SENTENÇA
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RELATÓRIO
O Demandado A... (doravante, “A...”), pessoa coletiva de direito público, com sede na Rua ..., n.º..., ...-... ..., com o número de identificação da pessoa coletiva ... (doravante “DEMANDADO”) vinculou-se previamente ao Centro de Arbitragem Administrativa (doravante, “CAAD”), através do Despacho A.../... /2011, datado de 21.01.2010, junto como Documento n.º 1 da Petição Inicial.
Ao abrigo do referido Despacho e do disposto no n.º 2 do artigo 8.º do (novo) Regulamento de Arbitragem Administrativa do CAAD, com as alterações de 09.04.2018 (doravante, “REGULAMENTO”), a Demandante B..., residente na Rua..., ...– ..., ...–..., no ..., titular do cartão de cidadão n.º..., válido até 11.01.2021, com o número de identificação fiscal ..., docente do Ensino Superior Politécnico ao serviço do A... (doravante, “DEMANDANTE”), veio, a 07.05.2018, através de correio eletrónico, requerer a submissão do presente litígio ao Centro de Arbitragem Administrativa (doravante, “CAAD”), através de requerimento, juntando a respetiva Petição Inicial, instaurando a presente ação contra o A... .
No referido articulado, a Demandante peticionou, a final, a condenação do Demandado à prática do ato legalmente devido, requerendo que fosse deferida a prestação de provas públicas de avaliação da sua competência pedagógica e técnico-científica para a categoria de Professora Coordenadora Principal.
Tendo sido regularmente citado, a 10.05.2018, o Demandado não apresentou contestação, nem remeteu ao CAAD o respetivo processo administrativo, nem quaisquer documentos respeitantes ao litígio, nos termos do n.º 4 do artigo 12.º do Regulamento.
Por correio eletrónico, datado de dia 26.06.2018, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD notificou o Senhor Dr. Nuno Pimentel Gomes da respetiva designação como árbitro de Tribunal Arbitral singular, cuja designação foi aceite.
Na sequência da aceitação da designação como árbitro, foram as Partes notificadas dessa designação, constituindo-se o Tribunal arbitral na referida data.
Em 19.09.2018, finda a fase dos articulados, não existindo questões que obstassem ao conhecimento do objeto do processo, não tendo as Partes requerido a realização de quaisquer diligências probatórias, não se afigurando tal necessário, nem existindo matéria de facto controvertida, foi proferido despacho notificando-se as Partes para, querendo, apresentar alegações finais escritas, no prazo de 20 (vinte) dias, nos termos do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 18.º e do artigo 24.º do Regulamento.
Em 11.10.2018, a Demandante apresentou as suas alegações finais escritas, mantendo e reiterando aquilo que consta da sua petição / requerimento inicial, nos precisos termos ali expressos.
O Demandado, devidamente notificado para o efeito e não obstante o compasso de espera que foi concedido para o efeito, não apresentou alegações finais escritas.
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Considerando que a matéria sub judice é respeitante a uma relação jurídica de emprego público – a de saber se a Demandante poderá ou não ser admitida à prestação de provas públicas para aceder à categoria de Professora Coordenadora Principal –, pode ser constituído Tribunal Arbitral para o seu julgamento, nos termos do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 180.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (doravante, “CPTA”), pelo que o Tribunal é competente em razão da matéria.
A isto acresce o disposto no Despacho A... /.../.../2011, de 21 de janeiro de 2011, proferido pelo Demandado, no qual é estabelecido o seguinte: “(…) o A... vincula-se à jurisdição do Centro de Arbitragem Administrativa – CAAD para a composição de litígios de valor igual ou inferior a 500.000 euros e que tenham por objeto: a) Questões emergentes de relações jurídicas de emprego público, quando não estejam em causa direitos indisponíveis e quando não resultem de acidente de trabalho ou de doença profissional (…)”.
O Tribunal é igualmente competente em razão do valor, sendo o valor atribuído ao litígio de EUR 30.000,01 (trinta e um mil euros e um cêntimo), não tendo este valor sido impugnado pelo Demandado.
Pelo que o presente Tribunal Arbitral é competente para dirimir o presente litígio.
As Partes têm personalidade e capacidade judiciárias, na medida em que têm, respetivamente, personalidade e capacidade jurídicas.
Pretendendo a Demandante a realização de provas públicas de avaliação da sua competência pedagógica e técnico-científica para a categoria de Professora Coordenadora Principal no A..., é, portanto, parte na relação material controvertida, sendo o Demandado A..., consequentemente, também parte na relação material controvertida, pelo que as Partes são legítimas.
Tendo o requerimento da Demandante, junto do A..., sido apresentado a 30.12.2016, o prazo para a decisão era de 90 (noventa) dias, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 128.º do Código do Procedimento Administrativo, tendo-se verificado o seu termo a 10.05.2017 (cfr. Documento n.º 3 junto com a Petição Inicial).
Caducando o direito de ação no prazo de um ano contado desde o termo do prazo legal estabelecido para a emissão do ato ilegalmente emitido, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 69.º do CPTA, e tendo a Petição Inicial sido apresentada no dia 07.05.2018, a ação é tempestiva.
Não há quaisquer nulidades ou outras questões que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
Em harmonia com o exposto, cumpre apreciar e decidir a presente ação.
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FUNDAMENTAÇÃO
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MATÉRIA DE FACTO
Considerando aquilo que foi alegado pela Demandante e não impugnado pelo Demandado e os documentos juntos ao processo (na Petição Inicial), dão-se como provados os seguintes factos:
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A Demandante é titular do grau de doutora;
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A Demandante exerce atualmente funções em regime de exclusividade ao serviço do Demandado, com a categoria profissional de Professora Coordenadora;
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A Demandante exerceu funções na categoria de Assistente do 1.º triénio, de 03.01.1995 a 02.01.1998;
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A Demandante exerceu funções na categoria de Assistente do 2.º triénio, de 03.01.1998 a 10.01.1999;
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A Demandante exerceu funções na categoria de Equiparada a Professora Adjunta, de 11.01.1999 a 20.03.2007;
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A Demandante exerce funções na categoria de Professora Coordenadora, desde 21.03.2007;
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A Demandante está vinculada ao Demandado por Contrato de Trabalho em Funções Públicas por Tempo Indeterminado;
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Em 30.12.2016, a Demandante apresentou, em 30.12.2016, junto do Senhor Presidente do A..., requerimento para prestação de provas públicas de avaliação da sua competência pedagógica e técnico-científica para a categoria de Professora Coordenadora Principal;
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O Demandado não proferiu qualquer decisão sobre tal requerimento;
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Em 07.05.2018, a Demandante apresentou Petição Inicial, à qual o Demandado não ofereceu qualquer resposta.
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MATÉRIA DE DIREITO
No caso em apreço, o objeto do litígio prende-se com a questão de saber se um(a) Professor(a) Coordenador(a), ao abrigo do disposto no artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, tem direito à prestação de provas públicas de avaliação da sua competência pedagógica e técnico-científica para transitar para a categoria de Professor(a) Coordenador(a) Principal, para efeitos do Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 185/81, de 1 de julho, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto (doravante, “ECPDESP”).
Com efeito, a carreira do pessoal docente do ensino superior politécnico, nos termos do artigo 2.º do ECPDESP, compreende as categorias de Professor Adjunto [cfr. alínea b)], de Professor Coordenador [cfr. alínea c)] e de Professor Coordenador Principal [cfr. alínea d)].
Ora, a Demandante entende que tem direito à prestação de provas públicas de avaliação da sua competência pedagógica e técnico-científica para transitar para a categoria de Professora Coordenadora Principal, ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, alegando, desde logo, o que se encontra disposto no preâmbulo do mesmo.
Este refere expressamente o seguinte: “Faculta-se igualmente possibilidade de a realização das provas públicas para a transição para a carreira, introduzida pela Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, através do aditamento dos n.os 9, 10 e 11 ao artigo 6.º e do n.º 5 do artigo 8.º-A ao Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, aos docentes que contem, desde 1 de setembro de 2009, 20 anos de serviço em regime de tempo integral ou de dedicação exclusiva (…).”.
Sustenta, deste modo, que é patente a vontade do legislador em regular a situação dos docentes abrangidos pelo n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, embora reconheça que tal situação é omissa no (posterior) Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto.
Entende, porém, que, sendo este diploma de 2016 complementar do Decreto-Lei n.º 207/2009 – o que, efetivamente, decorre dos termos do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto –, a omissão da referência a Professor Coordenador no artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, deveria ser considerada uma lacuna, que, por sua vez, deveria ser integrada atendendo ao disposto no n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto.
Em suma, entende que os docentes abrangidos pelo n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto – ou seja, os Assistentes, os Professores-Adjuntos e os Professores Coordenadores – que, à data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, exerçam funções em regime de tempo integral ou de dedicação exclusiva há mais de 20 anos, podiam, até ao dia 31 de dezembro de 2016, requerer a prestação de provas a que se referem os n.ºs 9, 10 e 11 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação dada pela Lei n.º 7/2010, de 13 de maio.
Vejamos.
O regime atualmente em vigor encontra-se previsto no artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, alterado pela Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto, o qual tem a seguinte redação:
“1 – Os assistentes e os equiparados a assistente, a professor adjunto ou a professor coordenador que, à data da entrada em vigor do presente decreto-lei, exerçam funções em regime de tempo integral ou de dedicação exclusiva há mais de 15 anos podem, até 31 de dezembro de 2017, requerer a prestação das provas a que se referem os n.ºs 9, 10 e 11 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 207/2008, de 31 de agosto, alterado pela Lei n.º 7/2010, de 13 de maio.
2 – Os docentes referidos no número anterior transitam, em caso de aprovação nas referidas provas, sem outras formalidades, para o regime de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado, na mesma categoria em que exercem funções.”.
Este regime difere, desde logo, do que se encontrava previsto nos termos do n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei 207/2009, de 31 de agosto, na redação da Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, cuja redação era a seguinte:
“(…)
5 – Os actuais assistentes, professores-adjuntos e professores-coordenadores que exerçam funções docentes em regime de tempo integral ou dedicação exclusiva há mais de 15 anos podem requerer a prestação de provas públicas de avaliação da sua competência pedagógica e técnico-científica, no prazo de um ano a partir da publicação da presente lei, nos termos do estabelecido nos n.ºs 8 a 10 do artigo 6.º, com as devidas adaptações, transitando, em caso de aprovação nas referidas provas, sem outras formalidades, para o regime de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato de trabalho por tempo indeterminado na respectiva categoria.”.
Assim, e em 1.º lugar, relativamente ao âmbito subjetivo da previsão de ambas as disposições podemos distinguir, por um lado, a constante do n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação dada pela Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, que previa (i) os Assistentes; (ii) os Professores-Adjuntos e (iii) os Professores Coordenadores e, por outro, a que resulta do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, que prevê (i) os Assistentes; (ii) os Equiparados a Assistente; (iii) os Equiparados a Professor Adjunto; e (iv) os Equiparados a Professor Coordenador.
Donde resulta que o elemento literal é desfavorável à tese propugnada pela ora Demandante: encontrando-se tão-somente previstos os “Equiparados a Professor Coordenador”, os Professores Coordenadores estão, a priori, excluídos do leque de sujeitos que podem requerer a realização de provas públicas para efeitos do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto.
Ademais, e tal como resulta da jurisprudência do CAAD [cfr. Sentença de 12.03.2018, (João Tiago Silveira), proferida no âmbito do processo n.º 51/2017-A], o próprio regime do n.º 2 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto (ainda que na redação da Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto) “(…) reforça este entendimento, pois a transição para um contrato por tempo indeterminado não faz sentido relativamente a professores coordenadores, que já beneficiam desse tipo de vínculo ((n.º 1 do artigo 10.º do ECPDESP).”.
Com efeito, tal como resulta do n.º 1 do artigo 10.º do ECPDESP, “[o]s professores coordenadores são contratados por tempo indeterminado.”.
Ora, caso o requerimento da Demandante tivesse sido objeto de uma decisão de deferimento e esta tivesse sido aprovada nas provas públicas, a consequência que lhe adviria seria, inter alia, a de que esta transitaria para o regime de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado, o que, como é bom de ver, já resultando do disposto no n.º 1 do artigo 10.º do ECPDESP, torna, no mínimo, tal consequência desajustada (rectius: inútil) para os Professores Coordenadores.
A isto acresce, em 2.º lugar, a circunstância de haver uma (outra) divergência substancial entre o regime previsto nos termos do n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação dada pela Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, e o regime previsto no artigo 6.º (maxime, no n.º 2) do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, também relacionada com a estatuição da norma.
Com efeito, a transição para o contrato de trabalho por tempo indeterminado – que, como é sintomático, não sucederia no caso em apreço – era realizada, nos termos do n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação da Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, “(…) na respectiva categoria.”, enquanto que a mesma transição, nos termos do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, é realizada “(…) na mesma categoria em que exercem funções.”.
Na senda da jurisprudência do CAAD [cfr. Sentença de 24.06.2018, (Elizabeth Fernandez), proferida no processo n.º 72/2017-A], esta disposição deve ser articulada com o regime previsto para o recrutamento de Professores Coordenadores Principais.
Ora, nos termos do n.º 2 do artigo 9.º-A do ECPDESP, “[o]s professores coordenadores principais são recrutados exclusivamente por concurso documental nos termos do presente Estatuto.”.
Assim, na esteira da jurisprudência do CAAD referida, “[p]ara garantia de cumprimento da regra da progressão por concurso documental a expressão legalmente usada «respectiva categoria» tem de ser entendida como sendo aquela que é a categoria profissional do candidato, por forma a manter o regime excecional naquilo que ele é: uma forma de transição para a carreira e não uma forma de progressão na carreira, sendo que, uma vez na carreira por esta via, poderá concorrer com os outros pares se e quando for autorizada a abertura de procedimento concursal para uma certa categoria, nas condições que vierem a ser previstas para tal e iguais para todos os candidatos possíveis.”.
Nesta medida, a estatuição da norma que a Demandante pretende ver-lhe aplicada analogicamente não seria, em princípio, apta a atribuir o que foi por si peticionado: com efeito, tratando-se de uma disposição cujo escopo é a transição para a carreira e não a progressão na carreira, não permite, por esta via, a progressão de Professora Coordenadora para Professora Coordenadora Principal, sendo esta apenas possível por via de concurso documental.
Como resulta da referida jurisprudência, “[a] lógica que preside à subida na categoria académica é, neste caso, a de submissão dos currículos académicos que foram sendo construídos pelos docentes a um escrutínio académico comparativo e não apenas a uma apreciação singular, o que deriva da circunstância de a progressão se alicerçar no mérito comparativo de cada um e derivar da necessidade da criação de vagas para certa categoria profissional, determinadas, por sua vez, em função do número de alunos dessa instituição.”.
Em 3.º lugar, as normas sob análise – o n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação dada pela Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, e o artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto – encerram um regime excecional de transição para a carreira relativamente ao regime geral de recrutamento dos Professores-Adjuntos – que, nos termos do artigo 5.º do ECPDESP, são recrutados exclusivamente por concurso documental –, dos Professores Coordenadores – que, nos termos do artigo 6.º do ECPDESP, são recrutados exclusivamente por concurso documental – e dos Professores Coordenadores Principais – que, nos termos do n.º 2 do artigo 9.º-A do ECPDESP, são recrutados exclusivamente por concurso documental.
No que concerne ao n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação dada pela Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, a excecionalidade do regime decorre, desde logo, do disposto na epígrafe, cuja redação é “Regime transitório excepcional”.
Ora, tal excecionalidade é desde logo evidenciada pela circunstância de tanto uma norma como a outra preverem, especificamente, prazos para que o direito nelas previsto fosse exercido, i.e., para que os sujeitos abrangidos pela sua previsão pudessem requerer a prestação de provas públicas de avaliação da sua competência pedagógica e técnico-científica.
O prazo previsto nos termos do n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação dada pela Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, era de um ano a contar a partir da publicação da presente lei, terminando, portanto, a 13 de novembro de 2011.
O prazo previsto nos termos artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, terminava a 31 de dezembro de 2016, tendo sido prorrogado até dia 31 de dezembro de 2017, por efeitos do disposto da Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto.
Face ao exposto, atenta a exclusão da Demandante do âmbito subjetivo do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2017, de 17 de agosto, pretende a Demandante aplicar (analogicamente) o disposto no n.º 5 do artigo 8.º-A do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação dada pela Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, quando é patente que aquele regime excecional já caducou.
Pese embora o Decreto-Lei n.º 46/2016, de 17 de agosto, não ter expressamente revogado o artigo 8.º-A (e em especial o n.º 5 deste artigo) do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, na redação dada pela Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, não se pode daí retirar, sem mais, que tal regime continue a vigorar.
Tendo o prazo previsto no n.º 5 do artigo 8.º-A atingido o seu termo, pode, pois, concluir-se que se verificou uma caducidade de tal disposição: com efeito, tal disposição destinava-se a ter uma vigência temporária, pelo que, após o dia 13 de novembro de 2011, pode, pois, concluir-se que estamos perante uma cessação da vigência de tal disposição, por caducidade (cfr., neste sentido, Miguel Teixeira de Sousa, Introdução ao Direito, Almedina, 2012, p. 174).
E, em 4.º lugar, a tal conclusão não obsta o disposto no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 45/2016, 17 de agosto.
Antes de mais, o preâmbulo não é determinante como elemento interpretativo.
Com efeito, como refere, por exemplo, José de Oliveira Ascensão (O Direito, 13.ª edição, Almedina, 2005, pp. 408-409):
“(…) Pertencem por exemplo aos elementos lógicos as afirmações formalmente incluídas pelo legislador na própria fonte, sem, todavia, possuírem carácter vinculativo directo.
São desta natureza:
– Os preâmbulos das leis (…)
(…) Estes elementos, apesar da sua grande autoridade, não têm o mesmo valor do texto. Em si, não têm o sentido de determinação, que é o próprio de uma fonte de direito, mas o de esclarecimento (preâmbulo) ou de análise de um caso com vista à sua solução, pela declaração da máxima de decisão que o rege. Por isso, se houver contradição é o que está no articulado ou no próprio texto da decisão judicial, conforme os casos, que prevalece.”
Partindo deste pressuposto, e sem prejuízo, o preâmbulo é claro quando se refere à “(…) transição para a carreira.” (e progressão para a carreira).
Pelo que (i) não se retirando da sua análise, sem mais, que o artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, se aplica também aos Professores Coordenadores (que pretendam a prestação de provas públicas para aceder à categoria – superior – de Professor Coordenador Principal); e (ii) sendo patente a referência à transição para a carreira – o que, mediatamente, aparenta excluir os Professores Coordenadores, considerando que estes já estão, efetivamente, na carreira, na medida em que são contratados por tempo indeterminado –, improcede, deste modo, o argumento invocado pela Demandante, não sendo, portanto, de o relevar para efeitos de aplicação analógica de tal disposição.
Em 5.º lugar, a interpretação (integração) preconizada pela Demandante parece também não ir ao encontro da teleologia subjacente à consagração de tais regimes excecionais.
O regime previsto no Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, subsequentemente alterado pela Lei n.º 7/2010, de 13 de maio, e depois complementado pelo Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, visou, entre outros aspetos, a remoção da precariedade dos vínculos do pessoal docente do Ensino Superior Politécnico.
Tal resulta dos preâmbulos do Decreto-Lei n.º 207/2009, de 31 de agosto, e do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, manifestando-se, em particular, na estatuição prevista no n.º 2 do artigo 6.º deste último diploma.
Ora, essa situação de precariedade não se verifica no caso dos Professores Coordenadores, que, beneficiando de contratos por tempo indeterminado, não necessitam, portanto, da tutela conferida por aquelas disposições.
Em 6.º lugar, sublinhe-se que é também determinante para o presente caso a circunstância de o artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, já ter sido objeto de uma alteração, por via do disposto da Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto.
Foram, assim, introduzidas alterações ao disposto no artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 45/2016, de 17 de agosto, relativamente (i) ao tempo de exercício de funções em regime de tempo integral ou de dedicação exclusiva, que passou, deste modo, de 20 anos (em 2016) para 15 anos (em 2017); e (ii) ao prazo para requerer a prestação de provas públicas que, ao invés de terminar a 31 de dezembro de 2016, passou a terminar em 31 de dezembro de 2017.
Se tivesse havido lapso ou omissão involuntária por parte do legislador, porventura teria ocorrido alteração ou correção por via da Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto. Não o tendo sido, tudo indica que a intenção do legislador foi terá sido a de não incluir os Professores Coordenadores no âmbito subjetivo daquela disposição.
Ademais, e em 7.º lugar, poder-se-á sempre questionar se estamos, efetivamente, perante uma lacuna.
Como refere Karl Engish [Introdução ao Pensamento Jurídico, tradução do alemão Einführung in das juristische denken (1983), Fundação Calouste Gulbenkian, 2001, p. 201):
“Com efeito, não podemos falar duma lacuna no Direito (positivo) logo que neste não exista uma regulamentação cuja existência nos representamos. Não nos é lícito presumir pura e simplesmente uma determinada regulamentação, antes, temos que sentir a sua falta, se queremos apresentar a sua não existência como uma «lacuna». Mas a inexistência da regulamentação em causa pode corresponder a um plano do legislador ou da lei, e então não representa uma «lacuna» que tenha de se apresentar sempre como uma «deficiência» que estamos autorizados a superar. Uma tal inexistência planeada de certa regulamentação (propriamente uma regulamentação negativa) surge quando uma conduta, cuja punibilidade nós talvez aguardemos, «consciente e deliberadamente» não é declarada como punível pelo Direito positivo. Se esta impunidade nos cai mal, podemos falar na verdade de uma «lacuna político-jurídica», de uma «lacuna crítica», de uma «lacuna imprópria», quer dizer, de uma lacuna do ponto de vista de um futuro Direito mais perfeito («de lege ferenda»); não, porém, de uma lacuna autêntica e própria, quer dizer, duma lacuna no Direito vigente («de lege data»). Uma lacuna de lege ferenda apenas pode motivar o poder legislativo a uma reforma do Direito, mas não o juiz a um preenchimento da dita lacuna. A colmatação judicial de lacunas pressupõe uma lacuna de lege data.”
Também neste sentido, veja-se o referido, por exemplo, por Miguel Teixeira de Sousa (Introdução ao Direito, Almedina, 2012, pp. 390-391):
“Um caso concreto pode não encontrar nenhuma resposta no ordenamento sem que isso indicie qualquer lacuna. Há que, antes do mais, procurar delimitar o espaço livre de direito (ou espaço ajurídico) perante a lacuna. (…)
A lacuna, em contrapartida, pressupõe uma incompletude no ordenamento jurídico, ou seja, a lacuna é uma «incompletude insuportável», uma «incompletude insatisfatória no seio do todo jurídico» ou uma «incompletude contrária a um plano no âmbito do direito positivo». Existe uma lacuna quando falta uma regulamentação que é exigida pelo sistema jurídico, ou seja, quando haja casos com relevância jurídica que não encontrem nenhuma solução nesse sistema. (…)
A incompletude no sistema é uma insuficiência do mesmo para abranger casos que ele deveria incluir. É o próprio sistema que se torna incompleto a ele mesmo, porque ele é incompleto em função do que regula. Uma lacuna é uma incompletude no sistema, não uma qualquer falta de regulamentação de uma qualquer matéria: enquanto não houver sistema, não há nenhuma lacuna; só à medida que o sistema se vai construindo é que as lacunas podem ir aparecendo.”.
Face às alterações de tal disposição inseridas pela Lei n.º 65/2017, de 9 de agosto, a aparente ausência de regulamentação parece ser intencional: quando muito poderíamos estar perante uma lacuna de lege referenda, mas não perante uma lacuna de lege data.
Pelo exposto, entendemos que não assiste razão à Demandante no que concerne à possibilidade de, enquanto Professor(a) Coordenador(a), lhe ser facultada a prestação de provas públicas de avaliação da sua competência pedagógica e técnico-científica para a categoria de Professora Coordenadora Principal.
Consequentemente, o pedido da Demandante para que o A... seja condenado à prática do ato legalmente devido, admitindo-a à prestação de provas públicas de avaliação da sua competência pedagógica e técnico-científica para a categoria da Professora Categoria Principal, não pode proceder.
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DECISÃO
Nestes termos, o Tribunal Arbitral decide julgar improcedente a presente ação e, em consequência, absolver o Demandado do pedido formulado, não reconhecendo à Demandante o direito de realização de provas públicas de avaliação de competência pedagógica e técnico-científica para transitar para a categoria de Professor Coordenador prevista no Estatuto de Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico (ECPDESP), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 185/81, de 1 de julho, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 207/2008, de 31 de agosto, e pela Lei n.º 7/2010, de 13 de maio.
Custas a cargo da Demandante.
Notifique.
Lisboa, 1 de fevereiro de 2019.
O árbitro,
Nuno Pimentel Gomes