Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 183/2013-T
Data da decisão: 2014-03-19  Selo  
Valor do pedido: € 19.971,70
Tema: Propriedade vertical; Verba 28.1 da TGIS
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DECISÃO

 

Requerente: A … & …, S.A. (NIF …), com sede no …, Rua …, doravante Requerente

Requerida: Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante AT.

 

  1. RELATÓRIO

 

  1. Em 29 de Julho de 2013, foi aceite o pedido de constituição de tribunal arbitral, nos termos do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), que a Requerente submeteu ao Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), solicitando a anulação dos actos tributários de Imposto do Selo do ano de 2012 (melhor identificados no pedido de pronúncia arbitral) no montante global de €19.971,00, operados ao abrigo da verba 28.1 da Tabela Geral de Imposto do Selo (TGIS).

 

  1. Nos termos do artigo 6.º, n.º 2, alínea a), do RJAT e por decisão do Conselho Deontológico foi designado árbitro o ora signatário, que aceitou a nomeação no prazo legal para o efeito.

 

  1. O tribunal arbitral foi constituído no dia 26 de Setembro de 2013 (cfr. Acta de constituição do tribunal arbitral), tendo a AT sido notificada para apresentar resposta, no prazo e termos legais. Foi designado o dia 9 de Janeiro de 2014 para realização da primeira reunião do tribunal arbitral, a que alude o art.º 18.º do RJAT.

 

  1. A Requerida apresentou a sua resposta em 1 de Novembro de 2013, pugnando pela manutenção do acto sindicado.

 

  1. Na reunião do tribunal arbitral, realizada nos termos e com os propósitos do artigo 18º do RJAT, a Requerente solicitou a apresentação de alegações escritas que a AT considerou dispensáveis. O Tribunal entendeu não dever (nem poder) limitar tal pretensão pelo que notificou as partes para apresentarem as suas alegações escritas.

 

 

A.1) O Pedido da Requerente

 

 

  1. A Requerente solicita a anulação das liquidações de imposto do selo referentes a 2012 e operadas ao abrigo da verba 28.1 da TGIS com fundamento em erro sobre os pressupostos de direito com as demais consequências e, a título subsidiário, a anulação das mesmas liquidações com base na respectiva falta de fundamentação. Alegou, em síntese, que:

 

  1.  Quanto ao pedido principal: Erro sobre os pressupostos de direito

 

O valor patrimonial tributário (VPT) inscrito na matriz não é superior a € 1.000.000,00 pelo que não tem aplicação a norma de incidência prevista na verba 28.1 da TGIS.

 

Com efeito, estamos na presença de um prédio em propriedade total com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, o que determina, nos termos do n.º 3 do art.º 12.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI) a consideração separada na inscrição matricial e a determinação, igualmente separada, do respectivo VPT.

 

Inexistindo qualquer norma legal que faça corresponder o VPT de um prédio composto por várias fracções independentes à soma das respectivas partes que, aliás, são objecto de liquidação de IMI separada com base no respectivo – de cada fracção - VPT.

 

Nos termos da alínea u) do n.º 1 do art.º 5º do Código do Imposto do Selo, a liquidação do imposto processa-se, no que à verba 28.1 da TGIS respeita, no momento e de acordo com as regras do CIMI (com as necessárias adaptações) que determinam que o imposto é liquidado anualmente e com base nos valores patrimoniais dos prédios.

 

No caso concreto, o IMI é liquidado em relação a cada parte susceptível de utilização independente e tendo em conta o respectivo VPT, pelo que não existe qualquer suporte legal para a actuação da AT que somou os VPT das fracções de utilização independente para ficcionar um valor do prédio total que, após expurgado dos VPT dos andares com afectação comercial, foi sujeito a imposto do selo.

 

Por outro lado, estando o prédio em propriedade total e sendo constituído por partes com afectação comercial e partes com afectação habitacional, não pode a AT definir a afectação do prédio como sendo s habitação. Tal qualificação extravasa a lei, não encontrando suporte nem na sua letra, nem no seu espírito.

 

Sendo a liquidação de IS decorrente da mesma ilegal.

 

Acresce ainda a inconstitucionalidade da interpretação da norma que subjaz às liquidações de imposto do selo, por violação do Princípio da Igualdade

 

A distinção, introduzida pelo legislador e intérprete, entre prédios constituídos em propriedade horizontal e prédios em propriedade total com partes susceptíveis de utilização independente para efeitos de imposto do selo constitui uma distinção arbitrária e violadora do princípio da igualdade.

 

Distinção esta que – para efeitos fiscais - não existia até à entrada em vigor da Lei que introduziu a nova verba 28 da TGIS.

 

Esta distinção arbitrária também se verifica na afectação dada ao prédio pelos seus proprietários, consoante os afectem funcionalmente a habitação ou a comércio, ainda que em qualquer das situações, destinando-os ao mercado de arrendamento.

 

Pelo que esta distinção arbitrária ofende o princípio da tutelado pelo artigo 13º da Constituição da República Portuguesa.

 

  1.  Quanto ao pedido subsidiário: Vício de falta de fundamentação

 

A Requerente foi notificada de vários documentos para pagamento, identificados com diferentes números mas não sendo indicada a liquidação que se lhes encontra subjacente: apenas se encontra identificado o número do documento relativo a cada notificação.

 

A ausência de fundamentação legalmente exigida do acto de liquidação constitui um vício que enferma o acto de ilegalidade, nos termos da alínea c) do art.º 99º do Código de Procedimento e do Processo Tributário (CPPT).

 

  1.  Em face do exposto, a Requerente solicitam:

 

  1. a anulação das liquidação de imposto do selo em causa, com base em erro sobre os pressupostos de direito, com as demais consequências legais; ou, subsidiariamente

 

  1. a anulação das referidas liquidações com base na respectiva falta de fundamentação;

 

 

A.2) A Resposta da Requerida

 

  1.  Na sua resposta, a Requerida pugnou pela total improcedência do pedido, sustentando os actos sindicatos com a seguinte fundamentação:

 

  1.  Quanto ao pedido principal de suposto erro sobre os pressupostos de direito

 

A Requerente não tem razão, porque muito embora a liquidação de imposto do selo nas situações previstas na verba 28.1 da TGIS se processo de acordo com as regras do CIMI, o legislador ressalva os aspectos que careçam da devida adaptação.

 

Este é o caso, precisamente, dos prédios em propriedade total, ainda que com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente: muito embora o IMI seja liquidado relativamente a cada parte (de utilização independente), para efeito de imposto do selo releva o prédio na sua totalidade, pois as divisões de utilização independente não são havidas como prédio, ao contrário doas fracções autónomas.

 

Também não tem razão a Requerente quanto à forma de determinação do VPT sujeito a imposto, porquanto existindo partes de afectação não habitacional, importa expurgar o respectivo VPT do valor sujeito a imposto do selo, sob pena de excesso de quantificação.

 

Por outro lado, também inexiste qualquer violação do Princípio de Igualdade, porquanto a diferente tributação – entre prédios constituídos em propriedade horizontal vs propriedade total – decorre dos diferentes efeitos jurídicos inerentes a estas duas figuras: a constituição em propriedade horizontal determina a independência jurídica de cada fracção autónoma, enquanto os prédios em propriedade total constituem uma única realidade jurídico-tributária.

Inexiste, assim, qualquer discriminação.

 

Quanto ao diferente tratamento dos prédios com distinta aptidão (comércio ou habitação), resulta de uma opção do legislador, norteada por critérios políticos e económicos. Aliás, não podemos esquecer o contexto em que surge esta tributação em Imposto do Selo, num momento de crise económica em que se procura uma máxima de eficácia na obtenção de receita fiscal com o mínimo de lesão de outros interesses juridicamente relevantes.

 

Deve, assim, improceder o alegado vício de violação de lei por erro quanto aos pressupostos de direito.

 

  1.  Quanto ao pedido subsidiário de alegado vício de forma por falta de fundamentação

 

Não é verdade que as liquidações não identifiquem o acto de liquidação que lhes serve de suporte, como aliás resulta da leitura do respectivo teor: identificam a disposição aplicável, a qualificação e quantificação do facto tributário e o apuramento do imposto por aplicação ao VPT em causa da taxa de 1%, bem como o ano a que respeitam e a data em que foram operadas.

 

Pelo que, tratando-se de um acto tributário que pode ser fundamentado de forma sumária, nos termos do art.º 77º, n.º 2 da Lei Geral Tributária (LGT), conclui-se que os actos tributários não carecem da fundamentação legalmente devida.

 

O vício invocado não pode, pois, proceder.

 

  1.   Com a sua resposta, juntou aos autos o Processo Administrativo.

 

  1.   As partes apresentaram alegações escritas em que reforçaram a argumentação produzida em sede de requerimento inicial e resposta.

 

  1. SANEAMENTO DO PROCESSO 

 

  1. O tribunal é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído nos termos do RJAT.

 

  1. As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas.

 

  1. O processo não padece de vícios que o invalidem.

 

  1. THEMA DECIDENDUM

 

  1.  Foi submetida a este Tribunal Arbitral a apreciação da legalidade das liquidações de imposto do selo operadas nos termos da verba 28.1 da TGIS, juntas aos autos com o pedido de pronúncia arbitral.

 

  1. MATÉRIA DE FACTO ASSENTE

 

  1.  Com interesse para a decisão da causa e com base nos documentos juntos, foi dada como assente a seguinte factualidade:

 

  1. A Requerente é proprietária de um imóvel em propriedade total, sito na Av. … em …, constituído por 14 (catorze) andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, sendo duas afectas a comércio e doze afectas a habitação.

 

  1. O VPT do prédio em propriedade total ascende a € 2.104.850,00.

 

  1. Cada andar ou divisão de utilização independente tem um VPT próprio calculado nos termos do Código do IMI que varia entre € 162.810,00 e € 171.500,00 e é sobre este que é liquidado o imposto municipal sobre imóveis de cada andar/divisão.

 

  1. A AT deduziu ao valor patrimonial total do prédio acima indicado o VPT dos dois andares/divisões afectas a comércio e considerou o resultado (€ 1.997.170,00) sujeito a imposto do selo nos termos da verba 28.1 da TGIS.

 

  1. Posteriormente e com base no VPT resultante de tal operação aritmética, operou a liquidação do imposto do selo (de € 19.971,70) que repartiu pro rata das doze divisões com afectação habitacional, operando doze liquidações de imposto tendo a Requerente como sujeito passivo. O encargo de cada uma dessas doze liquidações foi dividido em três prestações, a pagar nos meses de Abril e Julho e Novembro de 2013.

 

 

  1. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

 

E.1) Pedido principal – do erro de pressupostos na aplicação da verba 28.1 da TGIS nas liquidações sindicadas

 

  1.   A Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, que efectuou diversas alterações ao Código do Imposto do Selo, aditou à TGIS a verba 28, com a seguinte redacção:
  1. – Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1.000.000 – sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:
    1. – Por prédio com afetação habitacional – 1 %;
    2. – Por prédio, quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças – 7,5 %.

 

  1.  Nas disposições transitórias (art.º 6.º da referida Lei), estabeleceu-se o seguinte, no que ao ano de 2013 respeita:

(…) 2 – Em 2013, a liquidação do imposto do selo previsto na verba n.º 28 da respetiva Tabela Geral deve incidir sobre o mesmo valor patrimonial tributário utilizado para efeitos de liquidação de imposto municipal sobre imóveis a efetuar nesse ano.”

 

  1.   Em primeiro lugar, importa concretizar o conceito – novo - de “prédio de afectação habitacional”, uma vez que se não o encontramos na legislação fiscal anterior.

 

  1.   Com efeito, percorrendo os vários conceitos de prédio definidos nos artigos 3.º a 5.º do CIMI, encontramos as definições de prédios rústicos, urbanos e mistos. Afastando os prédios urbanos e mistos, que claramente não serão aplicáveis ao conceito em concretização, o artigo 6.º do mesmo código define as várias espécies de prédios urbanos, como segue:

 

Espécies de prédios urbanos

1 – Os prédios urbanos dividem-se em:

a) Habitacionais;

b) Comerciais, industriais ou para serviços;

c) Terrenos para construção;

d) Outros.

2 – Habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços são os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins.

3 – Consideram-se terrenos para construção os terrenos situados dentro ou fora de um aglomerado urbano, para os quais tenha sido concedida licença ou autorização, admitida comunicação prévia ou emitida informação prévia favorável de operação de loteamento ou de construção, e ainda aqueles que assim tenham sido declarados no título aquisitivo, exceptuando-se os terrenos em que as entidades competentes vedem qualquer daquelas operações, designadamente os localizados em zonas verdes, áreas protegidas ou que, de acordo com os planos municipais de ordenamento do território, estejam afectos a espaços, infra-estruturas ou equipamentos públicos. (Redacção da Lei n.º 64-A/08, de 31-12)

4 – Enquadram-se na previsão da alínea d) do n.º 1 os terrenos situados dentro de um aglomerado urbano que não sejam terrenos para construção nem se encontrem abrangidos pelo disposto no n.º 2 do artigo 3.º e ainda os edifícios e construções licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal outros fins que não os referidos no n.º 2 e ainda os da excepção do n.º 3.

 

 

  1.  Partindo destes conceitos e recorrendo aos artigos 11.º da LGT e 9.º do Código Civil sobre interpretação de leis, entende-se que a norma de incidência prevista na verba 28.1 da TGIS parte do conceito de prédio urbano habitacional, desde logo afastando os terrenos para construção e os prédios urbanos comerciais, industriais ou de serviços e os outros.

 

  1.   Mas a concretização do conceito vai mais longe: exige a afectação, o destino do imóvel, o uso que lhe é dado.

 

  1. Assim, neste exercício de delimitação conceptual, parece que a norma de incidência pretende visar os prédios urbanos que tenham como destino normal a habitação e sejam efectivamente usados (afectos) a habitação.

 

  1.   Aliás, parece ser é também por isso que foi adoptada na lei a expressão “prédios com afectação habitacional” e não “prédios de afectação habitacional”, prevista na Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º 96/XII, em que se baseou a Lei n.º 55-A/2012.

 

  1.  No que antecede, acompanha-se, assim, a decisão proferida no processo 50/2013-T deste CAAD, aliás invocada pela Requerente.

 

  1.  Até aqui, não existira erro nos pressupostos de aplicação da verba 28.1 da TGIS ao prédio da Requerente.

 

  1. Porém, a questão sub judice vai mais longe e prende-se com a qualificação relevância dos andares ou divisões susceptíveis de utilização independente no conceito de prédio e, consequentemente, na determinação da matéria colectável do imposto. Como vimos, só se o “prédio” tiver um VPT igual ou superior a € 1.000.000,oo ficará sujeito ao imposto do selo previsto na verba 28.1 da TGIS. Pergunta-se pois, nos casos dos prédios em propriedade total mas com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, como se determina o VPT relevante: somando o VPT daquelas divisões, como pretende a AT com base no conceito civil de prédio total? Ou considerando o VPT de cada um desses andares calculado nos termos do CIMI como defende a Requerente?

 

  1. A resposta tem que ser encontrada, por um lado na manifestada intenção do legislador, por outro, na concretização da mesma no enquadramento da norma de incidência.

 

  1. Como referido na decisão proferida no processo 132/2013-T este CAAD:

(…) nos trabalhos relativos à discussão da proposta de lei n.º 96/XII na Assembleia da República (…) justificou-se tal medida, apelidada de "taxa especial sobre os prédios urbanos habitacionais de mais elevado valor", com a necessidade de cumprir com os princípios da equidade social e da justiça fiscal, onerando mais significativamente os titulares de propriedades com elevado valor destinadas a habitação, e, nessa medida, fazendo incidir a nova "taxa especial" sobre as "casas de valor igual ou superior a 1 milhão de euros."

 

 

  1. Supõe-se, assim, uma capacidade contributiva (muito) acima da média que justifica um esforço contributivo “especial” para aqueles que tenham um “casa” ou “prédio” cujo valor seja pelo menos de um milhão de euros.

 

  1. A intenção do legislador parece, pois, indiciar que o escopo da norma de incidência é tributar realidades independentes, individualizadas e não resultantes de uma agregação ou soma, ainda que jurídica.

 

  1. E o enquadramento legislativo – diga-se - vai no mesmo sentido.

 

  1. Com efeito, nos termos do n.º 2 do artigo 67.º do Código do Imposto do Selo (CIS), “Às matérias não reguladas no presente Código respeitantes à verba n.º 28 da Tabela Geral aplica-se, subsidiariamente, o disposto no CIMI”

 

  1.  E recorrendo ao disposto no artigo 12.º, n.º 3 Cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina também o respectivo valor patrimonial tributário”.

 

  1.  Como vimos, nenhum dos andares em causa tem um VPT igual ou superior a um milhão de euros. Pelo contrário, o VPT mais elevado ascende a €171.500,00

 

  1.  E, com o devido respeito pela tese da AT, não parece que “as necessárias adaptações” ressalvadas pelo legislador, permitam considerar as partes de prédio susceptíveis de utilização independente para lhes atribuir um VPT autónomo e independente, considerando-as verdadeiros “prédios” para efeito de liquidação de IMI, por um lado,

 

  1. Para logo de seguida desconsiderarmos essa realidade jurídico-tributária em sede de tributação de imposto do selo - incidente precisamente sobre o valor patrimonial tributário e com remissão expressa para o CIMI, note-se – e recorrermos ao conceito jurídico-civil de “prédio total”, mediante a soma aritmética dos VPT de cada “andar”.

 

  1. Este raciocínio interpretativo não parece coadunar-se com os princípios de interpretação das normas tributárias plasmados no artigo 11º da LGT.

 

  1. E mesmo reconhecendo-se à AT na presente liquidação de IS rigor e coerência, ao considerar apenas os VPT´s dos andares afectos a fins habitacionais, de entre os existentes no prédio em regime de propriedade total de que tratam os autos, a filosofia subjacente a esta interpretação da lei parece radicar num “princípio de oportunidade tributária” tendo em vista a maximização da receita fiscal.

 

  1. Assim se conclui que a matéria colectável que serve de base à norma de incidência da verba 28.1 da TGIS é o VPT determinado nos termos do CIMI para cada “prédio” no sentido tributário deste termo, neste se compreendendo, pois, as fracções autónomas a par dos andares ou partes de prédio susceptíveis de utilização independente (e das moradias).

 

  1. E não o conceito civil que distingue os prédios em propriedade total com andares susceptíveis de utilização independente dos prédios em regime de propriedade horizontal.

 

  1. Em face do exposto, considera-se verificado o alegado vício de violação de lei por erro sobre os pressupostos de direito, o que determina a declaração de ilegalidade e consequente anulação das liquidações operadas.

 

  1. Alega ainda a Requerente que interpretação da norma em causa subjacente às presentes liquidações de IS é inconstitucional por violação do princípio da igualdade, na medida em tributava andares susceptíveis de utilização independente e não tributaria fracções autónomas.

 

  1.  Isto é, a norma de incidência dependeria, exclusivamente, do regime jurídico-civil escolhido pelo proprietário: se mantivesse o prédio em propriedade total, seria tributado; se adoptasse o regime de propriedade horizontal, evitava essa tributação.

 

  1. Entende a AT que não se verifica a alegada inconstitucionalidade porquanto a tributação do imóvel – em regime de propriedade total face a um constituído em regime de propriedade horizontal – decorre dos efeitos jurídicos inerentes a estas duas figuras.

 

  1.  Já vimos que os pressupostos da norma de incidência são distintos – no entendimento aqui sufragado – e não tratam diferentemente as duas situações acima referidas, o que desde logo afasta o tema da eventual inconstitucionalidade, pelo menos nessa medida.

 

E.2) Pedido subsidiário – do vício de forma de falta de fundamentação

 

 

  1.  Estando decido favoravelmente o pedido principal da Requerente, fica prejudicado o conhecimento do pedido subsidiário que a mesma apresenta no presente processo arbitral.

 

  1. DECISÃO

 

Em face do exposto, decide-se julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral com a consequente anulação, com todos os efeitos legais, dos actos de liquidação de IS ora impugnados.

 

Custas a cargo da Requerida Autoridade Tributária, no montante de € 1.224,00, por força do artigo 4.º do RCPAT e da Tabela I anexa a este último, considerando o valor da causa que se fixa em € 19.971,70

 Notifique-se.

19 de Março de 2014

 

O Árbitro

 

(João Maricoto Monteiro)