar em nada a anterior definição jurídica do particular, não tem conteúdo inovatório e decisório e, por isso, não é impugnável – cf. também o art.º 51.º, n.º 1, do CPTA.”.
Dito de outro modo, apenas não estaremos perante ato meramente confirmativo, mas perante ato novo, modificativo do primeiro - e portanto lesivo – quando aquele, sendo emanado da mesma entidade e dirigido ao mesmo destinatário, não se limite a repetir “perante os mesmos pressupostos de facto e de direito, o conteúdo e a fundamentação do ato anterior, sem nada acrescentar ou retirar ao conteúdo deste” – vd. Ac. STA, de 13/03/2019, prolatado no Proc. n.º 0358/18.5BESNT, relatado por Maria do Céu Neves, disponível para consulta em www.dgsi.pt.
A questão que cumpre decidir – qual seja, a impugnabilidade da deliberação da B... de 11/06/2019 – depende, por isso, da verificação (ou não) da relação de confirmabilidade entre o ato de homologação da avaliação de desempenho da Demandante (ato primário) e a deliberação da B... impugnada (ato secundário).
A deliberação da B... impugnada será meramente confirmativa do ato de homologação da avaliação do desempenho da Demandante (e inimpugnável), caso se limite a manter a anterior decisão sem alterar a definição jurídica da Demandante; inversamente, tratar-se-á de ato potencialmente lesivo dos direitos e interesses legalmente protegidos da Demandante (e impugnável), caso se revele ter conteúdo inovatório, “acrescentando ou retirando” ao conteúdo do ato primário.
Ora, em 16/04/2019, a Demandante foi notificada de ato homologatório da avaliação do seu desempenho, por ponderação curricular, nos anos de 2004 a 2017, do qual consta, relativamente aos anos de 2004 e 2012 a 2015, uma pontuação de 4 nos parâmetros “Outros”, “Funções desempenhadas para além do conteúdo funcional” e “Outras funções ou cargos relevantes” e uma classificação final de “Bom”, em cada um daqueles anos, com o fundamento de que “A questão nuclear da reclamação e recurso atêm-se ao facto de certas funções – como o caso as de membro de um gabinete ministerial ou equiparado – não terem sido valoradas de forma idêntica às da chefia de unidades orgânicas da Administração Pública ou equiparadas; / Ora, tais funções, relevantes em si e em abstrato, não têm necessariamente, nem encontram na lei, uma via que lhes atribua relevância específica na carreira, mais ainda numa carreira que tem um conteúdo funcional único e muito singular. Tal a razão que motivou que nos “itens” acima referidos a valoração atribuída tivesse sido 4 e não 3 ou 5; / Tal não afasta, como noutro local se disse, a eventual relevância, mesmo assim indireta e em geral, que poderiam ter tarefas ou trabalhos específicos desenvolvidos e conexionados com o conteúdo funcional do posto de trabalho, mas que a trabalhadora não invocou;” / Outro entendimento, designadamente o de fazer relevar diretamente para ponderação curricular ou avaliação de desempenho o exercício de funções com este não diretamente conexionadas – mormente quando o regime de recrutamento não advenha de concurso mas, outrossim, de escolha e/ou requisição (de obrigatório acatamento) em função de outros critérios – dificilmente se compaginaria com os princípios constitucionais que são invocados.”.
Reclamando do ato assim notificado, a Demandante pugnou, em 30/04/2019, pela atribuição de uma avaliação final qualitativa de “Muito Bom” nos anos de 2004 e 2012 a 2015 – por via da alteração da pontuação nos parâmetros “Outros”, “Funções desempenhadas para além do conteúdo funcional” e “Outras funções ou cargos relevantes” para 5 em todos aqueles anos – com o argumento que “O que a reclamante alega é que os cargos de adjunta e de chefe de gabinete (em substituição) de membros do Governo, são cargos e funções de reconhecido interesse público, como resulta do Decreto-Lei n.º 11/2012 de 20 de janeiro, e da alínea d) do art. 7.º do Despacho Normativo n.º 4-A/2010, publicado na 2.ª Série do Diário da República, de 8 de fevereiro, e como tal não podem deixar de ser valorados com a pontuação máxima”.
Em 09/05/2019, o Presidente da B... sustentou a homologação da avaliação do desempenho da Demandante, asseverando “A reclamante repete a linha de argumentação anteriormente desenvolvida, nada de novo acrescentando, pelo que mantenho as decisões anteriores com os fundamentos então aduzidos e que, a seguir, se transcrevem: (...)” concluindo “a divergência entre a reclamante e os avaliadores é a de que a reclamante entende que alguém que exerce quaisquer funções que a lei reconheça como relevantes, de qualquer tipo ou natureza, deve necessariamente ser avaliada no serviço de origem com notação máxima. A este respeito, os avaliadores entenderam que o tempo de serviço deve ser necessariamente avaliado (e assim o fizeram) com notação, sempre, superior à mínima (o que fizeram), mas não necessariamente com a notação máxima, que reservaram para aqueles casos em que a própria lei e o regulamento aplicável admite a sua direta relevância na própria carreira. Considerando que os parâmetros em causa na presente reclamação – “Outros”, “Funções desempenhadas para além do conteúdo funcional” e “Outras funções ou cargos relevantes” – foram pontuados com a notação 4 (quatro), um ponto abaixo da pontuação máxima, só pode concluir-se que foram meritoriamente reconhecidos pelos avaliadores.”.
A deliberação impugnada surge após recurso hierárquico interposto daquela decisão em 23/05/2019, pelo qual a Demandante volta a pugnar, com os mesmos argumentos, pela atribuição da pontuação máxima nos parâmetros “Outros”, “Funções desempenhadas para além do conteúdo funcional” e “Outras funções ou cargos relevantes”, insurgindo-se contra o entendimento perfilhado pela B... - quer no ato de homologação do seu desempenho, quer no ato recorrido - que o exercício de funções em gabinetes ministeriais não tem, necessariamente, de ser avaliado com a pontuação máxima nos parâmetros em causa.
O ato impugnado conclui (depois de verificar que fora suprida a falta de fundamentação que havia identificado na deliberação de 29/01/2019 e que determinou a repetição do ato de homologação) que “não existe lei ou norma constitucional (que, aliás, a recorrente invoca, mas sem identificar) nos termos da qual ao tempo de serviço público prestado fora da carreira deva corresponder uma notação predeterminada, muito menos que essa seja a máxima.”, pelo que, julgando o recurso improcedente, mantém a decisão de homologação notificada em 16/04/2019.
De tudo o que vem dito resulta, à saciedade, que a deliberação impugnada se limita a, perante os mesmos pressupostos de facto e de direito, confirmar o ato primário, mantendo-o no seu conteúdo e fundamentação, o que é dizer, nos seus precisos termos e sem alterar a definição da situação jurídica da Demandante.
De facto, resulta da fundamentação dos vários atos administrativos acima descritos e dos argumentos aduzidos nas sucessivas impugnações administrativas supra mencionadas que, desde a homologação da avaliação do desempenho da Demandante notificada em 16/04/2016, o discenso entre as partes se estabilizou na questão de saber se os cargos de adjunta e de chefe de gabinete (em substituição) de membros do Governo, que a Demandante exerceu em 2004 e entre 2012 e 2015, implicam, obrigatoriamente, a atribuição, para efeitos de avaliação do desempenho, a pontuação máxima nos parâmetros “Outros”, “Funções desempenhadas para além do conteúdo funcional” e “Outras funções ou cargos relevantes”, questão a que a B..., consistentemente, deu resposta negativa, usando, invariavelmente, dos mesmos fundamentos.
Constata-se que o segmento decisório da deliberação impugnada (“não existe lei ou norma constitucional (que, aliás, a recorrente invoca, mas sem identificar) nos termos da qual ao tempo de serviço público prestado fora da carreira deva corresponder uma notação predeterminada, muito menos que essa seja a máxima.”) nada acrescenta ou retira ao que foi decidido com a homologação da avaliação do desempenho da Demandada, quando se decidiu que “tais funções, relevantes em si e em abstrato, não têm necessariamente, nem encontram na lei, uma via que lhes atribua relevância específica na carreira” e que “Outro entendimento, designadamente o de fazer relevar diretamente para ponderação curricular ou avaliação de desempenho o exercício de funções com este não diretamente conexionadas – mormente quando o regime de recrutamento não advenha de concurso mas, outrossim, de escolha e/ou requisição (de obrigatório acatamento) em função de outros critérios – dificilmente se compaginaria com os princípios constitucionais que são invocados.”
Não se vislumbra, por isso, quais os “novos pressupostos” ou a “nova factualidade” a que a Demandante alude no requerimento entrado nos autos em 04/11/2019.
E nem se diga, como pretende a Demandante, que a alusão, na deliberação impugnada, a “resultado homologado por despacho de 9 de maio p.p., em tudo se mantendo o que, quanto ao demais, ficou administrativamente consolidado com a suprarreferida deliberação.” consubstancia qualquer inovação face ao anteriormente decidido, porquanto, além desta referência não introduzir qualquer modificação ao conteúdo do ato primário, resulta, manifestamente, do contexto da declaração da vontade expressa que ali se quis referir o ato de homologação da avaliação da Demandante, pelo que o destinatário normal imediatamente identificaria o ato ali mencionado como sendo o ato praticado pelo Presidente do B... em 06/03/2019 (cuja notificação foi completada em 16/04/2019) e que foi sustentando, em 09/05/2019, após reclamação da Demandante .
Assim sendo, como é, estamos perante erro material, tratado no art. 249.º Código Civil e no n.º 1 do art. 174.º do Código de Procedimento Administrativo (CPA), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro, por se tratar de “lapsus calami” que apenas dá direito à respetiva retificação.
Em síntese, sendo a deliberação da B... de 11/06/2019 destituída de conteúdo inovatório, lesivo dos direitos e interesses legalmente protegidos da Demandante, é também, nos termos previstos no n.º 1 do art. 53.º CPTA, inimpugnável, pelo que a exceção arguida terá de proceder.
Obstando a procedência da exceção dilatória de inimpugnabilidade do ato à apreciação do mérito da causa, de harmonia com o previsto no n.º 2 do art. 89.º CPTA, ficam prejudicadas as demais questões suscitadas, pelo que sobre estas não será emitida pronúncia.
III – Decisão
Em face do supra exposto, decide-se julgar procedente a exceção dilatória de inimpugnabilidade do ato e absolver a Demandada, B..., da instância, de harmonia com o previsto no n.º 1 do art. 53.º e no n.º 2 e na alínea i) do n.º 4 do art. 89.º CPTA.
Fixa-se o valor do processo em € 30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo), nos termos do artigo 34.º CPTA, sendo os encargos processuais suportados em partes iguais pela Demandante e pela Demandada, de harmonia com o previsto no n.º 5 do art. 29.º NRAA.
Notifique-se.
Lisboa e CAAD, em 22 de novembro de 2019.
A Juíza Árbitro
Sofia Ventura